“Perdidos” é a versão portuguesa do filme “Open Water 2: Adrift” (2006). Seis amigos embarcam num iate e decidem dar um mergulho no oceano. Mas o dono do barco, irresponsável, esquece-se de descer a escada. Agora as pessoas na água não conseguem escalar o barco. A escapadinha entre amigos transforma-se em tragédia.
“Perdidos” é de tal modo a “tradução” do filme original que, tendo gostado do segundo, também tenho de gostar da primeira. É quase tudo igual. As únicas referências à cultura portuguesa são Porto Santo (de onde partem) e a canção de Sérgio Godinho “O Primeiro Dia”. De facto, logo ao chegar, um dos personagens vai trauteando a canção, com o conhecido refrão “Hoje é o primeiro dia do resto da tua vida”. Achei esta utilização do clássico demasiado óbvia (dentro de um dia ou dois o personagem está morto) e não vejo nada de literal na canção de Godinho para a trivializar assim, apenas como presságio num filme de terror. Ainda por cima um filme de terror que já toda a gente viu. Sinceramente, não gostei.
Tem-se colocado em questão a própria necessidade de filmar este mesmo enredo em português, tendo em conta que “Open Water 2: Adrift” é bastante recente, e este filme já é o aproveitamento do sucesso de ainda outro filme, igualmente uma tragédia no mar, “Open Water” de 2003. (Ora aqui está algo que eu só descobri a pesquisar para este artigo. Os dois filmes originais são perfeitamente autónomos, também não percebo porque é que quiseram relacionar os títulos.) A melhor explicação é que a costa portuguesa tem o cenário perfeito para o filme (fica barato nesse aspecto), e somos um povo de velejadores. Tudo bem. Mas podiam ter inserido algo mais original, ou da nossa cultura ou a nível das personagens ou do próprio enredo. Eu, pelo menos, esperava esse toque de originalidade.
Por falar nas personagens, confesso que estas vão ser menos esquecíveis para mim do que as do filme original, que ainda eram mais bidimensionais. O jovem casal com o bebé em plena crise conjugal, o ex-namorado que tem dinheiro e é um “merdas” (epíteto que lhe dão no filme e que não podia ser melhor escolhido), a namorada deste (que não tem nada a ver com os amigos dele), e os dois amigos “fixes” que podem ou não estar num relacionamento. Não falta aqui conflito e o filme sabe explorá-lo como deve ser. Tal como no original, o que aconteceu a estes “portugueses” é perfeitamente realista, principalmente com o conflito à mistura. Logo, tenho de gostar.
Há um problema técnico com este filme, que é o som. Não preciso de ser grande especialista para o identificar. Não percebi a maior parte do que eles diziam, especialmente o personagem Vasco (mas os outros também), e muitas vezes dei por mim a olhar para o rodapé da televisão à procura das legendas. Isto tornou-se mais frustrante nas partes mais tensas. Por exemplo, quando o merdas pega na mulher que tem fobia à água e se atira com ela para o mar. Ele diz-lhe alguma coisa, mas escapou-me. Era interessante saber que justificação é que ele lhe está a dar. Assim foi como ver uma cena de filme mudo.
Outra coisa mal explicada é a presença da faca dentro de água. No filme original esta questão não se me pôs, o que significa que a presença da faca foi explicada ou mostrada de forma tão natural que eu não achei estranho. Aqui não, e perguntei-me “de onde raio saiu a faca”?
Também há uma cena de micro-segundo, no fim do filme, em que se vê que a escada é accionada, mas isto foi tão rápido que já li algumas críticas a dizerem que perderam este pormenor. Confesso que tive de voltar atrás e rever, e se não tivesse visto o filme original se calhar também não percebia.
Gostei da última cena, longa e focada nas reacções faciais da sobrevivente, um bocado mais na linha da tradição cinematográfica portuguesa. Nunca ninguém me vai ouvir elogiar cenas demasiado longas, mas acho que aqui fez todo o sentido. Foi um toquezinho de classe à filme europeu que me agradou bastante neste contexto. Pena ter sido o único.
14 em 20 (não posso dar mais porque o filme é uma cópia)
domingo, 13 de dezembro de 2020
Perdidos (2017)
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