terça-feira, 4 de fevereiro de 2025

Shark Night 3D / Medo Profundo (2011)


Estava eu aqui a queixar-me no outro dia que os filmes de tubarões parecem todos iguais quando este aparece com uma reviravolta.
Mas não nos entusiasmemos. “Shark Night 3D” é muito mau, incrivelmente mau. Nos primeiros 30 minutos eu estava a pensar que este filme não devia ter sido feito em 1D, nem em 2D e muito menos em 3D.
“Shark Night 3D” começa como todos os outros filmes do género: meia dúzia de adolescentes vão passar um fim-de-semana à casa de campo de uma colega/amiga no Luisiana, à beira de um lago de água salgada, no intuito de beber, fornicar e tomar drogas, mas o lago tem tubarões e um dos jovens é prontamente atacado. Aqui começa logo a estupidez. O rapaz perde um braço mas não podem chamar uma ambulância porque os telemóveis não apanham rede (o que eles já sabiam) e a casa isolada (que é uma casa de família dos pais da rapariga, outra geração, portanto) não tem um telefone fixo? Nem sequer um rádio para as emergências? Custa-me a crer.
De seguida, o rapaz que perdeu o braço decide voltar à água para se vingar do tubarão, porque no bairro dele paga-se “olho por olho”, como se o tubarão fosse um grande gangsta de esquina. Escusado será dizer que o rapaz acaba por perder mais do que um braço...
Como é que os tubarões apareceram no lago, tão longe do mar? Uma das teorias dos adolescentes é que foram transportados para lá por uma inundação num dos últimos furacões. E é aqui que o filme de tubarões se torna numa espécie de “Deliverance” (quem não viu “Deliverance”, filme de 1972 com Jon Voight, Burt Reynolds e Ned Beatty, vá já correr a ver, até por uma questão de cultura geral para além da cinematográfica).
Basicamente, um grupo de pacóvios racistas e ressentidos descobriram nos tubarões uma maneira de se “vingarem” dos miúdos privilegiados da cidade. Pronto, era a reviravolta e eu queria falar de “Deliverance”, mas não há muito mais a dizer.

11 em 20 (porque não mataram o cão, desculpem o spoiler)


domingo, 2 de fevereiro de 2025

1899 (2022)

O navio Kerberos, à semelhança do Titanic, viaja para a América com passageiros de primeira e segunda classe. Entre eles Maura Franklin, médica inglesa a quem não é permitido exercer a profissão por ser mulher. Depressa percebemos que todas as personagens principais, tal como Maura, têm segredos no seu passado, e que todos receberam um estranho envelope com a promessa "o que se perdeu será (re)encontrado".
A meio da viagem, o Kerberos recebe um telegrama com coordenadas que parecem provir do Prometheus, um outro navio da mesma companhia desaparecido no mar há quatro meses. Quando o Kerberos o aborda, o Prometheus é um navio fantasma, sem passageiros nem tripulação excepto um rapaz que se recusa a falar. O telégrafo foi destruído, então quem é que estava a mandar as mensagens?
Não é um spoiler dizer que neste navio nada é o que parece. Percebemos logo, desde os primeiros minutos, que algo de muito bizarro se passa a bordo. O próprio som de fundo, que por vezes nos chega distorcido como uma má transmissão de rádio, nos alerta para esta estranheza. Por todo o lado, no navio, encontramos triângulos: invertidos, sobrepostos, em pirâmide. Um personagem chega a bordo sem sabermos bem como, trazendo com ele uns besouros metálicos que, tudo indica, começam a provocar mortes entre passageiros e tripulação. Segue-se um motim e uma passagem sinistra em que as pessoas se atiram borda fora como se algo as controlasse. O capitão e outros passageiros vêem fantasmas de pessoas já falecidas. O que se passa?
O meu primeiro palpite foi que o Kerberos estava sob controlo de extraterrestres a fazerem uma experiência, ou que eram todos pacientes de um hospital psiquiátrico e que um deles estava a "fabricar" a viagem na sua mente, ou, a solução à "Lost", que estavam todos mortos e não sabiam. A resposta é mais elaborada do que isso, mas não esclarece todas as perguntas.

Spoilers
"1899" é dos mesmos criadores de "Dark", uma das melhores séries que já vi na vida, e já se esperava daqui um mistério complexo que nos fizesse dar voltas à cabeça e que nunca seria para espectadores impacientes. Mas, para não decepcionar ninguém, vou dizer desde já que a série foi cancelada depois da primeira temporada e que deixou os fãs frustrados e com muitas dúvidas por responder. Vou revelar que o que se passava era uma simulação, o que na minha opinião nem chega a ser um spoiler porque não explica nada. Se a simulação era para Maura, qual é o papel das outras personagens, algumas das quais com histórias dramáticas e passados traumáticos? Como é que elas foram parar à simulação? Quem é que faria de propósito uma simulação tão sádica? Eu tenho fé, depois de ver "Dark", que os criadores iriam explicar isto tudo nas temporadas seguintes.
O que me leva ao maior mistério de todos: como é que uma série é aprovada, aparentemente sem que os executivos saibam previamente o final e/ou acreditem na história, a ponto de a cancelarem após uma única temporada? Bem, no caso de "Lost", como os próprios criadores da série admitiram, ninguém sabia onde é que aquilo ia dar. Estando tanto dinheiro em jogo, já para não falar no desagrado dos fãs, estas coisas não me entram na cabeça.
Se mesmo assim vale a pena ver "1899"? Eu gostei bastante, pelo cenário de época, pelo ambiente sombrio, pelas histórias contadas, pelas personagens, pelo mistério criado. Só faltou integrar todos estes elementos num todo coerente, mas acredito que isso seria conseguido. Deste modo, mesmo inacabado, aconselho a todos os fãs de mistério e ficção científica.
Uma curiosidade, um dos actores é José Pimentão no papel de Ramiro, português de gema, a falar português de gema, antes de a Netflix ter decidido dobrar todas as falas em inglês.

