O que gostei e não gostei da semana política e o que não interessa sequer falar nem é mencionado.
Não gostei da entrevista de Helena Roseta. Pareceu-me demasiado vaga, demasiado empenhada em colaborar com os same old same old. Admito que já seja instinto pavloviano e que a senhora até esteja a ser honesta. Mas honesta, na política? Ainda vai ter de fazer muito para o provar. Palavrinhas não chegam.
A sua única sugestão concreta, de abrir um "livro de reclamações" sobre Lisboa, não me parece de uma candidata que conheça a cidade. Mas brincamos? Quer uma reclamação, senhora dona Helena Roseta? Aqui vai:
Lisboa está deserta!!!
Posso dizê-lo porque eu sou das poucas pessoas em idade produtiva e reprodutiva que moram de facto nas freguesias abandonadas da Lisboa antiga e que votam em Lisboa, e não em Sintra, nem em Almada, nem em Odivelas, nem naquela parte dos subúrbios que se estende para leste da Portela e da qual só sei que é mais uma fonte de poluição automobilística na direcção da cidade.
Porque é que Lisboa está deserta?! Porque as casas são demasiado caras. Isto já se sabe há séculos, senhora dona Helena Roseta. Qualquer dia não há quem vote.
A situação é tão grave que nem os gatunos já aqui vêm roubar porque sabem que aqui só moram velhinhos na miséria e imigrantes brasileiros e ucranianos empacotados em quartos de casas podres. (Os chineses ainda não descobri onde moram, se calhar também dormem nas lojas quando os empregados brasileiros vão para os tais quartos.)
O que me leva à campanha de Telmo Correia do CDS-PP. Foi criticado por visitar um lar de velhinhos. Não gostei da crítica. Deve ter sido feita por gente dos subúrbios que não sabe que Lisboa são os velhinhos. Lisboa são os velhinhos que vivem na miséria, de reformas miseráveis de 200 euros ou menos, a viver em casas baratas porque são podres, gente que quase já não se pode mexer, gente que se arrasta para as compras que já não pode carregar, gente que não vai ao Carrefour nem ao Freeport, gente que consumisticamente não interessa, gente que está velha e abandonada. Esta gente é que são os eleitores de Lisboa, da verdadeira Lisboa. O outro enganou-se. Lisboa é que o deserto, e sem aves migratórias. Sobrevivem alguns pombos e pardais às leis selvagens que os condenam à morte graças ao bom coração de boa gente que não obedece à desumanidade.
Lisboa é também a morada dos sem abrigo. Será que votam? Será que ainda se interessam? Duvido. Pouco interessa a quem vive na rua e só pensa na próxima refeição que chega na carrinha da solidariedade. Gente que também não interessa nada. Gente que não tem internet. Será que lêem o Metro? Talvez. É de graça.
Gostei muito da anedota do professor que foi suspenso por proferir quiçá uma graçola contra alguém que tirou um diploma na Farinha Amparo. Fartei-me de rir! O que eu me ri! É ver agora a malta do tempo da ditadura a acordar e a abrir os olhinhos. Destas coisas é que eu gosto.
E no meio de toda esta desgraça, ainda há um político em que eu acredito. Gostei muito da entrevista do Paulo Portas. Gostei da ambição que revelou ao dizer que não quer um partido residual. Pode não o conseguir mas gosto de pessoas ousadas, que não têm medo de fazer má figura, que não têm medo de ir à luta e perder, porque só quem vai à luta é que vence.
Gostei quando Paulo Portas falou na discussão das famílias actuais, quando partiu a louça toda do partido velho e não só prometeu como ao dizê-lo já o estava a abrir. O Bloco de Esquerda que se cuide. Gostei quando Paulo Portas, como ministro da Defesa, acabou de vez com a vergonha do Serviço Militar Obrigatório, a grande bandeira de esquerda que, ironicamente, levou o punho da direita. Mas neste país ao contrário com total inversão de valores nada disto é de estranhar. Quem ainda tem bichinhos residuais dos pós-25 de Abril na cabeça é bom que os sacuda e deixe entrar o ar. O homem pode ser um político, e para se ser um político convêm não dizer toda a verdade e nada mais que a verdade, mas não estou a imaginar Paulo Portas a fazer um exame por fax. É daquelas coisas de anedotas que não passam pela cabeça de ninguém.
