segunda-feira, 15 de junho de 2020

Catherine of Braganza, de Isabel Stilwell


Este livro é o romance ficcionado da vida de Catarina de Bragança, infanta portuguesa filha de D. João IV que se tornou rainha de Inglaterra ao casar com Charles II em 1662. Acredita-se que tenha sido Catarina de Bragança a introduzir o hábito de tomar chá na corte inglesa, o que depois se generalizou. É muito bom que este livro esteja traduzido em inglês para os ingleses ficarem a saber quem os ensinou a ter maneiras.

Um início muito aborrecido, para não dizer chato

Primeiro que tudo, e em jeito de disclaimer, eu não comprei este livro; foi-me oferecido. E foi-me oferecido em inglês, ainda por cima, quando eu preferia muito mais ter lido o original em português. A tradução não me permite avaliar a escrita, porque uma vez traduzida esta perde logo todas as subtilezas, todas as nuances, os segundos sentidos, a escolha das palavras, o ritmo, a poesia. Logo, fiquei sem saber como é que Isabel Stilwell escreve em português e não posso opinar nada sobre isso. E não conhecendo o original muito menos posso avaliar a tradução propriamente dita. Mas a cavalo dado não se olha o dente.
Segundo, embora eu goste muito de História em geral, não é deste período em particular. Claro que ouvi muitas vezes o saudoso Prof. José Hermano Saraiva a contar a história da Restauração, mas não me lembro de os filhos mais velhos de D. João IV serem mencionados (Catarina talvez fosse) porque, a verdade é esta, nem D. Teodósio nem D. Joana foram relevantes para a História (morreram novos, sem cônjuge nem descendência). Importantes foram os irmãos mais novos de Catarina, D. Afonso (esse mesmo, o tal do filme “O Processo do Rei”, e para quem viu o filme não preciso de dizer mais nada) e D. Pedro, que acabaria por usurpar o trono do irmão e casar com a mulher deste. Mesmo assim, interessei-me por saber mais acerca deste período histórico, ali já quase a entrar na modernidade, muito longe das minhas preferências medievais e renascentistas, e foi basicamente por isso que encarei o desafio de ler este livro.
E devo dizer, sem rodeios, que para mim o princípio do livro foi aborrecido de quase ir às lágrimas. E não tem a ver com o tamanho do livro, 640 páginas, incluindo biografias resumidas e retratos. Não, não é nada disso. Livros assim leio eu às 20/30 páginas por dia. Tive de pensar muito na razão de achar o livro tão aborrecido. Encontrei várias, mas a razão principal (para mim, pelo menos) é esta: a protagonista tem dois anos no princípio do livro, demasiado pequena para nos conseguirmos ancorar nela.
Esta parte vai ser um pouco técnica, mas necessária. Muitas vezes se pergunta quando é que um livro deve começar a contar a história. Há quem diga que deve começar na primeira página, ou logo no primeiro parágrafo, ou mesmo na primeira linha. Eu sou uma leitora muito mais paciente. Espero que o escritor me leve até à história conforme ele achar melhor para produzir o efeito pretendido. Mas aqui, admito, percebi qual é o meu limite. 10% do livro lido e começo a perguntar-me “mas afinal onde é que está a história?”. Claro que sei que é a história de D. Catarina, mas não é isso que o livro nos dá.
E agora outro disclaimer: não tenho nada contra o head hopping. Quem conhece a corrente de escrita anglo-saxónica actual sabe que o head hopping é considerado crime de pena capital e outros exageros. Eu discordo completamente. O head hopping, quando bem feito (e não é fácil fazê-lo bem feito, daí os autores iniciantes serem desaconselhados de fazê-lo), dá-nos a oportunidade de entrar dentro da cabeça de vários personagens no mesmo livro em vez de ficarmos agarrados a um só (como na vulgar “terceira pessoa limitada” que, como o nome diz, é limitada). O livro está efectivamente escrito com head hopping, o que contribui, nesta primeira parte, para não sabermos que personagem seguir e que história acompanhar. Será a história de D. Luísa de Gusmão? De D. João IV? Dos filhos mais velhos deles, Teodósio e Joana? Eu andei ali perdida sem saber a qual dos personagens prestar mais atenção e acabei por não me conseguir ancorar a nenhum. Pior um pouco, como disse, a protagonista é um bebé que não tem nada a dizer e muito menos a pensar. Ainda por cima, aquela família benzoca e beata lembrou-me aquelas famílias benzocas e beatas da Lapa, pior um pouco porque foi há 400 anos e era uma família nobre. Era tudo muito betinho, muito beato para o meu gosto, muitos padres, muitas santinhas, muita igreja, e acabei por não conseguir empatizar com ninguém. Chegando a 10% do livro já suspirava, à procura de motivos para continuar a ler.
Foi então que reparei na árvore genealógica da família e descobri um mistério. [Desculpem o spoiler.] Joana e Teodósio morreram no mesmo ano. Isto interessou-me e comecei logo a imaginar tragédias tipo Guerra dos Tronos. Mas interessou-me porque reparei nas datas, não porque o livro me desse razões. É claro que eu sabia que D. Teodósio não seria rei (não temos nenhum com esse nome) mas daí a morrer no mesmo ano da irmã dá que pensar. Não foi nada tipo Guerra dos Tronos. Tudo indica que morreram de tuberculose. Isto também me surpreendeu, confesso, porque sempre associei a tuberculose a uma época posterior, e não deixa de ser intrigante que um surto de tuberculose só infectasse dois membros de uma família muito próxima.
Mas não culpo o head hopping pelo meu aborrecimento a princípio. Na minha opinião o head hopping apenas obriga o leitor a estar um pouco mais atento. Talvez seja mais fácil escrever desta forma em português do que em inglês, admito, e há truques para tornar o head hopping tão pouco abrupto que o leitor normal nem dá por ele. Ou talvez estejamos já tão habituados a ele, por ser tão frequente na literatura portuguesa, que não nos incomoda. Mas os anglo-saxónicos têm um grande problema com isto, e, por razões semelhantes, com o narrador omnisciente, uma vez que só o narrador omnisciente permite o head hopping. Este livro, com efeito, está escrito em omnisciente, e bem escrito, de forma que não se nota a voz da autora (outra coisa que em geral me desagrada, tirando os casos em que a voz do autor faz parte do livro, o que daria pano para mangas que não pertencem a esta crítica).
O livro melhora imediatamente assim que Catarina cresce e começamos a acompanhar-lhe os pensamentos também, o que finalmente, e tardiamente, na minha opinião, nos permite estabelecer uma relação com a protagonista.
Eu sou daquelas que detesta quando uma crítica diz “se fosse eu fazia antes assim”, mas neste caso, até para exemplificar melhor, vou mesmo dizer que se fosse eu teria começado a história noutro momento, por exemplo, o momento dramático em que Catarina se prepara para partir para Inglaterra, nem que fosse num prólogo. Este momento fulcral permitiria que ela “olhasse para trás”, por assim dizer, e nos levasse à história da família quando ela era criança, mas neste caso já estaríamos ancorados na personagem principal e saberíamos que iríamos voltar ao ponto em que o livro começava. A falta de relação com a protagonista (e a ausência de uma personagem que me cativasse e a “substituísse”)  foi o que me prejudicou mais a leitura no início.

