domingo, 25 de junho de 2023

Extinction / Extinção (2015)

Ora aqui está um filme de pormenores confusos, quase à vontade do freguês para os interpretar. Um vírus (nunca sabemos exatamente o quê nem porquê) está a transformar os seres humanos em monstros. Não exactamente vampiros nem zombies, é mais uma coisa à “Wayward Pines” ou “28 Dias Depois”.
Alguns anos depois (é mesmo assim, sem nada pelo meio) dois homens, sobreviventes não infectados, vivem em casas contíguas sem se falarem. Um deles tem uma filha de uns 8 anos, a confiar na cronologia. Através de flashbacks percebemos que um deles era o marido da mãe da miúda, e o outro o amante. Nunca é dito claramente qual deles era o marido, mas pelo que percebi o marido é quem tem a custódia da miúda e o amante é o pai. Para piorar as coisas, parece que o amante, num estado de embriaguez e depois de uma discussão estúpida, foi o responsável por perder de vista a mãe da miúda, que acabou por ser morta pelos monstros. Obviamente, os dois homens têm-se um ódio de morte mas continuam “juntos” para proteger Lu, a miúda.
Sinceramente, acho que é esta a mensagem do filme, porque é graças a Lu que os dois se reaproximam na medida do possível.
O clima que os rodeia é de neve cerrada o ano todo. Mais uma vez não sabemos porquê. Podem ser as alterações climáticas, mas num filme em que um vírus transforma os seres humanos em monstros até podia ter sido uma colisão com a Lua. Durante todos estes anos, os dois homens e a criança julgaram-se os únicos sobreviventes, mas agora parece que não o são. Os tais monstros evoluíram e adaptaram-se ao frio, mas por outro lado as suas dentadas já não são infecciosas. Curiosamente, começam a ver-se cada vez mais pores-do-sol e o clima a voltar ao normal. Confusos? Eu também. Nada disto é explicado.
Finalmente, os sobreviventes encontram outras pessoas (afinal não são os últimos seres humanos na Terra) e… esperem por ela… a miúda ouve numa transmissão rádio que a maneira de matar os monstros é atingi-los no cérebro.
Assim tal e qual, não sei a copiar quantos filmes ao mesmo tempo. O enredo é este, o filme é este, já o vimos dezenas de vezes, e pergunto-me qual foi o objectivo. Continuo a achar que o objectivo era explorar a relação dos dois homens que têm de cooperar embora se odeiem.
Um filme que se esquece rapidamente e que só serve para entreter. Não há mesmo mais nada a dizer.
Gostei de ver de novo Matthew Fox, o Jack de "Lost", pelo menos até ele cortar o cabelo. Foi o melhor do filme.

12 em 20

 

domingo, 18 de junho de 2023

The Handmaid’s Tale, de Margaret Atwood

Não é costume dizer isto, mas a série estragou-me o livro. Não consegui ler sem imaginar “The Handmaid’s Tale” (a série) na minha cabeça a todos os instantes. Isto significa duas coisas: que a série respeita perfeitamente o material original, e que o livro publicado em 1985 foi o bastante para incendiar imaginações e perturbar consciências até aos dias de hoje.
Não estou a dizer com isto que não adianta ler o livro se já se viu a série, nem que a série é melhor do que o livro, mas depois de ter uma visualização de todo este mundo com personagens tão fortes como June (na série, porque no livro nunca é revelado o nome de Offred, a protagonista) não me foi possível dissociar as duas coisas. A maior parte das vezes dei por mim a reconhecer as cenas e a apontar mentalmente os monólogos de Offfred: “Olha, a June disse isto exactamente assim”; “Olha, a June disse isto mas deixou parte de fora”; “Olha, aqui está dito de forma diferente”. Também não ajuda que eu esteja completamente viciada na série.
Em suma, preferia ter lido o livro primeiro, mas agora já está. Atwood foi ousada em apresentar-nos Gilead tão intimamente sem grande exposição, como se o leitor conhecesse perfeitamente a distopia em que Offred estava aprisionada e porquê. Só posso imaginar o choque que isto tenha causado aos leitores que não sabiam para o que iam (como me costuma acontecer a mim), e que se calhar tiveram de ler duas ou três vezes para perceber todo o horror que Offred, muitas vezes veladamente, lhes ia revelando nos seus diários.
No entanto, existem pequenos pormenores de diferença. Como aquelas crianças a quem é repetidamente contado um conto de certa maneira até o ouvirem de forma diferente e que dizem “a história não é assim”, obviamente que reparei neles. Outros ajudam-nos a perceber melhor certas relações e acontecimentos que a série não aprofundou. Por exemplo, a origem da frase “nolite te bastardes carborundorum” está aqui muito melhor explicada.
E depois há a cena da gata…

