domingo, 30 de dezembro de 2018
Pompeii / Pompeia (2014)
Neste tipo de filmes-desastre, geralmente, o personagem principal é o desastre em si. Tudo o resto são personagens secundárias que só ali estão para enfrentar a calamidade. Foi uma surpresa que Pompeia não tenha sido assim. A história é tão interessante que a certas alturas até me esqueci completamente do Vesúvio.
Tive muitas vezes a sensação de estar a assistir a um épico à antiga, daqueles dos anos áureos de Hollywood, com perseguições em quadrigas e tudo. E não é todos os dias que vemos Jack Bauer vestido de Senador romano. Elegantíssimo, e malvadíssimo, como fica tão bem a Kiefer Sutherland.
A história não é original. Milo é o único sobrevivente de uma revolta Celta esmagada pelos invasores Romanos. Feito escravo, é agora um gladiador famoso a quem levam precisamente para a arena de Pompeia nas vésperas da erupção do Vesúvio. Por coincidência, Pompeia é visitada nessa mesma altura pelo homem que massacrou a sua tribo e os seus pais. Assim que o vê, Milo só pensa em vingança.
Nota acerca dessa cena inicial em que Milo, ainda criança, assiste à decapitação da sua mãe. É sempre difícil dizer se foi propositado ou não, mas é tão semelhante que não pode deixar de lembrar o início de “Conan o Bárbaro” (o de 1982, com Arnold Schwarzenegger). Muitas partes do enredo podiam também ter saído da série "Spartacus". O dono dos gladiadores chega mesmo a dizer: “Estes trácios só dão problemas.” E de facto, 100 anos antes, um certo trácio conhecido por Spartacus deu água pela barba aos romanos. Mas sabemos como isso acabou. Na arena, os gladiadores já não falam em revolta. Atticus, o campeão, acredita mesmo (ou quer acreditar) que lhe falta apenas uma vitória para lhe ser concedida a liberdade. Para tal, tem de combater com o Celta (Milo) e derrotá-lo. Nenhum dos dois tem qualquer interesse em matar o outro, mas é a vida de um gladiador.
Este enredo é bastante interessante por si só. Mas sabemos que um personagem “oculto” não tarda a intervir e a estragar os planos a toda a gente. Nesta altura estamos a torcer para que o vulcão expluda e safe os dois gladiadores.
A história é cativante mas isto não quer dizer que os personagens sejam muito desenvolvidos. Num filme-desastre, histórico, cheio de acção e efeitos especiais de grande magnitude, alguma coisa teria de ficar para trás. Os personagens são apenas desenvolvidos o suficiente para contar a história mas não deixam de ser bidimensionais. Os vilões são maus como as cobras. As personagens dividem-se entre opressores e oprimidos. A família aristocrática de Pompeia, para ser mais simpática ao espectador, é também oprimida pelo poder imperial. Cássia, a heroína, manifesta-se contra os jogos na arena, para sabermos que alguns romanos são “bonzinhos”. Não há tempo para muito mais.
Lamento dizer que os efeitos especiais me desapontaram, nomeadamente os da destruição da cidade e os da tsunami. Nota-se que é feito por computador, e quando se nota é mau. (Se nos lembrarmos da destruição da arena em "Spartacus", por exemplo, foi muito mais realista do que aquilo que acontece aqui.) Os efeitos especiais do vulcão, ao menos isso, já são realistas o bastante. Mesmo assim esperava mais.
Também não gostei dos clichés debitados a torto e a direito. Já basta que as personagens sejam bidimensionais. Os diálogos não precisavam de ser tão fracos.
O final surpreendeu-me. Não pensei que tivessem coragem de acabar assim. Neste aspecto, o filme diverge muito do fim “clássico”.
Pompeia não será certamente um dos filmes da minha vida mas vê-se bem e é mais original do que dava a entender a princípio.
14 em 20
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domingo, 23 de dezembro de 2018
Midnight, Texas
[crítica à primeira temporada]
Sobrenatural, vampiros, sangue, sexo tórrido. Era o que eu esperava de “Midnight, Texas”, série baseada na colecção homónima de Charlaine Harris, autora dos livros que deram origem a “True Blood”. Nem acredito que estou a dizer isto, mas a “Midnight, Texas” talvez falte mesmo o sexo tórrido para a acção abrandar. Tudo acontece a um ritmo tão alucinante que nem temos tempo para conhecer devidamente os personagens, muito menos envolvermo-nos com eles.
Por exemplo, a história de Manfred, o protagonista. Um verdadeiro médium, mas também capaz de “aldrabar” os seus dons para agradar a clientes ricas. Por causa de uma dívida contraída para pagar os tratamentos da avó com cancro, é obrigado a fugir para a pequena terriola de Midnight na esperança de escapar ao credor. Este credor promete ser um vilão terrível, mas afinal dão conta dele num só episódio. Tudo é assim em “Midnight, Texas”. A série é uma sucessão de monsters-of-the-week e tudo se resolve no próprio dia. Fez-me pensar que se calhar queriam rivalizar com “Sobrenatural”, mas a diferença é que em “Sobrenatural” os personagens são extraordinários: interessamo-nos por eles, sofremos por eles. Em “Midnight, Texas” mal os conhecemos. Nem parece haver muito para conhecer. Todos os personagens são bidimensionais.
Há o vampiro bonzinho, Lemuel, um antigo escravo que encontrou a liberdade no vampirismo. Esta podia ser uma história boa e dramática, mas não merece mais do que cinco minutos de flashback.
A outra fulana (a Lexi de “Diários do Vampiro”, mas nesta série nem lhe consegui fixar o nome), assassina profissional com um passado pesadíssimo, também nunca é desenvolvida a esse nível.
Depois temos o Reverendo, que é um tigromem. (Lobisomem, mas em versão tigre.) Este deve ter uma história bem interessante, se alguma vez a conhecermos.
Entretanto há também um casal gay, ele um anjo e ele um demónio, e amam-se. Mais outra história fofinha de que nunca conhecemos nada. Eu ia adorar assistir a como é que estes dois se apaixonaram e decidiram assumir um amor tão proibido.
E finalmente temos a bruxa Fiji, cujo gato é um familiar (espírito familiar) que fala. O gato é o meu personagem preferido. Nem querem imaginar a minha raiva quando em certo episódio decidiram sacrificar o gato. Sim, é verdade que foi o gato que pediu que o sacrificassem num acto altruísta e heróico, e que este não é um gato “normal”, mas com a ignorância e a maldade que ainda existem neste mundo preferia não ver estas atrocidades em obras de ficção. Felizmente, por qualquer razão que não fez sentido nenhum, o sacrifício não matou o gato. Pelo menos isso.
Tirando estes personagens “sobrenaturais” e/ou complicados, existem os normais. E os normais ainda são menos interessantes do que os outros e nem merecem que os mencione.
O verdadeiro enredo da série, afinal, não é a dívida que levou Manfred a Midnight. Midnight é daqueles locais em que o “véu” entre este mundo e o outro é mais ténue, e este véu está a ficar cada vez mais fino. O anjo prevê que quando este véu se romper o inferno passará através dele para reinar na terra. (Um enredo muito “Sobrenatural”.) Mas existe uma profecia, de que apenas um homem que fala com os vivos e os mortos pode deter o inferno. Este é Manfred, e esta é a verdadeira razão da sua presença em Midnight.
Contado assim até parece interessante, mas deviam ver o demónio medíocre que aparece em representação do inferno. Se calhar sou eu que estou mal habituada. Já vi tão melhor!
Se ao menos as personagens fossem profundas e cativantes a série ainda se aproveitava. Não basta deitar lá para dentro um sortido de criaturas sobrenaturais e julgar que basta. Não basta. É preciso que nos interessemos por elas. Se a série acabasse agora nunca mais pensava nesta gente.
“Midnight, Texas” é uma série para ver sem interesse nem expectativas. Daquelas que servem para olhar para a televisão e pensar noutras coisas. Para ser muito sincera, nem percebo como é que foi renovada.
Do mal o menos, resta-nos François Arnaud (César Bórgia de “Os Bórgias”) que me levava para todo o lado se eu tivesse a idade dele. Mal empregado neste papel.
domingo, 16 de dezembro de 2018
Poseidon / Aventura do Poseidon (2006)
Vi o primeiro “Poseidon” quando era miúda e foi daqueles filmes que me marcaram para toda a vida. De roer as unhas do princípio ao fim. Agora já não roo as unhas, mas este “Poseidon” de 2006 causou-me quase o mesmo efeito do primeiro.
Remake do filme de 1972 ("The Poseidon Adventure"), a história é igual: na véspera de Ano Novo, o cruzeiro de luxo Poseidon é atingido por uma onda gigante que vira o navio ao contrário. Um grupo de pessoas, apesar de desaconselhadas pelo capitão, decide encontrar a saída pelas hélices, que agora estão a descoberto. Entretanto, os passageiros e tripulação que se mantiveram onde estavam, à espera de socorro, são tragados pelas águas e pelos incêndios.
Classificado como filme-desastre, “Poseidon” tem elementos de puro terror: sobreviventes a tentar escapar de um ambiente hostil em que a morte espreita a cada esquina. Não deve haver cenário mais espectacular e aterrador do que um grande navio virado ao contrário, a encher-se de água, rodeado de mar profundo. (Excepto talvez um ambiente ainda mais hostil: uma nave espacial no espaço.) Depressa o percurso se torna opressivo e escuro, desorientador, e todos os perigos espreitam os sobreviventes: cabos eléctricos em carga, explosões, mobília e máquinas aos tombos, as grandes hélices ainda a trabalhar, e, nunca esquecendo, a água a subir cada vez mais depressa atrás deles, garantindo que não há retorno.
Não há tempo para respirar neste filme. É uma corrida desesperada até à única saída possível.
Tenho apenas uma queixa a apontar sobre o fim. Depois disto tudo, os sobreviventes têm à sua espera um salva-vidas aberto e em perfeitas condições, exactamente onde precisam dele. Curiosamente, é também o único salva-vidas que se vê em redor do navio. Isto é demasiado conveniente [quase um deus ex machina] e rouba algo do heroísmo que os sobreviventes demonstram até esse momento. Não custava nada terem feito com que houvesse mais dificuldade em chegar ao salva-vidas e teria sido o fim perfeito.
A última cena, em que vemos o navio vir à tona, virar-se, erguer a proa e por fim desaparecer na sepultura das águas profundas, é tão aterradora quanto bela. Para ver isto é que muita gente fez fila para o “Titanic”.
Por que é um filme bastante bem feito, de prender a respiração do princípio ao fim,
16 em 20
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sábado, 8 de dezembro de 2018
Dracula Untold / Drácula: A História Desconhecida (2014)
Em vez de “untold” e “história desconhecida”, o subtítulo devia ser “versão alternativa que a malta inventou”. Com isto em mente, dói menos ver este filme.
Então, por onde começar? Historicamente, o filme é inqualificável. Começa por ser a história do verdadeiro Vlad (mais ou menos) com datas e tudo. Mas depressa percebemos que este personagem é tudo menos Vlad. Vlad Tepes foi um monstro de sadismo. Um dos maiores entre os mais infames monstros da humanidade. O protagonista deste filme é um amor. Um marido amantíssimo, um pai meigo e extremoso. Um herói que se sacrifica pelos outros. Sem dúvida um personagem pelo qual apetece torcer.