ESTA SÉRIE MERECE SER VISTA: 1 vez

PARA QUEM GOSTA DE: Lost, Dark, ficção científica, mistério, drama

terça-feira, 28 de janeiro de 2025

Sea Fever / No Abismo do Mar (2019)


Uma traineira irlandesa parte para o mar levando a bordo como passageira uma estudante de biologia marinha que precisa de recolher dados para a sua investigação. Os donos do barco não têm tido sorte e estão quase a perder a embarcação se não conseguirem uma boa pescaria. Finalmente identificam um grande cardume mas este está numa zona de exclusão (onde é proibido pescar e onde existem baleias protegidas com crias). O dono do barco decide ignorar a proibição, sem dizer a ninguém, e de facto conseguem uma boa pescaria. Mas subitamente o barco é agarrado por alguma coisa que não o deixa mover-se. Um mergulho revela que é uma espécie de alforreca gigante e desconhecida que o prendeu nos seus tentáculos e está prestes a causar buracos no casco segregando uma substância gelatinosa que supostamente devia servir para atordoar uma presa grande (como uma baleia).
O animal acaba por se ir embora e libertar o barco, percebendo que não serve para comer, mas a substância viscosa já está no barco todo, incluindo no reservatório de água. Depressa, um a um dos tripulantes começam a apresentar comportamentos estranhos, seguidos de febre e cegueira. A estudante consegue isolar o motivo: a matéria viscosa contém ovos que entram na corrente sanguínea e se transformam em larvas, matando o hospedeiro. Uma vez que muitos tripulantes já estão infectados e que não conseguem descobrir uma cura, a estudante insiste numa quarentena em alto mar com que ninguém concorda. Sinceramente, eu também não concordaria. Primeiro deviam atracar em segurança, avisar as autoridades e então, sim, ficar em quarentena num sítio onde pudessem ter acesso a cuidados de saúde (se houvesse alguma coisa a fazer). A estudante acaba por decidir por todos e incapacitar o barco. Agora toda a gente fica impossibilitada de regressar a terra e de tentar encontrar uma cura. A estudante acha que fez um grande favor à humanidade, eu acho que ela não tinha o direito de se armar em deus.
“Sea Fever” é um filme na linha de “Alien” ou “The Thing” com um monstro marinho, que consegue manter a tensão do princípio ao fim. Mais uma vez é a ganância e o desrespeito pela natureza que coloca os pescadores em perigo e é a cegueira (passe o trocadilho) da arrogância que transforma uma situação péssima numa situação desesperada.

13 em 20 


domingo, 26 de janeiro de 2025

Wolf Creek (2016 - 2017)

“Wolf Creek” é uma série de duas temporadas baseada nos filmes homónimos. Eu não vi os filmes e não sabia o que estava a perder. Porque a série, forçosamente, contém spoilers, aconselho a ver os filmes primeiro.

