terça-feira, 5 de dezembro de 2023

The Dead Don't Die / Os Mortos Não Morrem (2019)


Comecei a ver “The Dead Don't Die” no canal SyFy à espera de uma comédia com zombies que não me fizesse pensar, e muito menos escrever uma crítica porque já tenho muitas para publicar e dão trabalho. Saiu-me um filme satírico de Jim Jarmusch, o mesmo realizador do excelente “Only Lovers Left Alive”, com cameos de Tom Waits e Iggy Pop e um enredo a puxar para o surrealista. Não é todos os dias que isto acontece!
Na pacata cidade de Centerville, “a real nice place” como diz o cartaz de boas-vindas, coisas estranhas começam a acontecer. Devido ao fracturamento hidráulico nas regiões polares em busca de gás natural, também conhecido por fracking, as notícias informam que a Terra saiu do seu eixo. Os dias estão mais longos, as noites caem subitamente. Todos os animais domésticos desapareceram dos donos. Até os animais de quinta, como galinhas e vacas, fugiram para a floresta.
A terrinha tem três polícias, e o mais novo observa os acontecimentos e diz umas três vezes “isto não vai acabar bem”.
De facto, os mortos começam a levantar-se do cemitério, mas não querem apenas comer os vivos. Continuam a desejar aquilo que mais ambicionavam em vida: os miúdos que morreram há mais tempo querem doces e brinquedos, alguns zombies do sexo masculino cercam a loja de ferragens, uma rapariga zombie quer ser modelo, alguns zombies mais jovens andam com um telemóvel na mão a murmurar “wi-fi, wi-fi”. O que não quer dizer que não comam os vivos quando os apanham; é que têm outras prioridades. Lembram-me os zombies músicos do coreto de “Land of the Dead”, que apesar de zombies continuavam a tentar tocar os instrumentos (muito mal, mas tentavam). Este sim, “Land of the Dead”, tem aspectos muito cómicos e satíricos. Já não foi isso que senti com “The Dead Don't Die”, apesar de o filme se assemelhar em temáticas e inclusivamente quebrar a quarta parede (termo usado no teatro quando os actores se dirigem directamente ao público) na minha opinião sem necessidade e sem o pretendido efeito cómico, o que ainda é pior.
Além desta homenagem a George Romero, noto aqui também vibrações de “Fargo” (os polícias da cidade em que nada acontece que se deparam com um apocalipse zombie que não têm capacidade de enfrentar). Mais do que apenas “vibrações, na verdade, já que o actor de “Fargo” Steve Buscemi (o da trituradora, lembram-se?) entra neste filme. Já a cangalheira-samurai Zelda (Tilda Swinton, a vampira de “Only Lovers Left Alive”) foi muito desaproveitada e sinceramente não percebi o que é que o realizador quis dizer com aquilo.
Já que é um filme sério, vamos falar a sério. O problema foi mesmo esse. Não percebi porque é que Jim Jarmusch, em 2019, achou relevante fazer um filme de zombies como metáfora da sociedade consumista, algo que Romero e os outros todos andam a fazer desde os anos 70 ou 60 (se contarmos o primeiro “Night of the Living Dead”, embora eu não o considere exactamente sobre consumismo). Jarmusch vai ao ponto de pôr Tom Waits a verbalizar “eles já estavam todos mortos”, como se a gente ainda não tivesse percebido. Não encontrei aqui um rasgo de originalidade que pudesse granjear pontinhos ao realizador, por muito que o procurasse. Nem consegui achar piada, o que é mais grave numa comédia. Penso que Jarmusch queria realmente fazer algo único que nunca saiu do papel. Mesmo assim, recomendo a todos os amantes de zombies.

14 em 20

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