A princesa séria
Era uma vez, havia um senhor e seu criado que andavam a correr mundo. O amo era uma pessoa culta, bem educada e virtuosa, mas o seu criado tinha um vício bizarro e incorrigível: por onde quer que passava, roubava tudo, tudo, tudo!
Sabendo disto, o senhor avisava todos os donos das casas por onde passavam, sublinhando: "Tenham cuidado onde o põem a dormir porque este rapaz rouba tudo, tudo, tudo!"
Um noite, tendo o amo dito, no local onde iam pernoitar, que o criado roubava tudo o que via, decidiram fechá-lo num galinheiro vazio de onde não podia levar nada. Mesmo assim, o rapaz lá deu volta aos cantos todos até encontrar um ovo... e enfiou-o imediatamente no bolso da casaca.
No outro dia de manhã, já iam o amo e criado longe da casa, este mostrou logo o que havia roubado: "Olhe, arranjei este ovo!"
"Ò rapaz, não tens emenda! Para que queres tu isso?"
"Não se preocupe, meu divino mestre, que tudo serve para alguma coisa!"
Isto passou-se, e lá foram à sua vida.
Noutra noite, chegada a hora de pernoitar, disse o amo ao dono da casa: "Tenham cuidado com este rapaz porque onde quer que fica rouba tudo, tudo, tudo! Há pouco tempo dormiu num galinheiro vazio e mesmo assim roubou um ovo!". "Não se preocupe, senhor", respondeu o dono da casa, "porque onde ele vai dormir não há nada para roubar!". Foram então trancá-lo no barracão onde trabalhavam os carpinteiros e no chão só havia lascas de madeira. Não foi de modas, o nosso rapaz, e tratou logo de encher delas os bolsos das calças.
No outro dia de manhã, iam já longe da casa o senhor e o criado, quando este mostra ao amo a "colheita" da noite. "Olhe mestre, arranjei estas palhinhas!"
"Ò meu grande parvo, para que queres tu isso?"
"Não se aflija, meu divino mestre, que tudo tem serventia!"
Isto passou-se, e continuaram caminho.
Foram noutra ocasião pernoitar a outra casa, onde o amo prontamente esclareceu o anfitrião: "Tenham cuidado onde metem este rapaz, porque ele rouba tudo, tudo, tudo! No outro dia, até cavacas de madeira ele meteu nos bolsos!". "Ah sim?", pergunta o dono da casa, com um sorriso malvado, "Então já sei onde o vou pôr!". Nessa noite, o rapaz foi deixado no palheiro onde as galinhas andavam de dia, e só havia caca no chão. Mesmo assim, foi de caca de galinha que ele encheu o chapéu.
No dia seguinte, já a distância da casa, vai o criado mostrar o chapéu ao amo, que ainda gritou mais alto:
"Ò meu grande porco! Deita isso fora!"
"Não se preocupe, meu divino mestre, que tudo tem a sua utilidade!"
Isto passou-se, e seguiram caminho.
Chegaram então a um reino em que a princesa mais nova sofria de estranha doença: nada a fazia rir. O rei tinha um grande desgosto, e era tão grande o seu sofrimento que prometeu casá-la com o primeiro homem que conseguisse quebrar este "feitiço". De quando em vez, a princesa era presente ao público, e vinham pretendentes de todos os cantos do reino para a tentarem fazer rir, mas por mais palhaços, ilusionistas e humoristas de maior ou menor erudição, nobreza ou fortuna, que lá aparecessem, de nada valiam para a divertir. Estava na altura do ano em que esta peregrinação se fazia quando os dois viajantes por lá passavam. Assim que soube disto, o bom do amo, ainda em idade casadoira e não tendo nada a perder, foi tentar a sua sorte. Aos pés da princesa, que olhava sobranceira do seu trono, contou-lhe as melhores anedotas que conhecia e, como não nutrissem efeito, em desespero de causa contou-lhe a seguir todas as outras até se esgotar a memória. Nada. A princesa séria continuava aborrecida. Nada lhe arrancava uma gargalhada.
Chegando ao pé do criado, acabrunhado e abatido, o senhor mal começa a dizer que deviam seguir caminho quando o rapaz o interrompe: "Agora vou lá eu!"
"Tu?! Um parvalhão como tu, deves fazer uma rica figura!"
Mas o criado lá foi, e mal a princesa se vira para ele tira o ovo da casaca e pede:
"Asse-me este ovo!"
"Não tenho lenha!", diz ela, rispidamente, para despachar aquele vagabundo coberto de trapos.
Então ele despeja os bolsos das calças e saem de lá as lascas de madeira: "Tenho aqui estas cavaquinhas!"
Já farta e enjoada daquela insistência, a princesa perde a compostura e desabafa: "Tal não é esta merda!"
E prontamente responde o rapaz: "Aqui tem um chapéu cheio!"
Assim que vê o moço tirar o chapéu, cheio de caca de galinha, a princesa séria desata a rir às gargalhadas sem se conter. E foi assim que o pobre criado obteve a sua mão em casamento e viveu feliz para sempre, junto do antigo amo, da nova esposa, a quem conseguia fazer rir, e do rei, que finalmente curou o coração daquele grande desgosto.
E assim reza a moral da história que mais vale cair em graça do que ser engraçado.
2 comentários:
Confesso que adoro passar os olhinhos por aqui para ver as tuas opiniões!Vou linkar o teu blog ao meu....esperoq passes pelo meu humilde espaço.
Bjs
Passarei. Obrigada. :)
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