domingo, 10 de julho de 2022

Strangerland / Em Terra Estranha (2015)

De vez em quando apanha-se um filme destes, em que a qualidade da história, dos personagens, das interpretações, do ambiente psicológico e sociológico, da opressão do cenário avassalador, valem mais do que a acção propriamente dita.
Catherine e Matthew Parker são um casal já em crise que se instala numa pequena cidade no meio do deserto australiano, terra estranha para eles, em fuga de qualquer coisa que só descobrimos depois. Acontece que a filha adolescente do casal, de apenas 15 anos, tem uma libido maior do que a idade e se envolveu sexualmente com um professor. A família muda-se para evitar o escândalo e tentar recomeçar.
A situação em casa não é das melhores. Uma noite, a adolescente e o seu irmão mais novo desaparecem sem deixar rasto. Os pais desesperados metem-se no carro para os procurar, mas nesse momento são atingidos por uma violenta tempestade de areia que torna as buscas impossíveis. No dia seguinte não há sinal dos miúdos. Terão sido raptados? Ter-se-ão perdido na tempestade? Se estão vivos no deserto, ao calor e sem água, não conseguirão sobreviver sozinhos por mais de 48h.
Mas este não é um thriller de crime, ou mesmo de busca e salvamento. É um filme que aborda as consequências do desaparecimento. O casal desagrega-se. Depois de um intenso sexo de luto (uma espécie de imperativo genético quando um animal perde as crias) as acusações voam: o pai comenta que a filha não sai a ele nos seus apetites sexuais, logo, deve sair à mãe; a mãe chega a perguntar ao pai se alguma vez abusou da filha (injustamente); o polícia desconfia dos pais, que são sempre os primeiros suspeitos, e dos envolvimentos românticos da adolescente, que são sempre suspeitos também; a mãe, tresloucada porque as buscas não resultam em nada, atira-se sexualmente ao polícia, só para ser rejeitada. Os habitantes da cidade suspeitam dos pais dos miúdos, recordando outro grande filme, “A Cry in the Dark”, com Meryl Streep (aquele do dingo que comeu o bebé). Por último, a própria mãe embrenha-se sozinha no deserto, à noite, em risco de se desorientar e desaparecer também.
Perder um filho é a pior experiência de um ser humano. Perder os dois de uma só vez, sem se saber se estão vivos ou mortos, é de enlouquecer. Nicole Kidman, que há muito provou não ser apenas uma carinha bonita, encarna esta angústia em toda a sua maturidade de actriz veterana (nada daquele desastre que foi “Eyes Wide Shut”).
O que impressiona mais neste filme é o seu realismo, embora muitos espectadores o considerem lento e insatisfatório. Eu tive sorte, consegui retirar daqui tudo o que o filme queria transmitir, e mais ainda.

18 em 20

 

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