Nos últimos dias, tem vindo sobre mim uma melancolia inexplicável que faz dor estar viva. Coisas de gótico, sem dúvida. Apanhei-me meia dúzia de vezes a pensar que a minha vida acabou e que devia acabar. Razões? Nenhumas em particular. Está frio. Tenho um gato doente desde o Verão, morre não morre. O empregozinho de merda onde se tem de pedir licença para ir fazer chichi. Ter 35 anos (muito cedo mais que isso) e ficar fora do mercado de trabalho enquanto nos obrigam por decreto a fumar menos e viver mais. Para quê, se as pensões não chegam? Não se pode dar milho aos pombos. Nojentas pessoas não gostam de animais e gostariam de os exterminar a todos. E às lareiras. E ao incenso, provavelmente. Pessoas sem pinga de sensualidade. Ter de comer carne porque a comida vegetariana é muito cara. Podia ser pior, podia ser obrigada a comer o meu semelhante, como no empregozinho de merda onde não lhes posso dizer as verdades que deviam ouvir. Que não querem ouvir, nem ler, nem ali nem aqui. Supermercados cheios de imigrantes pobres que vieram enganados. Cada vez mais sem abrigos nas ruas.
E no Quénia, o que será dos animais? Há muito tempo deixei me preocupar com limpezas étnicas. Tenho pena é dos animais, apanhados neste mundo da última Criação Divina, Adão e Eva, natural born killers, o flagelo de Deus.
Nada de novo, portanto. Não poderia dizer porque pensei na morte hoje e não ontem ou amanhã. Não há explicação racional.
Tenho dois artigos das minhas memórias para acrescentar aos outros dois mas apesar de alinhavados a vontade não aparece. E o gato morre não morre.
E eu hesito. Ser ou não ser? Viver ou renunciar? Mais um passo numa ou noutra direcção e terei feito a escolha. Hesito. Irrita-me. Não gosto de viver no meio termo. Ou tudo ou nada. Morre-se ou não morre-se. Vive-se ou não vive-se. Isto de viver por uma causa não é vida, é uma missão. Uma missão involuntária, tem esta algum mérito? Duvido. Parece mais um pedido de desculpas. Que fazer com esta vida que abomino? Tentar transformá-la numa coisa que sirva de alguma coisa? Isso é viver? Não, isso não é viver. Not in my book.
quinta-feira, 31 de janeiro de 2008
domingo, 27 de janeiro de 2008
Estado das coisas
Farta já de roer o osso, que quanto mais se mastiga mais enjoa, este argumento "no meu corpo mando eu", que utilizo no último post relativo ao mesmo assunto, também foi usado vezes sem conta para defender o direito ao aborto, como o Goldmundo não podia deixar de reparar. Com a diferença óbvia de que no meu argumento não se coloca em causa a vida por nascer dentro do corpo materno.
Mas não é por acaso que os pensamentos se cruzam. Se votei sim à liberalização do aborto foi tão só para acabar com a hipocrisia. Fim de conversa.
Mas o gene humano da hipocrisia ainda não foi totalmente isolado e estudado. Quase um ano depois, a mesma sociedade que legaliza a morte de nascituros a pedido das mães (e paga pelo Estado) é a mesma sociedade que quer ostracizar o tabaco em nome da vida. Não me admirava nada que amanhã o Estado preferisse pagar abortos do que xaropes para o catarro do fumador. Não me entra na cabeça mas não me espanta.
A pior forma de hipocrisia é aquela que é cega. Como a hipocrisia americana, de onde todo o fanatismo foi importado, e a estupidez também.
Mas nem só de miséria humana se fizeram os últimos dias. É com grande alívio que retiro este banner do fundo da página.
"Do Portugal Profundo" já não é arguido. O processo movido contra o autor do blog por José Sócrates enquanto cidadão e primeiro-ministro foi arquivado. Dir-me-ia mais reconciliada com a Justiça se não tivesse demorado meses. Segundo António B. Caldeira: «O motivo da "queixa do cidadão José Sócrates e primeiro-ministro enquanto tal", que finalmente posso revelar, foi a minha referência ao "centro governamental de comando e controlo dos media"». Sabemos todos que não foi por isso que o autor do blog foi processado mas sim por ter insistido nas nebulosas qualificações de um primeiro-ministro que não tem vergonha de querer parecer mais do que é. E durante tempo a mais foi calado pela Justiça, que não funciona. Que não se mexe. Que arquiva. Que não tem meios para investigar.
Tirar à Justiça os meios de investigação, eis a melhor arma até hoje descoberta contra a democracia moderna.
Apesar de tudo isto, congratulo-me com o tardio arquivamento deste triste processo pela parte que toca ao autor do blog. Não fico, todavia, mais descansada quanto à nossa liberdade de expressão.
A liberdade é uma coisa que se perde mais um pouco todos os dias.
Mas não é por acaso que os pensamentos se cruzam. Se votei sim à liberalização do aborto foi tão só para acabar com a hipocrisia. Fim de conversa.
