terça-feira, 15 de outubro de 2024

Doctor Sleep (2019)

Este filme interessou-me muito porque segue a vida de Dan Torrance, o miúdo que todos conhecemos de “The Shining”. Ele e a mãe são os sobreviventes dos acontecimentos horríficos do hotel Overlook onde o pai de Dan morreu depois de ter tentado matar a família por estar possuído pelos espíritos maléficos do hotel.
Ainda em miúdo, Dan tem uma conversa com o fantasma de Dick Hallorann, o cozinheiro do Overlook a quem Dan enviou um SOS psíquico em vão. Dan decide esconder os seus poderes psíquicos, talvez devido ao trauma.
Não admira que já adulto Dan seja um homem deprimido e perturbado, que se refugia no alcoolismo. Um dia decide deixar o álcool e vai trabalhar como auxiliar de um lar de idosos. O lar tem uma gata que parece saber sempre quem vai morrer a seguir, deitando-se aos pés da cama do moribundo. Dan segue-a e descobre que tem um dom para tranquilizar os doentes terminais, o que lhe vale a alcunha de Doctor Sleep.
Esta vida “pacata”, na “clandestinidade”, é interrompida quando Dan recebe um apelo psíquico da uma rapariguinha chamada Abra, alguém com poderes psíquicos iguais aos dele. Abra assistiu, em sonhos, ao homicídio de um rapazinho por um grupo de vampiros. Digo “vampiros” no sentido lato, uma vez que não bebem sangue mas alimentam-se das almas das vítimas, especialmente do medo e da dor.
Relutantemente, Dan aceita conhecer Adra mas aconselha-a a esconder os seus dons uma vez que este grupo de vampiros quase imortais tem poderes únicos. Se ela os viu, eles também a “viram”, o que não só a coloca em risco como também à família dela.
Este ninho de vampiros, saliento, é deveras assustador. Por exemplo, guardam o “resto” das almas não consumidas em recipientes que mantêm para emergências e preferem exactamente as almas das pessoas que têm poderes psíquicos, como Dan ou Abra.
Num último encontro com o fantasma de Dick Hallorann, este diz-lhe que é seu dever ajudar a miúda, e Dan concorda. Mas para derrotar estes vampiros poderosos Dan tem um trunfo: voltar ao Overlook, onde todos os espíritos famintos os aguardam. Foi bom ver o Overloook outra vez, embora não seja o Overlook de Stanley Kubrick. Este é um hotel abandonado, fechado e decrépito, uma sombra da sua glória (e ameaça) passada. Saliento a conversa que Dan tem com o barman fantasmagórico, que tudo indica ser o próprio Jack Torrance que ficou preso para sempre no Overlook.
Confesso que esperava mais de “Doctor Sleep” (e de Dan Torrance) e que o final me deixou desiludida e até um pouco triste. Não queria daqui uma saga, mas Dan Torrance tinha um “shining” extraordinário capaz de chamar Dick Hallorann à distância (a ponto de o próprio Dan preferir esconder as suas capacidades), e não vi esses imensos poderes psíquicos aqui.
“Doctor Sleep” é um filme de nostalgia, principalmente, com algumas imagens do original “The Shining” e tudo, com um argumento sólido que se sustenta por si só, mas para um sucessor de “The Shining” penso que todos queríamos mais.

15 em 20

 

domingo, 13 de outubro de 2024

Annabelle: Creation / Annabelle 2: A Criação do Mal (2017)