Primeira temporada
Uma família americana está a acampar na Austrália junto a um rio. O miúdo mais novo vai andar de colchão de água e é atacado por um crocodilo. Surgido do nada, um caçador mata o crocodilo com um único tiro. À noite, ao jantar com a família, o estranho mata o pai e a mãe com uma faca de mato e o miúdo com uma espingarda. Resta a filha adolescente, Eve, que é alvejada mas consegue escapar.
Este estranho é Mick Taylor, um serial killer que odeia turistas e que há décadas colecciona vítimas no grande Outback australiano. Mick é um verdadeiro “personagem”, de meia idade mas mais alto e mais forte do que parece, um chapéu à Freddy Krueger, umas patilhas grisalhas e um risinho irritante ainda antes de se tornar sinistro, e tão sujo e transpirado que o cheiro nos chega através do écran. Mick Taylor também tem por hábito fazer piadas sem graça nenhuma, ofensivas a tudo e todos. Psicopata dos piores, sádico sem escrúpulos e desprovido de empatia, Mick mata indiscriminadamente homens, mulheres e crianças, como quem elimina uma espécie invasora (aliás, como ele se refere aos turistas). Na verdade, Mick não mata apenas turistas, mas estes são os mais fáceis de fazer desaparecer, não têm família ou conhecidos no país e só se dá por falta deles passado algum tempo. É sugerido, em algumas cenas, que Mick queira também aproveitar-se sexualmente das mulheres que captura, mas percebe-se que esse é um interesse secundário, se é que chega a ser um interesse. O que ele quer mesmo é matar, e em alguns casos torturar antes de matar. Porque é que a polícia ainda não o identificou? Porque Mick não deixa pistas no local do crime e não faltam sítios na vastidão do mato, rios e deserto australiano onde fazer desaparecer um corpo, seja por cortá-lo aos pedaços e dá-lo aos crocodilos ou simplesmente deixá-lo ficar no fundo de uma ravina onde ninguém vai sem motivo. Mick aparenta “aparecer e desaparecer” do nada, quase fantasmagórico, porque conhece o terreno a fundo e usa toda a sua experiência e auto-confiança para surpreender as vítimas. A polícia sabe dos inúmeros casos de turistas desaparecidos mas não tem qualquer indício que aponte para homicídio.
Isto muda quando Eve sobrevive e relata à polícia o que aconteceu, fornecendo mesmo uma descrição de Mick e da sua carrinha azul-clara. Nem todos os polícias acreditam na versão de Eve, considerando que o caso possa ter sido um homicídio-suicídio, mas o detective Sullivan Hill (Dustin Clare, o Gannicus de “Spartacus”, alguns anos mais velho mas ainda com figura de gladiador), que há muito tempo estuda os desaparecimentos, leva-a a sério.
Eve não é uma adolescente vulgar. É uma atleta de pentatlo olímpico, em plena forma mas com uma adicção a analgésicos, que se culpa pela morte dos pais e do irmão uma vez que estavam a fazer aquela viagem por causa do seu problema. Quando Sullivan lhe diz que localizar e prender Mick vai ser muito improvável, já para não falar da dificuldade em condená-lo sem provas para além do testemunho dela (os corpos nunca são encontrados e o veículo da família aparece queimado), Eve decide não voltar a casa e pôr-se ela própria à procura de Mick. Os pais de Eve eram polícias e ela tem conhecimentos de investigação criminal. Para começar, consegue roubar o dossier de Sullivan com os casos dos desaparecidos e dirige-se aos locais onde estes foram vistos pela última vez.
No caminho, numa carrinha muito velha (e esconderijo de droga sem que ela saiba), Eve tem o azar de chocar contra um carro de polícia. Isto leva-a à esquadra, onde entra em contacto com traficantes de droga. Uma vez que a polícia lhe apreendeu o passaporte e o dinheiro, Eve foge da prisão e rouba os traficantes, que imediatamente a perseguem também.
A princípio Eve tem o benefício de seguir Mick sem que ele saiba que ela sobreviveu, mas, à medida que ela vai questionando pessoas por onde passa, alguém acaba por informá-lo de que andam à sua procura. Começa um jogo perigoso do gato e do rato em que Mick tem toda a vantagem.
“Wolf Creek” tem outra personagem sempre presente: a Austrália e as suas paisagens inóspitas, desérticas, belas e perigosas. Vale a pena ver a série só pelos cenários e pelos ambientes tensos que se vivem nesses ermos. Sullivan diz que as pessoas vão para “O Território” (norte da Austrália) para desaparecer, e isso explica a sua relutância em falar quando se nota claramente que sabem mais do que dizem. Nesta cultura de silêncio ninguém se quer meter na vida alheia, especialmente a dos estranhos de passagem, o que joga igualmente em favor de Mick.
A série pode ter sido um bocadinho exagerada na maneira em que retrata os personagens masculinos. Dos homens que cruzam o caminho de Eve, dois querem violá-la (um deles à troglodita: “preciso de uma mulher, dá-me filhos”), Mick quer matá-la (e possivelmente torturá-la também) e apenas um se aproveita como pessoa decente. Não conto o polícia porque era só o que faltava que o polícia não a tratasse com profissionalismo. Ora, eu sei que os homens não são santos, mas esta estatística está um bocadinho deturpada. Por outro lado, os predadores seguem as vítimas aos locais onde elas estão mais vulneráveis, e Eve não podia estar mais vulnerável do que no deserto.
Falando da polícia, não é injusto dizer que as autoridades não fizeram o trabalho que deviam e ficam muito mal na fotografia. Não sei se é mesmo assim na Austrália, mas um dos carros de uma vítima, cheio de sangue e tudo, logo, uma cena de crime, foi deixado à beira da estrada onde o encontraram, nem sequer o levaram para análises forenses. Isto é facilitar a vida a Mick.
Eve comete dois erros típicos de filme de terror. A dado passo, quando já é Mick quem anda à caça dela, este mata o único polícia de serviço numa esquadra de interior. É a primeira vez que o vimos deixar um corpo. Eve tem ali a prova tangível de que precisava mas não aproveita a ocasião para chamar ajuda. Verdade seja dita, por esta altura ela já não está a agir com racionalidade, já não quer apenas que Mick seja apanhado, quer matá-lo ela própria. E finalmente, quando tem a oportunidade, comete o erro do costume de presumir que ele já está morto em vez de o matar de vez e bem morto. Obviamente, Mick não está morto porque há uma segunda temporada.
Não vou dizer o que acontece a Eve. Se por um lado ela não o conseguiu matar, por outro foi a primeira vez que Mick foi exposto às autoridades como assassino, com descrição e tudo. Agora Mick já não é invisível, é um homem procurado.


