Marilyn Manson ao vivo
Pavilhão Atântico, 19 de Novembro
Passava das nove e meia quando cheguei ao Pavilhão Atlântico. Se calhar porque não estou habituada a concertos de estádio (fico-me por salinhas mais modestas) estranhei o aparato policial nas portas de entrada. A última vez que vi tantas fardas juntas foi no Disorder. Depois da revista policial digna de aeroporto em alerta laranja, perguntei-me se também tinham apalpado assim o maluco do americano que ia subir ao palco.
Perdi completamente os Turbonegro mas o trabalho não perdoa e a certa altura temi nem chegar a tempo de apanhar o princípio de Manson. Tive sorte. Cheguei no intervalo e ainda pedi uma cerveja "grande" pelo módico preço de 2 euros e 90 (não roubam pouco, não!).
O público era bastante heterogéneo, dos pitos aos cotas, dos metaleiros aos góticos, até à malta que que não tem nada a ver com nada e nunca se adivinharia que gostasse de Marilyn Manson.
Às 21h55 ouviu-se o intro e pouco depois caiu literalmente o pano. Marilyn Manson, pintado com uma banda vermelha horizontal sobre os olhos, muito ao seu estilo, atacou em força com "If I Was Your Vampire" do novo álbum.
Sucedeu-se um sortido de êxitos do passado mas o público estava frio, apático, nem batia palmas. Grandes espaços na plateia, longe de preenchida, e os balcões quase desertos. Eu própria me arrependia de ter pedido a cerveja "grande", ali especada com o "balde" nas mãos sem poder aplaudir. Não era que Manson desapontasse. A voz está boa, os novos músicos fazem o que devem... Mas faltava química.
A coisa só começou a animar quando Manson passou ao teatro. No alto de uma cadeira gigante, pôs-se a fazer malabarismos enquanto cantava "Are You The Rabbit?", mais uma do novo álbum, e o público empolgou-se.
Talvez Marilyn Manson tenha perdido aquela capacidade de chocar a que as pessoas se habituaram e ande simplesmente à procura de uma maneira nova de estar em palco. Uma coisa é certa, as pausas no intervalo das músicas para mudar o cenário são um "corte" no ambiente musical que arrefece completamente a plateia.
Munido de projecções relacionadas com os conceitos dos álbuns anteriores, Manson mostrou-se pouco "obscene" e muito bem comportado. Fizeram-lhe chegar uma bandeira de Portugal (cheguei a pensar que era lingerie mas não tivemos tanta sorte...) que pôs aos ombros em sinal de respeito. O público gostou. Eu não sei se Manson gosta de bandeiras (parece-me que não) mas foi bonito. Só faltava uma condecoração do presidente da República e um beijinho da primeira dama. Quem ainda espera o Anticristo que cospe e dá pontapés pode tirar o cavalinho da chuva. Pelo contrário, durante "Heart-Shaped Glasses" tivemos direito a uma chuva de confettis (pretos). Parecia o Dia dos Namorados.
Mas não vou ser mázinha. Quando já começava a pensar se tinha deixado "Os Sopranos" a gravar e se ainda chegaria a casa a tempo de ver "A Letra L" e se lá fora ainda chovia muito, fui arrancada do tédio por dois grandes momentos. O primeiro quando Manson se fez erguer num aparato metálico para cantar "The Reflecting God". Mais à vontade com o novo Manson, o público que quis entregou-se completamente: "shoot, shoot, shoot motherfucker, shoot!"
O outro grande momento foi quando o cenário voltou ao primeiro álbum, grandes faixas negras ao fundo com o símbolo do raio, e Manson, de fato, gravata e cartola, não só canta como interpreta um "Antichrist Superstar" em que faz de político, marioneta decadente, pregador, tudo ao mesmo tempo, para no fim lançar fogo ao livro que segura na mão. Política e religião a arder e eu a aplaudir freneticamente, às gargalhadas. Deve ser a primeira vez que um concerto apela ao meu sentido de humor mas confesso que me diverti imenso. "They say the drugs are made in Portugal" cai sempre bem. Não sei se Manson gostou. Com o homem tudo é ironia. Parece-me que não, como já me tinha parecido da última vez que o vi no Super Bock Super Rock. Gostava mesmo era de o ver no Coliseu, mais perto do público, mais intimista.
O próprio Manson parece também querer vencer a distância. Ainda andou a cantar para as primeiras filas antes do fim, e depois de "Beautiful People" lançou-nos uma nuvem de confettis brancos. Tudo muito profissional, tudo medido e ensaiado como numa peça de teatro. Pouco, se alguma coisa, é deixado à espontaneidade do momento. Para concerto de rock, sabe a pouco. Para peça de teatro, Manson terá de abandonar a tentativa de ser apenas um cantor de rock e abraçar o seu lado vaudeville. E talvez não fosse má ideia. O formato "concerto" parece atrapalhar mais do que ajudar. Rock is dead?
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