Sequelas e prequelas têm má reputação por uma razão, mas muito esporadicamente aparece a excepção que confirma a regra. “Annabelle: Creation” é dessas excepções, talvez de onde menos a esperávamos. Tal como o título indica, esta é a história original da boneca que viria a chamar-se Annabelle. Nos anos 40 ou 50, parece-me, esta boneca foi feita à mão por um bonecreiro que tinha bastantes encomendas. (A malta da paróquia não devia ver bem para querer encomendar aquela coisa medonha, mas enfim.) A boneca pode ter sido mesmo criada à semelhança da filha do casal, chamada Annabelle (se acham que isto é demasiada coincidência com o primeiro filme, é porque não é coincidência). Digo “criada à imagem da filha” de modo geral; obviamente que a miúda não é horripilante como a boneca.
A história começa em tragédia. Num acidente estúpido, Annabelle (a criança) é atropelada. Os pais da filha única e muito amada ficam desgostosos para toda a vida.
Muitos anos depois, este mesmo casal (os Mullins) decide acolher na sua grande casa meia dúzia de raparigas órfãs de várias idades, acompanhadas pela jovem freira do orfanato onde elas estavam. Imediatamente uma delas nos chama a atenção, Janice, uma pobre miúda que teve poliomielite e que precisa de um aparelho para caminhar, o que faz com muito esforço e cansaço.
Tudo isto é um ambiente de drama, onde o Mal existencial já existe e onde o outro Mal tem o cenário pronto. (Ver sobre isto “O Exorcista II”.)
Aliás, os Mullins são estranhos. A mulher foi acometida por uma doença e nunca sai do quarto. O marido faz questão de manter trancado o quarto da filha falecida. Isto não é suspeito, tendo em conta as circunstâncias, mas desde o início achei que ele olhava de forma esquisita para as miúdas, o que me deixou na dúvida se ele as tinha convidado por compaixão ou para as sacrificar nalgum ritual para ter a filha de volta. Não estava exactamente enganada em nenhuma das hipóteses, mas também não era o que eu pensava.
Mesmo assim, durante a noite Janice encontra a porta do quarto aberta. A tentação é demasiado grande. A falecida Annabelle tinha brinquedos irresistíveis, nomeadamente uma casa de bonecas que parece a reprodução do próprio quarto com a miniatura de Annabelle junto à mobília. Entretanto, uma porta abre-se sozinha e Janice descobre a boneca lá dentro (a boneca que vai ser conhecida como Annabelle, só para clarificar).
A partir daqui Janice começa a ser assombrada pelo fantasma de Annabelle. A princípio tem pena de Annabelle, até esta lhe dizer claramente que quer a sua alma. A melhor amiga de Janice, Linda, também começa a ser perseguida, e até as raparigas mais velhas sofrem perturbações no quarto delas, embora ninguém queira admitir. Janice chega a pedir à irmã Charlotte (a freira que as acompanha) para saírem daquela casa onde sente uma “presença maléfica”, mas a freira recorda-lhe que não têm melhor para onde ir. Lentamente, vendo que ninguém consegue ajudá-la, Janice resigna-se ao seu destino.
“Annabelle: Creation” prova que não são precisos efeitos especiais histéricos para meter medo, muito pelo contrário. Como naquela cena em que não há nada debaixo do lençol. Mãezinha, o que eu teria gritado se aquilo me acontecesse a mim! O que não significa que os efeitos especiais mirabolantes não apareçam, como um mau vício. Por exemplo, na cena do elevador de mordomo (um daqueles elevadores interiores, na parede, para subir e descer comida e roupa). A certa altura a miúda mete-se nele para fugir ao demónio (quando já se sabe que não é um fantasma que as assombra) e o demónio tenta puxá-la para baixo com as patas peludas, com garras e tudo. A miúda dá-lhe uma sapatada e ele larga. Como se faz a um gato. Eu desatei-me a rir. Uma entidade maléfica desiste com a sapatada de uma fedelha? Sinceramente, realizadores. Também vemos o demónio, a dado passo, baixinho, peludinho, chifrudo, negro, assim a parecer uma daquelas iluminuras medievais. Porque esta noção de demónio é medieval e não acredito que meta medo a alguém. Não sei o que se passa com os realizadores desta série de filmes em insistirem nesta absurdidade.
O filme também é mais longo do que devia. Por mim, toda aquela cena no celeiro era cortada. Não adianta a história, não acontece às personagens principais e nem se pode dizer que é para “encher” porque o filme já está demasiado cheio.
Apesar de me ter feito rir, “Annabelle: Creation” aguentou-se muito bem depois, o que não é dizer pouco. Não é um filme que me meta medo, mas é tenso e pesado. Acima de tudo é um filme com cabeça, tronco e membros (o que vem sendo raro) que até explica em parte o original “Annabelle” (o que eu também não esperava). A aposta na empatia pelas personagens (demónios peludos à parte) fez mesmo toda a diferença.

13 em 20 (menos um ponto pelas patinhas peludas)

 

terça-feira, 8 de outubro de 2024

Cell / Cell: Chamada Para a Morte (2016)

