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terça-feira, 12 de julho de 2022

London Plane – “Bright Black”

“Bright Black“ é o segundo álbum da banda nova-iorquina London Plane, acabado de lançar em Junho de 2022 (o primeiro é “New York Howl”, de 2018).
Segundo o press release, este é um disco para amantes de Bauhaus, David Bowie, Yeah Yeah Yeahs, XTC, Shriekback, Gary Numan, Wire, Soft Kill, Interpol, Preoccupations, Protomartyr, The Primitives, The KVB, Iggy Pop, The Cramps.
Ora, é exactamente nesta misturada de influências que reside o busílis para mim. Para dizê-lo curto e grosso, há músicas de que gosto muito e músicas de que não gosto mesmo nada. Não posso, por isso, considerar “Bright Black“ um álbum equilibrado que vá agradar a um público em específico do princípio ao fim, da mesma maneira que não conseguiu agradar-me a mim.
Mas nesta misturada há gemas espantosas a descobrir, nomeadamente (seria mesmo preciso dizê-lo?) as que recordam um som mais ao estilo de Bauhaus ou post punk, embora de maneira nenhuma cópias: “Bright Black”, “The Darker You”, “Watch That Madman Go” e “Francesco”.
As outras, nem por isso.

Para ouvir no Bandcamp da banda, AQUI.


“Bright Black“ is the New York band London Plane’s second album, just released in June 2022  (the first was “New York Howl”, from 2018).
According to the press release, this is a record for lovers of Bauhaus, David Bowie, Yeah Yeah Yeahs, XTC, Shriekback, Gary Numan, Wire, Soft Kill, Interpol, Preoccupations, Protomartyr, The Primitives, The KVB, Iggy Pop, The Cramps.
Well, it’s exactly in this amalgamated salad of influences that the problem resides for me. To put it short and simple, some tracks I like a lot and some tracks I don’t like at all. Therefore, I cannot consider “Bright Black“ as a balanced album that manages to please a specific audience from start to finish, the same way it couldn’t please me.
But in the midst of this amalgamated salad there are amazing gems to be discovered, namely (do I really need to say it?) those that recall a more Bauhaus-like post punk type of sound, though not, in any way, copies: “Bright Black”, “The Darker You”, “Watch That Madman Go” and “Francesco”.
The others, not really.

To be listened in London Plane’s Bandcamp, HERE.


terça-feira, 5 de julho de 2022

Noir Clubbing

[Originalmente publicado no Pórtico


Este é um post há muito devido, apesar das vicissitudes que o atrasaram. O Club Noir original abriu em Fevereiro de 2011 na Baixa (Rua da Madalena). O Noir Clubbing (novo nome) mudou-se para Alvalade (Rua António Patrício, 13B) em Novembro de 2019. Na verdade, a inauguração só aconteceu em Março de 2020. Entretanto, veio a pandemia. Pior altura não podia haver. Não tive oportunidade de conhecer o novo sítio antes e só consegui ir lá agora.
Sobretudo, tenho a dizer que mudou para melhor! Mais amplo, mais espaço, um bar maior, melhor som e pista de dança. Os habitués vão reconhecer a mobília, mas muito menos “apertada” e com mais lugar para conversar. As paredes estão pintadas em cores claras e decoradas com retratos de ícones da música alternativa. Os espelhos ajudam à ilusão de um espaço mais arejado. Até encontrei uma salinha, ao fundo à esquerda, com mais iluminação e menos som, para quem quiser maior intimismo. Por acaso encontrei-a quando procurava a casa-de-banho, que fica ao fundo à direita.
O bairro circundante é sossegado e longe dos centros barístico-turísticos da capital, o que é sempre uma vantagem para quem vai a este espaço alternativo de propósito sem vontade de ser incomodado por curiosos que lá caem de pára-quedas.
A música em si não mudou. Tudo o que é alternativo tem aqui lugar. Infelizmente, o bar tem de fechar às 4 horas, demasiado cedo, e só abre aos fins-de-semana e vésperas de feriado. Mesmo assim, aconselho uma visita urgente a este novo/antigo local de música alternativa.

terça-feira, 7 de junho de 2022

Dead Can Dance ao vivo no Coliseu de Lisboa (2.Junho.2022)

As minhas desculpas pela má qualidade das fotos. O meu telemóvel nem sequer tem zoom.


Quinta-feira, 2 de Junho. Coliseu de Lisboa. Os Dead Can Dance dão o segundo concerto na capital, último de uma digressão de dois meses. É a primeira vez que vejo os Dead Can Dance em concerto, a única das minhas bandas preferidas que ainda não tinha visto ao vivo. (Com a funesta excepção de Joy Division, que nunca verei.)
Os sonhos são irreais e irrealistas. São intimistas e emocionais. Este texto não pode fugir-lhes.
Foi um sonho concretizado. Um sonho que durante bastantes anos julguei nunca realizar. Primeiro, porque a banda se separou e Lisa Gerrard e Brendan Perry se dedicaram a projectos a solo. Segundo, depois da reunião da banda, que já tinha actuado em Portugal nesta nova encarnação, devido a questões profissionais que não me permitem assistir a concertos como gostaria. Por fim, devido à pandemia, que parecia nunca mais acabar.
Já tinha comprado o bilhete e ainda não acreditava que era real. Só acreditei na sala do Coliseu, quando Lisa Gerard começou a cantar “Yulunga”. Era real, estava acontecer. No dia seguinte questionei-me se aconteceu de facto. Os sonhos também parecem muito reais quando estamos a sonhá-los.
Tenho a certeza de que a culpa foi minha, mas saí do Coliseu insatisfeita, como se nem tivesse lá estado. O concerto foi curto. Uma hora e vinte minutos e Brendan Perry disse-nos “Obrigado. Boa noite” em português correcto, e a banda preparou-se para sair. É claro que voltou, para mais um encore de 20 minutos. Uma hora e quarenta minutos e o concerto acabava. Brendan Perry disse que era o último da digressão e que estavam cansados. Talvez tenha sido isso? Ou talvez eu me tenha fartado de esperar pelo sonho de ver os Dead Can Dance e os tenha envolto numa expectativa irrealista que não pode jamais rivalizar com a minha relação íntima e inexprimível com a música que amo desde que a conheço, há tantas décadas que nem vou dizer quantas?
Lisa e Brandan revezaram-se, uma canção cada. Não me posso queixar da falta de êxitos. A banda percorreu a maior parte dos álbuns e todas as suas fases de evolução, e as boas canções são tantas (não existe uma canção má!) que se fossem tentar tocá-las todas ainda lá estávamos. A plateia encontrava-se repleta. Já as bancadas, não. Talvez pelo preço dos bilhetes, talvez por ser o segundo concerto em dias consecutivos, talvez ainda medo da pandemia? A verdade é que já vi o Coliseu a abarrotar muitas vezes, e não foi o caso. 