O que eu aprendi que não sabia
A existência da família Bragança em Vila Viçosa durante o domínio espanhol é simples e bucólica. Eu não sabia que D. João gostava de música e que lhe é atribuída a composição do tema natalício Adestes Fidelis. Esta atribuição é contestada e alguns académicos inclinam-se mais para que a autoria seja dos monges de Cister. Curiosamente, este hino é muito mais conhecido em terras anglo-saxónicas do que por cá. Terá sido também uma exportação da nossa Catarina?...
O come, all ye faithful, joyful and triumphant!
O come ye, O come ye to Bethlehem;
Come and behold him
Born the King of Angels:
O come, let us adore Him,
Christ the Lord.
Seja como for, gostei que a autora aproveitasse o Adestes Fidelis atribuindo-o a D. João, o que nos mostrou algumas cenas alegres em família durante a infância de Catarina.
Desconhecia, igualmente, os dois filhos mais velhos de D. João, e especialmente a importância de D. Teodósio, o herdeiro ao trono, que no livro nos aparece como o verdadeiro príncipe perfeito, galante, instruído, inteligente, corajoso (e bonito, a acreditar no retrato). Até que ponto esta representação foi ficcionada não imagino, mas leva-nos a pensar que se perdeu um bom rei com a sua morte precoce.

