domingo, 8 de janeiro de 2023
The Walking Dead (2010–2022)
Ao fim de 12 anos nos nossos écrans, “The Walking Dead” acabou. Alguém deu por isso? Lembro-me de momentos em que o fim de uma temporada significava o terror de que alguém nos contasse um spoiler, por acidente ou de propósito. Desta vez não ouvi uma única palavra sobre o fim da série de zombies mais icónica da última década. E isto é triste.
“The Walking Dead”, no seu auge, foi a melhor série de zombies jamais feita, e ainda não vi nada que a superasse ou que não se alimentasse (directa ou indirectamente) das ideias do universo Walking Dead.
Muitos fãs começaram logo a chamar-lhe telenovela a partir da segunda temporada, mas eu não sou dessas. Acho mesmo que a série atingiu o seu melhor algures entre a fuga de Terminus (os canibais) e a chegada a Alexandria. Depois apareceu Negan e tudo descambou. As personagens tornaram-se caricaturas, bonecos de acção, os diálogos degradaram-se, cada vez mais rebuscados e irrealistas. Chegou a ser doloroso assistir a alguns episódios, tal como actualmente é doloroso assistir a “Fear The Walking Dead”, o que uma pessoa continua a fazer por ter investido tanto nesta série, e um pouco por masoquismo, e porque os zombies de Greg Nicotero são mesmo muito bons!
Bastantes fãs abandonaram “The Walking Dead” nessa altura e não posso censurá-los. As temporadas de Negan, principalmente, foram muito mazinhas, em todos os sentidos e até em termos de world building. Às vezes era difícil perceber o que estava a acontecer, o que implica não apenas má escrita mas má realização em geral.
Em retrospectiva, a morte de Karl, a saída de Rick e de Michone foram de facto golpes demasiado profundos de que a série nunca se conseguiu recuperar, por muito que Daryl e Carol a tenham tentado levar às costas até ao fim.
O fim (?)
Chegamos então à última temporada em que a show runner Angela Kang tentou pegar no que tinha e salvar o que podia. Nesta altura a qualidade melhorou bastante, mas era tarde demais. Esta devia ser a história da família Grimes e seus amigos. Não é de estranhar que nos últimos 8 episódios os escritores se tenham voltado para a única sobrevivente original do clã Grimes: Judith, a única Grimes que vem da primeira temporada. Sim, na barriga da mãe, mas Judith foi importante desde o momento em que Lori se apercebeu da gravidez. (Não posso incluir o filho de Rick e Michonne porque só no último episódio é que lhe deram qualquer coisa para dizer. O que me lembra novamente que Michonne jamais se iria embora atrás do fantasma de um homem e deixaria um filho tão pequeno no meio do apocalipse zombie, outra das perplexidades que ninguém percebeu.)
Nos últimos 8 episódios, a série regressa a Judith, resumindo, através de monólogo interior e montagens do passado, o que foi o caminho até aqui e recordando as personagens que ficaram para trás. Muito disto bateu directamente na nostalgia e acertou o alvo. Mas não resolve a questão premente: a série não acabou. “The Walking Dead” continua nas muitas sequelas já feitas (como a mais recente, “Tales of the Walking Dead”) e por fazer. O facto de a AMC ter anunciado sequelas com Rick, Michonne, Maggie, Negan, Daryl e Carol também despejou a série de tensão. Sabíamos que aqueles personagens não iam morrer e que a história deles não acabava aqui. (A minha maior surpresa foi saber que afinal a actriz Melissa McBride –Carol– recusou continuar e não vai participar no spin off com Daryl Dixon. Acho que ela só faz é bem.)
Resta quem? Os personagens secundários, e Judith. Ainda nos pregaram um susto do caraças com Judith, mas acho que Angela Kang percebeu a tempo que os espectadores se revoltavam se acontecesse alguma coisa à miúda que estava onde não devia estar. (Resumindo, os adultos deixam-na ir com eles para um conflito armado, apesar de a miúda não ter mais que 10 anos, porque ela lhes pede, quando lhe deviam ter dito: Vê lá se não queres levar uma lambada! Vai mas é acabar os trabalhos de casa! Até nos dois últimos episódios, “The Walking Dead” persiste em fazer coisas estúpidas, tipo “imagem de marca”.)
Mesmo assim, gostei da conversa sincera e emocional entre Maggie e Negan, em que este finalmente pediu uma desculpa sentida pelo que fez a Glenn e Maggie lhe respondeu também do coração. Mas não consigo esquecer que este novo Negan, como personagem, é um embuste. O Negan original era uma caricatura de desenhos-animados; este Negan é John Winchester. E está tudo dito acerca de Negan.
Ezekiel também confronta Negan, tal como Aaron já tinha feito. (Mesmo assim, é impressionante como estes personagens tardios se tornaram importantes, muito graças aos seus actores.) Ezekiel não esquece o que ele fez. A certa altura pensei que Ezekiel ia falar de Shiva, mas a tigresa não foi mencionada, embora igualmente vítima indirecta dos Salvadores. Sempre gostei de Ezekiel, mesmo quando ele andava a brincar ao Senhor dos Anéis nos tempos do Reino. Compreendo a ideia dele. Num mundo sem esperança, as pessoas precisam de fantasia para se distraírem. Escapismo. Não é por isso que vemos o nosso tipo preferido de Fantasia, seja com dragões seja com zombies, ou ambos? Não foi por isso que assistimos a “The Walking Dead”, e que nos irritámos quando a série não era tão boa a ponto de nos fazer esquecer a realidade?
