A primeira coisa que li sobre Outcast é que esta é uma série que efectivamente mete medo. Do mesmo criador de The Walking Dead, Robert Kirkman, e tendo como personagem principal um exorcista, claro que fiquei extremamente entusiasmada! Bem, culpa minha. Por esta altura já deveria saber que um artigo escrito por um espectador normal não traduz “meter medo” da maneira que eu entendo “meter medo”. E quanto a “meter medo” fiquei bastante desiludida. Mas já lá vamos.
Esta é a história de Kyle Barnes, um homem aparentemente perseguido por demónios desde infância. Os motivos por que é perseguido, porque é que os demónios possuem toda a gente que lhe está próxima, não são explicados, pelo menos até ao fim da primeira temporada (a que esta crítica se reporta). E tenho de começar logo aqui a dizer mal, quando eu até queria gostar desta série.
Para dez episódios, a série segue num ritmo demasiado lento para o meu gosto, mas admito que a história se centra em personagens que nunca me conseguem cativar e com as quais não me identifico. Grande parte dos episódios é sobre estas personagens e o seu quotidiano, tentando, ao mesmo tempo, interessar-nos pelos seus problemas e traumas, o que pode resultar muito bem com o tipo de público que estas representam. Para mim as personagens pouco representam e muitos dos episódios foram, lamento dizê-lo, quase uma seca. Só os demónios os salvaram.
O mesmo sintoma se aplica, curiosamente, a The Walking Dead. As personagens são de uma pobreza intelectual generalizada, insuportável se apresentada num enredo sem zombies. Deduzo que seja mesmo esse o objectivo: personagens que representam um certo público alvo com que este se pode identificar facilmente. Admito que resulte, mas eu não pertenço a este público alvo. Mesmo assim, as personagens de The Walking Dead ainda conseguem ser intelectualmente superiores às de Outcast, o que não é difícil. Mas as personagens de The Walking Dead estão ali para servir de papa para zombie e eu sou da opinião de que não é conveniente que o espectador se identifique muito com personagens de uma história de terror.
Já não se passa o mesmo com Outcast. Com Outcast, uma história muito mais lenta e centrada nos personagens, seria importante que nos importássemos com eles. Infelizmente, isso não aconteceu, e acabei a primeira temporada sem saber de cor do nome do protagonista (que fui consultar para esta crítica). O que diz tudo. Pior do que a pobreza intelectual dos personagens são algumas das suas escolhas e comportamentos, do estúpido ao ainda mais estúpido. (O que também é comum a The Walking Dead, curiosamente.) Nem o reverendo se safa. Se calhar por defeito cultural de influência católica, tenho a tendência de olhar para os responsáveis religiosos como pessoas cultas. Esta série recorda-me constantemente o que de menos culto existe na América profunda do “Jesus Belt”, em que o pastor só precisa de saber citar a Bíblia e interpretá-la como lhe dá mais jeito.
Cada vez que estes personagens abrem a boca entra demónio ou sai asneira, e não há como suportá-los.
Falemos então do único motivo por que vejo esta série: os demónios.
Esta é a história de Kyle Barnes, um homem aparentemente perseguido por demónios desde infância. Os motivos por que é perseguido, porque é que os demónios possuem toda a gente que lhe está próxima, não são explicados, pelo menos até ao fim da primeira temporada (a que esta crítica se reporta). E tenho de começar logo aqui a dizer mal, quando eu até queria gostar desta série.
Para dez episódios, a série segue num ritmo demasiado lento para o meu gosto, mas admito que a história se centra em personagens que nunca me conseguem cativar e com as quais não me identifico. Grande parte dos episódios é sobre estas personagens e o seu quotidiano, tentando, ao mesmo tempo, interessar-nos pelos seus problemas e traumas, o que pode resultar muito bem com o tipo de público que estas representam. Para mim as personagens pouco representam e muitos dos episódios foram, lamento dizê-lo, quase uma seca. Só os demónios os salvaram.
O mesmo sintoma se aplica, curiosamente, a The Walking Dead. As personagens são de uma pobreza intelectual generalizada, insuportável se apresentada num enredo sem zombies. Deduzo que seja mesmo esse o objectivo: personagens que representam um certo público alvo com que este se pode identificar facilmente. Admito que resulte, mas eu não pertenço a este público alvo. Mesmo assim, as personagens de The Walking Dead ainda conseguem ser intelectualmente superiores às de Outcast, o que não é difícil. Mas as personagens de The Walking Dead estão ali para servir de papa para zombie e eu sou da opinião de que não é conveniente que o espectador se identifique muito com personagens de uma história de terror.
