domingo, 15 de agosto de 2021

Night Train to Lisbon / Comboio nocturno para Lisboa (2013)

Um professor suíço, na meia-idade, descobre o livro filosófico de um autor português (fictício) que o traz impulsivamente a Lisboa. Aqui, tenta saber mais sobre o autor e acaba por reconstruir o seu passado dramático.
Durante todo o filme, senti-me confundida. Por um lado, parecia Portugal. Por outro, às vezes não reconhecia a cultura, e os acontecimentos históricos não foram bem retratados. Por exemplo, o funeral, em que os participantes deixam ali o caixão na carreta e vão-se embora. Não. Por cá as pessoas só se vão embora quando os coveiros começam a cobrir a campa. Ou melhor, é quando eu me vou embora porque é a parte que me impressiona. As outras pessoas ficam sempre mais tempo. É costume pegar num punhado de terra e atirar sobre o caixão. (Mas, verdade seja dita, também nunca fui a um funeral de gente fina.)
Este é um pequeno exemplo de discrepância. Outro, mais importante, é a maneira como se referem constantemente à “resistência” ao regime de Salazar. Nunca houve uma “resistência” assim denominada. Aquela cena dos “resistentes” a combinar a senha (canção) do 25 de Abril foi risível. Não foram os civis a recrutar os militares, foram os militares a iniciar a revolta civil. Nunca se mencionou sequer o PCP. Na altura, o PCP era a resistência. Não havia oposição ao regime que não passasse pelo PCP, mesmo que depois as águas se viessem a separar.
O filme é a adaptação do livro homónimo do autor suíço Pascal Mercier. A sensação com que fiquei é que o autor ou o realizador sabem um poucochinho de nós e da nossa história, mas não o suficiente. O que se vê no filme podia passar-se numa qualquer ditadura sul-americana ficcional à mistura com alguns toques à “portuguesa”. A coisa mais portuguesa que se ouviu é quando aquele personagem diz: “Nós aqui não gostamos de falar do passado. Preferimos enterrá-lo”. Será mesmo só nosso, ou é universal?
Mas a luta contra a ditadura é apenas o pano de fundo e acaba por não ter grande importância. Esta é a história de dois amigos e uma mulher, e de como a dor de corno os destruiu.
O filme pode parecer lento, mas o que me encantou, como não podia deixar de ser, foram as ruas familiares de Lisboa. Quase arrancava os cabelos quando as reconhecia e não conseguia lembrar-me dos nomes delas, sabendo que desde sempre as calcorreei para cima e para baixo. Aquele miradouro onde o Jeremy Irons está sentado? Eu podia jurar que era o miradouro da Graça, mas depois de observar melhor já penso que é o jardim de São Pedro de Alcântara (aquele mesmo ao lado do elevador da Glória). Reparando bem, vêem-se os miradouros da Graça e do Monte. É a mesma paisagem, mas do lado oposto. Lisboa é uma cidade lindíssima e merecia este filme. Só por Lisboa vale a pena ver. Pelo resto, nem por isso.

13 em 20


Sem comentários: