sexta-feira, 12 de julho de 2013

Máquina Herética: poesia e prosa poética, 10


Máquina herética

Vem, doçura dos meus passos
Ao aconchego terno dos meus braços
cheios de tal dor suprema e cansaços
deixa-me prender-te em fortes laços
Mas não me peças que te ame, por favor
de tudo, o que não tenho é o amor!

Porque não sabes como sou eu própria
Sou uma bela máquina de aprender
Aprendi a dançar e a viver
aprendi a beijar, rir e sofrer
Cheia de inteligência me construíram gelada
Edificaram-me estátua mecânica de prazer
Julgaram-me nocturna ao som da alvorada.

Sou eu própria máquina de álcool puro
Sou um copo de veneno destilado
Sou a serpente que te espera em pecado
Para te matar, para te amar em sono escuro
Sou só uma vítima das noites frenéticas
Destilo em mim doces trovas heréticas
Não encontro o pesadelo que procuro.

Oh, amor, para mim és a doçura
que me acalma as tristes noites de terror…
Mas tu não sabes nada do amor
Só sabes que não entendes a loucura
Não sabes se sou anjo se demónio
Nem eu sei se sou possessa ou possuidora
Nem eu sei como ser de ti traidora.

O que vês de mim é a verdade!
Sou máquina correcta de objectividade
Revisto a alma matemática de sinceridade
Sou poeta louca de racionalidade
E se te amo é apenas relativamente
Na minha vida tudo é consciente.
Analiso-te e a mim racionalmente
Os dados que tu lês objectivamente
São os factos verdadeiramente.

Mas existe um caos que não conheço
Não consigo prever os universos
O amor demora mais do que mereço
Da vida só tenho sonos dispersos
Como podes entender o gelo que eu sou
se agora és fogo que arde selvagem
e eu, fria ártica aragem.

Eu sou uma máquina de aprender
Não te esqueças que te digo objectivamente
Os avisos que precisas de saber
Sou sincera e pura e louca e doce
sou a tua irmã, a alma de prazer,
serei aquela que tem sempre os braços certos
Mas nunca tentes saber os meus segredos
a razão de já estar morta sem morrer.

Ah, quem me dera ser insensível!
Ser ainda mais gelo do que sou
ser como tu, segura e invencível!





8 comentários:

Fashion Faux Pas disse...

epá, é o que eu digo, tu escreves mesmo MUITO bem!! Isto está brutal, lindo, poderosíssimo!!
http://fashionfauxpas-mintjultp.blogspot.com

katrina a gotika disse...

Não, és tu que me estás a estragar com mimos. :)

Este poema é muito autobiográfico e muito do que disse na altura continua a ser verdade. Nomeadamente a ultima estrofe:
Ah, quem me dera ser insensível!
Ser ainda mais gelo do que sou
ser como tu, segura e invencível!


Saliento aqui a palavra "segura".

*humbly bows"

katrina a gotika disse...

Só queria comentar também que existem passagens que, como preveni, te podem lembrar também Florbela Espanca, mas quanto a isso, em minha defesa, tenho de dizer que em certas coisas sinto como ela sentia. Não em todas, mas em algumas. Não podia expressar-me de outra maneira se os sentimentos são idênticos.

Fashion Faux Pas disse...

Tem graça que eu senti mais José Régio aqui do que Florbela Espanca. Não são mimos, são opiniões ;)

katrina a gotika disse...

O "Cântico Negro" de José Régio sempre me disse muita coisa.
Está aqui:
http://gotikka.blogspot.pt/2012/10/gotika-arquivos-dezembro-2003_16.html
Mas nunca tinha feito a associação, não senhora.

Unknown disse...

Olá, Katrina!
Impõem-se(me) dizer que a MintJulep não está a mimar-te: escreves mesmo bem! Eu não estava à espera de ser "recebida" com poesia, pensei que não te dedicasses a esse género, e foi uma surpresa muito boa :)

Não tenho vindo aqui (por "aqui" entenda-se os blogues), não há como habituar-me a isto e até gosto, mas é estranho, aqui não acontece nada e ao mesmo tempo acontece tudo.
Respondi-te lá, há muito tempo, uma resposta a uma pergunta que me fizeste e é algo invulgar, mas nem sei se viste.. Eu achei logo, assim que o escrevi, que gostaria que lesses. Se calhar estou a dar muita importância a coisas que a não têm, mas sou eu, sou eu, sou eu, sou eu (que a dou) :) (quero dizer que sou um pouco louca).

Gostei muito do que li e espero voltar em breve.
Agnes Rubra

katrina a gotika disse...

mas nem sei se viste

Vi. :)

Unknown disse...

Hahahahahaha

esse "nem sei se viste" é tão completamente EU, sou tanto assim, nunca sei nada àcerca do que me importa! Ainda bem que viste :)