Spoilers
No livro, June (vou usar o nome da série) e Luke têm uma gata. Quando Gilead faz com que June e todas as mulheres percam o emprego, June conforta-se abraçando a gata contra o peito. Comovente, não é? Mas na hora de fugir para o Canadá com Hannah, Luke e June apercebem-se de que não podem “levar um gato com eles a cruzar a fronteira”, que deixar a gata para trás os podia denunciar (se a deixassem à solta ela miava em volta da casa) e que não a podiam oferecer a ninguém que os pudesse trair de seguida. Então o que é que fazem? A gata está escondida debaixo da cama e June até diz “eles sabem sempre”. Luke leva a gata para a garagem e mata-a. Assim mesmo. Mais tarde, quando de facto são traídos, June pergunta-se que género de maldade leva outros seres humanos a traírem os vizinhos. June, filha, e o que terá pensado o animalzinho nos seus últimos momentos naquela garagem, traído pela única família que conheceu, a quem amava e por quem se julgava tão amado que era abraçado contra o peito, que últimos momentos foram esses, cheios de medo, confusão, dor e amargura? Pensaste nisso?
Felizmente, os criadores da série perceberam que isto não ia cair nada bem no público actual e não incluíram essa cena. Afinal, o livro foi publicado em 1985, quando os animais não eram considerados parte da família. Que lhes fazer? Matá-los, afogá-los à nascença, fazia-se tudo isso quando eram incómodos e já não davam jeito. Actualmente é impensável deixar um animal para trás (por exemplo, os refugiados da Ucrânia levaram cães e gatos com eles), e não daria tanto nas vistas porque muita gente leva os animais de estimação quando vai de férias. Na altura talvez não.
Não é que eu não acredite que a June da série não seja capaz de matar um gato, dois gatos, mil gatos. Pelo contrário. O que acho é que a June da série é monstruosa a um ponto que a Offred do livro nunca chega a ser e mesmo assim não me apeteceu torcer por ela. Perturbou-me, revoltou-me. Isto não é dizer pouco quando se fala de “The Handmaid’s Tale”, mas para tudo o resto eu já ia preparada.
Ainda por cima, na série, quando fogem, June e Luke passam por imensos matagais desertos onde podiam muito bem ter deixado a gata e assim esta sempre tinha uma oportunidade de caçar ou encontrar um novo lar. Na garagem é que não teve oportunidade nenhuma.
A acção do livro só cobre as primeiras duas temporadas da série e a própria Margaret Atwood faz parte da equipa, o que poderá explicar o sucesso da expansão do mundo de Gilead. O livro termina quando Offred é levada para parte incerta pela polícia do regime, sem saber o que lhe vai acontecer. Acredito que este fim em aberto tenha causado pesadelos a inúmeras gerações de leitores.
Por fim, o livro deixa-nos uma nota de esperança. Muitos anos no futuro, durante um simpósio sobre Gilead, os diários de Offred (aparentemente gravados em cassete, como em certa passagem da série) são analisados e debatidos, sendo mesmo posta em causa a sua veracidade e de que modo Offred os poderia ter gravado e escondido. Mas Gilead é sempre referida como uma sociedade do passado, algo de extinto que merece a pena ser estudado. O que nos diz, também não disfarçadamente, que Gilead não ganhou no fim.
Margaret Atwood escreveu uma distopia magnífica, um sucessor perfeito dos gigantes “Farenheit 451” e “1984”, e ainda por cima com um contexto muito actual.
Recomendo a toda a gente que não faça o que eu fiz: leiam o livro primeiro, até porque é curto. E depois, sim, devorem a série.
Quanto à cena da gata… vou fingir que não li. Já me perturbou mais do que o bastante.

 

domingo, 11 de junho de 2023

Sinister / A Entidade (2012)


