Tendo em conta que esta é uma adaptação do romance homónimo de Shirley Jackson, a mesma escritora de "The Haunting of Hill House" (brilhantemente imortalizado no cinema como "The Haunting"), é quase estranho que "We Have Always Lived In The Castle" não contenha qualquer elemento sobrenatural ou fantasmagórico. Há outra espécie de terror, a que eu chamo terror quotidiano (ver ali acima na descrição do blog) que se prende com o mal que as pessoas fazem umas às outras. Sim, também existe uma mansão odiada pelas pessoas da vila mais próxima ("the castle"), mas porque os seus donos, os Blackwood, sempre foram muito ricos e snobs.
Para piorar a situação, há seis anos, na narrativa, um homicídio com arsénico matou o patriarca da família, a sua esposa e a sua cunhada. Constance Blackwood, a filha mais velha, chegou a ser acusada em tribunal, mas foi ilibada. Tanto Constance como a sua irmão mais nova Mary Catherine (conhecida como Merricat) têm vasto conhecimento das plantas venenosas que crescem no enorme jardim que rodeia a sua mansão, o que leva as pessoas da vila a chamarem-lhes bruxas também, embora o arsénico tenha sido comprado para matar ratos e não tenha provindo da propriedade Blackwood.
Passados estes anos, Merricat, Constance e o tio Julian (irmão do pai de ambas) vivem quase isolados na mansão de família. Apenas Merricat, uma jovem de 18 anos, tem por missão ir à vila todas as semanas para comprar comida, o que ela nunca faz sem deixar feitiços de protecção (inventados por ela), como enterrar moedas de prata e bonecas e pregar livros às árvores. Constance vive em negação, sempre a sorrir, sempre simpática e agradável, sempre a cozinhar em trajes de dona de casa dos anos 50 excepto quando se veste a rigor para o jantar na sala. O tio Julian, que também foi envenenado mas sobreviveu, anda de cadeira de rodas e tem as capacidades cognitivas debilitadas, possivelmente devido ao envenenamento mas nunca é dito explicitamente. De todos, o tio Julian é o mais enervante. O "trabalho da sua vida" é escrever um livro sobre a tragédia que vitimou a família, e repete incessantemente as frases de abertura de cada capítulo (já vai em 44) sem nunca escrever uma linha, e ainda diz que lhe falta tempo para escrever, um homem que não faz outra coisa na vida. Merricat, por seu lado, gosta de debitar, à mesa, os seus conhecimentos sobre plantas venenosas e os efeitos letais de cada veneno. Convenhamos, é uma casa de doidos.
Esta rotina é ainda mais perturbada quando recebem a visita do primo Charles Blackwood, um galã que chega com o objectivo claro de se apossar do dinheiro da família sob a desculpa de vir "ajudar" (nos anos 60 só os homens é que supostamente sabiam lidar com dinheiro...) e começa imediatamente por cortejar Constance, que se encanta por ele. Merricat tenta por tudo afastá-lo da irmã, a quem ela adora, e da mansão, tentando fazer "feitiços" ainda mais fortes, mas sem sucesso.
Apesar de ser um interesseiro, Charles parece a única pessoa normal nesta casa, a que o próprio acaba por chamar "manicómio". É Merricat, que parecia uma vítima indefesa no começo da história, quem depressa se prova a má da fita.
O filme (ao contrário do livro) sugere fortemente que tanto Constance como Merricat foram vítimas de abusos por parte do pai, mas vítima ou não Merricat comporta-se agora como uma pessoa tóxica, tentando por tudo isolar a irmã, com quem tem uma relação de co-dependência. Tudo indica que Merricat é profundamente desequilibrada, ou autista, ou esquizofrénica, ou mesmo psicopata declarada, como se verá no final. É ela quem provoca o acontecimento que vai despertar o ódio latente nas pessoas da vila e que quase termina em linchamento. Merricat, lobo em pele de cordeiro, consegue por fim "guardar" a irmã só para si, perante a passividade de Constance que não reconhece o poder manipulativo da irmã sob a desculpa de "protecção".
Outras pessoas vão tirar diferentes conclusões deste drama fortemente psicológico, mas para mim esta foi a principal (ajudada por outros desenvolvimentos que não vou revelar).