Ao contrário do que o título em português possa sugerir, este filme não tem nada a ver com o clássico de Hitchcock mas sim com telemóveis (cell phones) e é uma adaptação de um livro de Stephen King.
No terminal de chegadas de um aeroporto, o novelista gráfico Clay Riddell tenta encontrar uma tomada disponível onde carregar o telemóvel, sem sucesso. 90% das pessoas (ou mais) estão a falar ao telemóvel ou ligadas a algum dispositivo wi-fi.
De repente, um impulso electrónico (?) afecta todas as pessoas “ligadas”, transformando-as em monstros raivosos e assassinos que atacam os “não ligados”. Isto é, mais um filme sobre zombies-vivos e, como sempre, estes zombies-vivos só atacam os “não infectados”. Pergunto-me, depois de ver milhentos filmes destes, porque é que não se atacam uns aos outros também? Mas neste caso parece que as pessoas afectadas pelo impulso começam a agir em “mente de colmeia” para destruir a sociedade. Porquê? Boa pergunta. O filme nunca explica e eu também não me ponho a especular (embora tenha algumas suspeitas).
À medida que os sobreviventes deste mundo pós-apocalíptico tentam escapar aos “phoners” (nome que dão aos afectados), apercebem-se de que estes evoluem e já não precisam de dispositivos electrónicos para “infectar” os outros. O seu líder parece ser precisamente o protagonista do romance gráfico (BD) de Clay Riddell, sem que este tenha nada a ver com isso (o que não deixa de ser estranhíssimo).
Ora, eu já estou a ficar farta de filmes em que uma personagem adquire vida própria (literalmente) e estou ainda mais farta de filmes que não dão explicações, nem plausíveis nem implausíveis.
Não li o livro, embora não seja difícil imaginar de onde Stephen King tirou a ideia de “zombies” agarrados ao telemóvel. É uma premissa interessante e não sei se o livro a desenvolve num todo coerente, mas “Cell” esqueceu-se desse “pormenor”. Nunca sabemos quem controla os “phoners” (ou quem está por trás do personagem que ganha vida própria), nem o que eles querem e porquê. Simplesmente é apresentado assim, os “phoners” parecem tomar conta do mundo e nunca sabemos o que realmente aconteceu ou está a acontecer. Tudo isto é muito frustrante e mais do que sobejam filmes semelhantes em enredo e muito melhores em execução. “Cell” é para esquecer.

11 em 20

 

domingo, 6 de outubro de 2024

Shining Vale (2022-2023)


Comecei a ver “Shining Vale” convencida de que era uma série de terror. E é, mas é também o que podemos chamar de terror cómico ou comédia de terror, e conseguiu de facto fazer-me rir.
A série começa como de costume: uma família de quatro pessoas, os Phelps, pai, mãe, filha adolescente e filho mais novo, compram uma mansão no campo, antiga e enorme, para tentar reparar a vida familiar depois de Pat, a mãe, ter tido um caso extraconjugal com o canalizador. O miúdo mais novo, Jake, viciado em jogos e que raramente tira os olhos do telemóvel, olha para o casarão e pergunta: “Porque é que vamos ficar num hotel?”
Foi a minha primeira gargalhada, porque sempre que vejo estas séries em que famílias de quatro pessoas ocupam uma casa do tamanho de um hotel (e quase sempre assombradas) não percebo o que lhes passa pela cabeça. Só os custos de manutenção são um filme de terror! Por outro lado, também nunca se vê ninguém a limpar as ditas casas, o que é ainda mais relevante nesta série em que ninguém nunca faz nada. Nem o pai, Terry, que tem um emprego a tempo inteiro na cidade, nem a filha mais velha, Gaynor, mais interessada em engatar rapazes no liceu, nem a mãe, que nem limpa nem cozinha (comem sempre take away), e muito menos o nerd que vive permanentemente num jogo virtual.
Como também é da praxe, o casal comprou a casa porque o preço estava abaixo de mercado mas tiveram de gastar tudo para a adquirir, o que significa que não podem dar-se ao luxo de sair de lá.
Pat é uma escritora de erótica/soft-porno com bloqueio criativo (algumas das passagens que ela tenta escrever são igualmente hilariantes). Teve um grande sucesso há 17 anos e nunca mais conseguiu escrever nada. Os editores pagaram-lhe um adiantamento pelo segundo livro e ameaçam obrigá-la a devolvê-lo, piorando as finanças da família (e o caos em geral) e causando-lhe ainda mais stress porque Pat pura e simplesmente não consegue escrever.
No entanto, a mansão está de facto assombrada por uma dona de casa dos anos 50, Rosemary, que aborda Pat e que a convence a deixar-se possuir de modo a que Rosemary a ajude a escrever o livro. Rosemary confessa que durante a sua vida o marido nunca a deixou fazer nada de interessante e que nas páginas do livro se sente realmente “viva”. A princípio Pat não concorda que a possuam, mas com o bloqueio criativo e os comprimidos para a depressão que o psiquiatra lhe receita, acaba por deixar Rosemary entrar. O resultado criativo é tão bom que a editora de Pat lhe paga outro adiantamento.
Na sequência desse sucesso, Terry despede-se do emprego que odeia (numa cena de ir às lágrimas que alguém grava e que se torna viral), mas afinal o restante do livro de Pat, sem a ajuda de Rosemary, é recusado pela editora. Pat tem de deixar Rosemary possui-la outra vez para conseguir acabar o livro… mas o fim não é nada erótico porque Rosemary matou o marido e os filhos à machadada.
“Shining Vale” é a história de uma família completamente disfuncional que às vezes se convence de que é normal (mas não são mesmo!). Bastantes vezes a série nos tenta igualmente convencer de que a assombração e o sobrenatural só se passam na cabeça de Pat, mas o filho mais novo também é assombrado pelas vítimas de Rosemary no headset de realidade virtual e a princípio julga que fazem parte do jogo... até encontrar o crânio de um deles.
“Shining Vale” lembra-me o humor de outra série memorável, “Weeds”, mas com terror em vez de marijuana. A série tem duas temporadas de poucos episódios de 30 minutos. O enredo à volta desta família caótica torna-se ainda mais marado na segunda temporada (sim, “marado” é a palavra certa). “Shining Vale” tem alguns sustos fraquinhos mas gargalhadas poderosas (pelo menos para quem tenha o sentido de humor certo) e ainda é mais cómico ao segundo visionamento. Lamento não poder contar mais por causa dos spoilers. Imaginem “The Shining”, “Rosemary´s Baby”, “The Exorcist”, “The Amityville Horror” e outros clássicos em versão cómica e mesmo assim não seria tão tresloucado, acutilante e com tantos palavrões. Os Phelps, afinal, poderíamos ser todos nós, tirando os choques eléctricos, as drogas e os machados. “Shining Vale” foi uma surpresa que me fez rir e não posso recomendar mais.
Penso que o objectivo de “Shining Vale” era ser renovado por mais uma temporada mas acabou bem, e acabou onde devia.