Mas o gene humano da hipocrisia ainda não foi totalmente isolado e estudado. Quase um ano depois, a mesma sociedade que legaliza a morte de nascituros a pedido das mães (e paga pelo Estado) é a mesma sociedade que quer ostracizar o tabaco em nome da vida. Não me admirava nada que amanhã o Estado preferisse pagar abortos do que xaropes para o catarro do fumador. Não me entra na cabeça mas não me espanta.
A pior forma de hipocrisia é aquela que é cega. Como a hipocrisia americana, de onde todo o fanatismo foi importado, e a estupidez também.
Mas nem só de miséria humana se fizeram os últimos dias. É com grande alívio que retiro este banner do fundo da página.
"Do Portugal Profundo" já não é arguido. O processo movido contra o autor do blog por José Sócrates enquanto cidadão e primeiro-ministro foi arquivado. Dir-me-ia mais reconciliada com a Justiça se não tivesse demorado meses. Segundo António B. Caldeira: «O motivo da "queixa do cidadão José Sócrates e primeiro-ministro enquanto tal", que finalmente posso revelar, foi a minha referência ao "centro governamental de comando e controlo dos media"». Sabemos todos que não foi por isso que o autor do blog foi processado mas sim por ter insistido nas nebulosas qualificações de um primeiro-ministro que não tem vergonha de querer parecer mais do que é. E durante tempo a mais foi calado pela Justiça, que não funciona. Que não se mexe. Que arquiva. Que não tem meios para investigar.
Tirar à Justiça os meios de investigação, eis a melhor arma até hoje descoberta contra a democracia moderna.
Apesar de tudo isto, congratulo-me com o tardio arquivamento deste triste processo pela parte que toca ao autor do blog. Não fico, todavia, mais descansada quanto à nossa liberdade de expressão.
A liberdade é uma coisa que se perde mais um pouco todos os dias.
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quinta-feira, 24 de janeiro de 2008
Heath Ledger
Sin eater encontrado morto em casa no dia 22 de Janeiro, aos 28 anos.
Nada dá mais imortalidade do que a morte.
Eu Sou Deus
"O espírito da lei é proibir", dizia este nazi a quem só falta uma luneta em vez de óculos, no "Prós e Contras" da última segunda feira. Proibir, pois, diz esta sinistra criatura que eu desconhecia completamente, mas que como Director Geral de Saúde se deve mover nos interstícios mais tenebrosos do poder, aqueles em que não se vota nem a quem se vê a verdadeira cara excepto em raras ocasiões como estas. Francisco George, de seu nome, quer proibir. Se não houver espaço para fumadores está tudo bem para ele e não é preciso fiscalizar. Não sou eu que digo, é ele. Logo, não há espaço na cabeça desta criatura monstruosa para gente como eu. Como não lhe chamar nazi?
Alguma coisa já conseguiu, pelo menos lembro-me do seu nome o suficiente para o procurar na net. Lembro-me também como fugiu à argumentação de José Sá Fernandes e do presidente do Casino Estoril. Pois, sim, mas não, mas sim, mas não... Dava o dito por não dito, contorcia-se, retorcia-se, um perfeito réptil do diz que não disse sem dizer nada. Intelecto zero, manha tudo.
A certa altura, e foi isso que me chocou mais, começou a convocar todos os argumentistas do contrário a irem ao seu gabinete "debater mais", e lá se falava em estabelecer protocolos de excepção, a Associação Nacional de Discotecas de bolinha bem baixa não fosse Von Smallerhausen mudar de ideias, mas tudo nestes gabinetes à porta fechada, os arranjinhos, as cunhas para os obedientes e os poderosos, à maneira portuguesa, "se não falares muito arranjo-te qualquer coisa", um nojo em directo.
Em directo, continuava-se a debater o sexo dos anjos, se o tabaco mata ou não mata, porque há quem goste de virar o disco e tocar o mesmo porque não sabe outra canção. Uma das pessoas mais inteligentes presentes na sala, quer se concorde ou não, o tal presidente do casino cujo nome não recordo nem o conhecia de lado nenhum (surpreendeu-me) a certa altura faz a proposta "irreverente", disse ele, de deixar os donos dos estabelecimentos mais pequenos decidirem se é um local para fumadores ou não fumadores. "Não! Não! Não!", gritou um dos fundamentalistas da plateia, porque isso de deixar as pessoas decidirem é perigoso, veja-se o que aconteceu em Espanha, onde toda a gente permitiu o fumo.
Mas afinal a lei não está a ser tão bem aceite pela população? Do que têm medo, estes senhores? Da ganância dos donos dos restaurantes que até comiam um cancro se isso lhes rendesse 15 euros?
Dar liberdade aos fumadores e não fumadores de organizarem espaços só para eles? Claro que não. Qualquer dia, se as pessoas tiverem de pensar na escolha, até começam a pensar noutras coisas, e pensar é perigoso.
Este senhor, o da fotografia, o que convidava toda a gente para o gabinete dele, é perigoso. Foi com gente assim que se teceu o Terceiro Reich. Não gostam da comparação? Quem não quer ser lobo não lhe veste a pele.