Mas o público que compareceu sabia ao que ia. Algumas palmas no início de canções mais conhecidas eram rapidamente silenciadas para não se perder uma nota do som, uma sílaba da voz. Em momentos, quando Lisa cantou, todo o Coliseu ficou em silêncio. Mesmerizado, como na canção. E não faltaram as canções hipnotizantes: “Yulunga (Spirit Dance)”, “The Host of Seraphim”, “Sanvean”, “Persian Love Song”, “Black Sun”, e, a minha preferida das preferidas, “Cantara”. Já tinha ouvido os Dead Can Dance em concerto numa fase de maturidade da banda e sabia o que esperar, mas nunca deixo de ficar impressionada com o poder transcendente daquela voz. Já não é a jovem Lisa que cantava “Cantara” em “Within The Realm Of A Dying Sun”. A voz encorpou, engraveceu, mas continua a ser a voz da Deusa. A interpretação de Brendan Perry está praticamente na mesma, quase nem se nota a idade.
Então, o que é que eu queria afinal? Mais canções? E quais, se há tantas? “The Cardinal Sin”? “Xavier”? “Summoning of the Muse”? “The Arrival And The Reunion”? “As The Bell Rings The Maypole Spins”? “Nierika”? Impossível escolher.
O que eu queria mesmo era ficar arrepiada, era sentir calafrios pela espinha abaixo. Já ouvi quem se referisse a um concerto dos Dead Can Dance como uma experiência místico-religiosa, já ouvi chamar-lhe ritual xamânico. Infelizmente, não senti a magia que queria sentir. Sim, abanei a cabeça, bati palmas, dancei na cadeira, não consegui tirar os olhos do palco. Mas a hipnose nunca me arrebatou, nunca me levou para o mundo fora do mundo onde costumo ir quando ouço Dead Can Dance em casa nos “dias certos”. Culpa minha, volto a dizer. Talvez a minha relação com a música, tão idealizada e adorada durante tanto tempo que já é só minha, nunca consiga rivalizar com a realidade dos intérpretes a tocá-la à minha frente. Mas não é verdade que as grandes obras ganham vida própria, que fogem aos criadores?
Saí com a sensação de “dever cumprido”, a última banda que me faltava, a voz da Deusa a ecoar-me na memória. Devia-lhe essa reverência e prestei-lha. Mas queria mais, queria arrepios, e isso não aconteceu.
Se esta review não tivesse levado o tom intimista que lhe quis dar, diria apenas que foi um concerto soberbo, impecável em voz e som e 100% profissional, auxiliado por instrumentistas de cinco estrelas, que só pecou por ser curto. O que eu queria, a transcendência, o sonho em vigília, o arrebatamento, depende mais do ouvinte do que do intérprete. É preciso que o ouvinte se deixe arrebatar. Se calhar não era o “dia certo”.

 

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2022

Música gótica − origens − presente − futuro


Ao longo do tempo, durante a existência do blog Gotika, muita gente me perguntou o que é a música gótica. Também vou dar um link para esclarecer todas as dúvidas, mas antes vamos falar dos precursores da música a que, no período pós-punk, se começou a chamar gótica.
Vem de longe, de muito mais longe do que se pode pensar. Durante o período pandémico e o lockdown, o DJ Cyberpagan foi um dos DJs que começaram a emitir streams no Twitch (para nosso deleite). Este stream que vos trago aqui é uma obra de mestre, reunindo todas ou quase todas as influências que, em conjunto, se cristalizaram mais tarde em algo diferente do punk, entre a vanguarda de uns Bauhaus e a melancolia de uns Joy Division, só para citar alguns dos pioneiros. Esta é uma playlist para conhecedores e amantes do gótico que me surpreendeu por ser tão completa (não me consigo lembrar de uma influência que não esteja aqui representada). Para ouvir, descobrir e reflectir, AQUI.

Mas a partir de agora, quando alguém me perguntar o que é “música gótica”, vou responder com este outro stream da DJ Mortasha Kinski, gótico tradicional que cobre muitos dos grandes em duas horas (fantástico!), e não me perguntem mais vez nenhuma.
AQUI

Mas o gótico não acabou nos anos 80, longe disso. A pandemia teve o efeito positivo de impulsionar uma comunidade internacional no Twitch. Todos em casa e todos juntos, unidos pelo prazer da nossa música.
Passados alguns meses a explorar e descobrir, decidi partilhar os meus streams góticos preferidos, onde se ouve o que de melhor se faz na cena actual (gótica e afins, porque sempre foram os góticos a decidir qual era a música que queriam ouvir, e não o contrário, e quem não compreende isto não compreende nada do movimento). O gótico está muito vivo e em permanente evolução.
Aqui estão os meus preferidos. Espero ver-vos por lá.
Em primeiro lugar quero destacar o único DJ português que emite gótico no Twitch (que eu saiba, e geralmente acompanhado pelo DJ Exploding Boy):


Undead Decadance Party
www.twitch.tv/undead_decadance_party
Descrição: post punk, alternative 80s, goth, darkwave, electro
Festa ocasional. Bandas portuguesas actuais.

DJ Exploding Boy e Dj Yggdrasil

Feita a distinção do DJ da casa, seguem-se, em ordem alfabética:

DJ Acidbitter
www.twitch.tv/acidbitter
Descrição: dark alternative music, goth, post-punk, darkwave, industrial, EBM, synthpop, coldwave, ethereal, shoegaze, dark folk, neoclassical, etc
Este é um stream virado para as novidades que privilegia o vídeo, embora passe clássicos com frequência. O ambiente é bem-humorado e descontraído.




DJ Cyberpagan
www.twitch.tv/dj_cyberpagan
Descrição: goth, death rock, post punk, new & (c)old wave, indie
Assistir a um stream do DJ Cyberpagan pode ter a solenidade de uma aula universitária. Pode ser bastante obscuro, podemos não conhecer a maioria das bandas, mas aprendemos sempre alguma coisa. Até hoje, ainda não aconteceu eu não conhecer uma única banda tocada, mas esteve perto. Aconselho a melómanos que querem descobrir música recente e que não têm medo dos “lados B”. Não aconselho a iniciantes.

 

DJ Cyberpagan e a sua gata Pavučina


Dead Souls Gothic Lounge
www.twitch.tv/dead_souls_gothic_lounge
Descrição: goth rock, darkwave, post punk, industrial, coldwave, minimal synth, death rock, ethereal, neoclassical, shoegaze, witch house, dark 80s and 90s
Possivelmente o stream onde se pode ouvir o gótico / alternativo / etéreo / neoclássico mais obscuro que existe, com tendência igual para as novidades. Não é o único stream que passa post punk sul-americano (incluindo brasileiro) mas é o único onde se passa Mão Morta! Clássicos são raros, e grandes hits muito menos. Recomendo a quem já tenha um bom conhecimento do tipo de música. Não recomendo a iniciantes.


 
Dead Souls Gothic Lounge: DJ Naggaroth e o seu gato Phantom

 

DJ Miz Margo
www.twitch.tv/djmizmargo
Descrição: proto-goth, goth, death rock, dark punk, classic industrial, grave wave, batcave, gothabilly, etc
Miz Margo é uma experiência 100% gótica, quer passe as bandas mais recentes ou os clássicos. Quem gosta de Sisters of Mercy, Fields of the Nephilim, Mission, Christian Death, Cure, Bauhaus, Joy Division, Dead Can Dance, Siouxsie, e os outros todos, é aqui que deve ir primeiro e não será desapontado. Mas conte-se com bandas menos conhecidas e muita música nova.

