domingo, 6 de outubro de 2024

Shining Vale (2022-2023)


Comecei a ver “Shining Vale” convencida de que era uma série de terror. E é, mas é também o que podemos chamar de terror cómico ou comédia de terror, e conseguiu de facto fazer-me rir.
A série começa como de costume: uma família de quatro pessoas, os Phelps, pai, mãe, filha adolescente e filho mais novo, compram uma mansão no campo, antiga e enorme, para tentar reparar a vida familiar depois de Pat, a mãe, ter tido um caso extraconjugal com o canalizador. O miúdo mais novo, Jake, viciado em jogos e que raramente tira os olhos do telemóvel, olha para o casarão e pergunta: “Porque é que vamos ficar num hotel?”
Foi a minha primeira gargalhada, porque sempre que vejo estas séries em que famílias de quatro pessoas ocupam uma casa do tamanho de um hotel (e quase sempre assombradas) não percebo o que lhes passa pela cabeça. Só os custos de manutenção são um filme de terror! Por outro lado, também nunca se vê ninguém a limpar as ditas casas, o que é ainda mais relevante nesta série em que ninguém nunca faz nada. Nem o pai, Terry, que tem um emprego a tempo inteiro na cidade, nem a filha mais velha, Gaynor, mais interessada em engatar rapazes no liceu, nem a mãe, que nem limpa nem cozinha (comem sempre take away), e muito menos o nerd que vive permanentemente num jogo virtual.
Como também é da praxe, o casal comprou a casa porque o preço estava abaixo de mercado mas tiveram de gastar tudo para a adquirir, o que significa que não podem dar-se ao luxo de sair de lá.
Pat é uma escritora de erótica/soft-porno com bloqueio criativo (algumas das passagens que ela tenta escrever são igualmente hilariantes). Teve um grande sucesso há 17 anos e nunca mais conseguiu escrever nada. Os editores pagaram-lhe um adiantamento pelo segundo livro e ameaçam obrigá-la a devolvê-lo, piorando as finanças da família (e o caos em geral) e causando-lhe ainda mais stress porque Pat pura e simplesmente não consegue escrever.
No entanto, a mansão está de facto assombrada por uma dona de casa dos anos 50, Rosemary, que aborda Pat e que a convence a deixar-se possuir de modo a que Rosemary a ajude a escrever o livro. Rosemary confessa que durante a sua vida o marido nunca a deixou fazer nada de interessante e que nas páginas do livro se sente realmente “viva”. A princípio Pat não concorda que a possuam, mas com o bloqueio criativo e os comprimidos para a depressão que o psiquiatra lhe receita, acaba por deixar Rosemary entrar. O resultado criativo é tão bom que a editora de Pat lhe paga outro adiantamento.
Na sequência desse sucesso, Terry despede-se do emprego que odeia (numa cena de ir às lágrimas que alguém grava e que se torna viral), mas afinal o restante do livro de Pat, sem a ajuda de Rosemary, é recusado pela editora. Pat tem de deixar Rosemary possui-la outra vez para conseguir acabar o livro… mas o fim não é nada erótico porque Rosemary matou o marido e os filhos à machadada.
“Shining Vale” é a história de uma família completamente disfuncional que às vezes se convence de que é normal (mas não são mesmo!). Bastantes vezes a série nos tenta igualmente convencer de que a assombração e o sobrenatural só se passam na cabeça de Pat, mas o filho mais novo também é assombrado pelas vítimas de Rosemary no headset de realidade virtual e a princípio julga que fazem parte do jogo... até encontrar o crânio de um deles.
“Shining Vale” lembra-me o humor de outra série memorável, “Weeds”, mas com terror em vez de marijuana. A série tem duas temporadas de poucos episódios de 30 minutos. O enredo à volta desta família caótica torna-se ainda mais marado na segunda temporada (sim, “marado” é a palavra certa). “Shining Vale” tem alguns sustos fraquinhos mas gargalhadas poderosas (pelo menos para quem tenha o sentido de humor certo) e ainda é mais cómico ao segundo visionamento. Lamento não poder contar mais por causa dos spoilers. Imaginem “The Shining”, “Rosemary´s Baby”, “The Exorcist”, “The Amityville Horror” e outros clássicos em versão cómica e mesmo assim não seria tão tresloucado, acutilante e com tantos palavrões. Os Phelps, afinal, poderíamos ser todos nós, tirando os choques eléctricos, as drogas e os machados. “Shining Vale” foi uma surpresa que me fez rir e não posso recomendar mais.
Penso que o objectivo de “Shining Vale” era ser renovado por mais uma temporada mas acabou bem, e acabou onde devia.


ESTA SÉRIE MERECE SER VISTA: 2 vezes

PARA QUEM GOSTA DE: terror, casas assombradas, drama, comédia, The Shining, Rosemary´s Baby, The Exorcist, The Amityville Horror


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