Não sei que mais este osso dá para roer, mas que tem exposto toda a podridão de uma sociedade, isso tem. Desde os nazis aos bufos, desde os fumadores amochados aos não fumadores gozões. Uma sociedade incapaz de reagir. Em coma. Qual cancro? Aqui está tudo morto.
Lembro-me de um filme sobre os últimos dias de Hitler, não sei se o recente "Der Untergang / A Queda, Hitler e o Fim do Terceiro Reich" se outro mais antigo, ou ambos, em que Eva Braun e a secretária do Fuhrer saíam do bunker às escondidas para ir fumar e tinham de fugir à pressa para dentro quando caíam as bombas sobre Berlim. Toda uma corte a fingir que não fumava. Hitler era vegetariano e não tolerava o fumo. E não tolerava muito mais coisas, como todos sabemos, nomeadamente a existência de certas outras pessoas. No momento em que souberam que estava morto, todos estes lacaios se juntaram numa sala, puxaram dos cigarros e desataram a fumar. É histórico.
Acho que se não fumasse começava hoje só para mostrar que em mim mando eu. O meu corpo é o meu templo, dizem alguns fundamentalistas anti tabaco. Eu acrescento: o meu templo, o meu reino, o meu universo. Aqui dentro, Eu Sou Deus.
domingo, 13 de janeiro de 2008
Má vida
Sou fumadora. Quando não estou a fumar estou a roer as unhas, ou o osso. E este tem dado para roer, roer, e parece-me que ainda falta muito para chegar ao tutano.
Como sou utilizadora de transportes públicos, passo (perco) horas e horas da minha vida a observar os outros na sua vidinha, mas disso não me queixo porque me dá um especial prazer (podia dar-me para pior). Estava eu à espera de um daqueles autocarros que só passam duas vezes por dia, à frente de um cafézinho/taberna que já conheço muito bem, a fumar o meu cigarrinho, quando reparo num velhote que saiu do café de propósito para fumar o dele, duas vezes. Deve ter sido a primeira vez na vida que o proibem de fumar, pensei, mas com todo o civismo lá vinha para a rua quando lhe dava para o vício entre os copos e o jogo de futebol. Depois vi outra cena muito triste, mesmo muito triste. Um dos frequentadores do café, também velhote, gordo, vermelho e tão cheio de vinho que até cambaleava, saiu e gozou, mas muito a sério, numa autêntica perseguição: "Merda de tabaco! Eu quero saúde!" Diz o roto ao nu. Diz a cirrose ao cancro. Pois aquela grande besta está convencida que fumar faz mais mal do que ser obeso e alcoólico. Se querem que vos diga, o fumador parecia mais saudável, mas as aparências iludem e é provável que estejam ambos igualmente de pés para a cova.
O que me fez impressão foi a atitude "eu agora sou melhor do que tu". Já aqui disse que o fanatismo me faz mal aos nervos. Quando morrer, quero ter na minha lápide: "Aqui jaz, vítima de ira".
Mas queriam fanatismo à americana, na Europa? Pois cá vai.
Aqui está o outro extremo do fanatismo. Eu ainda sou do tempo em que se fumava no trabalho e agora percebo que não era uma boa prática, nem para fumadores nem para não fumadores. Demasiada gente a fumar em pouco espaço muitas horas por dia. O trabalho já é um castigo, não há necessidade de o tornar ainda mais penoso. (Digo o mesmo dos ares condicionados que também hão-de ir à vida quando se provar que estão na base de alergias como a minha. Por enquanto não, que o negócio prospera e ainda não inventaram pior.)
Quanto à situação dos empregados de bares e discotecas e a sua exposição ao fumo, o caso é mais delicado. Há uma etiqueta da noite que distingue um barman de um empregado de café. Trabalhar na noite dá prestígio no meio. Nem sequer é só para quem gosta; é para quem dá "estilo" à casa. Não é por acaso que os empregados de bar são jovens. Há vantagens bastante cobiçadas naquela idade em que toda a gente quer ser visto. Não penso que seja profissão para se ter toda a vida. A exposição aos altos decibéis de alguns locais de diversão também pode provocar danos permanentes. Eu, melómana, que não concebo uma vida de surdez, fujo do barulho excessivo como os não fumadores fogem do fumo. Mas profissões de risco há muitas e as suas compensações são várias. É tudo uma questão de prioridades.
Há que ser muito claros numa coisa. A má vida não se chama assim por acaso. Quando a má vida for saudável inventam-se outras formas de má vida. Acabar com a má vida, como querem os puritanos, nunca vai acontecer. Que o diga Jeová que destruiu Sodoma e Gomorra. Louco é o homem que tenta o que Deus não conseguiu.
A propósito, eu assinei a petição online pelo direito de escolha. Não sei se servirá para alguma coisa mas como foi difícil encontrá-la aqui fica o link:
http://www.bardali.com/adn/adn.html
Se for preciso assinar em papel, também o faço.