 D. Teodósio de Bragança, filho primogénito de D. João IV

O que eu já conhecia, mas que o livro me fez perceber em toda a sua dimensão, foi o dote colossal que Charles II recebeu por casar com Catarina. Nada mais nada menos do que as cidades de Bombaim e Tânger, o que sem dúvida ajudou a criar o império inglês de que eles se orgulham tanto, que afinal lhes foi entregue de mão beijada como restos do nosso, sem que eu acredite que as contrapartidas para Portugal tenham sido assim tantas.
Por último, e isto não sabia mesmo, a rima:
What are little girls made of?
Sugar and spice and all things nice,
that is what little girls are made of.
Parece ter sido inspirada por Catarina de Bragança, uma rapariga de estatura pequena, que no seu dote levou açúcar e especiarias na falta dos milhões prometidos por Luísa de Gusmão (mas já lá voltaremos.)
Por falar em Luísa de Gusmão, admito que nunca me apercebi da grande influência que ela teve na governação do reino pós-Restauração. Como disse, não é uma época da História que me excite por aí além. Mas neste livro consegui compreender até que ponto ela foi uma mulher de política e poder. E porque é que até há um liceu Luísa de Gusmão. Ah, foi por isso!
Foi também uma das únicas partes em que consegui estabelecer empatia com a família real. Após a morte de D. Teodósio e de D. Joana, D. João desinteressou-se da governação, que o agastava, e refugiou-se na música. D. Luísa tomou as rédeas do governo. Consegui empatizar com eles porque me pareceram um casal moderno. D. João lembrou-me aqueles accionistas que só vão às reuniões estritamente necessárias para assinar papéis, enquanto D. Luísa era a verdadeira CEO que assumia o papel do marido. Esta dinâmica, sim, é-me conhecida e quase consegui visualizar a versão moderna do casal, ela a chegar do trabalho ao fim do dia, ele entretido com os seus passatempos numa tentativa de escapar à desilusão e ao desgosto. Acontece.
Aproveito para falar também do Padre António Vieira, que neste livro me decepcionou. Talvez a culpa seja minha, mas esperava um personagem mais genial, mais marcante, um homem de craveira intelectual brilhante que se distinguisse sempre que abrisse a boca. Não foi nada disso que apanhei dele. Pareceu-me quase um padre vulgar, lá com as suas ideias que acabaram por nunca ser muito desenvolvidas neste livro. Se calhar porque nunca conseguimos passar tempo suficiente com ele, se calhar porque a sua presença em torno dos príncipes era a de um preceptor que não queria falar de temas controversos?... Sinceramente, estar ali António Vieira ou outro padre qualquer teria tido o mesmo efeito. (Talvez fique para outro livro.)
Gostei muito da maneira como D. Afonso é retratado neste livro. D. Afonso, que (aparentemente) devido a uma doença de infância sofreu problemas de desenvolvimento físico e mental, sempre foi muito mal tratado pela História e pelos historiadores, apelidado de imbecil e pior (veja-se o filme “O Processo do Rei”), considerado incapaz de assumir o cargo para que nasceu. Talvez. Mas aqui o livro mostra dele uma faceta bondosa e inocente, e um carinho pela irmã Catarina, que sempre o tratou com todo o carinho e respeito também, que me fez empatizar com o personagem. A autora vai ainda mais longe, dando-nos a perspectiva de D. Afonso como um jovem ressentido e revoltado por ter sido posto de lado pelos pais, e até nos diz que tanto D. Luísa como D. João lamentam não conseguir gostar do filho Afonso como gostam dos outros, devido às suas limitações, e D. João admite a si próprio que devia dedicar-se mais à educação de Afonso, que agora é herdeiro ao trono depois da morte de Teodósio, mas não consegue, se calhar mesmo por causa disso, porque encarar o filho mais novo como príncipe herdeiro é uma lembrança constante da morte do seu filho mais velho, que arrasou D. João. Toda esta dinâmica familiar é muito dramática e realista, e compreensível de todos os pontos de vista. Catarina deve ser a única pessoa na corte portuguesa que trata o irmão Afonso como a alguém digno de consideração, revelando um grande coração que nos predispõe a empatizar com ela também. Mas gostei especialmente desta versão de D. Afonso, que nos mostra o lado dele nesta história de uma forma que, embora ficcionada, podia muito bem ter sido mesmo assim e que vai contra a corrente do que se pensa maioritariamente sobre o futuro D. Afonso VI. Muito bem feito.

