quinta-feira, 24 de janeiro de 2008

Eu Sou Deus




"O espírito da lei é proibir", dizia este nazi a quem só falta uma luneta em vez de óculos, no "Prós e Contras" da última segunda feira. Proibir, pois, diz esta sinistra criatura que eu desconhecia completamente, mas que como Director Geral de Saúde se deve mover nos interstícios mais tenebrosos do poder, aqueles em que não se vota nem a quem se vê a verdadeira cara excepto em raras ocasiões como estas. Francisco George, de seu nome, quer proibir. Se não houver espaço para fumadores está tudo bem para ele e não é preciso fiscalizar. Não sou eu que digo, é ele. Logo, não há espaço na cabeça desta criatura monstruosa para gente como eu. Como não lhe chamar nazi?
Alguma coisa já conseguiu, pelo menos lembro-me do seu nome o suficiente para o procurar na net. Lembro-me também como fugiu à argumentação de José Sá Fernandes e do presidente do Casino Estoril. Pois, sim, mas não, mas sim, mas não... Dava o dito por não dito, contorcia-se, retorcia-se, um perfeito réptil do diz que não disse sem dizer nada. Intelecto zero, manha tudo.
A certa altura, e foi isso que me chocou mais, começou a convocar todos os argumentistas do contrário a irem ao seu gabinete "debater mais", e lá se falava em estabelecer protocolos de excepção, a Associação Nacional de Discotecas de bolinha bem baixa não fosse Von Smallerhausen mudar de ideias, mas tudo nestes gabinetes à porta fechada, os arranjinhos, as cunhas para os obedientes e os poderosos, à maneira portuguesa, "se não falares muito arranjo-te qualquer coisa", um nojo em directo.
Em directo, continuava-se a debater o sexo dos anjos, se o tabaco mata ou não mata, porque há quem goste de virar o disco e tocar o mesmo porque não sabe outra canção. Uma das pessoas mais inteligentes presentes na sala, quer se concorde ou não, o tal presidente do casino cujo nome não recordo nem o conhecia de lado nenhum (surpreendeu-me) a certa altura faz a proposta "irreverente", disse ele, de deixar os donos dos estabelecimentos mais pequenos decidirem se é um local para fumadores ou não fumadores. "Não! Não! Não!", gritou um dos fundamentalistas da plateia, porque isso de deixar as pessoas decidirem é perigoso, veja-se o que aconteceu em Espanha, onde toda a gente permitiu o fumo.
Mas afinal a lei não está a ser tão bem aceite pela população? Do que têm medo, estes senhores? Da ganância dos donos dos restaurantes que até comiam um cancro se isso lhes rendesse 15 euros?
Dar liberdade aos fumadores e não fumadores de organizarem espaços só para eles? Claro que não. Qualquer dia, se as pessoas tiverem de pensar na escolha, até começam a pensar noutras coisas, e pensar é perigoso.

Este senhor, o da fotografia, o que convidava toda a gente para o gabinete dele, é perigoso. Foi com gente assim que se teceu o Terceiro Reich. Não gostam da comparação? Quem não quer ser lobo não lhe veste a pele.

Não sei que mais este osso dá para roer, mas que tem exposto toda a podridão de uma sociedade, isso tem. Desde os nazis aos bufos, desde os fumadores amochados aos não fumadores gozões. Uma sociedade incapaz de reagir. Em coma. Qual cancro? Aqui está tudo morto.

Lembro-me de um filme sobre os últimos dias de Hitler, não sei se o recente "Der Untergang / A Queda, Hitler e o Fim do Terceiro Reich" se outro mais antigo, ou ambos, em que Eva Braun e a secretária do Fuhrer saíam do bunker às escondidas para ir fumar e tinham de fugir à pressa para dentro quando caíam as bombas sobre Berlim. Toda uma corte a fingir que não fumava. Hitler era vegetariano e não tolerava o fumo. E não tolerava muito mais coisas, como todos sabemos, nomeadamente a existência de certas outras pessoas. No momento em que souberam que estava morto, todos estes lacaios se juntaram numa sala, puxaram dos cigarros e desataram a fumar. É histórico.

Acho que se não fumasse começava hoje só para mostrar que em mim mando eu. O meu corpo é o meu templo, dizem alguns fundamentalistas anti tabaco. Eu acrescento: o meu templo, o meu reino, o meu universo. Aqui dentro, Eu Sou Deus.

8 comentários:

Klatuu o embuçado disse...

Concentra-te na cara desse gajo! Acho que é daqueles que tem nojo do minete.