DJ Miz Margo e o seu gato Squeeks


DJ Mortasha Kinski
www.twitch.tv/mortasha_kinski
Descrição: early 80s, new romantic, post-punk, goth, old industrial and dark wave
Mortasha Kinski passa vários géneros, mas escusado será dizer que prefiro os streams sobretudo inclinados para o gótico e anos 80. Para comprovar, nada como ouvir o link acima.

DJ Mortasha Kinski e o seu morcego (de peluche) Batty

 

The New Order Melb
www.twitch.tv/thenewordermelb
Descrição: gothic, post punk, new wave, industrial, death rock, alternative, dark electronic, the rest
Como o nome indica, este é um stream australiano onde o mundo vai acabar a noite, sábado de manhã, devido à diferença horária. Além do gótico puro e duro e das bandas mais recentes, The New Order Melb faz muitos especiais e tem sempre muitas surpresas. É essencialmente um stream divertido, descontraído e descarado, para os DJs e para nós. A melhor maneira de acabar a sexta-feira ou de começar o fim de semana.

The New Order Melb: DJ Wolf, DJ Anarki e DJ Eris


Xiled Radio
www.twitch.tv/xiledradio
Descrição: industrial, techno, powernoise, goth, shoegaze, synthpop, post-punk, ethereal, IDM, dark ambient, pagan folk, etc
Este é um stream virado sobretudo para novidades onde eu vou para ser desafiada, para ser exposta a música de que geralmente não gosto particularmente tirando alguns temas aqui e ali. O objectivo, como melómana que sou, é conhecer música nova e fora da minha “zona de conforto”, mas bastante dentro do espectro da música alternativa. O stream é muito relaxante e descontraído. 


Xiled Radio e o seu gato Ben


Estes são apenas os meus streams preferidos. Há muitos mais que eu sigo ocasionalmente e mesmo regularmente, e uma infinidade deles dentro do gótico e do alternativo em geral. Os streams de música foram o melhor que aconteceu durante a pandemia e são o sítio ideal onde descobrir música nova para quem não se contenta com os clássicos.


domingo, 8 de agosto de 2021

Parzival – “Casta”

Parzival foi mais uma banda que conheci através do Festival Entremuralhas. Confesso, a partir de certa altura, que uma amálgama de preguiça e de falta de tempo me afastou de uma das minhas actividades favoritas: procurar música nova. Durante algum tempo fi-lo ouvindo rádio online (a que hoje chamamos podcasts, mais precisamente) mas acabei por perder o hábito. Isto agora vai mudar com o streaming no Twitch, com DJs ao vivo e chat em tempo real, e a possibilidade de assistir comodamente no smartphone enquanto se faz outras coisas, algo de impensável nos tempos dos podcasts em que era preciso estar ao computador para ouvi-los, e, lá está, nem sempre havia tempo disponível para isso.
Dos Parzival, descobri primeiro o álbum “Urheimat”, talvez mais acessível e dançável. Fui ao Bandcamp deles e ouvi a discografia toda (outro luxo que não havia no meu tempo, em que a gente comprava o disco ou CD a partir de um único tema que passava na rádio e às vezes enfiava um grande barrete). Os álbuns são muito diferentes entre si. Diria que gosto muito de “Urheimat” e “Casta”, mas dos outros nem por isso. Da mesma maneira, pode haver quem tenha uma opinião rigorosamente contrária à minha.
É precisamente de “Casta” que quero falar, um álbum que me surpreendeu pela mistura de influências: música indiana, electrónica, marcial, épica, e direi mesmo operática, tudo isto numa banda dinamarquesa.
Tenho a perfeita consciência de que “Casta” não é para toda a gente. Mas, ao primeiro acorde, eu soube que era mesmo para mim. A música indiana fascina-me, até aquela dos filmes de Bollywood. “Casta” não é exactamente música dançável (embora possa muito bem ser dançada), mas leva o apreciador numa viagem de inúmeras subtilezas que se combinam surpreendentemente bem, uma delícia para o sentido auditivo.
Aconselho a audição imediata e, já agora, a da restante discografia, incluindo o excelente “Urheimat” (esse, sim, para dançar).



domingo, 14 de fevereiro de 2021

A Cat-Shape Hole In My Heart, vários artistas (1999) – requiem pelos ausentes

Um disco de grande beleza pelos nossos amigos felinos ausentes, essas criaturas misteriosas que dignam partilhar connosco as suas vidas efémeras.
O projecto começou quando Sam Rosenthal (fundador de Projekt e Black Tape for a Blue Girl) perdeu a sua gata Vidna devido à leucemia felina e decidiu convidar bandas a integrarem uma compilação que alertasse para essa doença. Os lucros foram, e são ainda, destinados ao Tree House No-Kill Shelter of Chicago, um abrigo para gatos.
Cruzei-me com este disco por acaso (se acreditasse em acasos) quando o encontrei em segunda mão nos anos 2000, ainda na velhinha loja Fata Morgana da avenida Duque de Loulé. Comprei-o logo, mesmo sem conhecer a maioria das bandas. Vinte anos depois, este disco fez-me companhia em alguns dos momentos mais penosos da minha vida: o adeus aos companheiros felinos que estiveram comigo e já não estão. Muitas destas canções fazem-me logo desatar em lágrimas, mas chorar lava a alma.
“A Cat-Shape Hole In My Heart” é um álbum de gótico puro e sublime, um requiem composto por pessoas que passaram pelo mesmo luto destruidor. Um disco obrigatório para góticos que amam gatos. Se ainda não o têm, não imaginam a falta que vos fez.
Não há uma única canção inferior nesta colectânea, mas destaco as minhas preferidas: o desgosto subtil de "Too Far Away" (Area), o comovente "Cayman" (Mira), o devastador "Night and Mourning" (Regenerator), os fantasmagóricos "Galactipus" (Tara Vanflower) e "Felix the Cat" (Collide), o melancólico "In The Snow" com o seu último verso "There’s something that falls apart the instant the light ends" (Dead Leaves Rising), o misterioso "In Dreams Of Mine" (Faith & The Muse).