Quem me conhece sabe que não gosto nada de misturas entre a realidade histórica e a ficção mirabolante. A romantização de um personagem histórico para efeitos dramáticos é admissível numa obra biográfica, desde que não seja tão excessiva que fuja à realidade. Neste caso, e em casos idênticos, mais valia terem enveredado pelo género Fantasia e criado um personagem original. Até porque já estamos todos fartos das mesmas histórias repetidas vez após vez. Eu, pelo menos, estou fartíssima.
Já que historicamente não há ponta por onde se pegue, vou falar do Vlad Drakul, o vampiro.
Os turcos estão à porta, ameaçando invadir o principado da Valáquia. Vlad descobre que numa gruta na montanha existe um vampiro com enorme poder e força sobrenatural. Sem capacidade de responder à ameaça turca, Vlad procura este vampiro para lhe pedir os mesmos poderes. Esta cena na gruta lembra muito a cena do Mestre na série The Strain (ou será o contrário?). O vampiro, um homem que vendeu a alma ao Diabo em troca de imortalidade, dá-lhe o seu sangue, mas Vlad tem de resistir à tentação do vampirismo durante três dias para não se transformar em vampiro também. Por isso, Vlad tenciona derrotar os turcos em três dias. (Historicamente, um insulto para ambas as partes do conflito.) Para tal, Vlad ataca os exércitos turcos com nuvens de morcegos. Sim, leram bem. Morcegos verdadeiros. (Como se já não bastasse o preconceito e a maldade que certos animais sofrem da parte de pessoas ignorantes, ainda há estes filmes idiotas a ajudarem à superstição. Os morcegos não fazem mal a ninguém. Comem insectos e são muito úteis ao ecossistema.) Quando os morcegos não chegam para derrotar os turcos (porque é que será?) Vlad decide aceitar o vampirismo de modo a transformar outros súbditos em vampiros. Com os morcegos e uma dúzia de vampiros consegue derrotar os turcos em três dias, mas não sem sacrifício.
Toda esta história dos “super-poderes” (domínio sobre os morcegos, poder de atrasar o nascer do dia, o próprio Vlad a transformar-se numa nuvem de morcegos) ficaria melhor num filme de super-heróis. Talvez o Homem-Morcego. Tive a sensação de que estava a ver um filme Disney, sanitizado para um público de 13 anos. Até a prata age sobre ele como a kriptonite no Super-Homem. Não há uma única cena que não passe este crivo infanto-juvenil. Toda a gente pode ver à vontade. Não há aqui nenhum empalamento ou outra malfeitoria mais desagradável.
Mas pelo contrário, e incompreensivelmente, a cena em que Vlad bebe o sangue da mulher que ama (a pedido dela e em circunstâncias completamente heróicas) não podia ser mais absurda. Esta era a cena que devia ter sido romântica. Ela é a grande paixão da vida dele. A sua esposa, a mãe do seu filho. E está a morrer. Vlad atira-se-lhe ao pescoço como um lobisomem. Não, não, não. Está tudo errado neste filme. Tudo. Errado.
O fim é decalcado de “Drácula de Bram Stoker”. Só falta a frase “atravessei oceanos de tempo para te encontrar” mas há outra semelhante.
De repente aparece o primeiro vampiro (o que criou Drácula) não se percebe muito bem de onde nem porquê, com a ameaça mais assustadora do filme: uma sequela. Este filme nem devia ter visto a luz do dia quanto mais uma sequela!
Não percebo mesmo qual foi o objectivo deste filme. Não foi um bom Vlad, não foi um bom Drácula. Foi uma manta de retalhos de filmes anteriores e bem melhores. Vi porque sou vampiro-dependente. Não aconselho a ninguém.
Só por causa dos actores, que bem se esforçaram em dar vida a este enredo estapafúrdio, dou
11 em 20
sábado, 17 de novembro de 2018
The Colony / A Colónia (2013)
Durante a primeira hora deste filme pensei que ia ver algo de muito bom. O final desaponta. Custa-me avaliar “The Colony” de forma negativa devido a essa primeira hora em que estive verdadeiramente interessada. Neste caso, mais vale fingir que não vi o fim.
Num futuro próximo, o aquecimento global provoca uma nova Idade do Gelo. Para sobreviver, a humanidade refugia-se em colónias subterrâneas, onde existem outras ameaças para além do planeta glacial do exterior. A comida é escassa e racionada. A doença propaga-se mais depressa no ambiente fechado e dizima os poucos sobreviventes.
Os doentes são colocados em quarentena. Na falta de melhoras, é-lhes oferecida a escolha de “dar uma volta” lá fora ou ser executado com um tiro. Na colónia 7, onde se passa a acção, o braço direito do homem que comanda passa logo à execução dos desgraçados, sem dar escolha. O chefe da colónia, (Laurence Fishburne, o Morpheus de “The Matrix”) discorda destes métodos mas já não tem coragem, ele próprio, de disparar contra as pessoas doentes e deixa a “tarefa” nas mãos do outro. Tudo isto já é muito dramático e intenso e promete conflito ético que baste para o filme todo.
Neste momento, a colónia 7 recebe um pedido de socorro da colónia 5, seguido de silêncio. Um grupo de auxílio parte imediatamente, percorrendo uma grande distância na neve. Quando chegam à colónia 5 encontram um bando de canibais que está em processo de comer todos os habitantes. O grupo de socorro não está preparado para uma ameaça destas. Conseguem escapar mas ingenuamente deixam um rasto de pegadas na neve que guia os canibais direitinhos à colónia 7. Segue-se o confronto.
No seu início, A Colónia lembra-nos vários outros filmes. Desde logo, “The Thing”, pelo ambiente gelado e opressivo. E “The Road” e “The Walking Dead”, por causa dos canibais, ou “30 Dias de Noite”, ou “O Dia Depois de Amanhã”. Muito prometedor. A cena em que o grupo de socorro chega à colónia atacada é verdadeiramente arrepiante. As “pancadas” que se ouvem ao longe lembram-nos inconscientemente o barulho de um talhante a cortar carne mas só percebemos quando vemos. Muito bem feito.
Se o filme tivesse acabado aqui, não tinha nada de mal a dizer. Infelizmente, todo este potencial é desperdiçado quando o confronto final transforma “The Colony” num vulgaríssimo filme de acção. Com algum gore pateta, devo mesmo dizer. Um dos habitantes da colónia bate tanto com um pé de cabra na cabeça de um canibal que esta já devia estar feita em puré, e mesmo assim ele não morre.
O que me leva à queixa principal. A certa altura um dos personagens da colónia 7 diz aos outros que tencionam fugir: “Se conseguirem sobreviver lá fora não conseguem escapar àquelas coisas.” E tem razão, porque o bando de canibais é coisificado. Melhor, é monstrificado. Não são vampiros nem zombies, são seres humanos, mas é-lhes retirada toda a humanidade. Ao fazer isto, o filme torna-se numa guerra entre bons e “monstros”, quando podia ser outra coisa muito mais profunda (“The Road”). E foi uma desilusão.
Aconselho, mesmo assim, a primeira hora do filme.
Nota para os amantes do “Sobrenatural”: neste filme aparecem duas caras conhecidas desta série. Julian Richings, que fez de Morte (uma das melhores interpretações da Morte, se não a melhor, que eu já vi em cinema ou televisão). E Lisa Berry, a Ceifeira Billie. Ambos memoráveis. Pena que neste filme os actores não tenham tido papéis tão bons. De tudo o que faz “Sobrenatural” uma série sólida, a qualidade dos actores e das suas interpretações contribui grandemente para o nosso deleite.
Quanto a “The Colony”, queria dar mais mas só posso dar
13 em 20
sábado, 3 de novembro de 2018
World War Z / WWZ: Guerra Mundial (2013)
O grande problema deste filme de zombies é que não tem zombies. Há um vírus tipo “28 Dias Depois”. Assim que alguém é mordido por um infectado, transforma-se em “zombie” em 12 segundos. 12 segundos! Nos casos mais demorados, 10 minutos. Não, isto não são zombies. Um zombie é um cadáver que come vivos. Estas pessoas não são cadáveres porque nunca chegaram a morrer.
Pior um pouco, em vez de ficarem mais lentos, os supostos cadáveres adquirem tanta força e velocidade que se nota perfeitamente que algumas imagens foram aceleradas por computador. Estes “zombies” são mais Incríveis Hulks ou algo do género.
E depois temos o enredo. Um ex-agente das Nações Unidas (nunca sabemos o que ele fez ao certo, excepto que era um durão), Brad Pitt (isto é, “Gerry Lane” interpretado por Brad Pitt, mas quem é que se interessa do nome do personagem quando Brad Pitt está no écran e não se chama “Louis”?), retirado da vida activa para se dedicar à mulher e duas filhas, uma destas com asma (mas isto nunca tem importância nenhuma), é o típico ex-militar dos filmes de acção que decide merecer o repouso do guerreiro. O personagem não passa disso, um Action Man a fazer de bom marido e pai extremoso. Como acontece nos filmes de acção, por razões e acasos ele acaba por ser chamado de volta ao seu trabalho quando há uma crise. E resolve-a. E aqui temos o enredo de filme de acção que já vimos ad nauseam.
World War Z até tem umas cenas interessantes no princípio, a lembrar o melhor de "The Walking Dead" e "Fear the Walking Dead". (Faço um parêntesis para realçar como "The Walking Dead" se tornou o mais alto patamar de comparação em tudo o que toca a zombies. Tirando o primeiro filme de George Romero, “A noite dos Mortos Vivos” de 1968, realmente não vi melhor e há que admitir.) São as cenas em que se percebe que algo está mal mas ainda não se sabe o que é. Como aquele engarrafamento em que a família está dentro do carro e começa a ver motos da polícia a avançar por entre o tráfego e transeuntes aterrorizados a fugir na direcção inversa.
Infelizmente, toda esta tensão se perde quando o protagonista observa um “mordido” a transformar-se em “algo” (recuso dizer zombie) em apenas 12 segundos. Catrapás, já estás! A partir daqui o filme torna-se num daqueles enredos em que um herói é enviado a várias partes do mundo à procura do paciente zero, de uma vacina ou de uma cura. Torna-se definitivamente um filme de acção. Como bom filme de acção, não morre ninguém importante. Afinal, o herói tem de salvar a família para que tudo acabe bem.
Entretanto, vi supostos zombies a correr mais depressa do que os vivos, a escalarem muros e arranha-céus (!) tipo formigas umas atrás das outras, e a morderem tudo e todos sem nunca pararem para comer alguém. Mas que?!... Será que as pessoas que fizeram o filme alguma vez viram um filme de zombies? Sim, viram. Na verdade, sendo um filme de 2013, em que "The Walking Dead" já liderava audiências, se calhar até nem queriam fazer um filme de zombies, mas os zombies já estavam na moda e aqui está isto. Um filme que eu vi no engodo de ter zombies. Se me dissessem que era um filme de acção com pessoas infectadas por um vírus raivoso talvez não visse, pois não?