Por falar em realidade, sou das poucas que gostou dos episódios na Commonwealth, apesar dos muitos, muitos erros. A Commonwealth mostra-nos o que seria o mundo actual, como o conhecemos, mas com zombies. De certa forma, os zombies vieram impor a lei do mais forte em todo o lado, mas na Commonwealth continuava tudo igual: os pobres, os ricos, os importantes, a carne para canhão. Foi interessante.
Tenho escrito bastante sobre esta série e não há muito mais a dizer que não tenha dito já. Podemos mesmo considerar que “The Walking Dead” acabou quando já há spin offs a filmar com os seus personagens principais? A avaliar pela qualidade dos spin offs já existentes, se calhar eu preferia mesmo que a série acabasse de facto aqui.
ESTA SÉRIE MERECE SER VISTA: 2 vezes até Negan aparecer; a partir daí é com cada qual
domingo, 17 de abril de 2022
Day of the Dead (2021 - ?)
Admito que sou doidinha por ver o início de um apocalipse zombie. As primeiras suspeitas, nunca levadas a sério quando são relatadas. O primeiro zombie, em “Fear the Walking Dead”, a avançar direito a uma bonita casa suburbana pelo caminho entre os relvados impecáveis. Rick Grimes a sair do hospital e a encontrar uma menina zombie com uma boneca ainda na mão. A confusão das autoridades, sem saberem o que fazer. Por fim, o desagregar da sociedade que “Fear the Walking Dead” nos prometeu mas não cumpriu o suficiente.
Depois desta fase inicial os sobreviventes aprendem a viver com os zombies, aprendem a evitá-los e matá-los, e cai tudo numa rotina que raramente passa do mesmo. “Day of the Dead” é uma série despretensiosa do canal SyFy que retrata o primeiro dia da invasão zombie. Infelizmente, as críticas arrasaram a série, no meu entender injustamente. Em grande parte porque usa o título homónimo do filme de George A. Romero, o que, concordo, não era necessário.
Toda a acção se passa no mesmo dia, numa pequena cidade americana em que há eleições para decidir quem será o novo Mayor e em que se prepara um casamento. Um dia normal como todos os outros. Mas, entretanto, uma companhia de extracção de gás faz uma determinada perfuração que encontra algo estranho: um homem (zombie) atado no fundo de uma gruta que nunca devia ter sido aberta. Alguém chama um detective incauto, que é mordido. Começa a infestação.
Mas estes zombies não são os mesmos de “The Walking Dead”. Não morrem com uma bala na cabeça, não morrem com coisa nenhuma. Só se pode rebentá-los com explosivos, prendê-los ou atrasá-los com tiros nos joelhos. Outra coisa interessante: alguns dos zombies mais “frescos” retêm algo das memórias de quem são/foram, o que não se vê muitas vezes. E os zombies mais frescos não se arrastam; correm. Os habitantes da pequena cidade oscilam entre a incredulidade e o terror.
Este não é um dramalhão como “The Walking Dead”, mas tem drama que baste. Os dez episódios permitem explorar e desenvolver as personagens, inclusive os vilões, que se movem naquela área cinzenta em que lhes conseguimos compreender as razões. Os momentos de humor são mesmo engraçados e inesperados, mas sem abusar. Há mortes com fartura, algumas bastante violentas, mas a série não quis entrar demasiado por aí. Esta é uma série em que, mais do que mortos a comer os vivos, os vivos se tentam organizar para derrotar os mortos, o que não vai ser fácil, porque para conseguirem unir-se nessa causa comum têm de esquecer os conflitos que a pequena cidade foi acumulando ao longo dos anos.
“Day of the Dead” entretém bastante e tem momentos de verdadeiro terror, especialmente no princípio, quando ainda ninguém acredita nos zombies. Quanto a estes, não são, de longe, tão bons como os de Nicotero, mas também estão bem caracterizados e são convincentes.
Não posso concordar com as críticas negativas e aconselho a toda a gente que gosta de zombies, com um drama à mistura que não pretende traumatizar-nos para toda a vida. Mesmo assim, é duvidoso que a série seja renovada, apesar de lançar as bases para isso a uma escala maior. De certa forma, tenho pena. Gostava de ver mais. Mas se era para pior (e nestes casos quase sempre é) mais vale ficar por aqui.
domingo, 23 de maio de 2021
The Walking Dead: World Beyond
Dizia eu que só acreditaria em spin offs de “The Walking Dead” quando as visse, mal sabendo que já estavam a ser filmadas. E parece mesmo que vêm aí mais. A qualidade é que não é nada por aí além, tirando os próprios zombies, e é por causa dos excelentes zombies de Nicotero que ainda se conseguem ver estas séries. Esta é outra igual.