Já não se passa o mesmo com Outcast. Com Outcast, uma história muito mais lenta e centrada nos personagens, seria importante que nos importássemos com eles. Infelizmente, isso não aconteceu, e acabei a primeira temporada sem saber de cor do nome do protagonista (que fui consultar para esta crítica). O que diz tudo. Pior do que a pobreza intelectual dos personagens são algumas das suas escolhas e comportamentos, do estúpido ao ainda mais estúpido. (O que também é comum a The Walking Dead, curiosamente.) Nem o reverendo se safa. Se calhar por defeito cultural de influência católica, tenho a tendência de olhar para os responsáveis religiosos como pessoas cultas. Esta série recorda-me constantemente o que de menos culto existe na América profunda do “Jesus Belt”, em que o pastor só precisa de saber citar a Bíblia e interpretá-la como lhe dá mais jeito.
Cada vez que estes personagens abrem a boca entra demónio ou sai asneira, e não há como suportá-los.
Falemos então do único motivo por que vejo esta série: os demónios.
Os demónios
Mas serão mesmo demónios? Após dez episódios, tenho razões para duvidar. Foi realmente muito estranho assistir ao comportamento destes demónios. Na verdade, quem nos diz que são demónios é o reverendo, que não diria outra coisa. Mas o reverendo não consegue exorcizá-los com a Bíblia e a cruz e água benta, o que também poderia não significar nada excepto pelos poderes do tal Kyle Barnes, que nem sabe que os tem. Com a simples imposição das mãos, Kyle Barnes consegue expulsar estas entidades das pessoas possuídas (se estão mesmo possuídas?...). A entidade, composta de parte etérea como fumo (à Sobrenatural) e parte óleo negro (como o vírus extraterrestre dos Ficheiros Secretos) sai pela boca do possuído, roda em espiral em direcção ao tecto, e dissolve-se. Do ponto de vista da cultura cinematográfica, parece uma possessão demoníaca. Os possuídos exibem comportamentos alterados, no mínimo estranhos e nos piores casos capazes de violência extrema, o que também é consentâneo com possessão. As imagens iniciais do genérico (o panorama invertido que sobrevoa a cidade) evocam a noção de que o universo demoníaco é invertido (por que motivo, honestamente, nunca me dei ao trabalho de pesquisar, mas compreendo o conceito). Até aqui, tudo nos leva a pensar que se tratam efectivamente de demónios. Mas depois há outras coisas que não fazem qualquer sentido no contexto em que os conhecemos. Ou são demónios muito esquisitos, ou não são demónios de todo.
Primeiro, o tal óleo negro. Ora, toda a gente sabe que o Diabo só se vê quando ele quer mostrar-se, e o mesmo dos seus capangas. De diabos transformados em óleo negro nunca ouvi falar. Mas vamos considerar que são diabos originais.
Segundo, está a haver uma verdadeira infestação de diabos na gente daquela cidade. Das conversas entre estes diabos, que são tudo menos incompreensíveis e crípticas como se esperaria destas entidades, parece mesmo que o objectivo é possuir o maior número possível de pessoas sem dar nas vistas. (E esta parte de “sem dar nas vistas” é importante porque o objectivo da possessão demoníaca sempre foi o de testar a fé dos crentes, nunca a de passar despercebida.) Os diabos estão a chegar em catadupa para um evento em grande escala que o reverendo interpreta como o Apocalipse, mas eu não vejo nada ali que se assemelhe ao Apocalipse. Antes pelo contrário. No Apocalipse, o Anticristo manifesta-se, não se esconde.
Terceiro, que eu saiba, o grande chefe dos diabos não anda por aí em forma de gente, de fato escuro e chapéu de gangster, a mutilar reverendos. Aniquilar a “concorrência” vai contra o objectivo. Sem concorrência, como é que se corrompem as almas? A concorrência é necessária. Quanto maior e melhor a concorrência mais gozo em corromper as almas. (É mais do que gozo, se é que é gozo, mas não vamos entrar em pormenores doutrinais.) O objectivo é arrebatar almas para o Inferno. Não vale possuí-las todas ou levá-las à força ou ameaçá-las à naifada. Há regras!