Há pouco tempo pesquisei e não apenas ainda se encontra à venda o CD em formato físico como agora é possível ouvi-lo e adquiri-lo no Bandcamp do Projekt Records:
projektrecords.bandcamp.com/album/a-cat-shaped-hole-in-my-heart-pay-what-you-wish-1999
Ouçam-no, guardem-no, comprem para os amigos, não emprestem. Um dia vão precisar dele.


domingo, 27 de dezembro de 2020

Siglo XX, ilustres desconhecidos


Os Siglo XX são uma banda belga formada em 1978. Uma banda que só descobri graças, mais uma vez, ao festival Extramuralhas do ano passado. Não posso dizer que nunca tinha ouvido falar deles, porque afinal até tenho um tema dos Siglo XX na compilação “Fuck Yeah Goths Mix One” (2010), mas simplesmente não lhes tinha prestado a atenção que merecem. Desde o Extramuralhas 2019, que lhes descreve o género musical como Coldwave, Gothic Rock, Darkwave e Post-Punk, fui finalmente aprofundar a discografia desta excelente banda. E fiquei perplexa de como é que me passaram ao lado este tempo todo. Mas mais vale tarde do que nunca.
Um dos motivos para isto, suspeito, é que a música dos Siglo XX não é exactamente dançável (pode ser, mas é mais para ouvir do que para dançar, no meu gosto pessoal) e passa muito discretamente no meio de outras bandas do mesmo género. Não é banda em que se repare numa disco ou bar, por exemplo, enquanto se conversa com amigos.
Às vezes os temas lembram-me Joy Division, outras Bauhaus, outras ainda Siouxie and The Banshees, e Sisters of Mercy e Nick Cave do início, e até Dead Can Dance do primeiro álbum. Como é que é possível perdê-los?
Os Siglo XX fazem um som subtil e envolvente, com letras fortes e sombrias, que merecia ser mais conhecido. Recomendo que os vão já descobrir se eles também vos passaram ao lado.

sexta-feira, 3 de novembro de 2017

Metropolis reabre no mesmo espaço

O bar Metropolis vai reabrir no mesmo espaço, Centro Comercial Imaviz, nas Picoas, a 17 de Novembro. Segundo post do Facebook, a reabertura deve-se aos muitos apelos dos clientes desde que encerrou a 30 de Setembro. No entanto, permanece em aberto a mudança de espaço, que pode ser "mais morosa que o desejado".

Boas notícias!

quinta-feira, 5 de outubro de 2017

Metropolis encerra portas

O bar Metropolis encerrou no dia 30 de Setembro. Segundo o post abaixo, no Facebook, está previsto um "novo Metropolis".
O Metropolis, nas Picoas, em Lisboa, inaugurou a 7 de Junho de 2008.
Nove anos de memórias.

Mais uma má notícia para a comunidade.

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

A música que descobri depois de 1990

Já me pediram, as vezes bastantes, para fazer uma listagem das bandas que um gótico não pode deixar de ouvir. Penso que entretanto já bastante gente o fez, pelo que não é isso que vou fazer.
O concerto dos Rosa Crux lembrou-me que a música não acabou nos anos 80 e que nunca aqui falei da música de que passei a gostar desde aí. Tenho reparado que pouca gente o faz. É difícil, confesso, mas graças ao leitor de música digital, onde consegui colocar toda a música que possuo, toda mesmo!, tornou-se mais fácil não esquecer ninguém.
[Nos meus tempos, para fazer uma listagem destas, era preciso andar a revirar CDs, discos e K7s! Como é fácil a música hoje em dia!]
Não vou falar dos Sisters of Mercy, nem dos Fields of the Nephilim, nem dos Dead Can Dance, nem dos Christian Death, nem dos Bauhaus, nem de Peter Murphy, nem dos Mission, nem dos Cult, nem dos All About Eve, nem de Joy Division, nem de Siouxie & the Banshees, nem de Nick Cave (com ou sem Bad Seeds), nem de Red Lorry Yellow Lorry, nem de Mão Morta, que foram as bandas que formaram o meu gosto musical para todo o sempre e eternamente terão um lugar no meu coração e todos os álbuns gravados no meu cérebro, onde de vez em quando começa a tocar este ou aquele tema destes senhores e senhoras.
Muito menos vou falar dos que nunca gostei, como os Cure, embora toda a gente ouvisse, nem dos Smiths, por quem não morria de amores embora toda a gente me matraqueasse com eles. Do punk, infelizmente, nunca me vou esquecer de tanto que tive de o suportar, mas tento!
E não vou mencionar os nomes clássicos de que só gosto de algumas músicas, como os Alien Sex Fiend, os Chameleons, os Cocteau Twins, os Echo & The Bunnymen, os Jesus & Mary Chain, os Love & Rockets, os Virgin Purnes, os Depeche Mode, os Rose of Avalanche e muitos outros.
E obviamente não vou falar dos que conheço mas de que nem sequer existe uma única música no meu leitor de música.
Porque a música para mim é um amor. Não se ama um bocadinho. Ou se ama ou se deita fora. Não há meio termo.
Do que vou falar é daquelas bandas e artistas que desde esses tempos iniciais de espanto e pavor me embalaram durante os momentos maus (e os bons) e tornaram a existência menos insuportável. Nem todos são góticos. Na verdade, desenvolvi uma inclinação pelo neo-folk, como poderão constatar, que também não é assim tão estranha considerando que Dead Can Dance estão lá em cima no topo da lista.

Vou falar, enfim, dos que passei a gostar depois de 1990. Heresia. Confissão. Danação.
Aqui vai, em ordem alfabética, porque depois dos que estão no topo da lista ninguém os conseguiu ultrapassar nem adianta tentar distinguir favoritos.


Adrian Alexis


Não sei o que aconteceu a este senhor. Grande música gótica, rock e electrónico, conheci-o através da Radio Ghoul School com o clássico "I want to be a vampire", segui os links. Não há nada que este senhor tenha feito de que eu não goste. Na altura o próprio Adrian Alexis disponibilizava música online pelo que tenho uma vasta colecção. Depois, desapareceu. Retirou o site, retirou as músicas. Pelo que percebi dos posts dele, tinha uma personalidade aberta e simpática, muito humilde para tamanho génio. O senhor é esquizofrénico e partilhava muita informação sobre a sua... condição. Não gosto de lhe chamar doença. É do conhecimento geral que muitas vezes o génio anda de mãos dadas com a loucura. Este é um dos casos.
Se quiserem procurar, ainda conseguem ouvir.
Por exemplo, aqui.
Vale a pena procurar.


Arcana
Conheci-os muito recentemente, devido ao Entremuralhas, e percebi o que andava a perder. Neoclassic darkwave. Não consigo parar de ouvir o álbum "Le Serpent Rouge". Uma paixão assim deixa sequelas.


Frank the Baptist
Catalogados como rock gótico/alternativo. Gosto do álbum "The New Colossus". Parece-me, todo ele, música de bêbedos para bêbedos. Aquelas coisas verdadeiras que só os embriagados conseguem dizer e só os embriagados sentem intensamente. Muito amor, muito ressentimento.


The Golden Palominos


The Golden Palominos, para mim, foi um projecto e um álbum. Já existiam antes, mas apenas quando o mentor do projecto Anton Fier compôs a música para a poetisa Nicole Blackman surgiu o álbum "Dead Inside". O último, o perfeito. Música, sons e spoken word. Entrou e mim e completou-me e faz parte de mim. Há mais nesta história. Faz parte da minha identidade, literalmente. Há coisas assim, que parecem ser feitas de propósito para alguém.