“World Beyond” é a versão adolescente de “The Walking Dead”. Enquanto que, na Virginia, Carl andava a comer comida de gato e a enfrentar famílias canibais, noutros lados do país as coisas parecem ter-se aguentado melhor depois do apocalipse zombie. É o caso da cidade de Omaha, de Portland, e do campus da Universidade do Nebraska, onde vamos encontrar os protagonistas de “World Beyond”. Isto causa alguma estranheza para quem viu a sociedade desaparecer e a anarquia reinar em “The Walking Dead” e “Fear the Walking Dead”, mas aparentemente ainda há comunidades onde sobreviveu o mundo como o conhecemos. O que coloca desde logo a questão: como é que os sobreviventes ainda não sabem uns dos outros, 10 anos passados desde o apocalipse, uma vez que em “Fear the Walking Dead”, e mais ultimamente em “The Walking Dead” também, toda a gente usa o rádio para comunicar? Estas comunidades sobreviventes não saberiam já da existência umas das outras? Mas no universo “Walking Dead” é melhor não fazer muitas perguntas.
Hope e Iris são duas irmãs (adoptadas) que frequentam a universidade, junto com outros jovens como elas que eu não sei de onde apareceram nem onde vivem os seus pais. Omaha, Portland? Mas lá estou eu a fazer muitas perguntas. O importante é que estes jovens do campus passaram pelo apocalipse num ambiente seguro e resguardado onde sabem que fora dos seus muros existem zombies mas nunca tiveram de se confrontar com eles. O início da série é quase o nosso mundo, e estes jovens do campus estão a ser educados para trazer de volta a civilização.
O pai de Hope e Iris é um cientista que dá aulas nesta universidade pós-apocalíptica até ser recrutado pela sinistra Civic Republic Military. (Como chamar a isto em português, Milícias da República Cívica? República Cívica Miliciana? Parece-me mais a segunda opção. Mas uma República não contém já o conceito de “cívica”, e “militar” não é um dos ramos de poder em que assenta uma república?) A princípio nada nos diz que esta República Cívica seja sinistra, mas há sempre esse suspense de algo pesado no ar quando os helicópteros aparecem. A localização das bases da República Cívica é secreta (o que faz sentido num mundo dominado pela anarquia e o saque) e o tal cientista não está autorizado a comunicar para fora delas, mas antes de partir ele arranja uma maneira de estabelecer contacto com as filhas. Hope e Iris recebem uma mensagem do pai em que este as informa de que corre perigo, e decidem ir salvá-lo (sozinhas contra um exército, porque acham que conseguem). Com elas vão outros dois jovens da mesma idade, Elton e Silas. Nenhum deles alguma vez teve de sobreviver sozinho fora dos muros e não sabem sequer matar um zombie.
Dois dos seguranças do campus, Felix e Huck, vão à procura dos miúdos e conseguem encontrá-los, mas, cada um pelas suas razões, estes recusam regressar. Foi a sorte deles, porque, por algum motivo que ainda não faz sentido, a República Cívica destruiu o campus universitário.
Esta série é sobre os primeiros adolescentes a crescer num apocalipse zombie, mas a República Cívica acaba por ser o enredo (neste caso, sub-enredo) mais interessante. É que foram estes misteriosos helicópteros que levaram Rick Grimes e Anne/Jadis (personagem também conhecida por “senhora da lixeira”, que afinal era uma agente infiltrada). É por isso principalmente, e por outros encontros com a República Cívica em “Fear the Walking Dead”, que os espectadores do universo “Walking Dead” sabem que esta gente não é boa e recorre a métodos chocantes. Por muito que estes digam que o objectivo é o “futuro”, o “bem maior”, reestabelecer a civilização, ficamos perplexos quando destroem um campus universitário onde estava a ser preparada a próxima geração com esse mesmo objectivo em mente. Eu, por exemplo, a princípio nem percebi o que tinha acontecido, de tão contraditório que isto é. E na verdade não se viu acontecer, mas foi dado a entender e toda a gente percebeu assim. Afinal, quem é esta República Cívica e qual é o seu verdadeiro desígnio? Mas a série só nos deu migalhas porque não vai ser aqui que se vai descobrir.
Hope e Iris, e os companheiros Elton e Silas, partem numa daquelas viagens de auto-descoberta e de descoberta dos outros típicas da adolescência. Não digo isto como crítica mas como constatação, é um drama adolescente com temáticas adolescentes, em que os quatro miúdos têm de aprender coisas como conduzir ou matar o primeiro zombie. (Experiências que Carl, na série-mãe, começou a ter na infância.) Há muita conversa e o ritmo pode ser considerado demasiado lento para a grande parte dos espectadores. Cada episódio parece uma aventura separada e os miúdos nunca se encontram em grande perigo como acontece na série original. Só nos últimos dois episódios é que acontece algo minimamente empolgante.