A este filme falta tudo o que é preciso para meter medo. É verdade, as últimas cenas são tensas, mas como já sabemos que ali está um típico herói de acção ninguém acredita que lhe aconteça alguma coisa. Afinal, ele tem de salvar o mundo!
O que nos mete medo, no zombie, é o horror de um cadáver humano que se reanima, podre e malcheiroso, para comer os vivos. (Simboliza, a bem ver, o horror da própria morte. Todos somos cadáveres a prazo). O que temos em World War Z são pessoas infectadas com um vírus raivoso. Sendo assim, preferi “28 Dias Depois”. Pelo menos é mais original. Os apreciadores de zombies não perdem nada se ignorarem World War Z.
12 em 20
sábado, 27 de outubro de 2018
Sanctum (2011)
Um grupo de espeleólogos aventureiros monta uma operação num complexo de cavernas inexploradas. A princípio está tudo tão bem organizado que até parece turismo de aventura. Até que um ciclone inesperado inunda as cavernas. A partir daqui os mergulhadores presos na gruta ficam com a saída bloqueada e começa uma desesperada luta pela sobrevivência. Este filme é inspirado em acontecimentos reais.
Por alguma razão, pensei que Sanctum ia ter ameaças sobrenaturais. Devia estar a confundir com outro parecido, The Descent. Sendo assim, é apenas um filme-desastre com elementos de terror, um terror muito velhinho: o de ser enterrado vivo. Enterrados vivos já estão todos, dentro de um sistema de grutas sem conhecerem a saída. Ou morrem por falta de oxigénio ou morrem afogados. A grande experiência destes espeleólogos não é suficiente na luta contra as cavernas. As mortes não são gratuitas.
O filme é muito competente a mostrar-nos a urgência, o perigo, a claustrofobia dos espaços apertados dentro e fora de água. É daqueles filmes que nos deixam sem fôlego porque temos a tendência de conter a respiração quando os personagens estão a mergulhar sem oxigénio.
As personagens não são fascinantes mas é impossível não torcerá por Josh, filho adolescente do espeleólogo principal, o único que não está ali de sua vontade mas porque o seu pai acha interessante levá-lo com ele nas expedições como “actividade de férias”. Pobre miúdo. Do que percebemos do filme, a mãe do miúdo já não é viva, ou o pai do miúdo estaria em mais apuros fora da gruta quando ela soubesse a que perigos aquele pai anda a expor o filho.
Tirando esta relação pai-filho, não há muito mais para comentar a nível de personagens. Os sobreviventes tentam desesperadamente encontrar outra saída, a caverna continua a inundar-se, os espaços são cada vez mais apertados, o material e os alimentos começam a ser perdidos no percurso ou a ficar inutilizados. O desastre é inevitável. Resta saber quem sobrevive.
E afinal não é necessária a ameaça sobrenatural. Basta o instinto de sobrevivência que acaba por virar uns contra os outros, tornando uma má situação numa situação ainda pior.
É um filme que vai agradar aos amantes de aventura que também gostam de terror (algumas mortes são bastante chocantes). Um daqueles que nos deixa agarrados ao écran do princípio ao fim.
15 em 20
Nota: Este filme teve ainda mais impacto em mim depois do recente incidente na Tailândia. Agora percebo que tipo de estreitos eles tiveram de vencer, debaixo de água, em que tinham de retirar o equipamento para passar. Não é para amadores. Aqueles miúdos tiveram mesmo muita sorte.
sábado, 20 de outubro de 2018
Ugetsu / Contos da Lua Vaga (1953)
O cinema japonês clássico é uma das minhas paixões “secretas”. Não sei explicar porquê. Talvez porque são sempre relatos de crueldade e servidão em que a sensibilidade sobressai de forma mais pungente do que nos filmes ocidentais. Uma sensibilidade muito japonesa que ainda se nota nos filmes modernos, até nos de terror.
Tenho a certeza de que já tinha visto “Contos da Lua Vaga”, filme de Kenji Mizoguchi de 1953. (Recordo-me de um ciclo de cinema japonês que passou na RTP2 há muitos anos, em que vi bastante filmografia da época.) Deve ter sido há demasiado tempo para lembrar e voltei a ver. Não me arrependi.
Não são filmes para toda a gente. Quem não conseguir abstrair-se do preto e branco e da actuação exagerada dos actores (como se estivessem no teatro), ou quem não conseguir “entrar” na cultura que serve de pano de fundo, dificilmente gostará do género. Nada aqui é Hollywood, e ainda bem.
“Contos da Lua Vaga” é um filme moral sobre a ambição e a ganância. Genjuro é um camponês pobre e humilde, casado e pai de um filho pequeno, que vive num casebre contíguo ao da sua irmã, Ohama, também casada com Tobei, igualmente camponês. A acção passa-se no século XVI, durante uma guerra civil. Genjuro domina a arte da olaria e aproveita a passagem dos exércitos para vender os seus trabalhos no mercado. Faz tanto dinheiro que nunca mais pensa nutra coisa. Por seu lado, o cunhado Tobei mete na cabeça que quer ser um samurai porque não quer ser pobre toda a vida. Ambas as esposas advertem contra a ambição em demasia mas, apesar dos riscos que correm em tempo de guerra, aceitam acompanhar Genjuro ao mercado para venderem mais olaria.
Fazem o caminho de barco, para evitarem os exércitos que andam a pilhar as aldeias, mas o rio também não é livre de perigos. Depois de avisados de que existem por ali piratas, Genjuro deixa a mulher e o filho em segurança, na margem do rio, e continua a viagem. Tobei e Ohama seguem com ele.
No mercado, fazem grande sucesso. A olaria de Genjuro é magnífica. Genjuro sonha em comprar sedas para presentear a sua esposa mas Tobei pega na sua parte e vai comprar uma armadura e uma lança que lhe permitam entrar ao serviço de um senhor da guerra. Ohama vai atrás dele, mas não o encontra. Perdida em terreno desconhecido, é emboscada por soldados que a violam. A cena da violação, que não se vê, é um dos exemplos desta sensibilidade nipónica de que falava a início. Ficamos na dúvida do que acontece, mas as dúvidas são esclarecidas quando um dos soldados lhe atira dinheiro como despedida. Acrescentado, ao abuso, injúria.
Entretanto, no mercado, Genjuro é abordado pela nobre dama Wakasa e sua aia que lhe fazem uma grande encomenda a ser entregue na casa senhorial. Quando Genjuro lá chega as coisas ficam estranhas. A dama Wakasa começa a seduzi-lo com cortesias e cantigas de requinte nobre e Genjuro não tem força para resistir. A aia ajuda-o a perceber o que tem de fazer: casar com Wakasa, imediatamente. Enfeitiçado, Genjuro esquece a mulher e o filho e fica sob o domínio de Wakasa. Nem repara, ao entrar na casa, que a entrada parece completamente abandonada. Sim, é uma casa assombrada. Wakasa, a aia, até as criadas, são todas fantasmas.
Entretanto, Tobei consegue tornar-se um homem importante ao serviço de um samurai. A sua única intenção é voltar a casa, para mostrar à mulher Ohama como está rico e prestigiado. Pelo caminho, os vassalos pedem-lhe que pare e descanse num bordel do caminho. Onde encontra Ohama, forçada à prostituição agora que ficou destituída de tudo pelos exércitos inimigos.
Ainda sob o efeito de Wakasa, Genjuro vai fazer mais compras para o seu novo lar quando encontra um sábio que o alerta. Incrédulo, descobre que todo o clã de Wakasa foi morto por inimigos e que a sombra da morte paira sobre ele também a não ser que fuja daquela assombração. Genjuro não consegue afastar-se do seu amor fantasma, mas permite que o sábio o exorcize. Quando ele regressa à casa senhorial, Wakasa está mais determinada do que nunca em levá-lo dali, agora que o considera seu marido, para a sua “terra natal”. Mas desta vez Genjuro está protegido do encantamento graças ao exorcismo que recebeu.
Não vou contar o fim. É digno de se ver e reserva ainda muitas surpresas. Os amantes do sobrenatural e do terror vão certamente gostar deste filme.
Para mais informações sobre o filme, em inglês, podem consultar o título original, Ugetsu.
15 em 20
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sábado, 13 de outubro de 2018
Frozen / Pânico na Neve (2010)
Três jovens são acidentalmente esquecidos num teleférico de uma estância de esqui. É noite, a temperatura é negativa, há uma tempestade de neve. Mas o frio não é o maior problema deles. Este é um daqueles casos em que o título português se aplica melhor do que o original. Sim, o frio é um problema também, mas o filme nunca se centrou na eventualidade de morrerem de hipotermia. Pelo contrário, se as temperaturas fossem assim tão baixas a história teria acabado muito mais cedo. Esquecidos no teleférico, a descoberto, pendurados a demasiada altura do chão, eles sabem que a estância de esqui vai ficar fechada a semana toda. Ninguém virá procurá-los. Não têm telemóveis com eles. Têm de sair dali ou morrerão de sede, de fome ou de frio, consoante as condições climatéricas a que ficarão expostos.
É um pouco incerto se a distância do chão é suficiente para saltar. Um deles tenta e parte ambas as pernas. Como se não fosse já uma situação terrível, de repente aparece uma alcateia de lobos atraída pelo sangue…
A premissa do filme é muito simples, mas as consequências são dramáticas. Este é um daqueles “podia acontecer a toda a gente” nas circunstâncias erradas. Não precisamos de investir muito nas personagens. O que conhecemos delas antes do acidente é suficiente para percebermos que não são excepcionais. São apenas pessoas normais apanhadas numa situação extrema em que têm de encontrar maneira de sobreviver.
E sim, existem alguns problemas de credibilidade neste filme. Por exemplo, que jovens desta faixa etária não levassem os telemóveis, mesmo arriscando-se a parti-los. Se fosse gente mais velha ainda acreditaria. Gente desta idade, não. Desde quando é que o risco de partir o telemóvel os impede? (Papá compra outro.) Mas de certeza que o filme arranjaria maneira de tornar os telemóveis inoperacionais (falta de rede) e ia dar ao mesmo. Por isso não considero uma falha significativa. Menos credível é que uma estância de esqui estivesse fechada desde domingo à noite até sexta-feira, isto é, a semana inteira, em plena época alta. Há sempre gente de férias, especialmente as pessoas que gostam de esquiar e que marcam as férias de propósito neste período. Isto já faz menos sentido. Mas a presença dos lobos, que também é estranha num local tão frequentado, até pode ser explicada por este lapso regular de actividade da estância. Uma estância, aliás, que devia ser encerrada por motivos de segurança. Bastou balançar um bocadinho o teleférico para saltar o parafuso principal que o mantinha preso à estrutura!
Mas nada disto é impossível e pode resultar de uma simples confluência de azares. Os nossos jovens estavam no sítio errado à hora errada. A partir do momento em que compreendemos a situação ficamos irremediavelmente agarrados ao filme. À medida que o perigo aumenta, temos de ver o final. É impossível não torcer por eles.