Grinderman
Eu disse que não falaria de Nick Cave, mas não na verdade não estou a falar do Nick Cave dos anos 80 mas do Nick Cave de agora. Continua, com os Grinderman, e os Bad Seeds, a fazer música e letras como antes, senão melhores porque amadurecidas. E cá está ele, muito vivo. Nos anos 80 ninguém lhe adivinharia semelhante futuro, não por falta de génio mas pelo resultado previsível a que conduzem os abusos. Ainda bem que esta excepção confirma a regra.


Hamza El Din


Hamza El Din, músico núbio já desaparecido, é considerado um dos pioneiros da world music. Conheci-o por acaso do genérico final de um filme, "Uma Paixão no Deserto", e, como tantos outros, fiquei presa à sua música hipnótica. Como disse a princípio, os meus gostos têm-se inclinado na direcção do étnico e do folk. O que não é estranho. Os Sisters of Mercy têm uma das melhores canções de todos os tempos na versão de "Temple of Love" cantada (ou melhor, encantada) por Ofra Haza (também desaparecida, precocemente). Existe em Hamza El Din uma melancolia do deserto, uma espiritualidade que alcança um divino em que a língua não é barreira. Começar a ouvi-lo, nos anos 90, pode ter aberto as minhas portas a um outro tipo de música. Folk, ou neo-folk, mas sempre melancólico.


Irfan
Vieram com os Arcana. Neo folk búlgaro. Na altura mencionei a banda mas desde aí descobri mais. Durante muito tempo, bandas como os Irfan não conseguiam ultrapassar o meu preconceito de "imitação de Dead Can Dance". Tendo "crescido" musicalmente com o original, não era fácil entregar-me aos seguidores. Nada fácil. Havia mesmo uma resistência, uma feroz fidelidade, uma recusa. Foi preciso muito tempo, muito tempo mesmo, para ouvir "Hagia Sofia" e reconhecer a perfeição numa canção que podia ser cantada por Lisa Gerrard, mas não é, e não deixa de ser boa por não ser. Mas, para mim, durante muito tempo, não foi.


Le Mystère Des Voix Bulgares
Nem de propósito, e ainda por cima a seguir alfabeticamente aos Irfan, e para mal dos Irfan, também "cresci" a ouvir Le Mystère Des Voix Bulgares como me foram apresentadas pela editora mítica 4AD, música sombria e bela e alternativa. Tão fantasmagórica que causava arrepios na espinha. E também acho que desde esse mítico primeiro álbum (homónimo) as senhoras de Le Mystère Des Voix Bulgares se venderam. Mas continuei à procura, e continuei a ouvir. Para mal dos Irfan, digo eu, porque catalogava estes últimos como mistura de Dead Can Dance e Voix Bulgares, duas imitações em um. Não é fácil competir com os mitos da infância. Mas voltando às Voix Bulgares, porque acho que se venderam? Porque se viu que o filão rendia e começou a massificar-se. Apanhei-as a cantar um tema em espanhol (vendidas)! Mas também as apanhei a cantar uma cantiga de amigo, sim, leram bem, uma cantiga de amigo que estudei na escola. "Tih vyater vee" não é mais do que uma versão das "ondas do mar de Vigo". Em galaico-português, com sotaque búlgaro. Aquilo é tão triste, tão arrastado, que se percebe melhor de onde veio o fado. "Ai Deus, se vistes meu amigo"... Bebi muito, e ouvi muitas vezes.


Lisa Gerrard
Para mim, é a voz da Deusa. Quem leu "As Brumas de Avalon", ou mesmo quem não leu mas quem sabe à mesma quem é a Deusa, percebe-me. Não é um anjo, não é humano, é Ela quem fala pela voz de Lisa Gerrard, e porventura, por isso, Lisa Gerrard não canta palavras de língua humana... Depois dos Dead Can Dance Lisa Gerrard continuou a solo, num registo mais semelhante aos Dead Can Dance do que aquele por que decidiu enveredar Bryan Perry, não tão completo porque falta a magia do duo, e muito mais comercial do que era, na minha opinião, mas num registo igualmente obscuro que deve calar de perplexidade os "normais" que a ouvem por acaso na banda sonora de um filme e têm duas reacções: ou gostam muito mas nem sabem o que procurar ou fogem de medo. Acontece muito, quando se ouve a voz da Deusa.
A solo, alguns dos meu temas preferidos de Lisa Gerrard são "Sailing To Byzantium" e "The Rite", mas soa tão fútil dizer uma coisa destas quando todos os versículos são sagrados...
Como poderiam uns Arcana, uns Irfan, competir com uma devoção assim?


Marilyn Manson
No deserto dos anos 90, porque aquilo foi um verdadeiro e interminável deserto em que só se ouvia grunge e as velhas glórias dos anos 80, cada vez mais decadentes e decepcionantes, Marilyn Manson foi uma lufada de ar fresco. Ou melhor, uma lufada de verdadeiro ar envenenado, que era o que se precisava. Eu não assisti a Marilyn Manson como os adolescentes dos anos 90 assistiram, nem podia. Eu tinha uma memória musical que evocava a teatralidade de David Bowie e Peter Murphy, a blasfema heresia dos Chistian Death, o halloweenismo de Alice Cooper. Como poderia eu olhar para Marilyn Manson e não apreciar o espectáculo com um sorriso? Não é assim para os adolescentes em relação aos seus primeiros amores. Para eles, é muito sério. Ou amam ou odeiam. É preciso criar distanciamento para gozar o espectáculo. Se Marilyn Manson é genuíno? É genuíno como um filme é genuíno. O filme é verdadeiro; o que se passa dentro do filme é ficcional. De modo que sorria com condescendência quando os nascidos para a música nos anos 90 lhe chamavam "poseur". Os amores e os ódios que Marilyn Manson despertava originavam-se nesse equívoco. Nos anos 90 assistiu-se a um fenómeno estranho em que se disse que "o alternativo se tornou comercial", e isto de alguma forma foi verdade e criou preconceitos que eu não partilhava. Para alguns, Marilyn Manson era muito "comercial". Mas esses, dentro da cena, esqueciam-se de que para a grande maioria das pessoas (os normais) Marilyn Manson era, e é, insuportável.
Tentemos colocar-nos nos anos 90. Antes da massificação da internet. Havia grunge, muito grunge, havia uns malucos como os Cradle of Filth, e havia o gothic metal a inundar a cena a um ponto que era eu quem considerava insuportável, e de repente surge um homem, maquilhado, teatral, a fazer música com melodia e refrões que realmente pegavam! Claro que gostei. Adorei. Tirando os Rammstein, Marilyn Manson foi o único projecto de que me tornei fan nos anos 90. [Quando digo fan não me refiro a gostar de um tema ou dois; falo da globalidade da obra.]
O que me leva a mencionar rapidamente os Nine Inch Nails, banda próxima, de que não gosto particularmente, e que ninguém queria dançar numa pista de dança gótica nos anos 90. Era tudo gothic metal. Neste deserto, eu abracei Marilyn Manson. Quando já não acreditava que houvesse vida depois do gótico. O gótico, para a imprensa, já não era alternativo, já não era a vanguarda, aliás, a própria palavra "vanguarda" tinha saído do dicionário musical como obsoleta (e saiu mesmo e nunca mais voltou) e nunca mais se ouviu falar de qualquer banda gótica depois dos anos 90. Existiam mas não se falava dos que as pessoas andavam a fazer. O gótico tinha sido abafado pela imprensa, e pelas rádios, mesmo as alternativas. (Eventualmente, também a imprensa e as rádios alternativas desapareceram. Lembram-se da XFM, lembram-se do Blitz jornal?) Pergunto-me mesmo se a cena não teria desaparecido se não fosse o estrondo da internet em todos os lares, de repente, a provar que afinal havia gente. Que há gente. Que está aqui. E ali, e ali.
Marilyn Manson foi, para mim, a única banda a fazer música que se ouvia nos anos 90 (antes dos Rammstein), e abracei-o(s) com ambos os braços.
Os últimos álbuns não têm sido tão bons como os primeiros mas continuo a ouvir.


