domingo, 11 de julho de 2021

Jurassic World: Fallen Kingdom (2018)


Este filme deixou-me deprimida. E nem sequer estou a brincar.
No primeiro “Jurassic Park”, impactante e inesquecível, os cientistas criaram os dinossauros porque os progressos técnicos o permitiram. Havia uma aura de inocência e deslumbramento, de ciência optimista e “miraculosa”. O parque foi criado para partilhar o assombro com toda a gente que pela primeira vez podia ver um dinossauro vivo após uma extinção de milhões de anos. Trinta anos depois, a inocência, o deslumbramento, o orgulho contido neste progresso, tudo isto deu lugar a um cinismo pérfido e capitalista capaz da maior vileza neste “Jurassic World: Fallen Kingdom”. Sinal dos tempos? Sem sombra de dúvida.
Perdi o episódio anterior, “Jurassic World” (2015), de que as críticas falam pessimamente. Parece que tentaram fazer um novo parque temático, desta vez contendo os dinossauros numa ilha de onde não podiam sair, o que é bem pensado. Mesmo assim, os dinossauros deram cabo do projecto, como dão sempre. Os dinossauros foram deixados em paz, até que neste filme o vulcão da pequena ilha entra em erupção e em breve a vai engolir em lava. Todos os dinossauros serão destruídos.
Coloca-se a questão ética: se foi o Homem que os criou, não deveria o Homem impedir a sua segunda extinção?
“Não”, diz o Professor Malcom (interpretado pelo veterano “jurássico” Jeff Goldblum), “devemos deixar extinguir estes magníficos animais. Não devíamos sequer tê-los criado, foi um erro, e agora a Natureza está a corrigir esse erro.”
“É então um acto de Deus?”, perguntam-lhe.
“Com todo o respeito, Deus não é para aqui chamado.”
Pois não, mas foram cientistas como o Professor Malcom que se divertiram bastante a armar-se em Deus. Quando dá para o torto, chutam para canto e responsabilizam a Natureza. Ora, parece-me que a Natureza não fez o vulcão explodir para corrigir os erros humanos. A Natureza está-se nas tintas se destrói humanos ou dinossauros. É, sim, uma incumbência duplamente ética impedir a destruição de animais que só ali estão por culpa da arrogância de cientistas como o Professor Malcom que não pensam nas consequências.
Digo “duplamente” porque é incumbência do ser humano impedir a extinção de fauna e flora que na nossa realidade muito próxima podem desaparecer devido à pressão demográfica e à destruição sistemática dos seus habitats. Os grandes carnívoros, os grandes felinos, os grandes herbívoros como as girafas, os elefantes e os rinocerontes, estão mesmo em risco de desaparecer, o que seria um delito vergonhoso, não da Natureza, mas do Homem. O filme lembrou-me disto e foi o primeiro momento depressivo que me atingiu. Neste estado de coisas, quem é que precisa de recriar animais já extintos para sofrerem de novo igual destino, quando nem os que existem conseguimos salvar? Só mesmo por arrogância, estupidez e insensibilidade.
Algo que este filme conseguiu, e que os anteriores, apresentando os dinossauros como monstros, não conseguiram ou não quiseram, foi fazer-nos empatizar com os dinossauros como os animais que realmente são.
Claire Dearing, a directora do parque da ilha jurássica no filme que eu não vi, encontra-se numa campanha de sensibilização para salvar os dinossauros. Quando tudo parece perdido, é chamada à mansão do milionário Benjamin Lockwood, aparentemente um dos sócios do projecto do primeiro Parque Jurássico, onde o executivo à frente desta grande fortuna a informa de que conseguiram comprar uma ilha que será um santuário para os animais, mas precisam da ajuda dela para capturar alguns espécimes.
Uma equipa parte para a ilha, já pressionada pelo pouco tempo que resta. O vulcão está mesmo prestes a destruir a ilha e os seus habitantes, e quem lá estiver também. É então que a equipa de resgate é traída. O executivo e os seus capangas são maus como a Máfia e dispostos a tudo, até ao homicídio, para levarem dali alguns espécimes de dinossauro (os mais “valiosos”) na intenção de os licitarem pelo melhor preço. Não existe santuário, era tudo um embuste.
Os membros da equipa são deixados para trás, quando a lava já escorre pelo vulcão abaixo. Alguns dinossauros, carnívoros e herbívoros, em desespero, lançam-se de uma falésia abaixo, procurando o mar onde morrem afogados. Mas até aqui a tragédia dos animais ainda não tinha tido tempo de bater a sério, porque os pobres coitados da equipa também se arriscavam a ficar transformados em estátuas de lava como as de Pompeia.
Quando finalmente os humanos estão a salvo, conseguindo entrar no barco que é o último transporte para fora da ilha, olham para trás. Mesmo à pontinha do cais de embarque, um grande dinossauro herbívoro olha-os a afastar-se, e chama-os e chora, nos seus roncos uivantes, enquanto a lava e a nuvem piroclástica se aproxima, devagar, devagar, e os chamamentos se tornam cada vez mais cortantes e aflitivos, até que por fim são apenas queixumes quando o animal compreende o seu fim.