Gostei quando ele disse, umas 30 vezes, com uma inteligência de quem sabe o que faz "o José Sócrates já não é o mesmo de há dois anos". Ser o mesmo até é, o asco é que se tornou visível. Estarei a falar demais? Se calhar estou. Lá vou eu para a choldra. É preciso ter cuidado com a língua e a ponta dos dedos. É preciso votar no líder do partido que saiu do 25 de Abril com mais ligações à ditadura para lutar contra a ditadura.
Ainda têm que me provar que o homem não é honesto, porque este, ao contrário dos outros, tem obra feita e meritória, assim como têm os ministros que têm saído do CDS nos últimos tempos e que não precisam da política para o tacho.
Verdade seja dita, há que louvar outros dois homens. Ribeiro e Castro, porque esteve ali firme e digno quando era preciso e soube perder e tem sentido de missão, e, surpreendentemente para mim, Marques Mendes, de quem se diz tanto mal, e a quem tanto se achincalha, e nos últimos tempos tem sido o único gajo com eles no sítio. Isto só prova que as pessoas só valem alguma coisa quando são verdadeiras. É um bocado como os diplomas. Só que as pessoas valem mais.
Paulo Portas, diga-se o que se disser, é um natural born leader e o resto é conversa, homens de palha e papéis tão mal cheirosos como as negociatas que ali estão para tecer.
Não gostei desta notícia:
O número de trabalhadores portugueses em Espanha continua a aumentar, tendo crescido quase quatro por cento entre Janeiro e Abril, para mais de 75 mil, de acordo com dados divulgados pelo Ministério do Trabalho e Assuntos Sociais, informa a agência Lusa.
O aumento do número de portugueses foi mais elevado do que o aumento total do número de estrangeiros em Espanha, que cresceram cerca de 1,3 por cento atingindo um total de 1.947.908 pessoas. Representam já 12 por cento do número total de imigrantes provenientes da União Europeia (625.454) sendo a segunda maior comunidade da UE depois da Romena (cerca de 187 mil).
Em termos gerais, a comunidade portuguesa é já a quinta, depois das oriundas de Marrocos (276 mil), Equador (269 mil), Roménia (187 mil) e Colômbia (143 mil).
Que isto cale a boca de vez aos que dizem que os imigrantes vêm para cá "fazer o que os portugueses não querem fazer". Mentira de merda. Sempre foi e sempre será. Os portugueses vão para Espanha trabalhar nas obras porque ganham mais ou não arranjam outra coisa. Hoje dizia, um futuro desempregado da Delphi, que via perspectivas de emprego, mas não aqui. Na Espanha.
Escravos vêm de lá para cá, e vão de cá para lá. Acho que foi sempre por isso que me recusei a sair. Escravidão por escravidão, fico em Roma. Como dizia alguém cujos comentários noutro blogue muito prezo: "é a guerra".
Eu estou a fazer a minha. E é por isso que me vou bater ao lado do senhor da fotografia e vou fazer campanha descarada a torto e a direito e sempre que me apetecer sem ganhar nada com isso. Porque ainda há gente decente neste país. Posso não ter esperança, mas tenho ideais. Afinal a esperança não é a última a morrer. Os ideais ficam.
Over and out.
3 comentários:
Os gajos que transformam os trabalhadores em escravos aqui ou na vizinhança, são os mesmos que o senhor da fotografia tem como amigos, ou já nos esquecemos em que regime vivemos ?
Esse discurso populista não inverte a realidade dos factos, lembro que alguém disse que enquanto houvesse uma pessoa com fome em Portugal, não haveria TGV.A mesma pessoa de direita que iniciou os estudos desse transporte para a burguesia ir almoçar a Madrid.
Concordo Sócrates é um bandalho um centrão, que tem menos de esquerda que o meu testículo do mesmo lado
Mas gosto do teu estilo
Então deve alertar-se o senhor para os amigos que tem. (Quanto à família, não se escolhe.) Penso escrever-lhe a dizer umas coisas. O Paulo Portas costuma disponibilizar um email pessoal. Não imagino que é ele quem o lê, mas pelo menos tinha um email pessoal à disposição de todos. Já não é o mesmo e ainda não descobri o novo.
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