Miranda Sex Garden


Esta foi uma banda que começou a cantar a capella e descarrilou, para nossa delícia, no álbum "Fairytales of Slavery", entre o ethereal, o darkwave e as guitarras cortantes. Não sei se elas imaginaram que estavam a fazer música para góticos, mas eu leio as letras sombrias e sei que não pertencem noutro lado nenhum. Tudo indicam que acabaram.


Moonspell
Gostei muito dos primeiros álbuns. Gothic metal português como nunca tínhamos ouvido na vida. Obviamente, gostei muito. Doía-me, contudo, ouvir um jovenzinho falar dos Fields of the Nephilim e dizer que lembravam os Moonspell. Doía, porque mostrava a que ponto tinha chegado o desprezo da imprensa pela cena gótica. Já não havia ninguém a elucidar os mais novos de que se havia semelhanças tinham sido os Moonspell a crescer com os Nephilim e não o contrário. Com a internet, este lapso foi corrigido. Mas não graças à imprensa. [A internet, os fóruns, os sites pessoais, os blogs, os webzines, têm sido os únicos divulgadores da cena e da música que agrada à cena. Tudo se tornou, após o ano 2000, o "do it yourself" de que falava o punk.]
Pessoalmente, acho que o gothic metal teve o seu tempo, abusou do seu tempo, e ultrapassou o seu tempo. O metal tem tendência a fazer isso, motivo pelo qual os Iron Maiden ainda mexem. Por mim, estou farta de gothic metal. Foi como o punk. Demais.


Nephilim
Eu disse que não ia falar dos Fields of the Nephilim, porque são os Nephilim. Um único álbum, "Zoon", 1996. Estilo: industrial. Demorei uns dez anos a encaixar aquilo. Tive a sorte de os ver ao vivo e de sentir o chão estremecer. E continuar a não conseguir encaixar aquilo. Depois, foi interessante. Quando finalmente encaixei compreendi que tinha sido avançado demais para o seu tempo. E eu a pensar, erroneamente, que era a pior coisa de sempre saída dos lados de Carl McCoy. Hoje em dia, até considero "Zoon" levezinho. Já consigo ouvir as melodias. Ah! Estão lá, debaixo do barulho! Era muito barulho para aquele tempo.
Lembra-me uma cena de "Regresso ao Futuro", em que o protagonista, vindo dos anos 80, sobe ao palco nos anos 60 e se põe a tocar rock'n'roll com uma guitarra. Toda a gente gosta muito até ele começar com os solos à heavy metal. Não era falta de gosto. Simplesmente não estavam preparados.


Nirvana
Ouvi Nirvana. Ouvi tudo de Nirvana. Nunca gostei de Nirvana como os adolescentes dos anos 90 gostaram de Nirvana, mas gostei muito de Nirvana. Para eles, foi o primeiro amor. Para mim foi um amor interessante. Mas faltava ali qualquer coisa. Faltava o sublime maior do que a vida. No grunge, a morte é a morte. No gótico, a morte é sempre algo mais. Falta ao grunge a beleza de querer ir ter com ela.
Pensei que era só eu mas muita gente me diz que ainda não consegue ouvir Nirvana. Eu também não consigo. É amargo.
Para ser completamente honesta, também gostei/gosto muito de Alice In Chains, mas não lhes vou reservar uma categoria própria. É a mesma coisa. Amargo. Preso à realidade de que o grunge queria escapar através das drogas. Mas, sem o sublime, a tristeza é apenas depressiva. O grunge era sobre a realidade. O gótico não é.


O Quam Tristis
Os meus gostos têm andado por caminhos por que jamais suspeitaria enveredar nos tempos do rock gótico dos anos 80. Banda electrónica com voz de igreja a cantar em latim? Sem sequer perceber o que eles dizem? Mas não é assim tão estranho. Por opção, eu estudei música na escola. Cantei aquelas litanias dos monges da Idade Média. Só podia dar nisto, na verdade.


Paradise Lost
Aqui está o exemplo de uma banda que melhorou com os anos. Na minha opinião, isto é. Cada vez menos metal, cada vez mais gothic. "One Second" foi um bálsamo nos deserto dos anos 90. Ficarei eternamente grata. Já não ouço muitas vezes.


PJ Harvey
Sempre pensei que ia gostar mais dela mas o nosso romance ficou-se por "To Bring You My Love".


Prodigy
Gostei de algumas músicas dos Prodigy. Achava-os capazes do mais perfeito e do mais parvo. Guardei o perfeito mas tenho vindo a reparar que envelhece depressa.


Rammstein
Das primeiras vezes que os ouvi quase sofri do mesmo efeito que me provocou "Zoon" dos Nephilim. Muito barulho. Eu estava habituada a procurar primeiro a melodia e só então prestar atenção à caixa de ritmos. (Vícios de fan dos Sisters.) A passagem do rock dos anos 80 para o industrial/electrónico dos anos 90 foi, na minha opinião, um problema de barulho. Não falo de decibéis, que disso a gente já gostava. Falo de percussão tão pesada que ofuscava a melodia. Era difícil encontrá-la e apreciá-la debaixo do barulho.
Há dúvidas sobre se os Rammstein são góticos, mas não há dúvida de que os góticos gostam dos Rammstein. Quanto às dúvidas, vou expô-las. A música, tecnicamente, e não penso que haja grande controvérsia sobre isto, define-se mais como industrial do que electrónico. Mas as letras contam uma história completamente diferente. Lembro-me, por exemplo, de "Klavier", que é toda fantasmagórica. E de "Sonnen", apocalíptica. Neste tempo de fusões, não arrisco a inclinar-me para uma opinião. Que os Rammstein se expõem a ser amados pelos góticos, com aquelas letras, com aquela música, expõe-se. Nos últimos anos da década de 90 e primeiros da década seguinte, os Rammstein assumiram o papel de ídolos, e continuaram por ali fora até às brincadeiras que a gente sabe ("Te Quiero Puta!"). Ouço regularmente. Mas não como ídolos, pois os meus ídolos são outros, e caíram, e não podem ser substituídos.