Segunda temporada
Mick tem perfeita consciência de que é um homem procurado e já nem se desloca na sua carrinha azul-clara quando tem de ir à “civilização”. O primeiro episódio mostra-nos a que ponto ele está irritado por saber que já o toparam. Mas entre saber que ele existe e saber onde ele está, num “deserto do tamanho do Texas”, como ele diz, vai uma grande diferença. Como se descobriu na temporada anterior, Mick tem a sua base de operações em Wolf Creek, uma cratera causada pela queda de um meteorito (que existe na realidade). Em tal ermo, a 500km da civilização, nada o impede de continuar a matar impunemente.
Desta vez, Mick descobre um autocarro cheio de turistas que vai visitar o Outback australiano. Depois de uma troca de palavras com o motorista, em que Mick se sente ofendido mas na verdade é uma desculpa, Mick mata o motorista, toma o lugar dele e desvia o autocarro para o deserto. De seguida deixa os turistas abandonados para começar a “caça”.
Gostei que o primeiro episódio se focasse especialmente nos personagens, para termos tempo de os conhecer e conseguirmos preocupar-nos com eles antes de começarem a morrer, como já sabemos que vai acontecer. Um dos passageiros é um geek que só fala de carros, coitado, e que é uma seca ambulante. Tive logo pena dele, porque a não ser que a série nos surpreendesse muito ele seria dos primeiros a ir. Não esperei é que fosse tão depressa, mas o desgraçado tem o azar de dar uma seca a Mick a falar dos melhores veículos para o deserto, e se o coitado é capaz de torrar a paciência a um santo, Mick não é nenhum santo. Visto assim, até foi cómico, mas tive pena do infeliz.
Os turistas são muito diversos: uma família alemã com uma filha adolescente, um casal gay, outro casal a tentar salvar o casamento, duas amigas canadianas, um veterano de guerra americano, um blogger de sucesso (que inveja), um psiquiatra forense especialista em assassinos. Quando se encontram abandonados no deserto, as opiniões dividem-se quanto ao que fazer. Dois deles, o marido de Rebecca e o parceiro de Steve, os mais aptos para caminhadas, decidem ir investigar o terreno e procurar Mick, que julgam o motorista substituto. Entretanto, no autocarro, os restantes encontram o corpo do motorista escondido no vagão refrigerador, e instala-se o pânico. Agora é uma questão de colocarmos as nossas apostas. Quem se vai safar? Eu tinha fé no veterano de guerra, o único com as competências necessárias para travar uma verdadeira batalha contra um inimigo armado que domina o terreno, ou em Brian, o psiquiatra forense, ou em Rebecca, que é sempre mostrada como uma mulher de acção e iniciativa, principalmente quando o marido nunca regressa da exploração (porque deu de caras com Mick).
A situação dos turistas é mais desesperada e impotente do que na primeira temporada. Perdidos no deserto, expostos ao sol escaldante e às tempestades nocturnas, sem telemóveis, sem comida e sem água, Mick só tem de os caçar um por um antes que eles se matem a eles próprios. Nina, a alemã de meia-idade, consegue a proeza de deslocar um ombro e ser mordida por uma cobra venenosa em menos de 24 horas. Brian, que também reconhece em Rebecca maiores hipóteses de escapar, sugere-lhe que deixem os outros para trás, e tem esta conversa de abandonar os mais fracos tantas vezes que a certa altura desconfiamos se ele não é um psicopata também. Brian argumenta que naquela situação limite vale a lei da sobrevivência do mais forte, ao que Rebecca retorque que o ser humano não age pela sobrevivência individual mas antes pela preservação da espécie como um todo. Mas, se é para filosofar, Rebecca está a ser hipócrita e Brian tem razão. Para o grupo ter mais probabilidades de sobreviver, um dos mais fortes teria de tentar fugir sozinho e pedir ajuda, aliás, como a própria Rebecca reconhece no fim, já para não falar em denunciar Mick para benefício de toda a humanidade. Rebecca não está a pensar no melhor para todos coisa nenhuma, está somente fixada em encontrar o marido se este ainda estiver vivo. O que é compreensível, mas não tem nada a ver com a sobrevivência da espécie.
A segunda temporada inclina-se um bocadinho para o sobrenatural. A certa altura os sobreviventes encontram um outro habitante da zona de Wolf Creek que lhes diz que ainda lá vive porque a cratera emite um zumbido, um chamamento, que o mantém lá, e que ele responsabiliza por ter sido a causa do encerramento da mina onde ele trabalhava. Em suma, a zona da cratera é maligna.
O mesmo pensam dois nativos que cruzam o caminho de Steve quando este se perde do grupo. A princípio querem-no ajudar, até ouvirem falar de Mick, a quem um deles chama o Homem-Espírito. O outro não acredita nessas superstições mas a verdade é que também já conhece a reputação de Mick e das “coisas más” que acontecem quando ele aparece, e insiste em ir buscar ajuda antes de o confrontar (o que é inteligente). O episódio dos nativos é dos mais interessantes em termos culturais. Quando um deles é esfaqueado, um dos mais velhos começa a entoar um cântico/feitiço contra Mick, uma espécie de vudu, e o certo é que funciona e que Mick se sente doente. Uma vez que o vudu, aparentemente, actua por auto-sugestão, e que Mick não tinha maneira de saber o que eles estavam a fazer, a insinuação é de que o vudu nativo resulta ou de que existe algo de sobrenatural no próprio Mick. Eu gosto muito de sobrenatural mas, neste caso, preferia um assassino de carne e osso, com as suas forças e fraquezas, como Dexter. Não precisamos de outro Michael Myers.
A primeira temporada é sangrenta que baste, mas a segunda supera-se. Existem muitas cenas susceptíveis de perturbar os mais sensíveis. Já os outros, aqueles que gostam de um bom thriller de terror e serial killers, se ainda não conhecem Mick Taylor não sabem o que estão a perder.
“Wolf Creek” teve apenas duas temporadas mas John Jarratt, o excelente actor que dá vida ao infame Mick Taylor, revelou que se fala numa terceira. Não sei até que ponto a coisa foi para a frente, mas ainda há muito para explorar nesta história que eu gostaria de ver.