“World Beyond” não é série que se compare às melhores temporadas de “The Walking Dead”, mas pelo menos a história não é o caos sem nexo em que se tornou “Fear the Walking Dead” (já não percebo o que se passa por lá). Vê-se bem, sem grandes expectativas, e só estão anunciadas duas temporadas, o que nos promete um enredo com princípio, meio e fim. Quem esperar mais do que isto vai ficar desiludido.
domingo, 4 de outubro de 2020
The Walking Dead [décima temporada]
[contém spoilers; não revela o final;
nem podia revelar porque, no momento em que escrevo, o último episódio ainda nem foi filmado]
E assim aconteceu que o apocalipse zombie durou tanto tempo que foi atropelado pelo apocalipse Covid. Mas não percamos a esperança. Já aí está o Covid. Talvez ainda venham os zombies.
Comecei a ver esta temporada sem saber que não tinham conseguido filmar o último episódio devido à pandemia. Curiosamente, quando acabou o penúltimo episódio também não me preocupei muito que não existisse o próximo. A qualidade da série melhorou, sim senhor, a olhos vistos, depois da saída de Scott M. Gimple (que foi estragar “Fear the Walking Dead”). Mas já tenho muita dificuldade em acompanhar o que se passa e, principalmente, em importar-me com as caras novas que só conheço há meia dúzia de episódios. Para fazer esta crítica estou a usar a cábula dos resumos dos episódios do IMDB, porque assim de repente nem me lembro de nada. Quando uma série atinge este ponto (e uma série que já foi inesquecível) é doloroso falar dela.
Pois a Michonne lá se foi embora também, o que não é um spoiler para quem acompanha as notícias em torno da série. Michonne não morreu. Simplesmente abandonou os filhos (Judith e o pequeno Rick Jr.) em Alexandria e foi atrás de uma ténue pista de que Rick possa estar vivo. Alguma vez a Michonne que eu conheço agiria assim, abandonar dois filhos no meio do apocalipse zombie? Mas nem pensar. A Michonne que eu conheço ficou enlouquecida quando o filho dela morreu. Não ia abandonar os filhos por uma pista obscura.
As personagens vão tendo flutuações de personalidade conforme o enredo (e os contratos) obrigam, e a certa altura até as personagens que já conhecemos há muito tempo começam a agir “out of character”. Isto cria um fosso, uma dissonância entre o espectador e as personagens, como se subitamente elas fossem possuídas por extraterrestres (mas menos interessante), em que já nem as reconhecemos. Este novo “Walking Dead” é uma série diferente, e até compreendo a necessidade de evolução, mas transformar as personagens numa coisa que elas não são arranca-nos a última âncora que nos agarrava à história. Hoje em dia vejo “The Walking Dead” e já não sei muito bem o que estou a ver.
Muitos problemas foram resolvidos com a direcção de Angela Kang, mas alguns dos mais irritantes persistem. O mais irritante de todos, julgo que é opinião unânime, é a mania de pôr os personagens a fazer coisas estúpidas para avançar o enredo.
Sim, as pessoas cometem erros e os personagens ficcionais não são diferentes, mas os acessos de estupidez momentânea dos personagens de “The Walking Dead” já são lendários. Desta vez calhou a sorte a Carol (uma das personagens mais respeitadas exactamente por estar sempre um passo à frente dos outros) de se comportar como uma imbecil. Isto porque perdeu o outro miúdo, Henry, a quem deviam dar um prémio qualquer por ter conseguido ser o personagem mais estúpido de todo o cast de “The Walking Dead”, e não apenas momentaneamente (o miúdo era constantemente imbecil). Mas Carol é uma personagem que já perdeu muito, que já perdeu tudo, e aguentou-se. Que não ia perder a cabeça agora, a esta altura do campeonato. Foi doloroso de assistir.
E depois temos Negan, uma batota completa. O Negan que nós conhecemos era um sociopata sem remorsos. Este Negan está cada vez mais bonzinho. Querem à força que a gente esqueça como ele esmagou à cacetada os crânios de Abraham e de Glenn com a Lucille. Aliás, já nem se fala da Lucille, para as pessoas não se lembrarem. E como se não bastassem os homicídios e a megalomania, ainda houve aquela vez em que ele queimou vivo um médico só porque desconfiou que este se andava a fazer a uma das suas “esposas”, “esposas” estas todas obrigadas a serem esposas de Negan, mercê de ameaças às famílias delas. E é este o personagem que querem reabilitar. Negan não tem redenção possível. A única vez que concordei com Carol nesta temporada foi quando ela disse: “O Negan também podia desaparecer”. Ah, se podia. Esta é que é a Carol que eu gosto. Admito que o Negan tenha uma qualidade redentora. Sempre foi bom com miúdos e adolescentes, o que se manifestou logo quando ele interagiu com Carl. Isto faz parte da personagem como ela nos foi apresentada. O resto é fabricação para ver se conseguimos começar a suportá-lo. (Ó Rick, para onde te levou a senhora da lixeira, que não vens enfiar um balázio na cabeça deste gajo?)
Pelo menos não sou a única que não esquece. Aaron e alguns outros habitantes de Alexandria também não esquecem. Negan só está vivo porque eles estão a honrar a “última vontade” de Rick, a quem julgam morto, de que Negan deve ser preso e não executado sumariamente, porque eles são “melhores do que isso”.