Aliás, a personagem Merricat é tão desequilibrada que algo que o tio Julian diz me deixou confusa. O tio Julian repete incessantemente o que se passou na noite do homicídio, e, embora desorganizado, nunca muda de versão. A certa altura ele diz que Merricat morreu num orfanato enquanto Constante estava a ser julgada. O próprio Charles o contradiz: "Mas ela está aqui sentada!" O assunto nunca mais é abordado, mas isto leva-me a especular se esta Merricat não será uma intrusa, uma impostora, não uma bruxa má com poderes sobrenaturais mas uma daquelas pessoas que se infiltram junto de gente fragilizada e fácil de controlar. Isso explicaria muitos dos seus actos. Por outro lado, pode bem ser uma invenção da mente transtornada do tio Julian.
Não li o livro e tenho curiosidade quanto a isto, mas não me apetece nada fazê-lo porque li "The Haunting of Hill House" e não fiquei maravilhada com a escrita da autora nem esclarecida quanto ao que tencionava descobrir.
"We Have Always Lived In The Castle" vale pelo mistério, pela atmosfera inquietante de perfeita loucura disfarçada pela familiaridade de uma harmonia doméstica artificial, pelos cenários e ambiente dos anos 60 cuidadosamente recriados, pela sensação de estranheza e desastre iminente onde a história nos leva. Pode não ser a adaptação mais exacta do romance original, mas é um filme excelente que nos perturba e nos faz pensar, e recomendo vivamente.
17 em 20
terça-feira, 23 de setembro de 2025
We Have Always Lived In The Castle (2018)
domingo, 21 de setembro de 2025
Black Sea / Mar Negro (2014)
Esta é uma história de ganância e desespero. Uma empresa de salvamentos submarinos despede bastantes trabalhadores, deixando-os em péssima situação financeira. Mas, antes disso, um deles julga que descobriu a localização de um submarino nazi carregado de ouro, no Mar Negro, que se destinava à Rússia antes de ser afundado. Partilhando esta informação com os colegas, estes decidem ir resgatar o submarino por conta própria.
Depois de arranjarem um financiador para o empreendimento ilegal, com metade da tripulação britânica e metade russa, os marinheiros fazem-se às profundezas num submarino soviético muito velho a que alguém chama "sucata" e com razão. Mas os verdadeiros problemas vêm mesmo de dentro: alguns homens não querem partilhar o possível achado com os russos nem uns com os outros, e isto ainda antes de descobrirem que estão na realidade a trabalhar para a companhia que os despediu e que os quer utilizar para recuperar o ouro nazi. Isto é, foram enganados e o achado nunca ficaria para eles. O desespero e a ganância viram-nos uns contra os outros e colocam-nos em problemas técnicos fatais.
"Black Sea" é um filme interessante e tenso, um "Indiana Jones" sem heróis mas com muita acção e um desfecho amargo.
14 em 20
terça-feira, 16 de setembro de 2025
Ready Or Not / O Ritual (2019)
No seu dia de casamento, Grace está prestes a realizar os seus sonhos: casar com o homem que ama, um dos herdeiros dos milionários Le Domas. Na mansão de família, depois da cerimónia e ainda antes da noite de núpcias, os recém-casados são chamados para que Grace participe numa espécie de iniciação à família a que todos os novos membros são sujeitos. Aparentemente é muito simples: Grace só tem de jogar um jogo, o que ela não estranha uma vez que a família fez fortuna no negócio do jogo. É então que o sogro conta a história do bisavô, um humilde trabalhador da marinha mercante que um dia encontra um passageiro, um tal de Mr. LeBail, que lhe entrega uma caixa misteriosa com uma condição: todos os futuros cônjuges da família têm de jogar o jogo que a caixa determinar.
Grace é convidada a tirar uma carta da caixa, no que ela participa considerando tudo aquilo uma excentricidade da família, quando lhe sai o Jogo das Escondidas em que ela, a noiva, tem de se esconder enquanto todos a procuram. O que Grace não sabe, e que o noivo não lhe disse, é que a família vai persegui-la e tenciona matá-la num ritual 100% satânico antes do nascer do sol porque os Le Domas acreditam que se não o fizerem o Diabo virá buscá-los (sim, os Le Domas sabem muito bem que fizeram um pacto com o Diabo e que a isso se deve a sua grande fortuna).
