domingo, 8 de janeiro de 2023

The Walking Dead (2010–2022)

[contém spoilers]

Ao fim de 12 anos nos nossos écrans, “The Walking Dead” acabou. Alguém deu por isso? Lembro-me de momentos em que o fim de uma temporada significava o terror de que alguém nos contasse um spoiler, por acidente ou de propósito. Desta vez não ouvi uma única palavra sobre o fim da série de zombies mais icónica da última década. E isto é triste.
“The Walking Dead”, no seu auge, foi a melhor série de zombies jamais feita, e ainda não vi nada que a superasse ou que não se alimentasse (directa ou indirectamente) das ideias do universo Walking Dead.
Muitos fãs começaram logo a chamar-lhe telenovela a partir da segunda temporada, mas eu não sou dessas. Acho mesmo que a série atingiu o seu melhor algures entre a fuga de Terminus (os canibais) e a chegada a Alexandria. Depois apareceu Negan e tudo descambou. As personagens tornaram-se caricaturas, bonecos de acção, os diálogos degradaram-se, cada vez mais rebuscados e irrealistas. Chegou a ser doloroso assistir a alguns episódios, tal como actualmente é doloroso assistir a “Fear The Walking Dead”, o que uma pessoa continua a fazer por ter investido tanto nesta série, e um pouco por masoquismo, e porque os zombies de Greg Nicotero são mesmo muito bons!
Bastantes fãs abandonaram “The Walking Dead” nessa altura e não posso censurá-los. As temporadas de Negan, principalmente, foram muito mazinhas, em todos os sentidos e até em termos de world building. Às vezes era difícil perceber o que estava a acontecer, o que implica não apenas má escrita mas má realização em geral.
Em retrospectiva, a morte de Karl, a saída de Rick e de Michone foram de facto golpes demasiado profundos de que a série nunca se conseguiu recuperar, por muito que Daryl e Carol a tenham tentado levar às costas até ao fim.

O fim (?)
Chegamos então à última temporada em que a show runner Angela Kang tentou pegar no que tinha e salvar o que podia. Nesta altura a qualidade melhorou bastante, mas era tarde demais. Esta devia ser a história da família Grimes e seus amigos. Não é de estranhar que nos últimos 8 episódios os escritores se tenham voltado para a única sobrevivente original do clã Grimes: Judith, a única Grimes que vem da primeira temporada. Sim, na barriga da mãe, mas Judith foi importante desde o momento em que Lori se apercebeu da gravidez. (Não posso incluir o filho de Rick e Michonne porque só no último episódio é que lhe deram qualquer coisa para dizer. O que me lembra novamente que Michonne jamais se iria embora atrás do fantasma de um homem e deixaria um filho tão pequeno no meio do apocalipse zombie, outra das perplexidades que ninguém percebeu.)
Nos últimos 8 episódios, a série regressa a Judith, resumindo, através de monólogo interior e montagens do passado, o que foi o caminho até aqui e recordando as personagens que ficaram para trás. Muito disto bateu directamente na nostalgia e acertou o alvo. Mas não resolve a questão premente: a série não acabou. “The Walking Dead” continua nas muitas sequelas já feitas (como a mais recente, “Tales of the Walking Dead”) e por fazer. O facto de a AMC ter anunciado sequelas com Rick, Michonne, Maggie, Negan, Daryl e Carol também despejou a série de tensão. Sabíamos que aqueles personagens não iam morrer e que a história deles não acabava aqui. (A minha maior surpresa foi saber que afinal a actriz Melissa McBride –Carol– recusou continuar e não vai participar no spin off com Daryl Dixon. Acho que ela só faz é bem.)
Resta quem? Os personagens secundários, e Judith. Ainda nos pregaram um susto do caraças com Judith, mas acho que Angela Kang percebeu a tempo que os espectadores se revoltavam se acontecesse alguma coisa à miúda que estava onde não devia estar. (Resumindo, os adultos deixam-na ir com eles para um conflito armado, apesar de a miúda não ter mais que 10 anos, porque ela lhes pede, quando lhe deviam ter dito: Vê lá se não queres levar uma lambada! Vai mas é acabar os trabalhos de casa! Até nos dois últimos episódios, “The Walking Dead” persiste em fazer coisas estúpidas, tipo “imagem de marca”.)
Mesmo assim, gostei da conversa sincera e emocional entre Maggie e Negan, em que este finalmente pediu uma desculpa sentida pelo que fez a Glenn e Maggie lhe respondeu também do coração. Mas não consigo esquecer que este novo Negan, como personagem, é um embuste. O Negan original era uma caricatura de desenhos-animados; este Negan é John Winchester. E está tudo dito acerca de Negan.
Ezekiel também confronta Negan, tal como Aaron já tinha feito. (Mesmo assim, é impressionante como estes personagens tardios se tornaram importantes, muito graças aos seus actores.) Ezekiel não esquece o que ele fez. A certa altura pensei que Ezekiel ia falar de Shiva, mas a tigresa não foi mencionada, embora igualmente vítima indirecta dos Salvadores. Sempre gostei de Ezekiel, mesmo quando ele andava a brincar ao Senhor dos Anéis nos tempos do Reino. Compreendo a ideia dele. Num mundo sem esperança, as pessoas precisam de fantasia para se distraírem. Escapismo. Não é por isso que vemos o nosso tipo preferido de Fantasia, seja com dragões seja com zombies, ou ambos? Não foi por isso que assistimos a “The Walking Dead”, e que nos irritámos quando a série não era tão boa a ponto de nos fazer esquecer a realidade?
Por falar em realidade, sou das poucas que gostou dos episódios na Commonwealth, apesar dos muitos, muitos erros. A Commonwealth mostra-nos o que seria o mundo actual, como o conhecemos, mas com zombies. De certa forma, os zombies vieram impor a lei do mais forte em todo o lado, mas na Commonwealth continuava tudo igual: os pobres, os ricos, os importantes, a carne para canhão. Foi interessante.
Tenho escrito bastante sobre esta série e não há muito mais a dizer que não tenha dito já. Podemos mesmo considerar que “The Walking Dead” acabou quando já há spin offs a filmar com os seus personagens principais? A avaliar pela qualidade dos spin offs já existentes, se calhar eu preferia mesmo que a série acabasse de facto aqui.

ESTA SÉRIE MERECE SER VISTA: 2 vezes até Negan aparecer; a partir daí é com cada qual

 

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