“Frozen” é um bom filme de “terror situacional”. Curto, tenso, sem desvios desnecessários, de um suspense de cortar à faca. Gostei e recomendo. O título é que podia ter sido mais bem escolhido.
Nota: os amantes de gore vão preferir ver a versão em DVD, que mostra cenas (não vou revelar de que tipo) que no filme original apenas se ouvem. Pessoalmente, bastou-me ouvir. Aplaudo a decisão de não cair na tentação de mostrar. Neste caso, Adam Green, o realizador, fez uma boa escolha em deixar certos pormenores à imaginação.
15 em 20
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sábado, 6 de outubro de 2018
Black Death / Morte Negra (2010)
O ano é 1348. O pano de fundo é o surto de peste bubónica na Inglaterra medieval. Eu esperava um drama histórico à volta da epidemia mas o filme anda mais no género Aventura a piscar o olho à Grimdark Fantasy.
O enredo é muito curto. A mando da igreja, um grupo de cavaleiros dirige-se para uma vila isolada em terreno pantanoso onde, segundo rumores, não só as pessoas são imunes à peste como existe um necromante que ressuscita os mortos. O que só pode significar que têm um pacto com o Diabo, obviamente. O objectivo do líder dos cavaleiros, Ulrich (Sean Bean, Boromir em “O Senhor dos Anéis” e Ned Stark em “Guerra dos Tronos”) é capturar e executar barbaramente esse herege. No caminho, alicia um jovem noviço como guia até à vila recôndita (Eddie Redmayne, que também conhecemos como protagonista da adaptação de ”The Pillars of the Earth”).
Chegando à vila em questão, é óbvio que algo de estranho se passa. Aqui não há pilhas de mortos a queimar ou enterrar. A igreja está abandonada ao pó e às teias de aranha e os residentes converteram-se ao paganismo. A pessoa mais importante da vila parece ser a bela Langiva (Carice van Houten, a Melisandre de “Guerra dos Tronos”). Obviamente, tem de ser uma bruxa.
O filme é brutal e cru do princípio ao fim. Morte não falta (natural ou provocada), violência muito menos, e outras nojices de revirar o estômago como os corpos cobertos de bubões purulentos. O filme salva-se à minha classificação de porno-tortura porque tem o bom gosto de não mostrar todos os pormenores tão explicitamente como podia ter feito. Nos instantes piores, a câmara afasta-se.
O que não quer dizer que este não seja um filme de violência gratuita, ou quase. Chegamos ao fim sem perceber qual era o objectivo. Afinal, por quem é que devíamos torcer? Os cristãos são fanáticos, maus e desleais. Os pagãos são desleais, maus e fanáticos. O jovem monge, o único que prometia ser uma pessoa decente, acaba tão mau como eles. A bruxa, afinal, é apenas uma curandeira que percebe de ervas e drogas. O piscar de olho à Fantasia, que o filme prometia desde o princípio, desfaz-se em explicações sherlockianas: não são ressurreições, são embustes (Teria sido muito mais interessante ter enveredado pelo sobrenatural.) O que sobra então deste filme? Todos são maus, a religião é má, a vida não é boa, a peste é pior. Tudo é negro como a peste.
Mesmo assim, o filme não é muito difícil de se ver graças ao bom gosto de evitar a porno-tortura. Promete mais do que oferece, mas oferece o bastante. No mínimo dos mínimos podemos regalar-nos com os cenários, o guarda-roupa, a fotografia. Tudo muito convincente do período histórico que representa, se não entrarmos em grande minúcia.
E os fãs da “Guerra dos Tronos” vão adorar o confronto entre este quase-Ned Stark e esta quase-Melisandre, disto tenho a certezinha absoluta. Eu, confesso, diverti-me.
13 em 20
O enredo é muito curto. A mando da igreja, um grupo de cavaleiros dirige-se para uma vila isolada em terreno pantanoso onde, segundo rumores, não só as pessoas são imunes à peste como existe um necromante que ressuscita os mortos. O que só pode significar que têm um pacto com o Diabo, obviamente. O objectivo do líder dos cavaleiros, Ulrich (Sean Bean, Boromir em “O Senhor dos Anéis” e Ned Stark em “Guerra dos Tronos”) é capturar e executar barbaramente esse herege. No caminho, alicia um jovem noviço como guia até à vila recôndita (Eddie Redmayne, que também conhecemos como protagonista da adaptação de ”The Pillars of the Earth”).
Chegando à vila em questão, é óbvio que algo de estranho se passa. Aqui não há pilhas de mortos a queimar ou enterrar. A igreja está abandonada ao pó e às teias de aranha e os residentes converteram-se ao paganismo. A pessoa mais importante da vila parece ser a bela Langiva (Carice van Houten, a Melisandre de “Guerra dos Tronos”). Obviamente, tem de ser uma bruxa.
O filme é brutal e cru do princípio ao fim. Morte não falta (natural ou provocada), violência muito menos, e outras nojices de revirar o estômago como os corpos cobertos de bubões purulentos. O filme salva-se à minha classificação de porno-tortura porque tem o bom gosto de não mostrar todos os pormenores tão explicitamente como podia ter feito. Nos instantes piores, a câmara afasta-se.
O que não quer dizer que este não seja um filme de violência gratuita, ou quase. Chegamos ao fim sem perceber qual era o objectivo. Afinal, por quem é que devíamos torcer? Os cristãos são fanáticos, maus e desleais. Os pagãos são desleais, maus e fanáticos. O jovem monge, o único que prometia ser uma pessoa decente, acaba tão mau como eles. A bruxa, afinal, é apenas uma curandeira que percebe de ervas e drogas. O piscar de olho à Fantasia, que o filme prometia desde o princípio, desfaz-se em explicações sherlockianas: não são ressurreições, são embustes (Teria sido muito mais interessante ter enveredado pelo sobrenatural.) O que sobra então deste filme? Todos são maus, a religião é má, a vida não é boa, a peste é pior. Tudo é negro como a peste.
Mesmo assim, o filme não é muito difícil de se ver graças ao bom gosto de evitar a porno-tortura. Promete mais do que oferece, mas oferece o bastante. No mínimo dos mínimos podemos regalar-nos com os cenários, o guarda-roupa, a fotografia. Tudo muito convincente do período histórico que representa, se não entrarmos em grande minúcia.
E os fãs da “Guerra dos Tronos” vão adorar o confronto entre este quase-Ned Stark e esta quase-Melisandre, disto tenho a certezinha absoluta. Eu, confesso, diverti-me.
13 em 20
sábado, 29 de setembro de 2018
Zero Dark Thirty / 00:30 A Hora Negra (2012)
“00:30 A Hora Negra” é a reconstrução realista da caça ao homem que resultou no assassinato de Osama Bin Laden em 2011. Baseado em testemunhos de pessoas envolvidas, acompanha os operacionais da CIA envolvidos na busca de uma década que terminaria em Abbottabad, Paquistão, onde o terrorista mais procurado do mundo se encontrava escondido.
O filme é isto e pouco mais do que isto. Quase um documentário. Os personagens nunca são aprofundados para além dos seus papéis profissionais. Se calhar porque se baseiam em pessoas reais, heróis americanos, e ainda era/é muito cedo para os mostrar como seres humanos? Talvez. O filme apresenta-nos os factos como eles se passaram, desde a tortura utilizada em prisioneiros nos anos de George W. Bush até à abordagem mais soft da administração Obama. Mas nunca se tenta moralizar o que vemos no écran. Não é esse tipo de filme. Este é um filme para quem quer conhecer mais pormenores do que realmente se passou em Abbottabad e como é que a CIA lá chegou.
É impossível não apontar as semelhanças com “Homeland”. Tal como na série, muito do jargão e técnicas de espionagem caem-nos em cima sem que ninguém os explique. Cabe ao espectador fazer o esforço de acompanhar. Se calhar não teria percebido tanto do filme se não visse a série. Assim, o filme pareceu-me quase um episódio de “Homeland”, apenas sem Carrie Mathison. Ou melhor, sem a Carrie Mathison bipolar, porque a protagonista, obcecada e frenética, lembra Mathison em tudo o resto.
Mas “00:30 A Hora Negra” não é um filme interessado em explorar personagens. É o que é, desde o 11 de Setembro à caça a Bin Laden e às pistas que levaram a CIA a encontrá-lo. Mesmo assim, esperava mais em termos factuais, nomeadamente as reacções das duas administrações da Casa Branca ao desenrolar dos acontecimentos. Sim, esperava ver os bastidores que conduziram a esta célebre foto:
O filme nunca nos mostra as presidências. Foca-se apenas na equipa de operacionais no terreno. Talvez seja muito cedo. Tenho a certeza de que ainda vamos ver uma melhor versão desta operação secreta, mais completa, por perspectivas mais humanas, quando tempo suficiente transformar as pessoas reais em personagens históricas. É uma questão de esperar.
(Este filme não tem nota porque não o encarei como entretenimento.)
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sábado, 22 de setembro de 2018
Assim Falou Zaratustra, de Friedrich Nietzsche
Eu sou Zaratustra, o Sem-Deus. Pois não sabeis que Deus está morto?
Afirmações destas devem ter sido muito chocantes em 1883, ano em que “Assim Falou Zaratustra” começou a ser publicado. (Apesar de não parecer, o livro está incompleto. Nietzsche tencionava publicar a conclusão.)
A filosofia de Friedrich Nietzsche influenciou todo o pensamento moderno. Mas será que ainda faz sentido ler “Zaratustra”, hoje em dia que somos tão pós-tudo que “Deus está morto” só nos induz um encolher de ombros?
Um livro para todos e para ninguém
Por paradoxal que pareça, “Assim Falou Zaratustra” é uma leitura tão acessível como difícil. A obra é apresentada como um romance fictício da vida de Zaratrusta (Zoroastro). Li algures que Nietzsche escolheu este profeta por achá-lo o primeiro a apontar que todo o conflito ético se baseia numa luta entre o Bem e o Mal. Não devia ser isto exactamente que pregava o Zoroastro original, mas serviu muito bem como modelo. Em “Assim Falou Zaratustra”, Nietzsche utiliza-o como uma quase-farsa, uma sátira ao Velho e ao Novo Testamento, às vezes fábula assumida (quando Zaratustra fala com os seus animais, a águia e a serpente, personagens importantíssimos que também falam). Que Nietzsche tem um ódio especial à religião, e ao cristianismo em particular, reflecte-se logo na afirmação chocante “Deus está morto”.
Chega a ser irritante de tanto que nos martela com isto. Na altura fazia sentido, mas penso que actualmente estamos tão além do pensamento religioso e tacanho em que Nietzsche batia que se torna um bocadinho demais.
Mas que Nietzsche e filósofos semelhantes tiveram influência nota-se ainda: nas pessoas que persistem, e que conheço pessoalmente, em passar um atestado de estupidez a toda a gente que tem tomates de admitir que acredita em algo de divino ou sobrenatural. Aguentem-se, filhos, eu também tive um grande choque quando percebi que inteligência não é sinónimo de sensibilidade. (Até me parece que são características tendencialmente opostas, o que me choca ainda mais.) Da mesma forma, queridos intelectos iluminados, nem só de Razão vive o homem. Mas se no tempo de Nietzsche fazia sentido “abrir os olhos”, hoje em dia já não há desculpa nenhuma e já não tenho paciência para estas manias de superioridade.