A princípio Grace acha que é uma brincadeira, até que percebe realmente o que se passa e que tem de fugir ou sobreviver numa casa completamente trancada em que até os criados e o mordomo, e inclusive as crianças da família, participam na caça.
“Ready Or Not” é considerado uma comédia negra, o que não me entra na cabeça porque não achei graça nenhuma, muito antes pelo contrário, e eu tenho um sentido de humor muito mauzinho e inclusivamente fartei-me de rir com “Insidious”. O filme é sangrento, tenso e assustador, às vezes é mesmo tétrico, e realmente notei algumas tentativas chochas de fazer humor enquanto uma jovem é perseguida e condenada à morte num ritual bárbaro. A certa altura ela cai acidentalmente dentro de um alçapão no estábulo onde a família guarda os cadáveres apodrecidos de toda a gente que matou. E isto era para rir?
Acredito que “Ready Or Not” podia ter sido um filme de terror excelente, algo mais ao nível de “Midsommar”, sem estas tentativas de “humor” que não tiveram graça nenhuma. Não estou de maneira nenhuma a dizer que um filme de terror não pode ter piadas. “Midsommar”, por exemplo, tem piadas e resultam. Algumas das piadas em “Ready Or Not” também resultam, como o cunhado que não está nada interessado em matar ninguém e passa a noite fechado na casa de banho com o telemóvel. Quando um amigo lhe pergunta como vai, ele responde: “Sabes como é… Merdas de família.” Isto teve piada porque a família realmente nos obriga a fazer merdas se quisermos participar nos rituais familiares. Tratar isto como mais uma merda é humor negro e engraçado. O resto do que tentaram fazer não é.
Mesmo assim gostei bastante da originalidade da história e recomendo. Simplesmente ignorem as partes que supostamente eram para ter piada.
13 em 20 (que podia ser mais sem as piadas chochas)
domingo, 14 de setembro de 2025
Outlander (2014 - ?) [sexta e sétima temporadas]
Jamie e Claire, a filha de ambos, Brianna, e o seu marido Roger MacKenzie, continuam as suas aventuras como colonos na América até ao eclodir da Revolução. Jamie e Claire tinham planeado regressar à Escócia, depois de algumas vicissitudes com os vizinhos, mas Jamie decide ficar e lutar contra os ingleses ao lado dos rebeldes conforme lhe dita a sua consciência libertária.
Esta é uma série romântica (e erótica) destinada sobretudo ao público feminino. A acção acontece muito devagar, mas é mesmo esse o propósito. Em todos os episódios tem de haver tempo para uma conversa profunda sobre sentimentos... e para fazer amor. Agora que Jamie e Claire já estão numa idade entradota, muitos dos momentos eróticos ficam a cargo de Brianna e Roger ou de outras personagens, mas os protagonistas não deixam de ter o papel principal.
A sexta temporada foi um bocadinho parada, na minha opinião, e resolvida às três pancadas nos primeiros episódios da sétima. As coisas começam a ficar mais interessantes com a Revolução Americana, as batalhas e as figuras históricas. Claire (que veio do futuro) sabe o desfecho, mas, felizmente, não conhece os pormenores nem as datas, o que mantém a tensão. Quando Jamie vai combater, um anónimo para a História, nunca sabemos se o destino dele não será morrer em batalha.
Já disse aqui que isto é mais uma telenovela, e as telenovelas têm destas coisas. A parte mais emotiva, para mim, foi quando Brianna e Roger tiveram de voltar ao futuro porque a sua bebé mais nova tinha um problema cardíaco. Não julguei que me afectasse tanto, mas pensando que Brianna vai viver num tempo em que sabe que os pais estão mortos no presente, embora vivos no passado, e que isto equivale a uma despedida antes da morte... custa um bocadinho.