Estranhamente, Negan e Alpha foram protagonistas da cena de sexo mais explícita que já se viu na série toda. Uma cena pervertida como só podia acontecer entre Alpha e Negan, mas aconteceu. Até os vimos aparentemente nus, ao longe. “The Walking Dead” nunca quis perder tempo com isso, mas nesta última temporada temos algumas cenas de sexo, incluindo entre duas lésbicas. Definitivamente, a série está mesmo a mudar com uma mulher ao leme.
Por falar em sexo. Outra batota, o padre Gabriel. Onde é que este personagem é o mesmo que a gente conheceu na temporada cinco? Andar com a Rosita deve ter-lhe feito muito bem à auto-estima. O homem agora parece um autêntico Rick Grimes. Até manda e fala grosso.
E por falar em Rosita, que tem uma filha com Siddiq. O que aconteceu a Siddiq foi uma manobra bem orquestrada como eu já não via há muito tempo em “The Walking Dead”. Não estava mesmo à espera daquilo, se bem que o espião dos Whisperers me tenha parecido uma pessoa implausível de sofrer uma lavagem cerebral por parte da Alpha. Mas os Whisperers, percebemos nesta temporada, já não eram simplesmente um grupo de sobreviventes, eram acima de tudo um culto. E nós sabemos o que os cultos fazem à cabeça das pessoas, e aquela Alpha era sinistramente carismática, portanto até vou admitir que deu a volta à cabeça ao médico Dante.
A nível de choques, penso que o Siddiq foi mesmo o choque da temporada. Conseguiram que a gente gostasse dele (não havia muito para não gostar, tirando o facto de que foi praticamente responsável pela morte de Carl por causa de um disparate de matar walkers para respeitar uma crença da mãe de Siddiq de que matar zombies era libertar-lhes as almas). Conseguiram que tivesse impacto. Isto acontece cada vez menos em “The Walking Dead”.
Do mal o menos, o nosso Daryl continua o mesmo de sempre. O disparate de adulterar a personalidade das personagens consoante convém ao enredo ainda não o atingiu. (Mas temo que venha a atingir.) Algumas das melhores cenas são entre Daryl e Carol, os veteranos da série, a conversar e a fumar um cigarro e a mandar bocas um ao outro como nos velhos tempos. O que só nos lembra de como esta série era boa quando o núcleo de protagonistas era sólido e coeso, mas já não é nada disso.
Houve alturas em que tive de fazer um esforço para me lembrar de quem era aquela cara que ali aparecia, de tal maneira já nem sei quem é que está na série e quem é que já morreu ou se foi embora. Por exemplo, não me lembrava nada que a Enid e a Tara tinham morrido na última “leva”, na temporada anterior, de tão insignificantes se tornaram os seus papéis. (Ou se calhar foram as actrizes que pediram para sair.)
O penúltimo episódio podia chamar-se “O gato que traiu Alexandria”. Sim, houve um gato, e ficou muito mal explicado como é que o Beta percebeu que o gato significava onde estavam os sobreviventes. Boo! Má escrita! Devíamos ter visto que havia um espião exclusivamente designado para espiar o gato, e aquele gato, pela sua importância, devia ter sido um personagem mais desenvolvido. Por exemplo, qual é a relação do gato com a Carol, com o Daryl, com o cão do Daryl, Dog? Como é que o Beta sabe que o gato é amigo de Lydia? Ou será que não é? A Lydia falou do gato de forma tão ambígua que eu fiquei na dúvida. E o Negan, a quem a Lydia falou do gato, o que é que ele sente pelo felino? Despertar-lhe-á pesadelos com Shiva, a tigra, que em tempos lhe comeu bastantes Salvadores? Tudo mal explicado. Aquele gato nunca se tornou um personagem tridimensional. Mal o deixaram dizer um mio. Nem sabemos se o vamos ver outra vez. Oportunidade desperdiçada de mergulhar na mente do cão do Daryl e de aprofundar o conflito com o gato, cujo nome deve ser Cat.
E assim acabamos mais uma temporada de “The Walking Dead”, que não chegou a terminar, na paródia. Já não dá para ver de outra maneira. É aceitar ou procurar outra série. Mas os zombies de Nicotero continuam tão bons, é difícil parar de ver.
§
Já depois de escrever este artigo li a notícia de que ”The Walking Dead” tem finalmente uma data marcada para acabar, lá para 2022 se a pandemia não atrapalhar. Talvez isto seja bom. Talvez a série desenvolva, agora que há um fim à vista.
Também li por alto que estão planeadas mais spin offs, mas já houve tantos anúncios neste sentido, sem que se concretizassem, que nessas só acreditarei quando as vir.
segunda-feira, 17 de junho de 2019
The Walking Dead (9ª temporada)
[crítica à nona temporada; contém spoilers]
O maior spoiler desta temporada é que não foi tão deplorável como se previa. Apesar da perda do protagonista, a nova showrunner Angela Kang conseguiu melhorar a qualidade: as personagens começaram a tomar decisões racionais (na maior parte, pelo menos), a história voltou a fazer sentido, a série tornou a ser uma coisa que se consegue ver sem que nos apeteça atirar o comando à televisão.
