terça-feira, 8 de janeiro de 2008

Os uns e os outros

Ainda não me cansei de morder o osso mas há muito tempo que não me davam um tão bom onde afiar os dentes.

Afinal, ele pode fumar no casino
2008/01/07 | 17:30 || Cláudia Lima da Costa
Inspector-geral da ASAE foi apanhado a fumar depois da entrada em vigor da nova lei, mas Casino explica que António Nunes estava numa zona de fumadores.

(...)

«Os conselheiros consideraram que é perfeitamente possível que nos casinos se possa fumar», disse Francisco George. Para o director-geral de Saúde, a lei é clara e não precisa de regulamentos nem de quaisquer outros procedimentos. Já Mário Assis Ferreira, considerou «equilibrada e não fundamentalista» a aplicação conjunta das leis do tabaco e jogo.


Claro que isto da lei da interdição total é só para os pobres. Logo um ou dois dias depois do Ano Novo ouvi um rico falar muito bem da sala de fumo do Gambrinus, restaurante fino de Lisboa, já totalmente equipado e preparado para receber a classe que pode pagar os seus vícios.
Alguém já viu os administradores das grandes empresas a fumar no passeio? E os deputados, acaso sentados nas escadarias de São Bento, fazendo a pausa? E no entanto, não é totalmente proibido fumar nos locais de trabalho? E na Assembleia da República?
Como há fumadores, põe-se a questão: onde é que eles fumam? Além do Casino, claro está. (Por acaso já li onde é que os deputados fumam, mas não é na rua.)
A quem esta lei afecta são os pequenos restaurantes e cafés onde só vai quem quer. Sobre restaurantes e cafés, acrescente-se, nos últimos quinze anos, mais coisa menos coisa, deixaram de ser o espaço de lazer e confraternização dos tempos do Bocage, passando pelos de Pessoa, e que deliciosamente ainda tive a sorte de saborear. Cafés onde se ia passar a tarde, onde não corriam connosco à hora do almoço, onde se podia ler, escrever e estudar, e até namorar. É curioso que foi mesmo a propósito desta lei que apanhei o peixe pela boca quando ouvi o dono de uma tasca comentar: "Se calhar até é bom. As pessoas já não fumam, vão-se embora mais depressa". Foi este clima pestilento de ganância que transformou os cafés e restaurantes em fábricas de chouriços que há muito tempo não frequento excepto por razões de força maior.
Mesmo assim, quando se pensava que esta lei vinha dar hipótese de finalmente separar as águas, fumadores para um lado, não fumadores para outro, como devia ser, com cafés e restaurantes diferenciados, vem apenas penalizar os pequenos espaços.

E se nos casinos se pode fumar, o que dizer de clubes privados? Em baixo, nos comentários, levantei a questão dos clubes de charutos e cachimbo. Um clube é um espaço privado só para sócios, não um espaço público. Em Portugal não existe (ou perdeu-se) esse tipo de associativismo, mas sinto cada vez mais falta dele por razões que nem têm a ver com esta lei. Entrada só para sócios. Fim de muitos problemas.
Continuo a não saber a resposta. Afinal, se eu decidir fazer da minha casa um clube de fumo é ilegal porque se junta muita gente a fumar?... O que é um espaço "público"? Um lugar onde entra toda a gente? E desde quando é que nos bares (uns mais do que outros) entra toda a gente? Se me proibirem de entrar na Kapital por não gostarem dos meus sapatos posso chamar a polícia e forçar o meu direito de entrada? Não, devido ao velho "direito de admissão". Logo, se eu decidir fazer um bar só para fumadores e proibir a entrada de não fumadores, ou vice versa, não estou a exercer o "direito de admissão"? A nova lei sobrepõe-se ao direito de admissão e ao direito dos clubes privados? Aceitam-se respostas.

Por último, os trabalhadores a quem esta lei afecta. Como sempre, os do costume. Os que têm pouco tempo para fazer pausas, os que não têm gabinetes, os que trabalham em grandes estruturas (prédios, centros comerciais, escolas, hospitais) de onde se demora muito tempo a sair para vir à rua. Isso é fundamentalismo, sim. Trabalhei num sítio que considero equilibrado. Havia uma cantina e espaço de convívio com uma sala à parte, totalmente isolada por vidro, onde se entrava, se fechava a porta e se fumava. Curiosamente, era também a única sala onde as janelas estavam abertas e se respirava o ar não viciado pelos ares condicionados. Nunca ninguém se queixou nem tinha de quê. Havia espaço para todos sem prejudicar ninguém nem o expulsar para a rua, de pé, de castigo, o que é altamente vexatório e toma contornos de perseguição porque é desnecessário.

Excepto, é claro, nos restaurantes finos e casinos, onde a saúde dos empregados já não parece ser tão importante porque servem a realeza. O fumoir foi sempre coisa de rico. As orgias de álcool e droga dos loucos anos 20 também. A criadagem fuma no estábulo e droga-se na sargeta. Agora percebe-se melhor quem é rico e quem não é. Uma lei, uma luz, um abismo.

Entretanto, neste mesmo Portugal de jantares de lagosta no Gambrinus e altas fumaradas no Casino do Estoril, Governo paga aumento das pensões (miseráveis) em 14 prestações, não vão os reformados perder a cabeça e gastar os cêntimos todos de uma vez, sei lá, num maço de cigarros.

4 comentários:

Pixie Assassin disse...

Afinal voltaram atrás e lá vão pagar os aumentos das reformas todos de uma vez. Vai ser ver os reformados todos doidos a irem de férias para as Caraibas com este aumento...

Anónimo disse...

venho-me pronunciar pela primeira vez. até concordo que a lei foi má divulgada e foi posta ao serviço depressa demais, não deu para os estabelecimentos tomarem as suas precauções.
mas eu como não fumador, já estava um bocadinho farto de sair e querer estar com os meus amigos e ver nuvens de fumo maiores que as das fábricas e dos comboios. pode ser muito mau para o negócio, mas é horrivel querer ir para o café e estarem 500 pessoas a fumarem lá dentro.

claro que não é fácil para quem fuma, não poder fumar em espaços públicos e nos cafés e afins e ainda por cima os ricos puderem fazer o que querem e bem lhes apetece, mas a pide voltou.

mas também há não fumodares que não vão aos cafés por causa do tabaco, é chato para ambos, e como eu disse anteriormente a lei foi imposta depressa demais e mal feita, primeiro tomavam-se providências em relação aos estabelecimentos e só depois é que a lei vinha.

em espaços grandes podia-se e devia-se criar salas para fumar, ou alguns espaços para fumar, porque acho que não se devem criar cafés para os que fumam e os que não fumam, não me parece que se deva privar um grupo de amigos de estar juntos, só por causa da lei.

não concordo que os chulos dos ricos sejam favorecidos. mas é o que temos.

agora que eu disse qualquer coisa, talvez não seja de jeito, mas espero resposta. beijinhos.

katrina a gotika disse...

Privar um grupo de amigos de estar juntos? Essa é boa. Se vão separar-se por causa disso, nunca foram amigos.

Klatuu o embuçado disse...

Nos Casinos é outro mundo, meio proibido a esposas e outras oficiais, mas giro!!

Eu quero uma lei especial só para mim - fumo e acho que sou doido e estou a ficar muito incomodado com as pessoas que não fumam e vão para bares só para fumadores fazer cara-de-cu-ofendido! :)