Como sou utilizadora de transportes públicos, passo (perco) horas e horas da minha vida a observar os outros na sua vidinha, mas disso não me queixo porque me dá um especial prazer (podia dar-me para pior). Estava eu à espera de um daqueles autocarros que só passam duas vezes por dia, à frente de um cafézinho/taberna que já conheço muito bem, a fumar o meu cigarrinho, quando reparo num velhote que saiu do café de propósito para fumar o dele, duas vezes. Deve ter sido a primeira vez na vida que o proibem de fumar, pensei, mas com todo o civismo lá vinha para a rua quando lhe dava para o vício entre os copos e o jogo de futebol. Depois vi outra cena muito triste, mesmo muito triste. Um dos frequentadores do café, também velhote, gordo, vermelho e tão cheio de vinho que até cambaleava, saiu e gozou, mas muito a sério, numa autêntica perseguição: "Merda de tabaco! Eu quero saúde!" Diz o roto ao nu. Diz a cirrose ao cancro. Pois aquela grande besta está convencida que fumar faz mais mal do que ser obeso e alcoólico. Se querem que vos diga, o fumador parecia mais saudável, mas as aparências iludem e é provável que estejam ambos igualmente de pés para a cova.
O que me fez impressão foi a atitude "eu agora sou melhor do que tu". Já aqui disse que o fanatismo me faz mal aos nervos. Quando morrer, quero ter na minha lápide: "Aqui jaz, vítima de ira".
Mas queriam fanatismo à americana, na Europa? Pois cá vai.
Despedidos por não fumar
2008/01/10 | 22:11
Patrão disse que empregados interferiam com «tranquilidade» do grupo
O proprietário de uma pequena empresa de tecnologia na cidade de Buesum, na Alemanha, foi processado por ter demitido três funcionários não-fumadores para os substituir por fumadores.
Segundo noticia o jornal alemão Hamburger Morgenpost, os funcionários, que já trabalhavam na empresa há cerca de dois anos e meio, foram despedidos depois de terem solicitado a criação de uma zona específica para não fumadores na empresa.
O dono não gostou do pedido, considerou que os três funcionários estavam a «interferir com a tranquilidade» do grupo e decidiu substituí-los por três fumadores, com a justificação de que estes «se adaptariam melhor». Está agora a responder em tribunal por despedimento sem justa causa.
Em declaração ao mesmo jornal alemão, o dono da empresa, que tem dez funcionários, considera que a proibição de fumar um ataque à liberdade individual. «Não posso preocupar-me com os problemáticos. Estamos sempre ao telefone e é mais fácil trabalhar enquanto fumamos», disse.
Aqui está o outro extremo do fanatismo. Eu ainda sou do tempo em que se fumava no trabalho e agora percebo que não era uma boa prática, nem para fumadores nem para não fumadores. Demasiada gente a fumar em pouco espaço muitas horas por dia. O trabalho já é um castigo, não há necessidade de o tornar ainda mais penoso. (Digo o mesmo dos ares condicionados que também hão-de ir à vida quando se provar que estão na base de alergias como a minha. Por enquanto não, que o negócio prospera e ainda não inventaram pior.)
Quanto à situação dos empregados de bares e discotecas e a sua exposição ao fumo, o caso é mais delicado. Há uma etiqueta da noite que distingue um barman de um empregado de café. Trabalhar na noite dá prestígio no meio. Nem sequer é só para quem gosta; é para quem dá "estilo" à casa. Não é por acaso que os empregados de bar são jovens. Há vantagens bastante cobiçadas naquela idade em que toda a gente quer ser visto. Não penso que seja profissão para se ter toda a vida. A exposição aos altos decibéis de alguns locais de diversão também pode provocar danos permanentes. Eu, melómana, que não concebo uma vida de surdez, fujo do barulho excessivo como os não fumadores fogem do fumo. Mas profissões de risco há muitas e as suas compensações são várias. É tudo uma questão de prioridades.
Há que ser muito claros numa coisa. A má vida não se chama assim por acaso. Quando a má vida for saudável inventam-se outras formas de má vida. Acabar com a má vida, como querem os puritanos, nunca vai acontecer. Que o diga Jeová que destruiu Sodoma e Gomorra. Louco é o homem que tenta o que Deus não conseguiu.
A propósito, eu assinei a petição online pelo direito de escolha. Não sei se servirá para alguma coisa mas como foi difícil encontrá-la aqui fica o link:
http://www.bardali.com/adn/adn.html
Se for preciso assinar em papel, também o faço.
30 Days of Night / 30 Dias de Noite
Às primeiras cenas de "30 Dias de Noite" sente-se na solidão da gélida paisagem que algo terrível está para acontecer. Burrow, Alasca, segundo o filme a cidade mais a norte do território americano, vive o último dia de sol antes de um mês de invernia noite ártica.
Ainda nem se tinha posto o sol, estranhos actos de vandalismo já levavam o xerife a desconfiar que alguém estaria a tentar cortar as comunicações entre o resto do mundo e a povoação já de si isolada pelas estradas intransitáveis. Todos os cães de trenó aparecem mortos numa poça de sangue. Pouco mais tarde, um forasteiro é preso por causar desacatos. É um louco "renfield" que anuncia a chegada dos seus mestres que o vão tornar um deles. Na cidade em que não nasce o sol, os vampiros fazem um banquete.