O que me leva ao grande tema do livro, o Super-Homem. Zaratustra prega o Homem-que-se-supera, e como o homem se supera constantemente, o Homem-que-se-supera é sempre o homem de amanhã. Por causa deste conceito de super-homem, o livro (e o pensamento de Nietzsche em geral) têm sido acusados de ter contribuído para a doutrina nazi. Admito que também li por causa disso, na curiosidade de saber de onde vêm as coisas. Agora que li, acho esta acusação injusta. É claro que percebo como é que o conceito pode ter sido interpretado assim, mas o livro é tão subjectivo que a interpretação também acaba por ser. Talvez fosse mesmo esse o objectivo. Por alguma razão o subtítulo de “Assim Falou Zaratustra” é “Um livro para todos e para ninguém”.
Afinal, a Fé não está morta
Eu confesso-me o “ninguém” do subtítulo. Muitas vezes não consegui compreender o contexto e a mensagem de algumas passagens. Faltam-me referências filosóficas, nomeadamente as mais próximas do tempo de Nietzsche e em que este batia com ardor. (A tradução que li, anotada, foi muito útil neste sentido.) Noutras passagens, Nietzsche fala de personagens-tipo da sua época que pura e simplesmente já não existem. Actualmente já nem nas igrejas há “adoradores da morte” cujo grande “objectivo” é morrer e ir para o Céu. Talvez apenas existam em seitas de pouca expressão numérica. As grandes instituições religiosas têm e querem ter um papel activo “neste mundo”. (Se deviam ter ou não, não é para aqui chamado agora.) Assim, admito que não apanhei muitas das indirectas, certamente deliciosas à época. Curiosamente apanhei outras, ainda mais obscuras, como aquele curto parágrafo em que Zaratustra faz uma piada ao Espiritismo. Até pensei que tinha percebido mal, mas a anotação confirmou. O que nos diz que nós compreendemos muito bem o que conhecemos e nos interessa. Mas muito do que Nietzsche fala neste livro já não é reconhecível para mim.
A somar a isto, o estilo satírico também me deixou na dúvida muitas vezes. A maior perplexidade surgiu-me na passagem sobre o eterno retorno. Não percebi mesmo se Zaratustra/Nietzsche estava a expor o conceito ou a gozar com ele. Nunca me preparo de antemão para ler um livro (nem mesmo para um livro de temas filosóficos complexos, como este é, porque gosto de pensar pela minha própria cabeça primeiro e só depois consultar as convenções) mas o conceito não me é desconhecido. Na verdade, cheguei a ele pela via espiritualista de inspiração oriental. Será que dizer isto faz com que Nietzsche (o anti-religião) ande às voltas na cova, ou o contrário? Não tenho resposta. O próprio posfácio do livro menciona o orientalismo no pensamento de Nietzsche como algo de incomum nos filósofos ocidentais da época.
Mas o conceito de eterno retorno é velho, muito velho. Veio do Oriente para os Gregos clássicos e chegou desta maneira ao pensamento filosófico ocidental, aparentemente “depurado” de espiritualices. Na minha opinião, só aparentemente. Dêem-se-lhe as voltas que dêem, o conceito nunca deixa de me parecer místico. Para um pensador aparentemente tão devoto à Razão que diz que Deus está morto, é uma tese paradoxal. Afinal, Zaratustra/Nietzsche passa o livro a criticar aqueles para quem “tudo está perdido, a vida não interessa, nada é novo” e aponta-lhes o homem-que-se-supera como objectivo último e grande esperança da humanidade. Mas se tudo se repete vez após vez, a Humanidade está destinada a correr sempre atrás do futuro sem nunca o atingir. Assim sendo, não têm razão aqueles para quem “tudo está perdido” e nada vale a pena, ou, pelo contrário, é a eterna busca que vale a pena? Mas acreditar que vale a pena é um acto de Fé, não de Razão. É acreditar que a Humanidade está destinada a evoluir e (também) que a Humanidade não regride mais do que já evoluiu.
Talvez a última parte da pregação de Zaratustra (incompleta) esclarecesse estes pontos sem sombra de dúvidas. Se é que precisam de ser esclarecidos. Para mim bastaram e achei “Assim Falou Zaratustra” uma leitura muito válida e provocadora ainda nos dias de hoje. Com algumas ideias concordei veementemente, de outras discordei furiosamente. Aqui e ali fez-me rir. E sobretudo fez-me pensar. Não sei se pensei o que Nietzsche queria que pensasse mas este também já não é o tempo de Nietzsche. Às vezes perguntei-me se ele não estava a dizer algumas das coisas que disse só para provocar. Porque são estes os nossos tempos. Os tempos dos “grandes desprezadores”. Como grande desprezadora que sou, talvez eu e Zaratustra pudéssemos ter sido bons amigos. Daqueles que andam sempre às turras. Eu também teria uma coisinha ou duas para lhe martelar aos ouvidos.
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sexta-feira, 7 de setembro de 2018
New Moon / Lua Nova (2009)
Segundo capítulo das aventuras de Edward o-vampiro-que-cintila e Bella a-rapariga-que-só-pensa-no-Edward.
(Relembro que li o primeiro livro da saga Twilight, e a partir daí decidi ficar-me pelos filmes. Esta crítica será apenas ao filme.)
Um dos motivos porque a saga Twilight foi tão mal recebida pelos verdadeiros amantes de vampiros foi na verdade um equívoco gerado pelo marketing à série. Um desfasamento de expectativas. Embora tenha elementos sobrenaturais, Twilight pertence mais ao género romântico do que a qualquer outro. O facto de ter vampiros e lobisomens é quase irrelevante. Se os substituíssemos por grupos rivais o enredo seria exactamente o mesmo. Esta é, acima de tudo, uma história romântica, e os amantes de horror que não apreciam o género romântico não vão encontrar aqui satisfação.
As minhas razões para continuar a seguir a saga são mais obcecadas. Sou de tal forma uma viciada em vampiros que muito raramente consigo resistir e vejo tudo: do muito bom ao muito mau. Para quem não é alérgico a histórias românticas, a saga Twilight vê-se.
Sempre desconfiei de vampiros que brilham
Depois dos acontecimentos do primeiro livro, que puseram Bella em perigo, Edward decide finalmente fazer a coisa certa e deixar de andar atrás de miúdas de liceu. Mas fá-lo mal. Em vez de revelar os seus verdadeiros motivos, arma-se em “todo-bom” e diz a Bella que esta não é digna dele. Grande estafermo. Eu já não gostava do Edward, mas neste filme começo mesmo a detestá-lo. Sem mais explicações, desaparece, deixando a miúda bastante deprimida por uns meses. Mas na verdade Edward não rompeu completamente, como devia ter feito se era mesmo esse o objectivo. Continuou em contacto com Bella através da ligação psíquica, o que pessoalmente achei de muito mau gosto. (Se vais, vai. Não vás pela metade.) Desta forma, nunca lhe permite recuperar e ultrapassar a relação. O que é mais grave, Bella fica à mercê dos inimigos dos Cullen, na ausência destes, e começa a ser perseguida por vampiros vingativos. Outra má onda. Não a deviam ter deixado sozinha nestas circunstâncias. Nomeadamente Edward sabe o que se passa (através da tal ligação psíquica) e nem isso o leva a mexer o traseiro para ir resolver problemas que são da família dele. (Estão a ver porque é que o detesto?)
Vampiros vs lobisomens
Felizmente, Bella torna-se mais próxima de Jacob, o índio. Admito que sempre gostei deste personagem. Sempre que ele aparecia no livro original, era uma lufada de ar fresco. Jacob parece ser o único que pensa e diz coisas com pragmatismo, e além disso tem sentido de humor. É difícil não torcer por ele. (Mas só aqui entre nós acho que a Bella não o merece.)
Quando se aproximam, Jacob ainda não sabe que é lobisomem. Mas atingiu a idade e as transformações começam a acontecer. (Coitada da Bella, também admito que não pode haver rapariga mais azarada. Ou se apaixona por vampiros ou lobisomens.)
Os lobisomens de Twilight, à semelhança dos vampiros, também não obedecem aos cânones. Não precisam da noite nem da Lua Cheia para se transformarem. Não sei se o livro explica melhor, mas fiquei com dúvidas. Conseguem transformar-se quando lhes apetece ou apenas quando se enfurecem? A Lua Cheia terá alguma influência, ou nenhuma? E até que ponto têm consciência humana na fase lobo? Se percebi bem, são responsáveis por alguns homicídios que a polícia da terra andava a investigar. Mas Jacob parece reconhecer Bella na fase de lobisomem, o que é problemático do ponto de vista da consistência. (Se como “lobo” tem este grau de consciência, também é responsável pelos homicídios.) Também não cheguei a perceber porque é que há rivalidade entre vampiros e lobisomens. O filme não explica, simplesmente apresenta como facto. Nos Diários do Vampiro, pelo menos, são apresentados como inimigos naturais porque uma dentada de lobisomem mata um vampiro. Aqui, não percebo qual é a rivalidade (e não me quero pôr a conjecturar). Afinal, não são todos monstros? Até deviam dar-se bem, penso eu. No primeiro livro/filme já havia aversão dos índios para com os Cullen, mas pensei que se devia apenas a saberem que eram vampiros. Afinal a aversão é outra.
É Jacob que lá está quando é preciso salvar Bella. Começa a estabelecer-se entre eles uma relação maior do que amizade. E eu a torcer por ele, obviamente.
Mas a relação não chega a ter tempo de se desenvolver. Em busca de adrenalina, e porque é jovem e não pensa (e para tentar que Edward a contacte psiquicamente), Bella decide mergulhar de um penhasco. Alice, a irmã adoptiva de Edward e vampira médium, tem uma visão deste mergulho e julga que Bella se tentou suicidar. Aqui acontece uma peripécia um bocadinho forçada. Sem confirmar que Bella está morta, Edward acredita apenas na visão de Alice e decide ir entregar-se a um clã de vampiros na Itália, os Volturi, que matam aqueles que quebram as regras. A primeira de todas é que os vampiros não devem expor-se aos seres humanos (brilhando ao sol). Nesta tentativa de suicídio à Romeu (porque não consegue viver num mundo onde Bella não viva), Edward decide quebrar as regras para que o matem. Mas eu acho isto um pouco precipitado. A própria Alice diz que nem sempre vê tudo. Porque é que o Edward acredita numa visão sem se certificar? Pelo menos ia ao funeral, não? Mas assim é mais dramático.
Bella e Alice chegam mesmo a tempo de o salvar, mas os tais Volturi exigem que ela seja transformada porque sabe demais. Isso, ou morta. Mais uma vez, Edward arranja-lhe problemas. Bravo, Edward vampiro-brilhante! E a Bella deixou o Jacob para isto!
Estes Volturi lembram-me os vampiros de Anne Rice, no tempo do coven do Cemitério dos Inocentes e do Teatro dos Vampiros. A qualquer altura, esperava que o vampiro Armand entrasse pela sala.
Armand, Lestat e Louis não estavam disponíveis para participar no filme.