Uma protagonista que não é para mim
Catarina tinha 23 anos quando casou com Charles II, mas a sua mentalidade parece mais a de uma adolescente de 13. A sinopse promete-nos a “coragem de uma infanta portuguesa que se tornou rainha de Inglaterra” mas para mim, muito pessoalmente, era preciso mais para falar de coragem. Como dizer isto sem ser mázinha?... Bem, Catarina não me pareceu exactamente uma inteligência muito brilhante ou um espírito muito profundo. Por exemplo, quando morreram os irmãos Teodósio e Joana, eu senti que sofri mais do que ela. Para Catarina estavam os dois no Céu, com Jesus, e não podiam estar melhor. Tentei esforçar-me ao máximo para ter em mente a religiosidade da época, mas D. João, por outro lado, nunca recuperou, apesar da religiosidade. Da mesma forma, D. Luísa também nunca recuperou completamente da perda dos filhos que lhe morreram bebés. Catarina não tem estes problemas existenciais, nem estes nem outros, e isso fez-me abanar a cabeça do princípio ao fim do livro. Não é uma protagonista para mim. É uma pessoa com quem, na vida real, eu dificilmente podia ter uma conversa intelectual. A superficialidade de Catarina, a infanta mimada, vai-se atenuando à medida que os desgostos a vão marcando, mas nunca a marcam como deviam. Não estou a dizer com isto que é uma personagem irrealista. Há mesmo gente assim. Mas gente assim não me seduz, e esta protagonista nunca me fez sentir grande coisa por ela.
Catarina foi preparada desde rapariguinha para a hipótese de casar com Charles II, nessa altura ainda um herdeiro sem trono. Não só nunca ela questiona, como alimenta esta fantasia acerca de Charles, sonhando com ele ainda antes de o conhecer. As negociações do casamento e do dote foram complicadas porque Charles queria muitos milhões que os portugueses não tinham. D. Luísa queixa-se dos “cofres vazios” (ah pois, não é de agora, começou logo aqui com a guerra da independência) ao mesmo tempo que precisa desesperadamente do apoio inglês contra Castela, que continua a reivindicar Portugal. Uma aliança com um reino protestante, em que a bênção do Papa não contava, era muito desejável para solidificar a independência do reino de Portugal na Europa. Catarina acha isto tudo muito normal e nunca lhe passa pela cabeça que Charles só está interessado no dote. Pelo contrário, quando ele lhe manda umas cartinhas de “amor” a rapariga fica completamente de cabeça perdida por ele, sem sequer o conhecer pessoalmente, muito embora já soubesse que Charles tinha filhos ilegítimos de outras mulheres. Mas, como eu dizia, Catarina tem 23 anos mas aparenta mentalidade de 13. Charles, para ela, é um príncipe encantado que vai ser seu marido e vão ser felizes para sempre. Por isso, não é com “coragem” que ela parte, é com a cabecinha cheia de ilusões.
Ora, podemos pensar que ao chegar a Inglaterra, ao ver que o marido é um mulherengo que muda de amante como quem muda de camisa, que tem tantos filhos ilegítimos que até eu perdi a conta, Catarina abre os olhos e percebe que a vida não é um conto de fadas. Mas não. Ela já ia apaixonada e ficou apaixonada toda a vida, toda a vida a tentar conquistar um marido que é simpático e cortês para com ela, mas nada mais do que isso. Digo mesmo mais, acho que a certa altura Charles até teve pena dela, como eu tive, por ela ser tão parvinha, e foi por isso que nunca se voltou contra ela quando se percebeu que Catarina não conseguia ter filhos, ou quando o movimento protestante fez da rainha católica um alvo. Charles sempre a protegeu, é verdade, com a decência de um homem que nunca a culpou por aquilo que ela não podia oferecer, especialmente um herdeiro, mas ter-se portado de forma decente não o faz um bom marido.
Catarina continuou sempre a iludir-se, mas sempre, sempre, até ficar viúva, de que ele a amava. Era só nisto que ela queria acreditar e nunca conseguiu acreditar noutra coisa. O que também não é irrealista. Há mesmo gente assim, que vive uma vida de fantasia na sua própria cabeça para não ter de lidar com a realidade. Catarina, neste livro, foi dessas, e o próprio Charles lhe fez a vontade de a deixar acreditar no que era melhor para ela. Pelo menos, assim, ela não era infeliz. Deve ter sido a única qualidade de Charles, porque de resto ele era mesmo um marido execrável que obrigava a esposa a conviver com as suas amantes que viviam na própria residência real. Mas isto não torna a personagem Catarina mais simpática aos meus olhos. Só a torna cega porque não quer ver, tipo avestruz.
Esta história foi tão aborrecida que já me estou a aborrecer a escrever esta crítica, imaginem, por isso vou abreviar.
Houve um momento, de facto, em que simpatizei com Catarina. Depois da morte de Charles, Catarina volta para Portugal e, através de cartas, conhecemos o seu estado de espírito. Numa passagem dessas cartas ela admite amargamente que fracassou em tudo o que tinha sonhado: não conseguiu dar um herdeiro a Charles, não conseguiu dar um rei a Inglaterra, não conseguiu promover a religião católica entre os ingleses.
Mas aqui, digo eu, Catarina também nunca aceitou os fracassos e nunca partiu para novos objectivos. Não, ficou sempre agarrada aos mesmos, sem qualquer evolução. Não é muito inteligente insistir em coisas que não resultam, mas foi precisamente o que ela fez a vida toda.
Mas depois ela diz algo que me atingiu. Quando Catarina foi para a Inglaterra, vinda de um país de costumes beatos em que até um decote era considerado imoral, foi considerada provinciana pela corte inglesa. Mas ao regressar, com toda uma nova ideia de moda e de estilo de vida, foi considerada escandalosa. E ela confessa que sente que agora já não pertence a lado nenhum. Isto tocou-me, e identifiquei-me.