O que distingue os grandes filmes de terror dos filmes para entreter é que os primeiros não precisam de grandes efeitos especiais nem sustos pindéricos. E este foi feito à moda antiga: poucos meios, quase a fazer lembrar a série B, sem querer fugir aos clássicos como John Carpenter ou Stephen King, mas com uma originalidade refrescante que nos faz ficar presos à cadeira até ao último minuto. Um excelente filme de vampiros que mete medo sem se esforçar muito, o que é uma agradável surpresa no panorama tantas vezes estéril e repetitivo da falta de ideias de Hollywood. Só por isso:
16 em 20
quinta-feira, 10 de janeiro de 2008
Romance com a morte
Aqui começa a mais bela história sobre o tabaco jamais contada.
Havia nicotina nos espermatozóides que me conceberam. A minha mãe, felizmente para mim, não fumava. Não porque não tivesse tentado mas não conseguiu porque não gostava. Isto de fumar não é para quem quer, é para quem gosta. Ela só queria ter estilo e ser aceite. Ficou-se pelo caminho. E nunca foi aceite nem nunca teve estilo (mas essa história não merece ser contada por ser demasiado banal).
Nasci. Nasci numa casa de fumador, num tempo em que as crianças andavam sozinhas na rua e descalças, e nenhum mal lhes vinha por isso.
Tempo de liberdade.
Desde que conheci o meu pai, conheci-o com um cigarro na boca. Naquela altura não gostava do cheiro. Há odores e paladares subtis que escapam aos sentidos mal desenvolvidos de uma criança, como o sabor suave de uma cenoura cozida.
Aquele cheiro era agressivo mas cresci com ele e habituei-me a ele. Aquele era o cheiro de que o pai estava em casa, à mesa, a fumar SG Filtro. E quando o pai estava em casa, à mesa, a fumar SG Filtro, nada me podia fazer mal.
Mais tarde, o pai começou também a beber. Aguardente, era o que ele bebia. E começou a beber muito, e também o cheiro da aguardente se tornou repulsivo. Ainda hoje a aguardente me cheira a morte.
O meu pai chegava a casa, de um clube privado onde se jogava à sueca até altas horas da noite, sentava-se à mesa a ler livros científicos e tomava um Rophinol para dormir. Esses eram os bons tempos.
Quando tinha sono ia para a cama e dormia como um anjo.
Não foi o cigarro que o matou, mas a aguardente. Cancro no pâncreas. Bem, cientificamente, pode-se dizer que foram as duas coisas, mais o Rophinol. Mais uma vida de prazeres até ao fim dos seus dias.
O meu pai teve tuberculose e foi mandado para o Caramulo curar-se, uns vinte anos antes de eu nascer, e a tuberculose não o matou. Irmão de sete ou oito irmãos, fora os que morreram em crianças, nem mais tarde uma operação que lhe tirou parte do estômago lhe deu sumiço.
Aos 75 anos, finalmente, chegou-lhe o cancro. Demorou uns seis meses. Ninguém sabia quanto tempo tinha de vida. Não houve quimioterapia nem radiações nem hospitais. Mas nesse tempo havia tempo para cuidar dos moribundos. O meu pai morreu na cama dele, no mesmo quarto em que eu durmo agora, com um enfermeiro que lhe vinha dar cada vez mais injecções de morfina. Dois ou três dias antes de morrer, sem dores mas em plena posse das suas faculdades, o meu pai deixou de fumar. Foi também nessa altura que entrou no pré-coma em que passou as últimas horas de vida. Morreu na cama, na cama dele, junto dos familiares, como deve ser, depois de uma vida bem vivida.
Ò morte, qual é o teu triunfo?
Invejo o meu pai por ter vivido num tempo em que se fumava, em que se tomava Rophinol, em que se bebia aguardente até cair, em que se morria fisicamente antes de se perder a razão, em que nos deixavam partir no tempo devido. Só queria da vida ter a sorte que ele teve e morrer suavemente na minha cama, com alguém que eu amo a segurar-me a mão e um enfermeiro a dar-me injecções de morfina. Morrer antes de me esquecer de quem sou, lúcida e consciente, uma jovem de 75 anos.
O meu pai nem sabe a sorte que teve. Mas eu sei. E não estou disposta a deixar de fumar senão dois ou três dias antes de morrer, na minha cama, com os meus amigos de volta. Nesse dia não me vai apetecer fumar, nem comer, nem beber, mas simplesmente partir, para Deus, onde pertenço. Assim seja.
Havia nicotina nos espermatozóides que me conceberam. A minha mãe, felizmente para mim, não fumava. Não porque não tivesse tentado mas não conseguiu porque não gostava. Isto de fumar não é para quem quer, é para quem gosta. Ela só queria ter estilo e ser aceite. Ficou-se pelo caminho. E nunca foi aceite nem nunca teve estilo (mas essa história não merece ser contada por ser demasiado banal).