Mas serão mesmo demónios? Após dez episódios, tenho razões para duvidar. Foi realmente muito estranho assistir ao comportamento destes demónios. Na verdade, quem nos diz que são demónios é o reverendo, que não diria outra coisa. Mas o reverendo não consegue exorcizá-los com a Bíblia e a cruz e água benta, o que também poderia não significar nada excepto pelos poderes do tal Kyle Barnes, que nem sabe que os tem. Com a simples imposição das mãos, Kyle Barnes consegue expulsar estas entidades das pessoas possuídas (se estão mesmo possuídas?...). A entidade, composta de parte etérea como fumo (à Sobrenatural) e parte óleo negro (como o vírus extraterrestre dos Ficheiros Secretos) sai pela boca do possuído, roda em espiral em direcção ao tecto, e dissolve-se. Do ponto de vista da cultura cinematográfica, parece uma possessão demoníaca. Os possuídos exibem comportamentos alterados, no mínimo estranhos e nos piores casos capazes de violência extrema, o que também é consentâneo com possessão. As imagens iniciais do genérico (o panorama invertido que sobrevoa a cidade) evocam a noção de que o universo demoníaco é invertido (por que motivo, honestamente, nunca me dei ao trabalho de pesquisar, mas compreendo o conceito). Até aqui, tudo nos leva a pensar que se tratam efectivamente de demónios. Mas depois há outras coisas que não fazem qualquer sentido no contexto em que os conhecemos. Ou são demónios muito esquisitos, ou não são demónios de todo.
Primeiro, o tal óleo negro. Ora, toda a gente sabe que o Diabo só se vê quando ele quer mostrar-se, e o mesmo dos seus capangas. De diabos transformados em óleo negro nunca ouvi falar. Mas vamos considerar que são diabos originais.
Segundo, está a haver uma verdadeira infestação de diabos na gente daquela cidade. Das conversas entre estes diabos, que são tudo menos incompreensíveis e crípticas como se esperaria destas entidades, parece mesmo que o objectivo é possuir o maior número possível de pessoas sem dar nas vistas. (E esta parte de “sem dar nas vistas” é importante porque o objectivo da possessão demoníaca sempre foi o de testar a fé dos crentes, nunca a de passar despercebida.) Os diabos estão a chegar em catadupa para um evento em grande escala que o reverendo interpreta como o Apocalipse, mas eu não vejo nada ali que se assemelhe ao Apocalipse. Antes pelo contrário. No Apocalipse, o Anticristo manifesta-se, não se esconde.
Terceiro, que eu saiba, o grande chefe dos diabos não anda por aí em forma de gente, de fato escuro e chapéu de gangster, a mutilar reverendos. Aniquilar a “concorrência” vai contra o objectivo. Sem concorrência, como é que se corrompem as almas? A concorrência é necessária. Quanto maior e melhor a concorrência mais gozo em corromper as almas. (É mais do que gozo, se é que é gozo, mas não vamos entrar em pormenores doutrinais.) O objectivo é arrebatar almas para o Inferno. Não vale possuí-las todas ou levá-las à força ou ameaçá-las à naifada. Há regras!
Por último, finalmente reparei no grande poster “X-Files: I want to believe” que o tal Kyle Barnes tem no quarto, bem visível, desde o primeiro episódio. The Walking Dead já nos habituou a deixar pistas, e eu até já tinha percebido sozinha que o tal óleo negro parecia o vírus extraterrestre dos Ficheiros Secretos, mas pensei que o poster era apenas uma homenagem.
Chegando ao fim da primeira temporada, pergunto-me se é mais do que isso. Aquela infestação de diabos e as conversas entre eles levam-me mais a pensar numa invasão extraterrestre (tipo “Body Snatchers”) do que demónios.
De qualquer das maneiras, o resultado é mau. É mau se a série prometeu demónios e exorcistas durante toda uma primeira temporada para depois nos dizer que são extraterrestres. É mau se forem extraterrestres porque nunca se percebe ao certo que o são, e até a pista, se o for, é uma extrapolação da minha parte que pode estar certa ou errada. Em qualquer dos casos, considero mau resultado chegar ao fim da primeira temporada sem perceber exactamente o que estou a ver. Nos primeiros episódios? Sim. Uma temporada inteira? Demasiado. (Lá tenho de me lembrar outra vez da pior temporada de Lost, quando tentaram convencer as pessoas de que a ilha tinha uma explicação científica.) Mas cheguei mesmo ao fim da temporada na dúvida, a saber muito sobre personagens que não me interessam nada e muito pouco sobre os demónios que podem não ser demónios.
O que mete medo
O que mete “medo”, em Outcast, são as cenas de violência real. A mãe a espancar o miúdo, o homem que viola e assassina a mulher do melhor amigo, os animais mutilados. Tudo coisas imputadas ao diabo, mas todos sabemos que neste caso o diabo tem as costas largas. Não é preciso diabo para as pessoas fazerem estas coisas, o que é mais triste do que assustador.