Não gosto de ser maldizente, mas neste caso é completamente óbvio. Assim que Scott Gimple entrou, a qualidade foi por água abaixo. Angela Kang pegou na série e fez um trabalho hercúleo tendo em conta o estado em que a herdou. Scott Gimple foi para “Fear The Walking Dead“ e este último programa deixou de ter pés e cabeça. Factos.
Agora sim, uma telenovela
Até que ponto é que são spoilers quando já se sabia no fim da temporada anterior? Rick foi-se embora para fazer um filme televisivo (ou vários, já ouvi as duas versões) no universo Walking Dead. Maggie bateu com a porta porque não lhe deram o aumento que ela exigiu e foi fazer outro programa, mas pode muito bem regressar se essa tal série não for renovada (chama-se “Whiskey Cavalier” e eu não vejo). Outra baixa de peso foi já anunciada para a temporada seguinte. Não vou dizer quem, porque nem toda a gente acompanha este tipo de notícias, mas esta vai ser mesmo muito difícil de gerir. Sempre quero ver como é que vão descalçar esta bota. Pobre Angela Kang, se calhar não merecia herdar uma série a desfazer-se aos bocados.
O grande momento da temporada, não há como dar volta a isto, foi a “morte” de Rick Grimes. Esta foi mesmo uma morte anunciada, oficialmente e tudo, com todos os fãs à espera do episódio “fatídico”. E considerando os litros de sangue que Rick perdeu, noutra série qualquer teria morrido mesmo. Mas isto é “The Walking Dead” e fizeram batota.
[Spoiler: e pela primeira vez o cavalo safou-se! Finalmente! Até os cavalos já começam a tomar decisões racionais!]
Mas Rick foi-se mesmo embora. A grande questão era, e ainda é, pode a série continuar a agarrar os fãs se dos primeiros episódios só restam Daryl e Carol, e (mais ou menos do princípio) Michonne? Têm sido introduzidos novos personagens e a série tem feito um grande esforço para nos interessar por eles, mas a verdade é que aqueles que nos interessam são o grupo de Atlanta, aqueles que vimos sobreviver aos primeiros dias do apocalipse, aqueles com quem partilhámos todos os horrores e alegrias desde então até agora, os que ainda vivem quando tantos outros ficaram pelo caminho. Uma série bem feita ter-nos-ia conduzido até ao fim da história dos personagens relevantes, aqueles em que nós investimos desde o início. Mas “The “Walking Dead” prolongou-se demais, muitos actores foram para outros projectos, e agora está efectivamente a funcionar como telenovela. Entram uns, saem outros, sem que consigamos ter tempo de nos ligarmos a eles. Pelo menos podiam aprender com as telenovelas brasileiras: é comprido, comprido, mas um dia acaba antes que sature. Ora, “The Walking Dead” não quer acabar. Quer ser abatido pela falta de audiências. Por este andar, vai conseguir o que deseja.
Vilões sem pés nem cabeça
Mas é preciso dar o devido valor à nona temporada e à nova showrunner. Desde os primeiros instantes, num episódio chamado “A New Beginning”, em que até o genérico é diferente, percebemos que a série vai tomar outro rumo. Confesso que a princípio não gostei muito do novo genérico. Parece uma coisa saída de “outro filme”, um mundo futurista de Fantasia com cavalos e natureza verdejante, muito longe dos subúrbios urbanos e desertos que eram imagem de marca da série. Custou, mas acabei por me habituar. Este já não é o mesmo mundo. Este é um mundo em que a sociedade que conhecemos desapareceu, em que tudo tem de ser reinventado, em que as pessoas têm de voltar às carroças e à agricultura. Tudo isto foi um bocadinho um choque, porque já nem parece a mesma série. Eu, pessoalmente, preferia o ambiente urbano e os prédios desertos.
Mas nenhum choque foi maior, para mim, como o momento em que Negan apareceu. Inconscientemente, eu já tinha “apagado” Negan. A série começa com um salto temporal depois da guerra com os Salvadores e de alguma forma irracional eu tive esperança de que se tivessem “esquecido” dele. (Não seria a primeira coisa incoerente que a série fazia, mas seria de certeza a mais perdoável.) Sim, eu sei que nos comics Negan está preso, porque Rick quer mostrar que apesar de tudo as pessoas ainda podem recuperar algo da civilização perdida e não é preciso andarem a matar-se uns aos outros, e que Negan na prisão significa um regresso à lei e à ordem, sim. Mas Negan é uma personagem tão mal concebida, tão antipática, tão desinteressante, e agora completamente irrelevante atrás das grades, que o melhor era libertarem Jeffrey Dean Morgan para ir para o “Sobrenatural” onde faz mais falta.
[Spoiler: sim, Jeffrey Dean Morgan vai regressar ao “Sobrenatural”, já há imagens!]
Houve uma passagem em que Negan conseguiu fugir da prisão e eu rejubilei, sem ironia: “Sim, faz-nos esse favor, desaparece e não voltes! Adeus!” Desgraçadamente, ele voltou. Enfim, foi um momento de esperança.