ESTA SÉRIE MERECE SER VISTA: 1 vez

PARA QUEM GOSTA DE: Dexter, Mentes Criminosas, Hannibal, serial killers


terça-feira, 21 de janeiro de 2025

Host (2020)

Este era o filme da quarentena que eu queria ver, embora na verdade não fosse preciso quarentena para ele acontecer. O enredo é muito simples: seis amigos, mortos de tédio por causa da quarentena Covid, decidem fazer uma sessão de espiritismo via Zoom e em vez de contactarem um espírito benévolo acabam por invocar um poltergeist ou coisa pior.
A princípio não estão sozinhos. Para os guiar, igualmente pelo Zoom, têm uma médium especialista. Apenas uma ou duas pessoas levam a séance a sério. Os outros estão completamente no gozo e até fazem um jogo em que têm de beber sempre que a médium disser “astral plane”. Em suma, em vez de cumprirem o desejo da anfitriã da reunião para que fiquem atentos e sejam respeitosos, fazem exactamente o contrário e estão na brincadeira (foi por causa de brincadeiras desrespeitosas com uma Ouija Board que Regan ficou possuída no “Exorcista”).
A sessão começa normalmente e a médium pede-lhes que se concentrem e tentem pensar num ente querido falecido com quem estabelecer contacto. É então que uma das amigas decide inventar uma história de um antigo colega de escola que se enforcou, só para se divertirem mais.
Subitamente, a ligação de internet com a médium é interrompida e os amigos ficam completamente sozinhos, sem qualquer orientação. É também quando as coisas começam a acontecer, e acontecem a todos independentemente de estarem em locais diferentes.
“Host” é muito curto (apenas 60 minutos, a duração de um episódio da Netflix) e totalmente filmado pelas câmaras dos computadores e telemóveis dos personagens. Este é um filme de 2020 que parece todo ele ter sido feito por pessoas em quarentena, cada uma em sua casa (se tal coisa é possível), mas resulta. Fiquei um pouco decepcionada, admito, porque o aspecto da quarentena Covid, o que em princípio seria toda a razão de ser do Zoom, não foi quase aproveitada. Aliás a fórmula não é original e mesmo antes dos lockdowns já tinha sido explorada em filmes como Unfriended: Dark Web.
No entanto, “Host” funciona pelo nível de violência que apresenta, criando no espectador uma sensação de que lhe podia acontecer a ele. Não aconselhável para ver à noite, sozinho em casa, depois de uma sessão de Zoom.

13 em 20

 

segunda-feira, 20 de janeiro de 2025

21 anos do blog Gotika

Este blog fez 21 anos em Dezembro passado. Não me lembrei de assinalar os 20 anos, mas mais vale tarde do que nunca.
No início, em Dezembro de 2003, o blog foi alojado no Sapo. Devido a períodos prolongados em que os servidores estavam em baixo e a falta de muitas funcionalidades úteis, mudei-me para o Blogger menos de um ano depois, em Setembro de 2004. Entretanto, o Sapo fez-me o favor de apagar o blog original por inactividade, (Obrigadinha Sapo, aqueles 2MB de ficheiros deviam estar a pesar muito, certo?) Ainda cheguei a publicar aqui muitos dos posts relevantes, mas não todos.
 
 
Nestes 21 anos, vi muita coisa acontecer. A blogosfera esvaziou-se. Muitos blogs nasceram e morreram, outros continuam abandonados por aí às teias de aranha. Depois de passar a novidade dos blogs, a maioria das pessoas mudou-se para o Facebook, para o Instagram, sei lá para onde. Nunca gostei dessas plataformas de fotografias e futilidade, mas depressa compreendi (da minha experiência pessoal) que muita gente andava nos blogs para fins de engate, como se a blogosfera fosse um site de dating. Oxalá tenham melhor sorte.

Este blog foi sempre a minha forma preferida de expressão. A princípio publicava posts muito pessoais, até achar que já tinha dito tudo o que queria dizer sobre mim e sobre a sociedade em que vivemos. Durante uns meses quase deixei este espaço às moscas, cheguei a ponderar deixar-me disto, mas resolvi ressuscitá-lo através de críticas de cinema, de televisão e literatura (e música, em muito menor quantidade), em que ainda vou mandando umas bocas à actualidade quando vem a jeito.
Nunca pensei neste blog como maneira de agradar aos leitores. Nesse aspecto, este espaço é muito egoísta. Fico feliz quando me lêem, não me ralo nada que não leiam. Preferia que gostassem do que aqui se escreve, mas ultrapassa-me. Também gostaria de ter mais comentários (actualmente estão abertos a todos) mas fica ao critério dos leitores.
A verdade é que o blog me tem dado muito gozo (e 800.000 visitantes!!!) ao longo de 21 anos. Tenciono ficar por aqui enquanto Blogger quiser. Amém.