Nasci. Nasci numa casa de fumador, num tempo em que as crianças andavam sozinhas na rua e descalças, e nenhum mal lhes vinha por isso.
Tempo de liberdade.
Desde que conheci o meu pai, conheci-o com um cigarro na boca. Naquela altura não gostava do cheiro. Há odores e paladares subtis que escapam aos sentidos mal desenvolvidos de uma criança, como o sabor suave de uma cenoura cozida.
Aquele cheiro era agressivo mas cresci com ele e habituei-me a ele. Aquele era o cheiro de que o pai estava em casa, à mesa, a fumar SG Filtro. E quando o pai estava em casa, à mesa, a fumar SG Filtro, nada me podia fazer mal.
Mais tarde, o pai começou também a beber. Aguardente, era o que ele bebia. E começou a beber muito, e também o cheiro da aguardente se tornou repulsivo. Ainda hoje a aguardente me cheira a morte.
O meu pai chegava a casa, de um clube privado onde se jogava à sueca até altas horas da noite, sentava-se à mesa a ler livros científicos e tomava um Rophinol para dormir. Esses eram os bons tempos.
Quando tinha sono ia para a cama e dormia como um anjo.
Não foi o cigarro que o matou, mas a aguardente. Cancro no pâncreas. Bem, cientificamente, pode-se dizer que foram as duas coisas, mais o Rophinol. Mais uma vida de prazeres até ao fim dos seus dias.
O meu pai teve tuberculose e foi mandado para o Caramulo curar-se, uns vinte anos antes de eu nascer, e a tuberculose não o matou. Irmão de sete ou oito irmãos, fora os que morreram em crianças, nem mais tarde uma operação que lhe tirou parte do estômago lhe deu sumiço.
Aos 75 anos, finalmente, chegou-lhe o cancro. Demorou uns seis meses. Ninguém sabia quanto tempo tinha de vida. Não houve quimioterapia nem radiações nem hospitais. Mas nesse tempo havia tempo para cuidar dos moribundos. O meu pai morreu na cama dele, no mesmo quarto em que eu durmo agora, com um enfermeiro que lhe vinha dar cada vez mais injecções de morfina. Dois ou três dias antes de morrer, sem dores mas em plena posse das suas faculdades, o meu pai deixou de fumar. Foi também nessa altura que entrou no pré-coma em que passou as últimas horas de vida. Morreu na cama, na cama dele, junto dos familiares, como deve ser, depois de uma vida bem vivida.
Ò morte, qual é o teu triunfo?
Invejo o meu pai por ter vivido num tempo em que se fumava, em que se tomava Rophinol, em que se bebia aguardente até cair, em que se morria fisicamente antes de se perder a razão, em que nos deixavam partir no tempo devido. Só queria da vida ter a sorte que ele teve e morrer suavemente na minha cama, com alguém que eu amo a segurar-me a mão e um enfermeiro a dar-me injecções de morfina. Morrer antes de me esquecer de quem sou, lúcida e consciente, uma jovem de 75 anos.
O meu pai nem sabe a sorte que teve. Mas eu sei. E não estou disposta a deixar de fumar senão dois ou três dias antes de morrer, na minha cama, com os meus amigos de volta. Nesse dia não me vai apetecer fumar, nem comer, nem beber, mas simplesmente partir, para Deus, onde pertenço. Assim seja.
Ser profeta é ser mais alto
Mais umas dentadas. Eu bem queria largar o osso, até porque os não fumadores fundamentalistas já começam a prejudicar a minha saúde (todos os fanáticos me fazem mal aos nervos) e depois só lá vai com a benza (enquanto não a proibirem também) mas o prato está cada vez mais suculento.
Queriam ir atrás de manias americanas? Pois tomem lá o extremismo e embrulhem:
Esta dos cinco metros é moda americana. Eu adicionaria uma tradição europeia e medieval aplicada aos leprosos: que fosse obrigatório que os fumadores de cigarro acesso circulassem pela rua com uma sineta ao pescoço para as pessoas saudáveis poderem fugir a tempo.
O que é que eu vos dizia?
Depois não digam que não foram avisados. Não se calem! Lutem pelo direito à escolha!
E o que querem os fumadores? É muito simples.
No trabalho: Salas para fumadores. Fechadas. Com janelas.
Na diversão: Cafés, restaurantes e bares para fumadores.
É de louvar o exemplo cívico que os fumadores têm dado desde que a lei entrou em vigor, cumprindo-a escrupulosamente, às vezes a pensar mais na multa dos outros que a sua desobediência propositada acartaria. Ao contrário do que dizem os fundamentalistas, afinal os fumadores não são o bando de energúmenos egoístas que se pintavam.
Já os não fumadores, por outro lado, tenho-o lido em vários sítios e sentido na pele a discriminação, têm demonstrado, desde as mais elegantes prosas de jornal ao mais jocoso comentário de rua, que pouco se importam com o incómodo que estão a causar. Pelo contrário, até gozam. E como não sou só eu que vejo isto, começo a achar a tendência preocupante. Coisas de Terceiro Reich, já o disse, afectam-me os nervos.