Rosa Crux
Descobri-os tão recentemente (embora tardiamente) que ainda não tive tempo de os processar melhor do que fiz aqui. Posso dizer, no entanto, que me motivaram a fazer esta lista. E que me levam a pensar em quantos mais tesouros ficaram enterrados na voragem de tudo o que os anos 90 abafaram.


Rubicon


Não posso fazer esta resenha e não mencionar os Rubicon, apesar da sua efemeridade. Os Rubicon foram a banda formada pelos outros Fields of the Nephilim quando se separaram de McCoy. Durou pouco, teve um grande álbum, "What Starts, Ends", e de facto não demorou muito a acabar. As guitarras dos Fields estavam lá mas faltavam as letras místicas de McCoy. Ainda assim, um grande álbum. E continuo a ouvir, e continuo a gostar, o que deve querer dizer alguma coisa. Afinal, era o núcleo musicalmente criativo dos Fields que ali estava.


Soundgarden
Grunge com atitude. Estes não queriam dar um tiro na cabeça. Estes esperneavam e davam luta. Por isso, também, gostei deles.


Suicide Commando
Devo confessar que comecei a ouvir os Sucide Commando por sugestão de um amigo e que os considerava demasiado electrónicos para levar a sério (outro preconceito), por isso usava-os como som para fazer ginástica em casa. Não, não estou a brincar. Ainda uso. E os VNV Nation também. Mas entretanto, "Die Motherfucker Die", descobri nos Sucide Commando uma homicida agressividade que vem mesmo a calhar ao espírito dos tempos. Cada vez gosto mais deles.


The Creatures
Até fica mal falar aqui de The Creatures (porque me faz parecer tremendamente musicalmente ignorante) mas a verdade é que só os descobri já depois de 2000. The Creatures é uma banda paralela aos Siouxsie & The Banshees. Com uma longevidade notável para uma banda paralela! Contudo, apesar de conhecer a sua existência, talvez porque a moda nos anos 80 fosse mesmo a Siouxsie, nunca tive oportunidade de os ouvir a sério. Simplesmente nunca aconteceu. Mas também não era fácil acontecer. O acesso à música era a todos os níveis limitado. Primeiro, era preciso saber que existia. Só se conhecia o que tinha destaque na imprensa ou nos fanzines ou quando os amigos recomendavam e emprestavam. Passando essa primeira fase, a de saber que existia, começava outra mais difícil, que era ter acesso à música em si, o que dependia sobretudo do acaso e da sorte. Falamos de tempos em que a música alternativa se produzia em poucos exemplares e menos ainda chegavam ao nosso mercado (quando chegavam e não era preciso ir comprá-los fora, o que não era para todos). As primeiras edições esgotavam e não voltavam a ser reeditadas. Com alguma sorte, encontrava-se um disco ou até mesmo um CD em segunda mão. O que nos ia safando eram os catálogos de K7s. E ainda assim, ler o nome de uma banda num catálogo, numa qualquer fanzine feita em papel A4 fotocopiado e vendida por encomenda por 100$ mais portes de correio, não era o mesmo que seguir links e clicar. Muita coisa despertava a curiosidade mas não havia por onde ir. The Creatures foram daquelas bandas de que eu sabia a existência, mas por uma razão ou outra a música nunca me chegou. Faltaram, sobretudo, recomendações. Não me lembro de ler na imprensa sobre os The Creatures os artigos elogiosos que acompanhavam os lançamentos de Siouxsie & The Banshees. O círculo de amigos e conhecidos também não lhes prestava atenção.
O que é muito estranho, porque agora posso dizer que se calhar até gosto mais dos The Creatures do que de Siouxsie & The Banshees. Há coisas esquisitas assim. Porque estava a ouvi-los e a pensar: porque raio passavam Siouxsie em todo o lado e não passavam isto? Todos aqueles anos a ser massacrada com punk a torto e a direito quando isto já existia! É o inexplicável. Os gostos, maioritariamente, eram mesmo outros. Arrisco até uma explicação. As canções melódicas dos The Creatures eram muito possivelmente recebidas com rejeição pela base punk de fans da Siouxsie como "som demasiado comercial". Compreendo, por isso, que The Creatures tenham sido a banda fantasma, e não ao contrário.


The March Violets
Estes são outros que me fazem parecer ignorante, mas apenas aparentemente. Na verdade, conheci-os quase ao mesmo tempo que os Sisters of Mercy, porque Andrew Eldritch publicou-lhes uns EPs pela editora Merciful Release (e até consta que eram amigos, até se chatearem, como não podia deixar de ser). Tenho a certeza de que andou por aqui uma K7 de March Violets, mas não sobreviveu muito tempo. Descobri-os, a sério, há poucas semanas. Porque estava de férias e tive tempo de pesquisar. O interessante da coisa é que a música envelheceu bem. Se ouvi, na altura, e não gostei, gostei agora. Não produziram muito mas o que produziram merece ser conhecido. Talvez tenham sido daqueles demasiado avançados para o tempo deles, porque se os tivesse ouvido ia achar, na altura, que eram pop insuportável. O erro foi que tentaram vendê-los como gótico. E na altura, à sombra dos Sisters of Mercy no seu auge, não tinham hipótese nenhuma. E se calhar foi exactamente o que aconteceu à gravação: não teve hipótese.


The Offspring
Isto pode parecer contraditório depois de tudo o que disse do punk, mas amei perdidamente dois álbuns de Offspring: "Smash" e "Ixnay on the Hombre". Chamaram-lhes neo-punk mas eu, que conheço o punk, digo antes que tomara o punk ter sido tão bom! (Neste momento há quem que me queira bater, e eu sei disso, e não me ralo.) Gostei intensamente, e depois eles venderam-se ou amoleceram, qualquer coisa do género. As letras deixaram de me dizer o que diziam. Abandonei.


Throwing Muses


Conheci-os também através da 4AD (não é por nada que se lhe chama "editora mítica") e continuei a seguir-lhes a pista. Rock alternativo americano que mais ninguém faz. Penso que acabaram.


Type O Negative
E no deserto que eram os anos 90, era refrescante ouvir uma banda de gothic metal a gozar com o gothic metal, e com a cena, e com aquilo tudo. Aliás, tem havido muitos clássicos na cena que são a gozar com a cena, o que só prova que a cena vive e não tem medo de se rir de si própria. O humor continuou negro até ao mais negro final.


Violent Femmes
A estes também conheci tarde. "Bateram forte" nos anos 90. Comprei os álbuns todos. Foi uma paixão. E falando dos Violent Feemes, a nenhuma banda se aplica melhor o termo "paixão". Foi amor quase à primeira audição. Porém, não sei se teria gostado deles durante a minha adolescência. Provavelmente não. Andava a ouvir coisas muito diferentes. O nome Violent Femmes não aparecia na coluna certa do catálogo. Literalmente. E também não me surpreende que os temas abordados pelos Violent Femmes, tirando o irritante e repetido "Blister in the sun", não agradem a muitos e por isso permaneçam pouco divulgados. O que inocentemente parece típica insegurança adolescente consegue ser muito mais retorcido do que o vulgar dos mortais tem capacidade para suportar. Definitivamente, não é para toda a gente.


