E se o Anticristo não quisesse sê-lo? Longe do original de 1976, com o miúdo sinistro que me lembra uns AC/DC muito maléficos, este é um Damien adulto, dos nossos dias, que recalcou todos esses acontecimentos traumáticos da infância e juventude. Imagens do primeiro “The Omen” são usadas em flashback e a história parte daí, mas este é um Damien muito diferente.
Desde o início da série que tive dificuldade em perceber o caminho que os criadores queriam seguir. Damien Thorn (Bradley James, o Arthur de “Merlin”) é um repórter fotográfico de guerra, simpático e humanitário, e um verdadeiro herói. Seria difícil antipatizar com este “Anticristo”. Por outro lado, não é verdade que o destino do Anticristo é arrastar nações atrás de si e conduzi-las à guerra, causando o Armagedão e a Segunda Vinda? Mas a decência de Damien não é uma simpatia falsa, ardilosa. Este Damien é mesmo do Bem. Como, então, convertê-lo ao Mal?
Em Damasco, em pleno conflito na Síria, no dia em que faz 30 anos, Damien tem um encontro com uma velha suspeita e vestida de negro (penso que sei quem é a Velha, mas não revelo) que lhe diz as palavras que o Espírito Santo diz dos Céus após o baptismo de Cristo. Este choque, aparentemente, faz com que Damien recorde todos os acontecimentos traumatizantes da infância, como o momento em que fez cair a mãe de um balcão abaixo.
Cada vez mais taciturno, confessa à ex-namorada que apesar da amnésia sempre sentiu uma “escuridão” sobre si, razão pela qual pôs termo ao relacionamento e se tornou um solitário. O seu único amigo é mais um colega e sócio que trabalha com Damien.
À medida que Damien investiga a mulher de negro e as suas estranhas palavras, bem como a sua infância, as pessoas que lhe são próximas ou com quem ele contacta começam a morrer em acidentes bizarros. Isto chama a atenção de um detective experiente e determinado que está convencido de que Damien, o único elo de ligação entre as vítimas, é um assassino, e que começa a persegui-lo para o apanhar em falso.
O próprio Damien repara que todos os seus colegas, durante as suas carreiras de repórteres, sofreram ferimentos de guerra, mas não ele. Damien lembra-se também dos Rottweilers que o seguem para todo o lado, e recorda-se do seu sinal de nascença, o 666 no couro cabeludo. Ao mesmo tempo é abordado por uma mulher misteriosa, Ann Rutledge, que se apresenta como executora da fortuna dos Thorn e lhe revela coisas igualmente portentosas sobre o seu destino: a coberto de uma grande corporação multinacional a operar nos mercados financeiros e na indústria militar, Damien tem tudo e todos à sua espera.
Damien rejeita-a terminantemente e ao seu papel de Anticristo. Obcecado, entra em depressão e começa a culpar-se por coisas que nunca poderiam ser culpa dele, como os massacres que testemunhou no terreno e até catástrofes naturais, e tenta suicidar-se. É literalmente salvo pelos Rottweilers.
Mas Damien não pode simplesmente recusar e fugir. Por um lado os satânicos perseguem-no para que os lidere; por outro, o Vaticano manda assassinos para o matarem. O Bem intrínseco à personagem leva-o a tentar pôr fim a si próprio, mas as entidades sobrenaturais não permitem. É um beco sem saída.
Em desespero de causa, deixa-se conduzir ao “inimigo”, uma freira exorcista do Vaticano, num episódio ironicamente chamado “O diabo que conhecemos”. Damien quer pedir ajuda, mas em vez disso, fazendo “o trabalho de Deus”, ela apunhala-o e tortura-o para exorcizar os demónios, o que finalmente faz despoletar os poderes do Anticristo.
Porque é que esta série não foi renovada? Sinceramente, não sei. Os fãs de “The Omen” gostaram mas a crítica acusa a lentidão do enredo e a falta de concretização do que está realmente à disposição de Damien (só começamos a perceber no último episódio). Tenho para mim que os criadores da série queriam ir construindo o contexto devagar, acreditando de certeza que a série seria renovada. Por exemplo, há todo um episódio em que Damien está em coma e acontecem várias coisas contraditórias que me confundiram imenso porque não se percebeu que era um sonho. Qual foi o propósito deste episódio? Penso que foi “reunir” de novo Damien e a sua mãe adoptiva e dizer-nos claramente que nem a nível subconsciente Damien quer ser o Anticristo. Se ao menos se tivesse percebido melhor que era um sonho o episódio teria sido mais eficaz.
Infelizmente, na minha opinião, a série não foi renovada. E digo infelizmente porque havia aqui muita coisa a explorar, como Damien contra o seu destino, a importância do livre-arbítrio contra a inevitabilidade, a luta entre o Bem e o Mal a nível ético, e talvez até a luta entre as forças do Bem e as forças do Mal a nível religioso. Mas a série foi demasiado lenta para agradar à maioria, o que é pena. Recomendo a todos os fãs do tema e admito que é uma delícia ver Bradley James no papel de Anticristo.
Saliento os créditos de abertura, em que vemos imagens clássicas do diabo e demónios espelhadas nos arranha-céus das grandes corporações. Muito bem feito: é mesmo lá que ele está! Outro caminho a seguir seria o Anticristo voltar-se contra a raiz de todo o Mal. Que pena. Eu gostei da cinematografia, do enredo, da imagética demoníaca, das alucinações, dos exorcismos, dos Rottweilers, da música genial de Bear McCreary, da tensão, das personagens… Bem, gostei de tudo, na verdade. Só não gostei que a série não tenha sido renovada.
ESTA SÉRIE MERECE SER VISTA: 2 vezes (especialmente porque o episódio do coma é muito confuso se não se vir outra vez, há que dizê-lo)
Vale a pena ver os créditos de abertura AQUI.
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