Mas a decisão de enviar Brianna e Roger de volta para o futuro foi interessante. A nível de enredo eles já não tinham muito que fazer no passado, e no futuro Brianna começa a investigar o círculo de pedras como sendo um portal intertemporal, o que abre lugar a alguma ficção-científica, se bem que "Outlander" não seja o género de onde a esperar.
No entanto, o que me comoveu mais na sétima temporada foi a canção do genérico cantada por Sinéad O'Connor, uma das últimas coisas que ela gravou. Isto apanhou-me muito de surpresa porque só vi esta temporada em 2025. Como alguém disse em comentários, a canção parece ter sido escrita para ela. A letra adquire toda uma dimensão de nos deixar arrepiados.
ESTA SÉRIE MERECE SER VISTA: 1 vez
PARA QUEM GOSTA DE: romântico, drama, erótico, História
Outlander | Opening Credits ft. Sinéad O'Connor | Season 7
terça-feira, 9 de setembro de 2025
Underwater / Submersos (2020)
Não gostei deste filme por várias razões. A principal, as personagens não têm personalidade. Kristen Stewart (a miúda do Twilight) é Norah, investigadora numa base de uma empresa de extracção petrolífera situada algures na Fossa das Marianas (nunca percebi se mesmo no fundo ou muito perto do fundo) onde a profundidade alcança os 10.000km. Nunca sabemos nada de Norah, pelo que depreendo que a intenção era mesmo pensar nela como a miúda do Twilight, com o aliciamento de a vermos várias vezes em roupa interior (muito desportiva, mas é roupa interior).
Mal o filme tinha começado, algo (um tremor de terra ou outra coisa que vai aparecer depois) faz com que a base sofra danos estruturais e fique inundada, inutilizando os meios de fuga. Norah e meia dúzia de sobreviventes decidem descer até uma base antiga mais abaixo (mesmo no fundo, ou ainda não) que vai implicar terem de caminhar pelo leito do mar em fatos especiais. Durante a descida há alguém que implode dentro do fato devido à pressão astronómica da profundidade, o que teria sido bastante perturbador se tivéssemos conhecido a personagem, mas desta forma foi só um momento de choque gratuito e nem sequer conseguimos perceber bem quem morreu.
A segunda razão porque não gostei deste filme foi a grande dificuldade em acompanhar a velocidade alucinante da acção. Desafio qualquer pessoa a ver o filme comigo e a conseguir explicar-me exactamente, a cada momento, o que se passa e porquê. Demorei umas três horas a ver o filme com tanto rewind que tive de fazer nas partes em que a acção me perdeu completamente, e mesmo assim não consegui perceber tudo o que se passava.
A caminho da base, os sobreviventes são atacados por um monstro marinho das profundezas. A terceira razão por que não gostei deste filme é que algumas das cenas com os monstros são decalcadas de "Alien", muito especialmente a do monstro bebé. Uma espécie desconhecida de criaturas marinhas (que podem ou não ter provocado o acidente na base principal, não se percebe o que realmente aconteceu) devia ter sido o ponto alto do filme, mas infelizmente os monstros não foram bem explorados e não são tão assustadores como poderiam ser. Quem esperar ver aqui um "Alien" submarino vai ficar muito desapontado.
Saliento a única cena interessante do filme, que foi a perspectiva de quem está a ser engolido vivo, possível porque o engolido estava dentro do fato. Se não é original, é pelo menos pouco habitual. Tudo o resto neste filme nos dá a sensação de que já vimos semelhante e muito melhor, e que o realizador se limitou a fazer uma cópia mazinha para arrecadar uns trocos.
Nem Kristen Stewart de bikini, suada e a exibir os músculos, salva "Underwater" do completo afundanço. Que desperdício.
11 em 20
domingo, 7 de setembro de 2025
Faro (2025)
Um importante advogado de Faro aparece assassinado, vestido em roupa bondage, amarrado ao mastro do seu próprio veleiro. Quem o matou, e porquê? Dois inspectores da Polícia Judiciária começam a investigação.
"Faro" é um policial muito bem feito, que consegue também abordar temas actuais como a imigração, a corrupção, a especulação imobiliária.
