domingo, 24 de setembro de 2023

The Well of Shades, de Juliet Marillier


Há relativamente pouco tempo, numa resposta a um fã no Goodreads, Juliet Marillier afirmou que Faolan foi um dos seus personagens secundários que ganhou mais protagonismo do que a autora esperava para ele. “The Well of Shades” é um exemplo disso mesmo, onde a história e o destino de Faolan eclipsa os de Bridei e Tuala e Broichan, que aqui são eles os protagonistas do enredo secundário.
Depois da grande vitória de Bridei sobre os gaélicos, Faolan, espião e assassino de Fortriu, é enviado numa missão tripla. Bridei tem razões para desconfiar de um aliado e precisa de saber se está a ser traído. Mas, antes, Bridei faz questão de que Faolan resolva os problemas que deixou para trás com a família. No caminho, Faolan tem o dever de visitar os parentes de Deord para os informar da sua morte heróica que ajudou à fuga de Ana, Drustan e Faolan das terras de Caitt.
É na casa de Deord que encontra Eile, filha de Deord, numa situação de miséria e maus-tratos. Deord e Faolan foram ambos reclusos de uma prisão terrível (confesso que não sei o que os levou lá) e tinham essa “dívida de irmandade” um para com o outro. Deord não conseguiu regressar para a família (tornou-se no carcereiro benévolo de Drustan) e a mulher dele suicidou-se. Eile vive com a tia e o marido desta, Dalach, que não só lhe bate como a viola e Eile até já tem uma filha dele, Saraid. Faolan só se apercebe disto tudo quando Eile mata Dalach e lhe pede ajuda para fugir. Eile é ainda muito jovem mas já bastante traumatizada. No entanto, durante a viagem criam-se laços entre ela, Faolan e Saraid, e este começa a ponderar um futuro como pai e marido, o que é incompatível com a sua “profissão” actual. Além disso, não sabe se Eile está interessada nesse compromisso.
Drustan e Ana estão em White Hill (a residência de Bridei), onde celebram o casamento antes de seguirem viagem para as terras de Drustan no Caitt. Todos partem do princípio de que Eile os acompanhará, especialmente depois da oferta generosa que Ana lhe estende: uma vida na corte de Drustan com todas as honras e regalias como gratidão pelo sacrifício que Deord fez por eles. No entanto, Eile não quer acompanhá-los, antes deseja esperar por Faolan que entretanto já partiu noutra missão.
Ainda mais interessante do que o romance entre Eile e Faolan (quem conhece a obra de Marillier já adivinha que vai ser um “felizes para sempre”) é a chegada a Fortriu de uma comitiva de monges cristãos liderados pelo monge Colm que vêm pedir permissão para se estabelecerem num mosteiro em terras pagãs. Isto prenunciava um grande choque de crenças entre o druida Broichan e o monge Colm, mas devido aos próprios acontecimentos da história este confronto nunca acontece e Bridei cede a utilização das terras por dois anos.
Como sabemos dos livros anteriores, Bridei é muito fiel aos deuses. Desde que proibiu o sacrifício humano e anual ao Deus Sem Nome, Bridei tem existido no pesadelo de que este deus se vingue na sua família. Este medo torna-se real quando o seu primogénito Derelei desaparece da corte e se embrenha na floresta sem deixar rasto… O resto da história é a busca por Derelei, Saraid e Eile (que também desaparecem por mão criminosa).
A escrita de Juliet Marillier está cada vez mais vívida e agradável, mesmo que esta história não seja tão interessante como as anteriores que já li. Deu-me a entender que é uma história de transição para a conclusão da série e um desejo de dar um fim feliz a Faolan. Até agora não foi publicado mais nenhum livro da série “The Bridei Chronicles”. Tenho acompanhado a obra de Marillier desde o primeiro livro “Daughter of the Forest” e tenho efectivamente notado uma grande evolução (excepto quando a autora escreve a palavra “piquenique”, para meu grande desgosto e decepção), a não ser no que já considero o “calcanhar de Aquiles” da autora: a bidimensionalidade dos vilões a que “The Well of Shades” ainda não conseguiu fugir.
Aqui temos dois, o tal Dalach que abusa da sobrinha da esposa (e a certa altura começa a falar em abusar de Saraid também, a sua própria filha) e de quem nem vale a pena falar mais.
E depois temos Breda, uma psicopata e princesa mimada que faz tudo o que lhe dá na gana. Desta vez Marillier tentou dar a Breda maior interioridade escrevendo algumas cenas pela perspectiva dela, o que teria funcionado se Breda tivesse uma interioridade interessante. Acontece que é só invejosa e egoísta e muito aborrecida como vilã. Não digo que não seja credível, eu é que prefiro vilões mais “cinzentos” ou interessantes por muito repulsivos que sejam (por exemplo, um Hannibal Lecter, que nos choca mas é fascinante). Talvez Marillier ainda consiga dar-nos um vilão decente numa história posterior.
Não recomendaria “The Well of Shades” como primeiro livro a quem não conhece Juliet Marillier, mas de certeza que vai agradar aos fãs.



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