Ter de assistir a isto partiu-me o coração e fiquei doente durante alguns dias. Fiz uma pausa no filme, deprimidíssima. Este animal representa todos os outros que foram deixados para trás a uma morte horrível. Isto não é coisa que alguma vez consiga esquecer na minha vida e não aconselho a pessoas sensíveis.
Os animais que foram “salvos” são directamente conduzidos para o leilão de super-ricos na mansão Lockwood, onde os dinossauros são licitados para todos os fins imaginários: farmacêuticos, bélicos, e até porque a filha de um milionário quer ter um dinossauro bebé.
Eu ia dizer que este filme me deprimiu em três momentos, mas acrescento aqui um outro. Estes animais foram “salvos” para serem “desmantelados” em partes à vontade do freguês que pagar mais. Já que os dinossauros não davam lucro como atracção circense, que ao menos rendam alguma coisa como peças de talho. Inqualificável.
Como é apanágio destes filmes, há sempre um vilão idiota que abre uma jaula sem querer, e lá escapa um super-predador. Nunca percebi porque é que estes filmes são supostamente “para crianças” porque sempre os vi como filmes de terror, e este não é excepção. A única diferença entre estes filmes e os de terror é que os maus são comidos e os bons lá conseguem sempre safar-se, para não traumatizar as criancinhas.
Desta vez quem abre todas as jaulas para os dinossauros escaparem livremente para o mundo real não é um adulto (pelo menos não foram assim tão estúpidos), mas uma criança incapaz de ponderar as consequências do seu acto de “compaixão”. E agora os dinossauros estão à solta na natureza, super-predadores que não deveriam existir.
O meu quarto e último momento de depressão foi quando um destes super-carnívoros invade um jardim zoológico e lhe sai ao caminho um orgulhoso leão. Em voz off, ouvimos ainda o depoimento do Professor Malcom: “Os dinossauros estiveram cá antes de nós e podem muito bem vir a estar cá depois de nós”. O leão não tem hipótese, os nossos magníficos animais selvagens não têm defesas contra dinossauros. E deu-me uma melancolia profunda, profunda. Entre os animais que já cá estão e os que não deviam já estar, escolho, de alma rasgada em duas, os que já cá estão.
De quem é a culpa? Não de Deus e muito menos da Natureza. Um bom final, se houvesse justiça, seria atirar aos dinossauros os cientistas que fizeram a merda para encher o ego.

Este filme deprimiu-me deveras, mas não por ser um bom filme. Os personagens são bidimensionais, os vilões são maus como as cobras (Don Corleone seria um santo ao pé deles), o enredo é igual a todos os filmes anteriores da série. Salva-se neste filme uma vertente Terror mais acentuada do que nos anteriores, e talvez uma invasão da Terra pelos dinossauros numa próxima sequela.
 
14 em 20 (porque me atingiu emocionalmente e porque os dinossauros são bastante realistas)
 

 

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