Ao mesmo tempo, "Faro" remete ao período pós-revolução em que terrenos foram ocupados ilegalmente para construir casas, neste caso na ilha de Faro. (Por acaso não sabia que as ocupações tinham acontecido até tão tarde.) Um grupo de investimentos quer comprar todas as habitações da ilha para construir um grande resort turístico. Um dos moradores, Zé Maria, recusa-se a vender. Quando as ofertas não resultam, os investidores recorrem à violência.
A narrativa é simples e escorreita, mas as questões abordadas são complexas e controversas. No decurso da série são apresentados ambos os lados da moeda.
Gostei da narrativa directa, dirigida ao desvendar do mistério, sem se perder em dramatismos desnecessários neste tipo de enredo. Confesso que desde o primeiro episódio tinha uma ideia mais ou menos formada de quem tinha matado o advogado e que me surpreendeu a quantidade de outros suspeitos que foram aparecendo, todos eles com motivo e oportunidade. Só se descobre ao certo no último episódio, e faz sentido.
Até não tencionava ver a série uma segunda vez, porque foi tão fácil de seguir o enredo, quando me surgiu uma dúvida. Essa dúvida ficou esclarecida, mas ao segundo visionamento surgiu-me outra. Porque é que Marta se interessou por Ernesto, o filho do advogado? Da primeira vez pensei que fosse ele que tivesse as gravações. Sendo assim, pode ter havido muitas motivações, mas não percebi exactamente o porquê.
Também tenho algumas questões quanto à casa de bondage/SM. Admito que não conheço a cena "à portuguesa", se é que isso existe, mas do que conheço da cena em geral não é um sítio onde qualquer pessoa vá tomar uns copos. São clubes com muitas regras, alguns onde só se entra por convite e com "recomendação", não é "porta aberta". Fiquei um bocadinho perplexa porque toda a gente lá ia. Não estou mesmo a imaginar um engenheiro Seabra num sítio desses, a não ser que não seja só uma casa de bondage...
"Faro" é uma série que se vê muito bem e um mistério interessante e bastante português. Recomendo vivamente.
Por último, e só para não dizerem que sou uma marreta a bater sempre na mesma tecla, esta série NÃO tem problemas de som. Contra factos não há argumentos.
ESTA SÉRIE MERECE SER VISTA: 1 vez
PARA QUEM GOSTA DE: policial, crime, História
terça-feira, 2 de setembro de 2025
Henry V (1989)
Apesar de ser um filme antigo, não tenho memória de alguma vez o ter visto nem fazia ideia de que era uma adaptação da peça de Shakespeare. Fiquei agradavelmente surpreendida por este "Henry V" se ter mantido tão actual como se tivesse sido estreado ontem.
Isto deve-se muito às palavras intemporais de Shakespeare, o relato das aventuras militares de Henrique V que invadiu a França porque achava que tinha direito à coroa francesa, e que, embora com um exército enfraquecido e em menor número, conseguiu a vitória sobre o país invadido e conquistou o trono.
Não sou doida por Shakespeare mas admiro muito os actores shakespearianos pela tarefa espinhosa de articular aqueles diálogos artificiais e obsoletos como se fossem a linguagem mais natural do mundo. O que não falta aqui são profissionais das peças de Shakespeare, actores da maior qualidade, e nota-se. Mas o maior trunfo do filme, aquilo que o faz parecer novo apesar de ter 35 anos, é o seu realismo, especialmente o realismo da batalha de Agincourt, sangrenta, lamacenta e brutal, como se faz agora. Muita gente se queixou das imagens em câmara lenta, e vão continuar a queixar-se, mas eu apreciei porque consegui acompanhar tudo o que estava a acontecer sem sentir que a acção saísse prejudicada.
Os franceses ficam muito mal nesta fotografia, e os feitos dos ingleses são grandemente exagerados, embora Shakespeare não tenha escondido algumas das faces mais repulsivas da guerra, mas Shakespeare estava a escrever para agradar a Elizabeth I, e se a aborrecesse podia acontecer-lhe algo de muito desagradável ao pescoço...
Só o futuro poderá dizer se este filme se vai manter tão intemporal como a peça, mas eu diria que 35 anos sem envelhecer é um óptimo auspício. Aconselho a toda a gente que gosta de adaptações de Shakespeare com excelentes actores.
17 em 20