quarta-feira, 31 de maio de 2006
Romance com a morte
Hoje em dia há muitas e completas definições do que é o movimento gótico. Uma das melhores está no Wikipedia.
Goth
Está tudo lá para quem quiser ler. Mas ser gótico não é apenas vestir de preto, gostar de filmes de terror e de um certo tipo de música. Há mais qualquer coisa. Algo de único que separa aqueles que ficam daqueles que mudam de pele. Esse valor imperceptível é abraçar a morte.
Abraçar a morte não é prestar-lhe culto, nem aderir a actos de violência e destruição, mas sim tê-la sempre presente na vida consciente, a cada minuto, a cada segundo, como a sombra que nos segue. De tanto fascínio que produz, uns acabam por amá-la, outros acabam por temê-la, mas todos a abraçam.
E quem não sabe o que significa abraçar a morte escusa de perguntar. (Escusa mesmo de perguntar porque é como perguntar o que é o amor sem nunca o ter sentido.)
Abraçar a morte vem primeiro. Possivelmente segue-se-lhe o vestir de preto. A música, os filmes, a maquilhagem, são a moda dos tempos. Não havia disto no tempo de Florbela Espanca, nem de Sylvia Plath, nem de Edgar Allan Poe. O que havia, e sempre haverá, é o abraço da morte. Entre rejeitá-lo e retribuí-lo, é como o sexo. Cada um faz como quer.
Não é por acaso que escolhi para ilustrar este post a imagem que aparece na capa de "closer", dos Joy Division. O fio condutor sempre foi o mesmo desde as páginas de Brahm Stoker ou dos poemas dos românticos do século XIX. Não há volta a dar-lhe.
Ser gótico é ter um romance com a morte.
Post Scriptum
Admitir que se é gótico é simplesmente admitir um amor proibido.
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6 comentários:
Sim.
A paixão pela morte, esse amor quase sagrado, não é exclusivo dos góticos.
Eu acho que é.
Mas diria mais fascínio do que paixão. Paixão pela morte leva-me a pensar nas pessoas que gostam de assistir a cenas macabras ou mesmo praticá-las (como os serial killers, ritualistas religiosos e afins). Isso é servir a morte. Os góticos limitam-se a tê-la presente. As palavras são traiçoeiras e o cuidado nunca é demais nos dias que correm...
Aqui não há nenhum "viva a morte".
Se eu disser que todos os dias penso na morte - penso demoradamente na morte - algumas pessoas concluem que ando com vontade de me suicidar. Outras são góticas, vistam como vestirem, ouçam a música que ouvirem.
E em rigor não há sequer o "penso demoradamente na morte". Como @ amad@, a morte é o que sustenta as coisas em que penso. A morte delas - das coisas - a minha, a tua: isso vem depois. Antes, há a presença simples da morte, como o tempo ou o espaço. Permite o pensamento, não deriva dele.
Eh bien.
Ardath, a paixão pela morte, exactamente no sentido em que a gotika a descreveu, define alguns. E nada mais há que os defina. O resto são acessórios. O próprio nome "gótico", a música, a religião, a cor: coisas plantadas sobre uma estranha dança entre o olhar e o nada, entre o olhar e o tudo.
Não há outra forma de dizer isto.
Filhos de qualquer coisa que aconteceu há duzentos anos. Talvez qualquer coisa que se rasgou.
Não irei negar a utilidade da definição na Wikipedia... mas é inócua... o tom seria o mesmo se estivessem a definir «eucalipto» ou «sexo oral»...
Nunca senti que abraçava a morte... A Noite sim, mas essa, para mim, é a Vida...
Mas não deixa de poder ser melhor leitura para alguns do que muita merda que para aí anda...
Cito:
«Elder goths.
An elder goth is a senior member of the goth subculture, usually between the ages of 29 and 40. Elder goths are generally longtime veterans of the scene, perhaps going back to the Batcave era, but there are some late bloomers.
Elder goths are more likely to draw upon the artistic aspects of the scene, in contrast to their younger counterparts who are sometimes motivated to act for shock value. Older goths may regard those who act in this ways as poseurs. An elder goth may refuse to acknowledge them as fellow goths. In contrast to the stereotypical image of a goth as a maladjusted outcast loner, some elders are married with families, and most have close knit ties with other members of the subculture.»
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