O mais preocupante é que “The Walking Dead” continua a tentar redimir Negan, talvez até a ponto de o tornar um personagem importante na nova sociedade, e isso é um erro. Negan é um monstro e ninguém o quer ver dar-se bem. É verdade que tem jeito para miúdos e que as cenas com Judith, agora crescida, têm tentado convencer-nos de que ele é um homem mudado. Mas não é. O que a série estará a tentar fazer é transformá-lo noutro personagem completamente diferente, o que nunca é bom do ponto de vista da coerência. Isto não é bom drama e não ajuda à recuperação da série.
Mas mal tínhamos recuperado do primeiro salto temporal, em questão de poucos episódios, e ainda na primeira parte da temporada, há outro salto de alguns anos. Não me perguntem quantos. Só sei que agora a Judith tem aspecto de andar algures na terceira ou quarta classe, mas posso estar enganada. Entretanto [grande spoiler] Judith tem um irmãozinho mais novo cuja idade também não percebemos muito bem porque ainda mal o vimos. (Qual é o interesse em arranjar mais um descendente ao Rick Grimes se acabamos por não o conhecer?...)
Maggie já se foi embora, nem a vimos ir. Carol está a viver com o “rei” Ezekiel e estão ambos a criar o adolescente mais burro que já apareceu em “The Walking Dead”: Henry. Sinceramente, acho que aqui a série estava a gozar consigo própria e com a famosa estupidez dos seus personagens. Henry foi um puto criado com os melhores sobreviventes do seu mundo. Era impossível ser tão idiota. Carol merecia melhor. (E aqui lembrei-me da filha dela, Sophia, a que apareceu no celeiro com os zombies, na quinta. É curioso como ainda me lembro do nome dela. Mas tenho a certeza de que vou esquecer Henry assim que acabar de escrever este artigo. O que aconteceu a Sophia, todo o grupo a arriscar a vida para a encontrar, teve impacto. Fez crescer Carol e Daryl na nossa simpatia. Henry não teve importância nenhuma.)
O que nos leva aos novos vilões desta temporada, que Henry consegue atrair até às comunidades. Os Whisperers são a coisa mais irrealista que “The Walking Dead” já fez. Ainda mais irrealista do que a malta da lixeira. É preciso querermos acreditar muito para aceitarmos que algumas pessoas consigam viver disfarçadas de zombies durante anos e anos desde o apocalipse, e, ainda mais estranho, que nunca se tenham cruzado nem com Rick nem com nenhum outro grupo de sobreviventes. Como vilões, têm os seus momentos, mas é preciso desligarmos grande parte do cérebro para os aceitar.
Mas os zombies são imperdíveis...
Em suma, “The Walking Dead” já foi uma grande série mas talvez seja mesmo impossível recuperá-la das temporadas catastróficas da guerra com os Salvadores. Angela Kang fez um excelente trabalho e a qualidade melhorou a olhos vistos, mas à medida que os personagens importantes vão saindo os escritores vão tendo de improvisar o melhor que podem para acomodar essas perdas que nada têm a ver com o enredo. E é isso que a história parece agora: um improviso em cima do joelho. Tudo se ressente da longevidade, ou melhor, da velhice da série. Se de repente “The Walking Dead” fosse cancelado e não houvesse uma décima temporada eu não me importaria quase nada. E este “quase” significa Daryl, Carol e Michonne. Gostaria de os ver ter um fim coerente. Mas as esperanças de isso acontecer são quase nulas também.
E, no entanto, eu sei que continuarei a ver esta série (tal como “Fear The Walking Dead”) enquanto ela passar. É que os zombies de Greg Nicotero são muito bons, imperdíveis. Mas actualmente já não espero qualquer desenvolvimento dramático/emocional que me afecte, como acontecia no princípio, e é pena ver uma das minhas séries preferidas chegar a este estado.
terça-feira, 3 de julho de 2018
In the Mouth of Madness / A Bíblia de Satanás, de John Carpenter (1994)
Gravei este filme na dúvida de já o ter visto ou não. Se vi, absolutamente nada me recordou de já ter visto. Mas este é daqueles filmes que se esquecem. 24 anos depois é possível que não reste a mais leve memória.
O título português é enganoso e leva em erro. Não há aqui nada de Bíblia nem de Satanás. Assumidamente inspirado em Lovecraft, a começar pelo título que nos remete imediatamente para o conto At the Mountains of Madness, a ameaça vem de uns seres Antigos que querem deixar os “abismos inomináveis e tenebrosos” [palavras minhas] e tomar conta do mundo. São os Antigos de H. P. Lovecraft. Tentar adaptar ideias de Lovecraft é sempre uma ideia interessante, mas falha na execução.