Tal como os vampiros de Armand, também estes se julgam a autoridade vampírica e gostam das suas regrazinhas. São os piores. O filme consegue um momento de quase-terror quando um grupo de turistas é guiado para dentro do palácio dos Volturi para lhes servir de refeição. Como é que eles explicariam todos estes desaparecimentos, pergunto-me? Levantar suspeitas também é contra as regras. Mas o filme não é sobre isto.
O facto é que Bella quer ser vampira. Desde o início do filme, não fala de outra coisa. Até me perguntei: mas esta miúda nunca leu Anne Rice? Aparentemente não, porque no mundo de Twilight não existem as Vampire Chronicles. Bella não quer ser vampira para ser imortal, nem para ser jovem para sempre, nem para ter poderes especiais. Nada disso. Bella quer ser vampira para ficar mais próxima de Edward. A princípio ele rejeita a ideia (única coisa em seu favor) mas acaba por concordar (lá se foi a coisa).
E assim terminaram duas horas de filme. Não imagino quando verei a continuação. Acompanho por uma questão de curiosidade e cultura “geral”, como acompanhei o Harry Potter. (De outra forma, como é que ia perceber as referências culturais da gente mais nova?) Comparando entre ambos os fenómenos, desgosto menos do Twilight. Pelo menos tem vampiros. E pronto, é só isto.
13 em 20 (ponto extra porque os Volturi me lembraram outras vampiragens)
sexta-feira, 31 de agosto de 2018
Stranger Things
(crítica à primeira temporada)
!! CONTÉM ALGUNS SPOILERS, NÃO REVELA O FINAL !!
Às vezes temos surpresas. Quando uma série nos chega muito bem recomendada como uma das melhores da década, senão de sempre, criamos expectativas que por vezes nos desiludem. Ou não. Breaking Bad foi-me apresentada como uma série extraordinária e imperdível, e confesso que não fiquei entusiasmada. Drogados a vender speed? Achei que não era para mim. E no entanto adorei. Também Stranger Things me chegou altamente recomendada e despertou-me logo o interesse. Ambiente e música dos anos 80, um monstro, uma miúda com poderes especiais, experiências ultra-secretas em instalações militares. Isto é mesmo para mim. Ou assim pensei. Infelizmente, a série não me encheu as medidas.
Fiquei desiludida, mas a culpa não é da série. Pensei que era uma história sobre um monstro que por acaso envolvia miúdos. Afinal, é uma história sobre miúdos que por acaso envolve um monstro. Fica o alerta. Isto não é puro terror. Podia ter sido, mas tirando algumas cenas perturbadoras (e muito breves) pode perfeitamente passar como série para ver em família. Seriam mais problemáticas, neste aspecto, algumas passagens de “quase-sexo” entre adolescentes do que o aparecimento do próprio monstro.
Percebe-se melhor quando se sabe que Stranger Things é feita de homenagens. Nem falo de influências, são mesmo homenagens descaradas. A mais evidente de todas é o grupo de miúdos com bicicletas que escondem a miúda com poderes especiais. (E.T.) Muitas das referências são a Spielberg, incluindo “Tubarão” por estranho que pareça. Não sou grande apreciadora de Spielberg, o que explica perfeitamente a minha reacção de enfado. Aliás, é bastante interessante que uma série com tantos momentos de enfado consiga mesmo assim ser viciante. Não vou negar, viciou-me. É um produto feito para binge watching e resulta. É preciso muito auto-controlo para não ver os oito episódios de enfiada.
Mas é curioso, porque achei os dois primeiros episódios aborrecidos e o facto de serem longos (50 minutos ou mais) também não ajuda. Mas depois de ver o segundo episódio só consegui parar ao sexto.
É difícil escrever sobre uma série que vive do suspense para agarrar o espectador sem revelar spoilers, e tentarei não o fazer. Logo no primeiro episódio, um monstro escapa do que parece ser um laboratório militar. Nesse mesmo dia, do mesmo laboratório, escapa também a miúda com poderes especiais. Nesse mesmo dia, um dos miúdos do grupo das bicicletas desaparece misteriosamente. A partir daqui tudo é spoiler.
Os colegas que toda a gente teve
Como não quero revelar spoilers, vou falar antes das personagens. O maior problema para mim, nesta série, é mesmo a incapacidade de me interessar por elas. O que torna a maior parte do primeiro episódio numa seca só entrecortada pelas breves cenas do laboratório e de Eleven (a miúda com poderes). Os miúdos são normais. Sim, são um bocadinho geeks, mas são completamente normais. Vidas normais, pais normais, bicicletas normais, jogos de Dungeons&Dragons normais. Ver estes miúdos 15 minutos seguidos é demais para mim.
Depois temos uma sub-história de adolescentes igualmente normais. Nancy (irmã mais velha do protagonista Mike) namora com um miúdo popular, Steve, que quer ir para a cama com ela. Nancy não quer, mas depois já quer, e depois convida uma amiga (Barbara) para fazer de pau-de-cabeleira numa festa na casa de Steve, mas a meio da festa manda Barbara embora para poder ir para a cama com Steve. Oh Céus, poupem-me! Sei que isto que vou dizer não vai ser consensual porque Nancy se tornou numa das personagens preferidas de muitos fãs, mas eu DETESTO esta sonsa! Nem três dias depois de perder a virgindade com o tal Steve já estava mais interessada no Jonathan (irmão mais velho do miúdo que desapareceu). Ninguém diria ao olhar para ela, com aquela roupinha foleira de menina queque, muito certinha, que não parte um prato. Toda a gente teve uma colega assim naquele tempo, e irra, detesto sonsas. Mas há algo também na actriz. Se calhar até a cara dela me irrita.
A personagem Barbara foi muito maltratada pela série. Talvez nem os próprios criadores tivessem noção do impacto que ela ia ter. Barbara era a típica adolescente dos anos 80 que ainda não se sabia valorizar. Óculos grossos, peso a mais, vestida como se tivesse o dobro da idade. Mas a aparência física é irrelevante fora do mundo juvenil do liceu. Barbara é responsável, sensata, e acima de tudo é uma boa amiga. Uma amiga que não merecia ser tratada como Nancy a tratou. Tudo nela a torna uma personagem simpática de quem conseguimos gostar. Sem querer desvendar muito, Barbara mal apareceu na série e deixou uma impressão inesquecível. Se calhar porque toda a gente também teve uma colega assim e o efeito nostálgico é mais forte.
Mas Jonathan é o adolescente mais interessante. Habituado a uma vida complicada, é o único que transcende a vulgaridade da terrinha em que vive. Jonathan é o tal que ouve Joy Division e que traz a música alternativa para a série. Pena que goste da sonsa da Nancy. Mas é preciso dar tempo ao tempo. O puto só deve ter 18 anos e horizontes ainda muito limitados àquilo que conhece. Merece melhor, mas vai ter de procurar fora daquele buraco de banalidade. Também tive colegas assim. A maioria saiu do buraco.
Os adultos, felizmente, não são aborrecidos. Quando já me estava a passar com tanto drama (e marmelada) adolescente, as cenas com os adultos salvaram-me do tédio total. Os dois protagonistas, a mãe do miúdo desaparecido e o xerife da terra, são personagens profundas e cativantes, com muito passado e bagagem emocional. Por mim, podiam desaparecer todos os adolescentes (menos o Jonathan, para ouvirmos Joy Division) e os miúdos, e a série podia ficar só com adultos. E mais dramática e com terror a sério.
Por esta altura devem estar a perguntar: mas e o monstro? Porque é que estamos a falar desta gente quando há um monstro? Era isto exactamente que eu dizia no início. A série é sobre esta gente e por acaso há um monstro. E como também já estou a bocejar outra vez só de falar nesta gente, vamos mas é falar do monstro.
O monstro
O monstro não me convenceu. Não é um grande spoiler revelar que é uma criatura de outra dimensão. Também fica imediatamente estabelecido, logo no primeiro episódio, que existe uma ligação entre o monstro e Eleven. Não pode ser por acaso que escaparam os dois no mesmo dia. (Eu tenho as minhas teorias quanto a isso, mas este é um mistério que continua na segunda temporada e não me cheira que a série siga pelos caminhos que estou a imaginar. Pode ser que me surpreendam.) A cena inicial, no laboratório, é bastante explícita quanto à natureza predatória da criatura. Mas há uma falha de lógica ainda não explicada que rouba credibilidade a este monstro. Aparentemente, na outra dimensão não existe nada para comer. Absolutamente nada. Se este é um monstro animalesco que precisa de comer, como é que sobrevivia no “outro lado”? E estava lá sozinho? Não havia mais monstros? Pensei, a princípio, que seria antes um “monstro de energia” fabricado pelos militares. Descobrir que era só um monstro “animal” desapontou-me. E como é que descobriu, assim que chegou a este lado, que as criancinhas são saborosas? E como é que aprendeu a farejar sangue à distância, como um tubarão (por causa da tal homenagem, só pode)? Há mais inconsistências destas que nunca são explicadas. Para uma espectadora como eu, que não está a ver a série por causa da nostalgia dos anos 80, as inconsistências foram-se avolumando a ponto de me desiludir. A primeira regra do terror é que tem de nos convencer para meter medo. Se algo mina a credibilidade começamos a desligar as emoções e o efeito perde-se. Não é por acaso que a única cena que me arrepiou foi aquela em que a homenagem é a Alien. Fiquei tensa na cadeira, abri mais os olhos, cheguei-me para a frente. Parei de respirar. Porque o extraterrestre de Alien, o filme original de Ridley Scott, é completamente credível e aterrador. À menor alusão gela-se-nos a espinha. Era este terror que eu esperava de Stranger Things e que de certa forma nos foi “prometido” na cena inicial da série. Pelo sexto episódio percebi que a história ia mesmo ser sobre os miúdos que querem matar o monstro com pedras e fisgas. Pior, comecei a temer que os miúdos o conseguissem. Felizmente, a série não enveredou assim tanto pela fantasia infanto-juvenil que me teria retirado imediatamente do público alvo. As promessas dos primeiros episódios são cumpridas.
Mais negro para a próxima?
Stranger Things podia ter ido mais fundo e mergulhado em águas mais negras. Por opção, não o quis fazer. Isto prejudicou sobretudo a melhor personagem da série, sobre quem mal falei por causa dos spoilers. Eleven é a verdadeira estrela da história. Vítima de condicionamento psicológico, Eleven só quer ser normal num mundo que para ela é alienígena. É por ela que sofremos, é por ela que torcemos, é sobre ela que tecemos teorias. O final da primeira temporada deixa-nos com um sabor amargo que só pode ser remediado na segunda.
Porque, é claro, há uma segunda temporada. E é claro que vou ver porque a série é excelente. Não é o que eu esperava mas é completamente irresistível. Li algures que os criadores prometem que a continuação vai ser mais negra. Será mesmo, ou é só publicidade enganosa? As promessas foram cumpridas mas as minhas expectativas não foram satisfeitas. A única maneira de tornar a série mais negra, como prometem, é sair do conforto family friendly da fantasia infanto-juvenil que tornou a série acessível a um público mais alargado. Pode ser que me engane mas duvido que se atrevam.
sexta-feira, 24 de agosto de 2018
The X-Files / Ficheiros Secretos 2018
E aqui estamos nós outra vez a falar dos Ficheiros Secretos, versão 2018. É a temporada 11, para quem já se perdeu.