 Catarina de Bragança, rainha de Inglaterra

Recomenda-se
Um dos aspectos mais positivos dos romances históricos é que tornam figuras históricas em pessoas de carne e osso para o leitor. “Catherine of Braganza” consegue fazer isso e agora nunca me vou esquecer destas pessoas. Desconheço se a autora teria melhor material por onde tornar a história mais interessante (foi muito aborrecido para mim, em partes) mas também compreendo a opção de apenas mencionar “de longe” alguns dos capítulos mais sangrentos desta mesma história. Para começar, o célebre defenestramento de Miguel de Vasconcelos no Terreiro do Paço (nem sequer se fala disso). Depois, a morte do pai de Charles II, Charles I, um rei que foi decapitado por traição (essa é uma história que eu gostaria de saber melhor, admito, e a própria Catarina se pergunta que raio de sistema político era aquele em que o parlamento mandava mais do que o rei). Depois ainda, a decapitação do filho ilegítimo mais velho de Charles, James, também por traição, a mando do próprio tio e sucessor de Charles II, James II. Há aqui muito material à Guerra dos Tronos, mas aceito que o intuito da autora tenha sido mesmo evitar as partes sangrentas.
Um outro elogio que a autora merece é a ausência de descrições fastidiosas e demoradas. Admito que tive o livro na prateleira durante muito tempo, e que sempre que olhava para ele imaginava as páginas e páginas de descrições que eu supunha que tinha (é costume nos romances históricos) a descreverem tudo desde os vestidos às espadas aos botões às fivelas, já para não falar da arquitectura e da decoração e dos serviços de mesa, e suspirava, e não tinha coragem de pegar no livro. Graças a Deus, a autora poupou-nos a isso tudo, descrevendo apenas o necessário e o importante. Nos dias que correm, em que basta irmos à net e olhar para um retrato ou uma fotografia, já não são precisas essas descrições exaustivas que faziam a vez da internet e da televisão no século XIX.
Em suma, um romance histórico que não me encantou (por causa da própria história e dos personagens) mas que está suficientemente bem escrito para se recomendar. Teria preferido a inclusão de algumas partes mais sangrentas, mas compreendo a opção.
Por último, uma palavra para a capa lindíssima que fica mesmo bem num local bem visível da estante.

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