 

domingo, 19 de janeiro de 2025

Great Expectations, de Charles Dickens

Este foi o meu primeiro livro de Charles Dickens e eu pensei que ia ser a seca da minha vida. Não podia estar mais enganada. A julgar pelas adaptações cinematográficas, sempre imaginei que “Great Expectations” era um dramalhão à semelhança dos romances das irmãs Brontë, com infindas descrições de trinta páginas cada uma (como era comum na altura). Nada me faria adivinhar como a escrita de Dickens é divertida e nunca vi um filme que conseguisse transmitir o seu grande sentido de humor, especialmente no que toca a “Great Expectations”.
A história é uma das minhas favoritas de sempre e posso dizer sem exagerar que me marcou em tenra idade (à semelhança da maneira com que Miss Havisham marcou Pip, curiosamente), influenciando a minha maneira de pensar e até a minha personalidade, e isto sem sequer ter lido o livro. Era, pois, mais do que justo que finalmente o lesse, e embora tarde mais vale tarde do que nunca.
Pip, o protagonista, é um órfão de família humilde que vive com a sua terrível irmã mais velha e o cunhado ferreiro, Joe, marido dela, que funciona para ele como um padrasto bondoso. Aproveito para falar já da irmã de Pip, uma mulher horrorosa que se enfurecia sozinha com o seu complexo de mártir para ter desculpa para bater a Pip e ao marido, o que só sublinha a natureza benévola de Joe. Tendo em conta a situação de abusos psicológicos e tareias que sofre, e que só conhece os pais das campas no cemitério, Pip até me parece uma criança muito bem-disposta.
É precisamente no cemitério, num dia de Natal, que Pip tem o encontro fatídico que vai mudar a sua vida sem que este desconfie. Um foragido pede-lhe ajuda, fora as ameaças, e Pip concorda em ajudá-lo. O foragido acaba por ser preso e Pip nunca mais pensa sobre ele.
Entretanto, Miss Havisham e Estella entram na sua vida. Miss Havisham, abandonada pelo noivo no dia do casamento, vive na escuridão da sua sala decadente entre relógios parados, teias de aranha, o vestido de noiva em farrapos e o bolo de casamento a apodrecer há anos na mesa do banquete. Para se vingar dos homens, Miss Havisham adoptou Estella, nesta altura ainda uma rapariguinha, a quem treina para ser fria, distante e caprichosa. Pip é convidado a visitar a casa de Miss Havisham para brincar com Estella, e para Estella brincar com ele, como o gato brinca com o rato, sob o olhar perverso de Miss Havisham.
Aqui devo dizer que não achei a Miss Havisham do livro a mesma velha tétrica e fantasmagórica que é retratada nos filmes, por muito que Dickens se esforce para passar essa impressão. Ou, se calhar, os filmes superaram o original com a ajuda da imagem que vale mil palavras. A Miss Havisham do livro é igualmente trágica, sem dúvida, mas consegui reconhecer-lhe uma faceta mais humana, mais insegura, mais vulnerável, uma mulher de carne e osso que come, bebe e passa cheques. Os filmes, parece-me, sempre tentaram transformá-la numa assombração, como Dickens pretendia projectar mas, pelo menos a mim, não convenceu. (Também concedo que seja fácil dizer isto depois de ver os filmes e que a impressão podia ter sido completamente diferente se tivesse lido o livro primeiro.) O que Dickens conseguiu perfeitamente foi transmitir a pessoa perturbada e doentia em Miss Havisham, seja ela espectral ou de carne e osso, e a sua obsessão em exercer vingança através de Estella.
O plano resulta, e Pip apaixona-se perdidamente pela altiva Estella, nomeadamente à medida que ambos crescem e ela se torna uma mulher cada vez mais bela. O efeito mais iníquo desta maquinação de Miss Havisham, no entanto, como percebemos mais tarde, não é que Estella venha a partir o coração de Pip, mas que Pip comece a ter vergonha das suas origens, especialmente de Joe, o cunhado que foi para ele um pai e que Pip começa a olhar com crescente embaraço por não ter as maneiras, a educação e a linguagem a que Pip é exposto na casa rica de Miss Havisham.
Certo dia, Pip é informado de que um benfeitor anónimo lhe pretende deixar uma grande fortuna para que Pip se transforme num gentleman. Acreditando piamente que o benfeitor é Miss Havisham, Pip depreende também que isto significa que a velha senhora pretende que ele se case com Estella. Miss Havisham conhece este equívoco (e esta ilusão) mas nada faz para o esclarecer porque lhe convém que Pip continue o mais iludido possível.
Sempre gostei do sentido duplo do título. Os advogados chamam a Pip, referindo-se a esta fortuna prometida, “um jovem de grandes expectativas”, mas nós sabemos que são antes “grandes esperanças” e que estas esperanças são Estella, Estella, Estella. Mas eu não considero, de maneira alguma, que “Great Expectations” seja baseado numa história de amor. Não há aqui amor nenhum. Pip “ama” Estella porque é ela é bela, sofisticada, educada. Ele próprio admite que Estella não tem outras qualidades, nem é amável nem é agradável, e quando está com ela não podia ser “mais infeliz”. Isto não é amor mas obsessão, como se conquistá-la fosse a prova de que a merece, de que atingiu um estatuto, de que finalmente é alguém, um gentleman. Mesmo depois de saber que foi iludido e manipulado, Pip não consegue livrar-se desta relação tóxica que só existe na sua cabeça desde infância.
Estella não tem melhor sorte. Igualmente sujeita a uma lavagem cerebral desde criança, acredita no que lhe foi ensinado e segue em frente até destruir a sua vida. Confesso que esperava conhecer mais sobre esta personagem fascinante no livro, mas Estella é sempre vista pela perspectiva de Pip, uma perspectiva completamente distorcida e perplexa, quando não cega de todo.
O que mais gostei nesta história, desde sempre, foi como Dickens descreveu os mecanismos psicológicos que podem manipular e arruinar uma criança para sempre, especialmente quando não existe contraponto às influências nocivas que recebe, a ponto de a manipulação perdurar e continuar a fazer estragos bem para lá da idade adulta. Pip acaba por perder tudo, mas sobretudo compreende que a coisa mais valiosa que perdeu, por sua culpa, foi a amizade pura e desinteressada de Joe, que dinheiro nenhum poderia pagar.
Dickens é muito elogiado pelas suas personagens inesquecíveis (sem dúvida) ao mesmo tempo que é criticado por estas serem algo caricaturais (não nego), o que as torna ao mesmo tempo divertidas. Prefiro ver estas “caricaturas” como humor (ou ironia, ou sarcasmo) e como crítica social. A verdade é que “Great Expectations” ainda se lê muito bem nos dias de hoje e recomendo a toda a gente que gostou dos filmes.