Apesar de toda a minha indignação na crítica à mini-série / 10ª temporada de 2016, confesso que não a levei muito a sério. Como ali digo, “aconteceu-me um raro fenómeno de dissociação televisiva em que continuei a ver sem ver nada. Fui abduzida. O corpo ficou na cadeira em frente à televisão mas a mente já não estava lá.” Enfim, pensei eu, mini-série a apelar à nostalgia (e ao lucro fácil) que começa e acaba aqui. As reacções dos fãs foram semelhantes à minha e acreditei piamente que era a última vez que via o Mulder e a Scully.
Com este novo regresso, a que já chamaram “temporada” em vez de “mini-série”, levei o caso mais a sério. Então os Ficheiros Secretos iam voltar? Iam mesmo voltar, regularmente? Então é para ser bom. Não se admite outra coisa. E comecei a ver com uma maior expectativa que o primeiro “regresso” não me mereceu.
Logo no primeiro episódio, banhada. Toda aquela pandemia do vírus alienígena, o fim do mundo, tudo isso, bem, foi um sonho. [Como naquele famoso e infame episódio de Dallas, de que os leitores mais novos não se vão lembrar mas que é um clássico, em que uma temporada inteira desaparece com um sonho.] Tudo o que vimos na temporada anterior simplesmente não aconteceu. Era só a Scully a ter uma visão do futuro.
Aqui apeteceu-me logo atirar o comando ao écran. Mas acalmei-me. Racionalizei. Se calhar o Chris Carter não sabia se a série ia ser renovada e quis acabar em grande, com o fim do mundo. Sim, com um cliffhanger, mas em grande. E quando a série foi mesmo renovada, percebeu que não era exequível ou não tinha orçamento para continuar o enredo por ali e teve de retroceder. Racionalizei e aceitei. Se isso significava o regresso dos Ficheiros Secretos como os conhecíamos, um caso por semana, Mulder e Scully mais velhos, vinte anos mais tarde, enfrentando novos problemas pessoais e desafios diferentes, até perdoaria o começo desastrado. Porque, afinal, é disso que os fãs dos X-Files sempre gostaram: Mulder e Scully a investigarem casos estranhos, daqueles que nos fazem hesitar entre acreditar e não acreditar. Daqueles que fazem justiça ao slogan da série, I want to believe.
No baú do esquecimento
Esta temporada recordou-me tudo o que já não ia bem nos X-Files quando a série original chegou ao fim. A mitologia, que já não tinha pés nem cabeça. A conspiração, que já não fazia sentido. Mas pelo menos acabaram com a invasão alienígena: o planeta está tão estragado que os extraterrestres já não estão interessados em vir para cá. E aqui sorri. Nunca vi os Ficheiros Secretos à espera de comédia, mas não rejeito. E depois começaram a acontecer coisas estranhíssimas. Sabiam, ou lembram-se, que o Homem dos Cigarros era o pai do Mulder? Lembram-se de isso ser dito, implícita ou explicitamente, na série original? Porque eu não me lembrava nada. Absolutamente nada. E conforme fui lendo críticas aos episódios comecei a recordar-me das últimas temporadas da série que a minha memória tinha pura e simplesmente bloqueado. E lembrei-me que nos últimos tempos a série já não era nada de especial. Até houve uma temporada em que o Mulder esteve ausente! Substituído por um tal agente Doggett interpretado pelo actor de "Exterminador Implacável 2", Robert Patrick. Como é que me esqueci disto tudo? Bem, porque já era mau. É claro que vi, fielmente, mas a série já tinha passado o prazo de validade. Infelizmente, foi disso que esta temporada 11 me recordou e não é o tipo de memórias que queremos ter de uma das nossas séries favoritas. Nostalgia, sim. Do que foi bom, do que lembramos dos tempos áureos. A série não devia ter sido ressuscitada sem motivos épicos para a tirar do baú do esquecimento.
Mas também conhecemos William! Finalmente! Então o puto sempre existe! E não é filho do Mulder. Ficamos logo a saber, no primeiro episódio “My Struggle III”, que o Homem do Cigarro inseminou a Scully, drogada e inconsciente, com um embrião de ambos. Esperemos que a inseminação tenha sido artificial e já é repulsivo o bastante. Mas isto significa que durante este tempo todo o Mulder julgou que era pai de um filho que afinal é o irmão filho do pai. [Não resisti.] E irritou-me um bocadinho. Nunca fui muito apreciadora de terem transformado a relação entre o Mulder e a Scully num romance, admito. Mas fui-me habituando à dinâmica romântica entre os dois e fui-me afeiçoando à ideia de que algures no mundo tinham um filho. De repente, não têm. Nada nos adiantou tentar importar-nos com um miúdo que só vimos brevemente em bebé. Não é filho do Mulder e a Scully foi inseminada por violação científica. O “choque” não compensa a perda do investimento emocional. E faz-nos questionar o mais básico que um espectador nunca devia questionar: vale a pena investirmos emocionalmente nestes personagens? Porque o fim da temporada faz-nos suspeitar que não. Mas agora já me estou a adiantar.
Os bons motivos para uma continuação
Apesar disto tudo, a temporada 11 também me recordou o que me tornou fã dos Ficheiros Secretos. Alguns episódios foram bons, mesmo bons:
“Kitten” Centrado em Skinner e na sua experiência no Vietname, é um episódio à antiga, em que experiências governamentais com drogas alucinogénicas transformam pessoas pacatas em soldados sanguinários. Nada de sobrenatural ou alienígena, mas sempre interessante.
“Rm9sbG93ZXJz” Um episódio que podia ser um filme de terror salpicado de comédia. Num futuro mais ou menos próximo (?) Mulder e Scully vão comer a um restaurante japonês completamente operado por robôs. Depois de ser servido com um jantar horripilante, Mulder recusa-se a deixar gorjeta. Isto leva a uma conspiração entre todas as máquinas dotadas de inteligência artificial que perseguem Mulder e Scully atrás da gorjeta. Parece cómico mas tem momentos muito tensos. A sorte é que a inteligência das máquinas não é assim tanta. Mas faz-nos pensar até que ponto queremos inteligência artificial nas nossas vidas. Eu pensei em comprar um daqueles aspiradores redondos autónomos que andam de um lado para ao outro. Agora é que não compro mesmo! Um excelente episódio, o melhor da temporada na minha opinião.
“Familiar” Este episódio fazia mais sentido no Sobrenatural. Não sei até que ponto é que alguém decidiu que o regresso dos X-Files devia ser palhaçada. Funcionou muito bem com o Lagartomem da temporada anterior, episódio “Mulder & Scully Meet the Were-Monster”, mas para mim já não funcionou tão bem com “The Lost Art of Forehead Sweat” desta temporada, que supostamente devia ser cómico mas não me fez rir. “Familiar” é um episódio a roçar o mau gosto, em que no meio da palhaçada duas crianças são assassinadas e Mulder vê um Mastim do Inferno. No Sobrenatural fazem isto muito bem. Prova de que Sobrenatural é uma das séries mais subestimadas de sempre. Os X-Files tentaram fazer o mesmo e falhou ali qualquer coisa.
“Nothing Lasts Forever” Deste episódio gostei mesmo muito. Um culto procura a eterna juventude alimentando-se de carne e sangue de adolescentes e alguma ficção-científica. E resulta. O que os torna vampiros, nem mais nem menos. Uma diva dos anos 60 permanece jovem e bela como se tivesse vinte anos graças ao seu batido de sangue humano. Muito Erzsebet Bathory. Aconselhado a quem gosta de vampiros. Não aconselhado a pessoas de estômago sensível.
Com estes episódios, recordei o que gostava nos Ficheiros Secretos e vi uma verdadeira possibilidade de continuação. Mulder e Scully, com ou sem romance, a investigar casos estranhos. Sempre foi isto. Bastava só isto.
Mas entretanto aconteceu "Ghouli".
I want to forget
"Ghouli" foi o episódio que introduziu William e não podia ter sido mais disparatado. Começou com um monstro, mas afinal não era um monstro, era William, o filho perdido de Scully e Mulder, o personagem que todos ansiávamos conhecer, o salvador do mundo com o seu ADN alienígena. E estava morto. Mas afinal não estava morto, estava só a fingir-se de morto enquanto Skully chorava à sua beira. Ainda não estávamos refeitos do choque de descobrir que o episódio era sobre um personagem que devia ser fulcral, quando percebemos que William é um estafermo. Mas a série não percebe que William é um estafermo e segue em frente, episódio e temporada, como se nos devêssemos importar com este parvalhão. Entre as belas coisas que William nos mostra, consegue fazer com que as suas duas namoradas se esfaqueiem uma à outra (sim, duas namoradas, ao mesmo tempo). Quando os pais adoptivos são assassinados, não o afecta nada. E ainda diz a uma das namoradas que partilha visões com “uma mulher qualquer que deve ser a minha mãe biológica”. Não é um amor? Mas a série parece querer apresentá-lo como um rapaz interessante e incompreendido. Infelizmente, é apenas um estafermo. E a maneira como o episódio se desenrola é das coisas mais mal feitas que vi na vida. Como se fosse o script de uma história monster of the week em que o William foi metido à força porque não tiveram ideia melhor. É espantoso como uma série deste nível conseguiu destruir o personagem que devia ser o centro emocional da temporada.
Mas isto não é o mais grave. O mais grave é mesmo o fim.
Depois de algumas peripécias, em que Mulder e Scully nunca se apercebem de que têm por filho um estafermo, algo acontece que os leva a pensar que William morreu (mesmo). E aqui Scully tem uma reacção absurda. Depois de anos a agonizar pelo filho perdido, diz apenas: “Ele era só uma ideia, uma experiência de laboratório.” Como?! E Mulder diz esta pérola: “Que sou eu senão um pai?” Como?! Quando é que o Mulder foi um pai? Conheceu o miúdo durante cinco minutos. Trocou com ele cinco palavras. Mulder nunca foi um pai e Scully nunca diria do filho “deixa lá, a gente faz outro”. Ok, ninguém diria uma coisa destas de um filho, ponto final. Quem é que escreveu este diálogo e com que intenção? Porque eu quero esquecer o que vi e ouvi, de tão mau.
Uma coisa são episódios chochos. Outra coisa muito mais grave, como dizia acima, é transformar os personagens em marionetas de papel em que não se consegue investir emocionalmente. E fazer isto ao Mulder e à Scully, a quem conhecemos há mais de vinte anos, é imperdoável.
A temporada 2018 recordou-me o pior e o melhor dos Ficheiros Secretos. Mas o melhor não superou o pior, e é pena. Se é para trazer a série de volta, com pés e cabeça, porque não? Se é para destruir bons personagens e boas memórias, que esta seja a última vez que tenho de falar dos X-Files. De cada vez que tentam dar à série o fim que merece (e que nunca teve) conseguem fazer pior. Se é assim, como fã, prefiro que desistam. Que deixem a série repousar em paz.
domingo, 19 de agosto de 2018
Blog em obras
Após anos de resistência, finalmente decidi experimentar um template mais interactivo. Aqui está ele. Com mais funcionalidades, maior facilidade em seguir posts mais antigos, procurar por etiquetas, lista de updates dos blogs que sigo, essas modernices todas.