Ellison Oswalt é um escritor de crime real que se muda, com a mulher e dois filhos pequenos, para a casa onde ocorreu o homicídio de uma família inteira. (Primeiro erro: numa história de terror nunca ninguém deve ir viver para a casa “assombrada”.) Toda a família anterior foi assassinada, com uma excepção: a filha mais nova, ainda criança, desapareceu sem deixar rasto. É este mistério que o escritor quer explorar no novo livro, que, espera ele, seja um sucesso de vendas que venha compensar a falta de êxito das suas obras mais recentes. Com a casa antiga penhorada, Ellison Oswalt não se atreve a dizer à esposa que estão a viver na residência onde ocorreu o crime.
Como pessoa racional que é, espera que o ambiente o inspire para escrever o melhor livro da sua vida (e aquele que o vai livrar das dificuldades financeiras). Mas assim que se instala no seu escritório repara numa caixa com várias bobines de vídeo: estas filmagens são os homicídios horripilantes de várias famílias anteriores em que, igualmente, só desapareceu a criança mais nova. Agora Ellison Oswalt sabe que o assassino tem acesso à sua casa, e ainda pensa chamar a polícia, mas o xerife foi tão pouco colaborativo, e o escritor precisa tanto de um êxito na sua carreira, que muda de ideias.
Mais tarde, consegue recrutar a ajuda do assistente do xerife que identifica estes outros homicídios como remontando aos anos sessenta e setenta, o que tornaria o assassino demasiado velho para continuar a cometer crimes desta natureza. (Quem viu todos os episódios de “Mentes Criminosas”, como eu vi, tem uma explicação óbvia para isto: é um aniquilador de famílias que rapta as crianças mais novas para as endoutrinar a fazer o mesmo através da Síndrome de Estocolmo e de uma lavagem cerebral apropriada).
De facto, a solução do filme passa exactamente por aquilo em que eu estava a pensar, mas com um desvio no sentido do sobrenatural.
Ora, o filme estava a ir muito bem como policial. O sobrenatural é que não chegou para me convencer. Não gostei do truque baixo de passar a maior parte do filme à noite, no escuro, enquanto o escritor percorre a casa sozinho (ou com um taco de basebol) à procura de intrusos, sem que a gente consiga ver nada do que está a acontecer. Não estou a ironizar, nos primeiros dias de permanência na casa pensei que a família ainda estava à espera de que a luz fosse ligada, tal era a escuridão constante, até durante o jantar.
Por fim, Ellison Oswalt percebe que nenhum sucesso financeiro vale mais do que a sua família e decide fugir a toda a velocidade. Mas ainda irá a tempo?
“Sinister” daria um excelente policial se não quisesse ser outra coisa, outra coisa, aliás, já tão batida e esgotada que o espectador adivinha o fim assim que começa o filme. Não é promissor. Aconselho pelo entretenimento. O fim não deixa de ser chocante, apesar de previsível.

13 em 20

domingo, 4 de junho de 2023

Wayward Pines (2015 – 2016)

Alguém se lembra da primeira temporada de “Wayward Pines”, prometida como uma mistura de “X-Files”, "Twin Peaks", ficção científica, distopia e terror? Eu também não. Mesmo assim, decidi ver a segunda e última temporada, só para saber como é que a história acabava.
Se a primeira parte de “Wayward Pines” era toda um jogo mental, entre destrinçar a realidade da mentira, entre descobrir em quem confiar ou não, a segunda parte é muito menos pretensiosa. Aqui já sabemos tudo o que precisamos de saber.
A cidade de Wayward Pines, com cerca de 1500 habitantes mantidos em criogenia até ao ano 4000 e tal, é o último reduto da raça humana. Fora dos seus limites, os seres humanos sofreram mutações genéticas que os transformaram em aberrações, com dentes e garras e tudo, e são donos do mundo. O problema de Wayward Pines é sobreviver.
Se na primeira temporada os dirigentes da cidade nos pareciam fascistas, agora vemos as coisas pelo outro lado. O objectivo é “frutificar”, aumentar o número de sobreviventes para terem alguma hipótese, e assegurar comida para todos. Nestas circunstâncias o que nos parecia fascismo assemelha-se mais a Lei Marcial. O que não quer dizer que não haja atropelos. As meninas são incentivadas a ter filhos assim que têm o período, preparadas ou não. É uma violência. Assegurar a sobrevivência da humanidade não implica cair na desumanidade. A resistência ainda existe, cada vez mais fraca, até ser completamente arrasada. Nesta altura já não há muito a que resistir, diga-se a verdade.
As colheitas estão fora da vedação e é perigoso ir buscá-las. Com os números de sobreviventes a aumentar, é necessário procurar mais locais de plantação. A comida é racionada. Pouca gente se preocupa a sério com este problema.
De repente, todas as aberrações desaparecem de vista e os sobreviventes julgam ter uma oportunidade. Mas subestimaram os novos habitantes da Terra. Quando estes regressam, muito mais inteligentes do que os julgavam, queimam todas as colheitas já existentes. Parece ser o fim da humanidade como a conhecemos.
A segunda temporada de “Wayward Pines” é isto, uma última comunidade de seres humanos a tentar sobreviver numa situação periclitante e cada vez mais improvável. Mesmo assim conseguiram atingir-me directamente nos sentimentos com uma revelação que ninguém esperava.
Penso que a premissa podia ter sido muito mais bem aproveitada mas não tenho a certeza se “Wayward Pines” julgava que ia ser renovada ou não. Todos os sobreviventes da primeira temporada são rapidamente despachados em meia dúzia de episódios, até os principais. O fim é ambíguo e frustrante. Apesar de tudo indicar que alguém tinha um plano infalível para dizimar as aberrações com um cocktail de doenças infecciosas, parece que estes não só sobreviveram mas agora estão a procriar com os seres humanos dando origem a uma nova espécie? Estou a especular, porque não sabemos. O objectivo seria renovar ou era mesmo para acabar assim?
Aconselho esta temporada a quem gosta de distopia e histórias de sobrevivência, sem grandes expectativas.

ESTA SÉRIE MERECE SER VISTA : uma vez