Essa merda de só meterem frustrados e caixa d'óculos em certos cargos tem os seus retornos...

Goldmundo disse...

Ah, grande Gotika ;) Boa.

Há um café em Lisboa que não aplica a lei. Heróis inconscientes. Não digo o nome, que os nazis abundam. Mas foi bom ver uma nuvem de fumo à entrada, e TODOS a fumar, lol.

Goldmundo disse...

E o último parágrafo lembrou-me a historia do "mandar na barriga".

"Do diafragma para baixo mando eu"?

Bem, ficamos livres para ter as pernas semi-nuas e musculadas do José Socrates. E afinal de contas, só ficam em servidão os pulmões, o coração e o cérebro. Acho que muita gente nem dá por ela.

Tristes tempos, escura espera.

Anónimo disse...

O que mais me chocou nesta espécie de cidadão foi o seu discurso inicial em que elogiou os fumadores pelo seu civismo ao respeitarem a Lei.

Estava a ouvi-lo e estava a imaginar o Hitler a elogiar os judeus pelo seu civismo ao respeitarem a Lei e andarem todos com a cruz de David ao peito...

Vítor Mácula disse...

Olá Gotika.

Pois, e há uma afinidade fascista outra, para além da pretensão absolutista do Estado ditar os comportamentos até à intimidade, que é a hierarquização do corpo a partir da saúde, e por decorrência os comportamentos e as validações morais e políticas.

A redução tecnocrata ao corpo e à vida enquanto conjunto de funções imediatas, que torna um cigarro ou uma lareira um estrito produtor de dióxido de carbono, um hediondo contaminador a erradicar duma sociedade funcional e limpa. A da lareira foi estrondosa no documentário, quando a senhora ao lado do Sá Fernandes disse um pouco displicentemente que as lareiras também produziam dióxido de carbono e que talvez devessem ser proibidas no “espaço público” e o fuinha da foto, sei lá se no gélido calor do momento que o habita, exclamou: E porque não? Eu sei que estas coisas são difíceis de compreender… Lá está. Aquela gentil cabeça pressupõe que quem quer ter lareiras no espaço público, é apenas por “ignorância”… não lhe passa pela nhuurrice que outras antropologias há que não se limitam a querer saber se os beijos são ou não contaminadores… (há um filme qualquer de bardachice orwelliana com o Stallone em que os contactos orgânicos entre pessoas são proibidos…)

Lembrei-me também da Hanna Arendt nos seus comentários e análises ao julgamento do nazi Eichmann, em que ela diz que o que mais a impressionou primeiro, foi estar não perante um desbragado pulsional de morte e poder, mas de um simples… amanuense, um escriturário kafkiano que executa ordens e contabiliza resultados….

Para ter uma noção desta antropologia que se impõe politicamente, é ir ler as regulamentações europeias relativamente à produção alimentar e à restauração… e também o famoso tratado de Bolonha para o ensino superior e as pedagógicas para o ensino básico e secundário… (estes últimos tu deves apreciar, relativamente à noção de escolha são um delícia negativa…)

abraço

Goldmundo disse...

Olá Vitor. Claro.

O problema central é o da negação do homem. E esta onda infra-humana não tem estratégia possivel de resposta. Não se detém o ruído com mais ruído. Lembras-te do velho "socialismo ou barbárie"? Na actual versão, entre isto e a barbárie tenho saudades da barbárie.

E a pergunta de Lenine: "Que fazer?". Enfim, pode ser que uma boa recessão ponha limites a esta coisa. Duvido, mas pode ser.

katrina a gotika disse...

Olá Vítor! Bem lembrada essa parte da lareira! Foi a cereja no topo do bolo. Por azelhice, ou por ser tão absurdo que custa a digerir, esqueci-de de lhe fazer referência no texto. De facto custa a compreender, a nós, seres pensantes, seres humanos, que galgámos a escala evolutiva precisamente graças ao domínio do fogo que se mantinha acesos dia e noite para afastar as feras.

Óptimo comentário também esse do amanuense. Passou-me o mesmo pela cabeça. Daí a perigosidade destes tipos cinzentos que fazem "protocolos de excepção" em gabinetes bolorentos (onde provavelmente se fuma).

Goldmundo, estava eu hoje a pensar que se deixam as grávidas abortar outro ser humano, mas fumar não. Mais vale abortar do que fumar. ;)
Curioso.
E nem isto te faz escrever das tuas?

Goldmundo disse...

Pois. Eu sei.