No filme, um escritor de sucesso no género do terror (a lembrar Stephen King) desaparece com o manuscrito do seu último livro. Um investigador de seguros (Sam Neill), especializado em fraudes, é contratado pela seguradora da editora lesada para o encontrar. Segundo este, o desaparecimento do escritor é um golpe de marketing e uma fraude à seguradora. (O que não faz muito sentido, pensando nisso. Se a editora estivesse a par do marketing não chamaria a seguradora. Mas avançando.) Seguindo as pistas dos livros, o agente de seguros convence-se de que a cidade ficcional onde se passam as histórias do autor é de facto real, e segue o escritor até lá após transpor um portal que existe na estrada. Ao chegar, descobre que os habitantes da cidade já começaram a ser possuídos pelos Antigos, exibindo deformações físicas como tentáculos e cometendo actos de grande violência. Entretanto, no mundo lá fora, os leitores dos livros anteriores do mesmo autor também estão a enlouquecer. O medo que o filme quer transmitir é que qualquer pessoa que leia os livros ou veja o filme (este filme) também enlouquecerá.
Como é fácil de perceber, o filme não convence. Se calhar é o início prosaico, que mais parece um policial, que nunca nos submerge num ambiente de terror minimamente credível. A citação de certos trechos de Lovecraft, neste contexto de modernidade, até nos soa a má escrita. Nada mais injusto. A linguagem literária de Lovecraft é de facto antiquada e rebuscada, mas é também por isso que resulta. Cria toda uma atmosfera que nos faz deslizar, sem nos apercebermos, para dentro de um universo que nos vai inquietando a cada palavra. Quando Kthullu aparece, acreditamos. É esta submersão que o filme nunca consegue, nem de longe.
Trilogia do Apocalipse
Quando acabei de ver fui novamente verificar se era um mesmo um filme John Carpenter (razão por que o gravei) ou se me tinha enganado. Mas é mesmo um filme de John Carpenter, mestre do terror que muito aprecio e respeito. O argumento não é dele mas de Michael De Luca, mas John Carpenter gosta deste filme e considera-o a terceira parte da sua “trilogia do apocalipse” (a seguir a The Thing e Prince Of Darkness). É difícil, a esta distância, recordar a relevância na altura dos temas que são abordados, nomeadamente o descrédito da religião e a vontade das massas em tomar a fantasia por realidade. Tudo isto agora nos parece tão batido. Tão quotidiano, tão fake news. Sem precisarmos sequer de monstros a ajudar. O final até é interessante, com o agente de seguros a sair do hospital psiquiátrico em que tinha sido internado, um dos únicos sobreviventes à loucura que toma conta da humanidade. Mas depois de ver Rick Grimes acordar do coma e sair do hospital para um mundo apocalíptico de zombies, esta cena já não tem o impacto que teria se a tivesse visto primeiro. (Será que vi? Será que os criadores do comic The Walking Dead viram? Não faço ideia. A cena é semelhante.)
Quanto aos efeitos especiais, é injusto falar deles 24 anos depois e sem alertar que o filme é de baixo orçamento. Os efeitos especiais são muito maus, vistos hoje em dia, a lembrar as criaturas de plástico dos piores filmes do canal SyFy. Isto também não ajuda a convencer-nos quando finalmente vemos os monstros.
Se era eficiente em 1994? Lembro-me de ter visto muito melhor, até antes, mas também não consigo dizer se estes efeitos especiais eram abaixo da média para a altura. Se calhar até não eram. Não me lembro assim tão bem dos filmes medianos. Só me lembro dos bons, um deles The Thing, do mesmo realizador, que é de arrepiar ainda hoje.
Este é um filme datado que não sobreviveu ao teste do tempo. Reparei, por exemplo, que o agente de seguros se acha no direito de tratar a protagonista como se fosse um objecto sexual só porque é atraente (Julie Carmen). A personagem feminina também parece achar muito normal que ele lhe chame “querida” e se atire a ela descaradamente, num ambiente de trabalho, sem a conhecer de lado nenhum. O cúmulo foi quando chegaram à tal cidade fictícia e ele só alugou um quarto para os dois. (O que raio foi isto?! Eles não estavam numa relação.) Em tempos de movimento “Me Too”, é difícil de acreditar.
Mas fez-me igualmente questionar, enquanto estava a ver, se devia estar a prestar mais atenção a estas coisas, num filme de terror, do que à acção propriamente dita.
Li várias críticas ao filme, das piores às melhores. Alguns fãs (certamente) chamam a este o melhor filme de Carpenter pelas questões filosóficas que aborda. Não, nem pensar. Nem assim. Este é o senhor que nos deu The Thing, Assalto à 13ª Esquadra, Christine, Halloween, O Nevoeiro. Este filme não está minimamente à altura destes outros títulos. Também não direi que é o pior filme de John Carpenter, mas é de certeza um dos piorzinhos. Culpo principalmente o enredo que nunca nos consegue convencer, muito menos perturbar.
(Como curiosidade, reparei logo, no genérico, no nome de um desconhecido Gregory Nicotero nos efeitos especiais de maquilhagem. Hoje em dia milhões de pessoas o reconhecem como Greg Nicotero do genérico de The Walking Dead. Os efeitos de maquilhagem ainda são dos melhores que o filme apresenta. Nada ao nível que estamos habituados hoje em dia, mas é injusto comparar.)
Achei este filme tão datado, a todos os níveis, que não vou dar nota. 24 anos depois é fácil ser injusto para com um filme que na altura podia ser apenas mediano e que hoje nos parece simplesmente mau.