Mas não se iludam, não fumadores. Como muitos de vocês (os mais inteligentes) já perceberam, se eu fosse a vós punha as barbas de molho. Isto começa com o tabaco mas não pára por aí. Depressa chega à salsicha, ao sal, à gordura, ao exercício compulsivo. Se esta liga de doentes com cancro leva a melhor, não tarda que a associação de doentes de cancro do fígado nos queira salvar a todos de beber álcool. De seguida, a associação de hipertensos proíbe-nos de comer sal, gorduras e beber café. Se pensam que exagero, reparem de onde se importou a moda e pensem na América, o país mais hipócrita do mundo, que proíbe o fumo individual mas se recusa a admitir que as suas emissões de CO2 podem condenar a humanidade inteira. Quanto mais penso na América mais lamento o que vejo na Europa. É triste.
Queriam ir atrás de manias americanas? Pois tomem lá o extremismo e embrulhem:
Associação apela ao fim do tabaco em casas e carros
A União Humanitária dos Doentes com Cancro (UHDC) quer que seja proibido fumar em qualquer local, desde que estejam presentes menores ou não fumadores.
De acordo com Luís Filipe Soares, presidente da UHDC, «se está provado cientificamente que fumar prejudica gravemente a saúde de quem fuma e a dos que o rodeiam, não pode haver nenhum argumento para justificar que um fumador possa fumar junto de um não fumador».
Alargar a proibição de fumar
Congratulando-se com a «generalizada boa aceitação» da nova Lei do Tabaco, a UHDC diz acreditar que, depois de consolidada a actual Lei do Tabaco em toda a União Europeia, a referida lei irá mais longe.
A UHDC refere alguns exemplos que, segundo esta associação, serão abrangidos no futuro pela lei do Tabaco. Assim, a UHDC diz que «um dia» será proibido fumar em casa ou no carro, desde que o fumador esteja na presença de não fumador ou de menores. Mesmo ao ar livre, esta associação acredita que será proibido fumar na presença de menores ou a menos de cinco metros de outras pessoas.
Esta dos cinco metros é moda americana. Eu adicionaria uma tradição europeia e medieval aplicada aos leprosos: que fosse obrigatório que os fumadores de cigarro acesso circulassem pela rua com uma sineta ao pescoço para as pessoas saudáveis poderem fugir a tempo.
O que é que eu vos dizia?
ACORDEM!
ELES QUEREM ILEGALIZAR!
ELES QUEREM ILEGALIZAR!
Depois não digam que não foram avisados. Não se calem! Lutem pelo direito à escolha!
E o que querem os fumadores? É muito simples.
No trabalho: Salas para fumadores. Fechadas. Com janelas.
Na diversão: Cafés, restaurantes e bares para fumadores.
É de louvar o exemplo cívico que os fumadores têm dado desde que a lei entrou em vigor, cumprindo-a escrupulosamente, às vezes a pensar mais na multa dos outros que a sua desobediência propositada acartaria. Ao contrário do que dizem os fundamentalistas, afinal os fumadores não são o bando de energúmenos egoístas que se pintavam.
Já os não fumadores, por outro lado, tenho-o lido em vários sítios e sentido na pele a discriminação, têm demonstrado, desde as mais elegantes prosas de jornal ao mais jocoso comentário de rua, que pouco se importam com o incómodo que estão a causar. Pelo contrário, até gozam. E como não sou só eu que vejo isto, começo a achar a tendência preocupante. Coisas de Terceiro Reich, já o disse, afectam-me os nervos.
Mas não se iludam, não fumadores. Como muitos de vocês (os mais inteligentes) já perceberam, se eu fosse a vós punha as barbas de molho. Isto começa com o tabaco mas não pára por aí. Depressa chega à salsicha, ao sal, à gordura, ao exercício compulsivo. Se esta liga de doentes com cancro leva a melhor, não tarda que a associação de doentes de cancro do fígado nos queira salvar a todos de beber álcool. De seguida, a associação de hipertensos proíbe-nos de comer sal, gorduras e beber café. Se pensam que exagero, reparem de onde se importou a moda e pensem na América, o país mais hipócrita do mundo, que proíbe o fumo individual mas se recusa a admitir que as suas emissões de CO2 podem condenar a humanidade inteira. Quanto mais penso na América mais lamento o que vejo na Europa. É triste.
terça-feira, 8 de janeiro de 2008
Os uns e os outros
Ainda não me cansei de morder o osso mas há muito tempo que não me davam um tão bom onde afiar os dentes.
Claro que isto da lei da interdição total é só para os pobres. Logo um ou dois dias depois do Ano Novo ouvi um rico falar muito bem da sala de fumo do Gambrinus, restaurante fino de Lisboa, já totalmente equipado e preparado para receber a classe que pode pagar os seus vícios.