 

terça-feira, 14 de janeiro de 2025

Midsommar / Midsommar, o Ritual (2019)

Este foi um dos filmes mais aterradores que vi nos últimos tempos, se calhar porque podia mesmo acontecer. Um jovem casal, Dani e Christian, decidem visitar um festival de verão tradicional da Suécia na companhia de colegas de universidade de Christian, todos estudantes de antropologia. O convite vem de Pelle, um colega sueco que lhes promete uma experiência inesquecível numa comuna hippie e isolada da civilização onde o Solstício de Verão é celebrado à antiga. Quem conseguiu ver a porno-turtura de “Vikings” já está a adivinhar o que vai sair daqui. Quem não conseguiu, aconselho a que não veja este filme também.
A princípio é tudo “rosas”, sol da meia noite e muitas drogas, muitas delas naturais, e trajes brancos com grinaldas de flores. No entanto, alguns “pormenores” ao canto do écran começam a dar-nos a sensação de que algo está muito errado. Por exemplo, um urso numa jaula minúscula. Quando os turistas perguntam a Pelle o que é aquilo, a resposta é um encolher de ombros: “É um urso”. E a mesma resposta é casualmente dispensada sempre que os recém-chegados fazem perguntas sobre aspectos inquietantes da festividade.
Não quero estar aqui com spoilers, mas o que mais me aborreceu foi o facto de estes estudantes de antropologia serem tão ignorantes (até mesmo idiotas) quanto ao que se estava a passar. (Na Europa é proibido manter animais selvagens em cativeiro, muito menos numa jaula minúscula, por exemplo.) Outro jovem da comunidade também estava a estudar fora do país e traz com ele um casal de britânicos, igualmente estudantes. Assim que a festividade começa a envolver suicídios rituais, os britânicos, chocados, decidem ir-se embora, mas fazem tal escarcéu, em vez de fugirem sorrateiramente, que não vão longe.
Já os americanos deixam-se convencer de que aquilo a que estão a assistir é uma forma de vida (e morte) alternativa e decidem mesmo basear a tese de curso na festividade. Tanta credulidade só tem uma explicação, a duplicidade de Pelle, membro da comuna hippie, que se fez passar durante anos por um estudante normal e evoluído quando o seu objectivo era recrutar convidados (vítimas) para o ritual. É natural confiarmos em alguém que nos parece igual a nós e que em nada nos faz pensar que pertence a um culto pagão radical.
Sem mais spoilers, há alguns conselhos que podemos tirar disto tudo, alguns dos quais eu já aplico na minha vida há muitos anos e ainda aqui estou:
1) nunca se ponham numa situação em que vão para um local tão remoto que dependam de transportes alheios para sair de lá
2) nunca tomem drogas / álcool ou algo que vos faça perder a lucidez nessa situação remota onde não conhecem a maioria das pessoas
3) se as coisas começam a meter sacrifícios de sangue, fujam
4) fujam sorrateiramente
5) quando as coisas começam a cheirar mal é porque há merda da grossa

18 em 20


domingo, 12 de janeiro de 2025

Ghost House / Casa Fantasma (2017)