A única cena que mete medo é quase uma cópia do “Exorcista”. Um miúdo possuído a fazer exactamente as mesmas coisas que faz a miúda possuída do “Exorcista”. Não considero um plágio mas uma homenagem. Se mete medo? Claro que mete medo. Não é por nada que o “Exorcista” é considerado um dos filmes mais assustadores de sempre.
O que mete “medo”, em Outcast, são as cenas de violência real. A mãe a espancar o miúdo, o homem que viola e assassina a mulher do melhor amigo, os animais mutilados. Tudo coisas imputadas ao diabo, mas todos sabemos que neste caso o diabo tem as costas largas. Não é preciso diabo para as pessoas fazerem estas coisas, o que é mais triste do que assustador.
A única cena que mete medo é quase uma cópia do “Exorcista”. Um miúdo possuído a fazer exactamente as mesmas coisas que faz a miúda possuída do “Exorcista”. Não considero um plágio mas uma homenagem. Se mete medo? Claro que mete medo. Não é por nada que o “Exorcista” é considerado um dos filmes mais assustadores de sempre.
As possessões seguintes tornam-se cada vez menos assustadoras e cada vez mais violentas, e já não causam o mesmo efeito. Quanto mais a série se afasta dos temas demoníacos e se foca na banalidade da violência real, cada vez menor o efeito. O que nos assusta no “Exorcista” funciona a nível inconsciente. Temos medo do que não vemos, do que nos pode controlar contra a nossa vontade, da possessão. Se os demónios nem parecem demónios, não produzem o efeito de demónios.
A melhor possessão da série, tenho de dizê-lo, é quando alguém que não vou identificar mata o marido assim que a entidade entra dentro dela. E foi a melhor possessão porque a entidade dentro dela a faz parecer um zombie. Acreditei, a certo momento, que ela ia começar a comer o cadáver do marido. Da maneira como deambula pelas ruas, desgrenhada e descalça, podia ter aparecido em The Walking Dead e ninguém dava pela diferença. A melhor possessão da série funciona porque nos lembra da outra série, com tudo o que isso implica.
A melhor possessão da série, tenho de dizê-lo, é quando alguém que não vou identificar mata o marido assim que a entidade entra dentro dela. E foi a melhor possessão porque a entidade dentro dela a faz parecer um zombie. Acreditei, a certo momento, que ela ia começar a comer o cadáver do marido. Da maneira como deambula pelas ruas, desgrenhada e descalça, podia ter aparecido em The Walking Dead e ninguém dava pela diferença. A melhor possessão da série funciona porque nos lembra da outra série, com tudo o que isso implica.
Ainda não comecei a ver a segunda temporada*, e ainda tenho esperança de mudar de ideias, mas até agora Outcast não me consegue convencer como a grande série que esperava que fosse e que podia ter sido. Se ao menos os personagens fossem mais interessantes (e inteligentes), se ao menos os demónios fossem mais demónios e menos outra coisa que não se percebe.
Espero bem que estas entidades não sejam afinal um vírus extraterrestre que visita o planeta Terra ocasionalmente desde a mais remota pré-História, dando assim origem ao mito dos demónios (e dos vampiros). Se há uma coisa que me irrita é a “mistura” de científico com sobrenatural. Nunca vi nada que saísse bem feito dessa mistura. Porque é que as pessoas insistem?
Espero bem que estas entidades não sejam afinal um vírus extraterrestre que visita o planeta Terra ocasionalmente desde a mais remota pré-História, dando assim origem ao mito dos demónios (e dos vampiros). Se há uma coisa que me irrita é a “mistura” de científico com sobrenatural. Nunca vi nada que saísse bem feito dessa mistura. Porque é que as pessoas insistem?
* Entretanto, depois de escrever este artigo, já vi o primeiro episódio da segunda temporada. O mistério quanto às entidades continua a arrastar-se, a arrastar-se, a arrastar-se... Com alguma sorte, pensam os criadores da série, para espremer dez temporadas disto.
Eu já estou desapontada e ainda vou no décimo primeiro episódio. O início da segunda série não augura melhoria. Se vou continuar a ver? Claro que vou. Demónios ou extraterrestres ou gambuzinos, onde há terror lá estou eu. Que a série podia ser muito melhor do que é? Sim, podia. O que é que a série pretende alcançar? Não faço ideia. Por esta altura, acredito que os criadores também não fazem.
Eu já estou desapontada e ainda vou no décimo primeiro episódio. O início da segunda série não augura melhoria. Se vou continuar a ver? Claro que vou. Demónios ou extraterrestres ou gambuzinos, onde há terror lá estou eu. Que a série podia ser muito melhor do que é? Sim, podia. O que é que a série pretende alcançar? Não faço ideia. Por esta altura, acredito que os criadores também não fazem.
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