ESTA SÉRIE MERECE SER VISTA: 2 vezes

PARA QUEM GOSTA DE: terror, casas assombradas, drama, comédia, The Shining, Rosemary´s Baby, The Exorcist, The Amityville Horror


terça-feira, 1 de outubro de 2024

The Bye Bye Man / O Nome do Medo (2017)


Esta é daquelas histórias tipo “Candyman” em que não se pode pronunciar o nome da entidade senão ela aparece. Infelizmente o filme é tão mau que decidiu pôr o spoiler logo no título.
Mas não é a falta de originalidade que torna “The Bye Bye Man” um filme mau. Muito pior do que isso, é por não nos conseguir convencer do poder da entidade (cujo nome eu não vou dizer mas está no título).
O princípio promete. No passado (anos 60, 70) um homem de aparência pacata sente-se na obrigação de matar família e vizinhos por eles terem divulgado o nome maldito (que eu não vou dizer mas está no título) e de se suicidar de seguida. Leva-nos a pensar que esta Entidade deve ser muito má, mas não sabemos porquê. Isto assusta-nos e cria tensão.
No presente, um casal de namorados, Elliot e Sasha e o amigo deles, John, decidem trocar o dormitório da universidade por uma casa alugada pelos três. Elliot encontra o nome maldito talhado dentro da gaveta da mesinha de cabeceira, e a partir daí começa a ouvir coisas e a ter visões. Por exemplo, uma noite alguém arranha profundamente as paredes exteriores da casa (para nos lembrar de Freddy Krueger). Por esta altura pensamos que o filme vai ser isto: uma espécie qualquer de Freddy Krueger/Candyman ia aparecer e retalhar os miúdos, mas o filme decide ser mais inteligente. Antes não fosse.
O que o Bye Bye Man faz (ooops, já disse) é enlouquecer as pessoas, causar-lhes alucinações, torná-las paranóicas, virá-las umas contra as outras e, ultimamente, levá-las a cometer homicídio. Admito que não estava à espera disto. Mas a questão aqui é outra: como é que o filme nos convence de que o Bye Bye Man (ooops, já disse outra vez, e basta dizer uma vez para o chamar porque ele não se faz caro) consegue entrar na cabeça das pessoas e endoidecê-las? Krueger, por exemplo, controlava as pessoas enquanto dormiam. “The Bye Bye Man” não consegue fazer isto de maneira nenhuma. Aliás, acabamos o filme sem saber quem é, ou quem foi, este vilão que se apresenta de capuz e acompanhado por um cão enorme que parece um mastim do inferno esfolado vivo (talvez a parte mais eficiente do filme), mas tudo nos leva a crer que esta Entidade já foi humana, algures. Como é que ele se tornou quem é, como é que tem tantos poderes, o que é que ele realmente quer, nada disso é dito ou mostrado, logo, não acreditamos neste vilão. Não se consegue ter medo daquilo em que não se acredita, mesmo num filme de terror em que já vamos para lá a fingir que acreditamos. Isto já é metade do efeito. A outra metade tem de ser o filme a fazer, e este não faz. Por isso é que é mau.
Espero que isto não signifique a conclusão mais aterradora com que saímos daqui: que se preparava a prequela a contar a história do vilão. Se calhar era mesmo isto que estava programado.
Muito mau. Ver apenas para passar tempo.

11 em 20