quinta-feira, 15 de fevereiro de 2007

Porque votei "sim"

A princípio, decidi não votar de todo. Acho que este referendo foi uma palhaçada para entreter o povo e o distrair dos problemas mais graves que são de facto urgentes e terríveis, como, por exemplo, e ironicamente, a falta de segurança e recursos que levam as mulheres a abortar.
Foi o ebola que, noutro sítio onde conversamos, me convenceu a ir votar. Disse-me qualquer coisa como: "já que não nos deixam resolver tudo, vamos resolver o que podemos resolver". Não respondi, é verdade, mas fiquei a pensar no assunto. E achei que devia ir votar e fazer a minha parte para de facto resolver o assunto.

Cheguei à conclusão, com este voto, de que, para o pior e o melhor, considero a hipocrisia um mal pior do que a indiferença pela vida. Não é todos os dias que se chega a uma conclusão destas e não gosto mais de mim por admiti-lo mas às vezes é preciso reconhecer a chaga no próprio corpo antes de o apontar no corpo dos outros.
Em 1998, votei "não". E se me perguntarem se concordo com a liberdade da mulher em abortar até às dez semanas, não concordo, não concordo mesmo nada! Votei contra a minha consciência. E votei assim por uma razão:

Não quero que as mulheres não façam um aborto porque o aborto é ilegal. Quero que as mulheres não façam um aborto porque a sua consciência não o permite. Em plena liberdade, em pleno uso do seu livre arbítrio. E isso é uma tomada de consciência civilizacional, como acabar com as touradas ou a pena de morte. É uma longa caminhada da humanidade para se tornar mais sensível, mais empática, mais humana. É nisso que acredito.

Em 1998, porque estava convencida de que o "sim" ia ganhar, pensei que o meu voto era uma tomada de posição, uma expressão de consciência. A abstenção maciça chocou-me. Sim, chocou-me que todas aqueles mulheres que já foram abortar tivessem tido uma oportunidade de deixarem de ser criminosas aos olhos da lei e não a tivessem aproveitado. Chocou-me que as pessoas, homens também, porque os filhos não são feitos só pelas mulheres, se estejam perfeitamente nas tintas para o facto de serem criminosos ou não.
Mas estávamos em 1998. Ainda tinha muito que aprender sobre este país antes de conseguir acreditar que é um país de pernas para o ar. E como elas (e eles) não votaram, fui votar eu, desta vez, porque já vi miséria material -- e moral -- suficiente para perceber que às vezes o aborto é a melhor solução. Todos os argumentos pró e contra já foram amplamente debatidos e não vou repeti-los aqui.
O que me fazia confusão era a hipocrisia. Isso acabou. Assim o ar parece mais limpo.
Agora também vou poder dizer a todos os casais que foram irresponsáveis que os acho irresponsáveis e que se deviam considerar irresponsáveis. Agora posso dizer-lhes que os acho levianos e insensíveis. A liberdade implica responsabilidade. É por isso que as crianças não andam sozinhas na rua.

Perturba-me, imenso, que pensem em obrigar-me a pagar os abortos dos outros com o dinheiro dos meus impostos. O Estado não tem nada que meter o bedelho na vida íntima das pessoas. Estar grávida não é uma doença. Fazer um filho não é ter cancro. Evita-se. Ou aborta-se. Mas não quero ser eu a pagar. Suspeito, pelo andar da carruagem, que não terei outra alternativa senão pagar abortos de filhos que não fiz.

E pergunto-me: homessa! E ninguém pega num cacete e se revolta num país em que não há dinheiro para manter abertas maternidades mas há meios e recursos para meter o aborto no Orçamento de Estado?!

Não espero resposta a esta pergunta de retórica. Claro que não há revolta. Está tudo demasiado cheio de fome para se levantar.

Mas não quero fugir muito ao intuito deste post. Porque votei "sim". Fui votar sim para acabar com a hipocrisia. Ponto final. Neste acto, também contribuí para liberdade de escolha. Por isso, tenho o direito de exigir o mesmo para mim. Onde está a minha liberdade de escolha de ter um filho? Não sou suficientemente irresponsável para trazer ao mundo uma criança para viver na miséria. Gostaria muito de ter a liberdade de escolha de trazer ao mundo uma criança em condições dignas sem ter de a dar a gente rica. Onde está a minha liberdade de escolha?

Ah, pois, já me esquecia. Tenho tanta liberdade de escolha como a mulher que, desesperada, vai fazer um aborto. É essa a liberdade que nós temos.

Todos os dias acorda um. Que hoje acordem mais uns quantos.

3 comentários:

*@rclight* disse...

cara amiga
gostei mto d cá passar
e apreciei a maneira mto humana como abordas este tema

cada um é livre d votar sobre o k quer

sempre fui a favor da vida
mas o meu voto foi sim

pk defendo o aborto em todas as situações em k a mulher possa sair altamente prejudicada devido ás consequencias k nós sabemos quais são!

n t esqueces-t da violação?
e d problemas d saúde em k o feto possa por em perigo a vida da própria mae?
d má formações?
são estes aspectos k justificam abortar legalmente

beijo

caminante disse...

Cara amiga, no es mi estilo entrar en polémica. Expreso unas cuantas ideas, por si sirven.
Destacaria aspectos de tu Post. Pero sería repetirlo. Y no es el caso.
Creo que no es buena la opción de estar a favor del aborto. Tú misma lo dices: si se supiese lo que es, no se haría.
Creo que la pregunta que haces sobre la contradicción de cerrar maternidades -como ya ocurrió- por falta de dinero no tiene sentido cuando se gasta tanto para pagar tantas muertes inocentes.
Defiendo con todas las consecuencias que no se criminalice a la mujer en ningún caso. Que una madre aborte es algo terrible. Muy fuertes han de ser las razones -deconocidas tantas venes- que llevan a una madre a tomar esa decisión. Pero no criminalizar no significa estar de acuerdo con eliminar una vida que tiene los mismos derechos que la madre. Los derechos nacen de la persona. Y ambos -madre e hijo- son
personas.
Defiendo que se creen condiciones para que ningúna madre recurra al aborto. Hay cientos de iniciativas que caminan para que eso sea así.
Concuerdo contigo que la abstención revela una inmensa carencia de espíritu cívico y de individualismo. Si no me implico en la mejora de la sociedad no tengo ningún derecho a protestar.
Una afirmación bellísima la tuya y llena de contenido: la libertad implica responsabilidad.
Perdóname mi largo comentario. No quiero seguir más. Sólo una cosa: la decisón responsable es de la mujer. Y no sólo de la mujer.
Mi libertad termina donde comienza la libertad de los demás. Y el niño en el seno materno tiene su libertad. Alguien ha de defenderla.
Un fortísimo abrazo de quien ama a Portugal. Corre por mis venas sangre portuguesa.

Göttlicher Teufel disse...

fizes-te bem