fevereiro 09, 2004
Um filme: "O Estigma" (Stigmata)
Da primeira vez que vi o filme fiquei impressionada. Na boa tradição do terror, a história passa-se com uma pessoa completamente normal que não percebe nada do catolicismo nem sabe distinguir um colar de um rosário. É o tal fenómeno "e se me acontece a mim?..."
A ideia até não é má de todo. Inspirado na descoberta real de um manuscrito atribuído a São Tomé, cuja inspiração divina nunca foi reconhecida pela Igreja, o filme explora uma conspiração do Vaticano para encobrir o evangelho escrito pelo próprio Jesus Cristo. "O reino de Deus está dentro de ti, e à tua volta, não em edifícios de pedra e madeira. Mexe uma tábua e Eu estarei lá, levanta uma pedra e lá Me encontrarás" teriam sido as verdadeiras palavras de Jesus aos apóstolos na Última Ceia. Palavras que seriam consideradas pelo Vaticano uma ameaça à Igreja enquanto instituição, afirmada que estava a sua inutilidade como mediadora entre Deus e o homem.
Estes filmes não são feitos para pensar muito mas podiam não ter deixado passar uma falha tão grande: se estas são as palavras de Jesus na Última Ceia, e se o evangelho foi escrito por ele próprio, Jesus tinha que se pôr a escrever bem depressa entre a celebração da Páscoa e o momento em que é traído por Judas, um pouco mais tarde, nessa mesma noite. Se pensarmos que nessa altura não havia computadores nem esferográficas, só recorrendo mesmo aos poderes divinos. Psicoquinese ou ubiquidade, talvez?
Além disso, a teoria da conspiração à volta do Vaticano já vem tarde. Há muito tempo que a Igreja prega a existência do reino de Deus dentro de cada homem.
Perdida a verosimilhança do conteúdo, resta a análise da forma. E é aqui que o filme se estampa a toda a velocidade. Se era para copiar os momentos de tensão do “Exorcista”, se era para explorar as dúvidas existenciais de um jovem padre como no “Exorcista”, se era para documentar a possessão demoníaca de uma inocente rapariga como no “Exorcista”, fazia-se um remake do “Exorcista”!
Mas como na altura o “Exorcista” já ia numa óptima terceira sequela, e o filme original é tão bom que qualquer realizador arrisca a reputação se lhe tocar, e as boas ideias não nascem nas árvores, ficou-se por uma cópia de “Os Dias do Fim” (o tal em que o Schwarzenegger derrota o próprio Satã).
Sinceramente, não sei qual dos filmes saiu antes, “O Estigma” ou “Os Dias do Fim”, mas não interessa grandemente. Se os efeitos especiais não foram feitos pela mesma equipa, estudaram todos na mesma escola ou, pior, é o que parece. Espionagem industrial?...
Conclusão, ao contrário do “Exorcista”, a que a cada visionamento se percebe mais um detalhe da história, “O Estigma” desfaz-se quando o espectador já sabe quantos vasos se vão partir a seguir. É a diferença entre um filme com conteúdo e um filme para ver e esquecer.
Publicado por _gotika_ em 02:29 AM | Comentários: (26)
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