Woven Hand


Esta é uma banda que descobri há coisa de dois anos. Continuo a achar que a definição (?) da Wikipedia ainda é a melhor: "combines elements of neofolk, alternative country, post-rock, punk, industrial music, folk rock, old-time music and native American music, among other influences". Como é que se define uma coisa assim? A nível das letras, ainda não decidi o que pensar. Digamos apenas, por exemplo, que em "Winter Shaker" ele canta "halleluia" de maneira propositada a fazer parecer dialecto de índio norte-americano durante um ritual. Tive dificuldade em acreditar nos meus ouvidos. Adivinharei bem a intenção: o Grande Espírito é um só? No entanto, as letras dos álbuns têm-se tornado cada vez mais religiosas, com expressões retiradas da Bíblia, e dos seus livros menos propensos a citação, como Rute, que implicam que o letrista conhece o Livro de trás para a frente. Se é assim, e a fé é genuína, pergunto-me porque é que aquilo não se tornou uma banda de rock evangélico, dirigida a um público muito mais vasto e certamente muito mais grato. E intrigam-me, intrigam-me muito. Diria mesmo que me assustam pelas ressonâncias que encontro em mim. Considero-os uma das bandas mais interessantes e originais da actualidade, mas não os percebo. Apetecia-me perguntar-lhes se não é convidar o pecado e a tentação frequentar antros alternativos, dar concertos para descrentes, ou se o objectivo é mesmo evangelizar os pecadores... E não, não estou a ironizar. Nem eles estão. É a sério, é tudo a sério. E intriga-me.


Os regressos 

Foi mais difícil não me esquecer dos regressos porque também se encontram em ordem alfabética juntamente com os lançamentos antigos. Espero não esquecer nenhum.
Saliento três, já neste milénio: Nick Cave & the Bad Seeds ("Dig Lazarus Dig" 2008), Bauhaus ("Go Away White" 2008), The Fields of the Nephilm ("Mourning Sun" 2005).


Sobre o primeiro, Nick Cave & the Bad Seeds, não tenho nada a acrescentar que não tenha dito sobre os Grinderman.
Bauhaus. Bem, Bauhaus foi uma surpresa. O novo álbum soa a Bauhaus ressuscitados. Sem tirar nem pôr. É este o grande forte e ao mesmo tempo a grande fraqueza do álbum. O estilo Bauhaus, que era uma explosão de originalidade e criatividade nos anos 80, já não o é agora. O génio não se conseguiu superar a si próprio. Digo-o sem desilusão, mas tinha esperança de ser arrebatada outra vez. Não fui.
Por fim, o que eu considero o melhor álbum destes três regressos, The Fields of the Nephilim. Para falar de "Mourning Sun" prefiro fazer uma analogia com a literatura. Imaginem que "Elizium" era um romance. Imaginem que "Mourning Sun" é a sequela desse romance quando ninguém a esperava. Porque "Mourning Sun" começa exactamente onde "Elizium" acaba. E quem gostou do primeiro muito dificilmente não gostará igualmente do segundo. Ao estilo da saga. Aliás, há muito que os Fields nos prometiam uma "Sequel". É mesmo coisa deles. Por mim, que venha a trilogia.


Este artigo foi maior do que eu previa e menor do que eu temia. Contava falar de meia dúzia de bandas, e afinal falei de mais, mas temi que se fosse por esse caminho, o das bandas que foram importantes, o artigo nunca mais acabasse. Afinal acabou. Não foram muitas as bandas que tiveram impacto em mim depois dos anos 80 a ponto de as mencionar como "importantes". Com certeza muita coisa faz efeito a nível inconsciente, a nível geracional, mas não pessoal. Às vezes não é fácil distinguir uma coisa da outra.
Referi-me muitas vezes aos anos 90 como um deserto musical, e foi. Talvez seja injusto dizer isto depois de uma década musicalmente fora de série como foram os anos 80 (como já tinham sido, por exemplo, os anos 60). Muitos projectos ficaram à sombra, foi inevitável. A nível da cena gótica, então, foi uma década terrível para se fazer chegar ao público aquilo que se fazia.
No entanto, causa-me ainda maior estranheza a falta de criatividade que permeou toda a primeira década de 2000. Houve muito seguidismo, mas pouca originalidade. Como se as pessoas que fazem música sofressem do medo de não ter lugar se arriscassem ser diferentes. Se nos anos 90 o alternativo é que era comercial, por acidente, dá a impressão que na primeira década de 2000 o alternativo se guiou por fins comerciais, de propósito. Como se as próprias bandas/projectos se auto-espartilhassem para agradar ao gosto do público, já compartimentado, que queriam alcançar. A nível musical, isto nunca é bom.
Até prova em contrário, considero que a primeira década do milénio já não foi um deserto em quantidade, mas deixou muito a desejar em criatividade. Talvez nesta segunda década, agora que a internet já não é nova e os mercados musicais se aprendem a organizar, comece algo novo a borbulhar como não temos há muito tempo.

Espero sinceramente que este artigo tenha sido útil a alguém. Deixo já aqui o desafio, a quem me lê, que publique igualmente uma lista de descobertas após 1990. Para que os tesouros não fiquem por desenterrar.
Eu, por exemplo, estou interessadíssima nessas listas e nesses tesouros. Não se esqueçam de partilhar.

quinta-feira, 12 de julho de 2012

Entremuralhas 2012

25 e 26 de Agosto Castelo de Leiria Merece uma visita a página oficial do Festival Entremuralhas, aqui: fadeinaacultural.com Tal como já nos habituou em edições anteriores, a organização disponibiliza áudio ou vídeo das bandas em cartaz este ano. Uma boa oportunidade para a descoberta de bandas menos conhecidas, ou para saborear um ante-gosto do que se vai ouvir, para os que vão, ou a decisão de não perder o festival, para os indecisos. Só na edição do ano passado conheci Irfan e Arcana, e pergunto-me como era possível viver sem eles. Sem falar das outras bandas com que tive um primeiro contacto (por exemplo, Narsilion) que apesar de agradáveis descobertas não se tornaram imprescindíveis como o ar para respirar. Na edição deste ano, e passando ao lado dos cabeças de cartaz Suicide Commando e VNV Nation e Clan of Xymox, amplamente conhecidos, tive já a oportunidade de escolher do lote uma banda para mim até aqui desconhecida, os Daemonia Nymphe. Migalhas de luxo para os que não podem ir.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

R.I.P. António Sérgio

António Sérgio morreu aos 59 anos no dia 1 de Novembro.
Apesar de atrasada, fica aqui a homenagem a um dos radialistas mais importantes para a música alternativa em Portugal.
Foi com choque (e mágoa) que recebi pessoalmente a notícia deste súbito desaparecimento. António Sérgio era uma autoridade em música alternativa com quem as pessoas da minha geração aprenderam a ouvir... o desconhecido. António Sérgio não se ficou pelo "som da frente" dos anos 80. Continuou sempre a procurar música nova e alternativa.
A sua falta será sentida.

Para uma noção mais completa do seu percurso, remeto os leitores para o obituário publicado no Blitz.