Não estou muito satisfeita com o resultado estético. Os templates disponíveis não deixam mudar tudo o que se deseja. Por exemplo, o título do blog. Nem sequer posso escolher pô-lo à direita, à esquerda ou ao meio. No texto e links abaixo dos posts também não consigo mexer. É frustrante.
Assim, o blog vai andar em obras até eu conseguir olhar para ele sem me chatear.
Como é tradição nacional, não é para fazer; é para ir fazendo.
Não estou muito satisfeita com o resultado estético. Os templates disponíveis não deixam mudar tudo o que se deseja. Por exemplo, o título do blog. Nem sequer posso escolher pô-lo à direita, à esquerda ou ao meio. No texto e links abaixo dos posts também não consigo mexer. É frustrante.
Assim, o blog vai andar em obras até eu conseguir olhar para ele sem me chatear.
Como é tradição nacional, não é para fazer; é para ir fazendo.
sexta-feira, 17 de agosto de 2018
Final Destination 2 / O Último Destino 2 (2003)
Não é todos os dias que podemos dizer que uma sequela é melhor do que o original. É precisamente o caso com O Último Destino 2. Neste, já não encontramos as falhas de lógica que prejudicaram o primeiro filme. Tudo é surpreendente e faz sentido. Mas conseguirão enganar a morte?
Nesta sequela, uma jovem tem a visão de um sangrento choque em cadeia. Petrificada, já não consegue prosseguir viagem, e assiste ao concretizar da sua visão: acidente na estrada, mortos e feridos. A primeira surpresa acontece logo com os amigos que a acompanham no carro. Julgamos que vão ser eles a ser perseguidos pela Morte quando subitamente um camião os cilindra a todos ainda no local do acidente. (Eu não esperava isto, confesso). Chega-se depois à conclusão de que desta vez a Morte está a corrigir o seu desígnio em ordem contrária: do último que devia morrer ao primeiro. O que torna a jovem da visão a última vítima.
Desta vez aparece também o cangalheiro sinistro, mas pelo menos já nos dizem que ele “sabe muito destas coisas”. Isto torna-o mais do que um cangalheiro e o personagem faz mais sentido do que fazia no primeiro filme.
O Último Destino 2 vê-se muito melhor do que o original. Se calhar ajuda a interpretação de A.J. Cook (que conhecemos de “Mentes Criminosas”, aqui tão nova e rechonchuda, no bom sentido, que me custou reconhecê-la). As mortes continuam a ser rebuscadas, mas não tão delirantes, o que só reforça a credibilidade.
Apesar de achar que este filme é melhor do que o primeiro, acabo por dar-lhe a mesma nota porque o princípio da série sempre tinha o ponto da originalidade.
14 em 20
sexta-feira, 10 de agosto de 2018
Land of the Dead / A Terra dos Mortos, de George A. Romero (2005)
O título deste filme podia ser “A Fúria do Herói Zombie”. Um dos heróis do filme é mesmo um zombie revoltado com a maneira indigna com que os vivos tratam os da sua espécie. O que por si só já nos diz que este não vai ser um filme de zombies igual aos outros.
Os novos zombies
É praticamente um facto sociológico: o imaginário do zombie, como o conhecemos, surgiu numa época de inquietação existencial perante a alienação das massas cada vez mais passivas. Os anos 60 e 70 foram as décadas em que a geração dos Baby Boomers chegou à idade adulta. Os Baby Boomers nasceram nos anos após a segunda guerra mundial (em que houve um verdadeiro baby boom, daí o nome). Em relação à geração anterior, que teve de suportar a Grande Recessão, o rescaldo da Primeira Guerra Mundial e a Segunda, e as várias misérias decorrentes da situação internacional, os Baby Boomers foram uns privilegiados. A vida era simples e o caminho bem definido: escola, emprego, casa e filhos. Os salários eram razoáveis, havia emprego para toda a vida. Toda a gente tinha carro e dinheiro para gastar no passeio semanal ao supermercado. Instalou-se o consumismo. A vida era estável. Melhor do que na geração anterior, melhor do que na geração seguinte (nós, os Generation X, e nem falo dos Millenials, nem sabemos o significado de estabilidade). Era a geração que se podia “dar ao luxo”. A vários luxos, na verdade, como a alienação voluntária do flower power e do make love not war. Mas até os hippies assentavam, mais tarde ou mais cedo, para engrossar as massas consumistas e alienadas de uma rotina sempre igual.
Contudo, o medo existia, latente, cinematograficamente espelhado nos filmes de terror: o Twilight Zone, as invasões alienígenas, os insectos gigantes resultantes de experiências nucleares, e os zombies. As próprias massas mortas vivas a devorarem-se/consumirem-se a elas próprias.
Comparemos estes zombies iniciais com o que temos agora. Em The Walking Dead, feito para gerações em que a palavra “estabilidade” já nem existe, o importante é sobreviver. Subsistir mais um dia, à precariedade, às contas a pagar, a tentar viver debaixo de um tecto sem acabar na rua. Sobreviver aos energúmenos que nos acusam de viver “acima das nossas possibilidades” quando na verdade vivemos abaixo das nossas potencialidades. Talvez sejamos zombies também, meio vivos e meio mortos de cansaço, a geração no future que já sabia que nunca o ia ter, mas somos uns zombies diferentes. Os nossos heróis anti-zombie já não se limitam a fugir e a esconder-se e a esperar pelas autoridades. Os nossos heróis anti-zombie só contam consigo próprios.
Land of the Dead, de 2005, é algo na transição entre os filmes de zombies invasivos e os filmes de sobrevivência feroz em que da sociedade como a conhecemos já só sobram resquícios. No apocalipse zombie as ameaças vêm de todos os lados. Os vivos são muito mais perigosos do que os mortos. Land of the Dead vai nesse caminho, mas ainda não chega lá.
Os zombies também se revoltam
Comecei a ver este filme com zero expectativas. O filme que iniciou o universo zombie de George A. Romero, “Night of the Living Dead”, de 1968, foi um dos mais assustadores que já vi na vida. Apesar de ser a preto e branco, ou mesmo por causa disso (a televisão da altura era a preto e branco, o que quase lhe atribuía uma aura de “documentário”); apesar da pouca caracterização dos mortos-vivos, dando-lhes um aspecto mais realista de “cadáveres frescos”; apesar da explicação de que a “ressurreição dos mortos” era causada por uma contaminação radioactiva no cemitério (lá está, o medo latente da Guerra Fria). Os restantes filmes de Romero, lamento dizê-lo, aqueles a cores e com muito ketch up, começaram a tender para o exagero e a palhaçada. Interessantes para ver sem pensar muito. Maus efeitos especiais, zombies a invadir supermercados e a conduzir carros. Com estas memórias, também não esperava muito de “Land of the Dead”. Tendo em conta estas expectativas fiquei agradavelmente surpreendida.
Em Land of the Dead, já estamos em pleno apocalipse zombie, com todas as regras que conhecemos. Mas ainda não é a sociedade esfarrapada de The Walking Dead. Os vivos vivem em cidades bem vedadas e defendidas. Equipas bem preparadas vasculham os arredores abandonados em busca de provisões. Numa dessas excursões de busca, o nosso herói “vivo” (Simon Baker do “Mentalista”) repara que um dos zombies manifesta inteligência acima da média zombiesca. Este nosso herói zombie, a que o filme chama Big Daddy, está cada vez mais indignado com os massacres que os vivos infligem aos zombies. Esquecendo, é claro, que os vivos matam os zombies porque os zombies comem os vivos. Mas este zombie está muito revoltado, se calhar com as indignidades com que os vivos chacinam zombies sem distinção: velhos, mulheres e crianças. Os outros zombies não são tão espertos, mas Big Daddy consegue liderar uns quantos numa marcha de indignados para se vingarem dos vivos “maus”.
Isto parece palhaçada mas o filme consegue fazer-nos empatizar com estes zombies maltratados. Até temos pena deles.
Do lado dos vivos também há grandes injustiças. Uma elite de poderosos, ricos e privilegiados, vive num arranha-céus com tudo do bom e do melhor enquanto uma maioria de pobres e excluídos subsiste das sobras nos “subúrbios” da torre. Também alguns destes excluídos se encontram indignados e a planear uma revolta. Estas intenções valem-lhes repressão brutal por parte do chefão das elites.
Este é um mundo onde o dinheiro ainda existe e vale bastante. Um dos membros da equipa consegue juntar o suficiente para comprar um lugar no arranha-céus mas é rejeitado com desculpas. Mas ele sabe, e nós sabemos, que está a ser rejeitado porque é hispânico. Não faz parte da elite, não tem qualquer possibilidade de ascender na vida. Revoltado, também este jura vingança. Já o nosso herói do lado dos vivos só deseja comprar um carro que o leve para bem longe, para onde não haja zombies nem pessoas. (Amigo, como te compreendo! Era exactamente o que eu fazia!)
Todo este ambiente de tensão resulta na destruição da cidade. O zombie Big Daddy aprende por acaso a disparar uma metralhadora e consegue ensinar os outros a fazer o mesmo. [Zombie Rambo] Também os ensina a atravessar um rio, simplesmente caminhando debaixo de água já que não precisam de respirar. [Zombie ninja] Não se vê claramente, mas é ele e o seu exército zombie que consegue fazer explodir as defesas da cidade. É a fúria do herói zombie.
O final é estranho. O nosso herói vivo, relutante mas bonzinho, decide poupar estes zombies espertos. Porque o faz é um mistério. Se calhar porque compreende neles uma consciência de si próprios? Se calhar porque os considera também excluídos, como a grande massa de gente viva nas mesmas condições?
Claramente, a preocupação social do filme já não deriva do consumismo e da apatia, como os originais, mas de uma preocupação com a desigualdade que em 2005 já deve ser gritante. A América já não era a terra das oportunidades. Até os zombies se revoltam, e com razão.
É um filme diferente dos zombies de até então, com algumas cenas perturbadoras que me surpreenderam. Já não julgava que depois de tantos filmes do género ainda alguma coisa me impressionasse, mas aquela cena do umbigo faz mesmo impressão.
The Walking Dead criou outro patamar de qualidade que filmes anteriores não conseguem alcançar (tirando o original “Night of the Living Dead”, de 1968, que é realmente arrepiante), mas este Land of the Dead é um filme cheio de acção que merece ser visto. Gostei de encontrar motivações em todos os personagens, até nos zombies. As diferentes perspectivas conseguem criar-nos empatia e dividir-nos entre a ameaça colocada pelos mortos-vivos e as dúvidas que Big Daddy nos suscita.
Não é uma obra prima, mas vê-se bem.
Curiosidade: neste filme os mortos-vivos já são chamados de “walkers” e “stenchers”. Julguei que “walkers” era originalidade de The Walking Dead, mas enganei-me. É do mestre Romero.
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