Desde que ouvi a canção “One Night in Bangkok” de Murray Head, nos anos 80, que percebi que a Tailândia não é para mim. Choca-me a cultura, a comida, a pobreza abjecta e a prostituição a que esta conduz. No entanto, a Tailândia é um destino turístico de eleição onde os apaixonados Julie e Jim decidem ir passar umas férias românticas. Ela fica especialmente impressionada com um aspecto da mitologia local, as “ghost houses” ou “casas de fantasmas”, criadas para albergar os espíritos errantes de modo a que eles não precisem de residir com os vivos.
Entretanto, Julie e Jim conhecem dois turistas britânicos, alojados no mesmo hotel, que os convencem a passar uma noite de farra na cidade. Algo de estranho se passa com estes dois britânicos, que convencem Julie a visitar um “cemitério” de “casas de fantasmas” que os locais abandonaram no campo sem coragem de as destruir. Mas afinal a história é mais sinistra. Um deles viaja com a namorada que ficou possuída por um espírito vingativo exactamente por tocar numa “casa de fantasmas”. Os britânicos prepararam uma armadilha para que o espírito possua Julie em vez da namorada, que é exactamente o que acontece. Agora Jim tem apenas três dias para encontrar ajuda para Julie antes que o espírito a consuma.
“Ghost House” é muito influenciado pelo terror japonês, mas falta-lhe essa subtileza para nos meter medo. O filme é longo demais, com demasiadas insistências em cenas e visões do espírito vingativo, viagens de um lado para o outro e personagens supérfluas, tudo para nos convencer de que o espírito é mesmo muito mau. Uma vez que a possuída já estava quase a morrer, era escusado prolongar tanto o filme.
Pelo menos temos a oportunidade de assistir a um exorcismo tailandês (presumo), o que não se vê todos os dias.

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terça-feira, 7 de janeiro de 2025

Die Wannseekonferenz / A Conferência (2022)

Não há muito a dizer deste filme para a televisão excepto a sinopse. A 20 de Janeiro de 1942 altos representantes do regime Nazi reuniram-se numa mansão de luxo para a Wannsee Conference, uma reunião para discutir os pormenores da “solução final para os judeus”.
O filme é apenas isto: todos sentados à mesa a debater um genocídio como quem decide uma estratégia empresarial, excepto quando há intervalos para café, bolos e cigarros e podemos ver o ambiente sereno, e até bucólico, da beleza invernal em que o assunto foi discutido. Temos muitos pormenores desta reunião porque foi redigida uma acta com todas as intervenções de todos os oradores e foram enviadas 30 cópias aos participantes e outros interessados para que “ninguém dissesse que não sabia”.
Obviamente este não é um filme de enredo e acção mas um documento histórico que vale ouro para quem gosta de conhecer estas coisas a fundo.
Não tenho mais nada a dizer e muito menos nota a atribuir. É mesmo caso para ver o filme e está lá tudo bastante explícito.

 

domingo, 5 de janeiro de 2025

The Burning Girls (2023)

A reverenda Jaqueline (Jack) Brooks e a sua filha adolescente, à procura de um recomeço nas suas vidas, instalam-se na pequena comunidade inglesa de Chapel Croft. Jack vai ocupar a vaga deixada pelo reverendo Fletcher, que se enforcou em plena capela. Chapel Croft é uma localidade rural conhecida pelos mártires Protestantes queimados na fogueira no séc. XVI, especialmente duas meninas que não foram poupadas. A povoação comemora-os todos os anos numa festividade alegórica. Diz-se que as meninas assombram a capela.
À chegada, Chapel Crof parece uma terra pacata onde nunca acontece nada (excepto o suicídio de um reverendo e o desaparecimento de outro), mas logo na primeira noite Jack vê o fantasma das meninas em chamas. A seguir, fica a saber que há 30 anos duas amigas adolescentes desapareceram sem deixar rasto, e que não houve grande investigação porque eram algo rebeldes e presumiu-se que tivessem fugido juntas. Uma residente mais antiga expressa a Jack as suas suspeitas de que o reverendo Fletcher não se suicidou, mas que foi assassinado porque começou a investigar as mártires e as duas raparigas desaparecidas nos anos 90. À medida que pesquisa o assunto, Jack vai descobrindo uma teia sombria de segredos e homicídio. Será ela a próxima reverenda em perigo?
Para que não haja desapontamentos, digo já que “The Burning Girls” não é um mistério sobrenatural mas antes um mistério de crime. Sim, os fantasmas estão lá, mas igualmente para pedir justiça.
Saliento mais um grande papel de Samantha Morton. A princípio não a reconheci, como é compreensível, mas aquela cara provocou-me arrepios. Só depois percebi que é a mesma actriz que fez Alpha/Dee, a líder dos Whisperers em “The Walking Dead”. Os Whisperers eram uma ideia um bocado estapafúrdia mas Alpha era uma mulher aterradora. Em “The Burning Girls” Samantha Morton também interpreta uma mulher durona, e apesar do papel de reverenda há momentos em que consegue transmitir a mesma aliança velada de uma Alpha. Eu não queria receber uma ameaça daquela mulher!
Apesar de ser um enredo que se desenvolve devagar, deixando-nos primeiro embrenhar na atmosfera tranquila e campestre de Chapel Croft e dando-nos tempo de juntar as pistas à medida que a tensão aumenta, a estranheza começa em pequenas coisas logo de início. Mas ninguém está à espera da reviravolta final.
“The Burning Girls” não é um policial em que no fim o criminoso vai para a prisão, mas antes um drama em que as personagens têm de ajustar contas com o passado.

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PARA QUEM GOSTA DE: mistério, crime, drama, fantasmas