Alguém já viu os administradores das grandes empresas a fumar no passeio? E os deputados, acaso sentados nas escadarias de São Bento, fazendo a pausa? E no entanto, não é totalmente proibido fumar nos locais de trabalho? E na Assembleia da República?
Como há fumadores, põe-se a questão: onde é que eles fumam? Além do Casino, claro está. (Por acaso já li onde é que os deputados fumam, mas não é na rua.)
A quem esta lei afecta são os pequenos restaurantes e cafés onde só vai quem quer. Sobre restaurantes e cafés, acrescente-se, nos últimos quinze anos, mais coisa menos coisa, deixaram de ser o espaço de lazer e confraternização dos tempos do Bocage, passando pelos de Pessoa, e que deliciosamente ainda tive a sorte de saborear. Cafés onde se ia passar a tarde, onde não corriam connosco à hora do almoço, onde se podia ler, escrever e estudar, e até namorar. É curioso que foi mesmo a propósito desta lei que apanhei o peixe pela boca quando ouvi o dono de uma tasca comentar: "Se calhar até é bom. As pessoas já não fumam, vão-se embora mais depressa". Foi este clima pestilento de ganância que transformou os cafés e restaurantes em fábricas de chouriços que há muito tempo não frequento excepto por razões de força maior.
Mesmo assim, quando se pensava que esta lei vinha dar hipótese de finalmente separar as águas, fumadores para um lado, não fumadores para outro, como devia ser, com cafés e restaurantes diferenciados, vem apenas penalizar os pequenos espaços.
E se nos casinos se pode fumar, o que dizer de clubes privados? Em baixo, nos comentários, levantei a questão dos clubes de charutos e cachimbo. Um clube é um espaço privado só para sócios, não um espaço público. Em Portugal não existe (ou perdeu-se) esse tipo de associativismo, mas sinto cada vez mais falta dele por razões que nem têm a ver com esta lei. Entrada só para sócios. Fim de muitos problemas.
Continuo a não saber a resposta. Afinal, se eu decidir fazer da minha casa um clube de fumo é ilegal porque se junta muita gente a fumar?... O que é um espaço "público"? Um lugar onde entra toda a gente? E desde quando é que nos bares (uns mais do que outros) entra toda a gente? Se me proibirem de entrar na Kapital por não gostarem dos meus sapatos posso chamar a polícia e forçar o meu direito de entrada? Não, devido ao velho "direito de admissão". Logo, se eu decidir fazer um bar só para fumadores e proibir a entrada de não fumadores, ou vice versa, não estou a exercer o "direito de admissão"? A nova lei sobrepõe-se ao direito de admissão e ao direito dos clubes privados? Aceitam-se respostas.
Por último, os trabalhadores a quem esta lei afecta. Como sempre, os do costume. Os que têm pouco tempo para fazer pausas, os que não têm gabinetes, os que trabalham em grandes estruturas (prédios, centros comerciais, escolas, hospitais) de onde se demora muito tempo a sair para vir à rua. Isso é fundamentalismo, sim. Trabalhei num sítio que considero equilibrado. Havia uma cantina e espaço de convívio com uma sala à parte, totalmente isolada por vidro, onde se entrava, se fechava a porta e se fumava. Curiosamente, era também a única sala onde as janelas estavam abertas e se respirava o ar não viciado pelos ares condicionados. Nunca ninguém se queixou nem tinha de quê. Havia espaço para todos sem prejudicar ninguém nem o expulsar para a rua, de pé, de castigo, o que é altamente vexatório e toma contornos de perseguição porque é desnecessário.
Excepto, é claro, nos restaurantes finos e casinos, onde a saúde dos empregados já não parece ser tão importante porque servem a realeza. O fumoir foi sempre coisa de rico. As orgias de álcool e droga dos loucos anos 20 também. A criadagem fuma no estábulo e droga-se na sargeta. Agora percebe-se melhor quem é rico e quem não é. Uma lei, uma luz, um abismo.
Entretanto, neste mesmo Portugal de jantares de lagosta no Gambrinus e altas fumaradas no Casino do Estoril, Governo paga aumento das pensões (miseráveis) em 14 prestações, não vão os reformados perder a cabeça e gastar os cêntimos todos de uma vez, sei lá, num maço de cigarros.
Afinal, ele pode fumar no casino
2008/01/07 | 17:30 || Cláudia Lima da Costa
Inspector-geral da ASAE foi apanhado a fumar depois da entrada em vigor da nova lei, mas Casino explica que António Nunes estava numa zona de fumadores.
(...)
«Os conselheiros consideraram que é perfeitamente possível que nos casinos se possa fumar», disse Francisco George. Para o director-geral de Saúde, a lei é clara e não precisa de regulamentos nem de quaisquer outros procedimentos. Já Mário Assis Ferreira, considerou «equilibrada e não fundamentalista» a aplicação conjunta das leis do tabaco e jogo.
Claro que isto da lei da interdição total é só para os pobres. Logo um ou dois dias depois do Ano Novo ouvi um rico falar muito bem da sala de fumo do Gambrinus, restaurante fino de Lisboa, já totalmente equipado e preparado para receber a classe que pode pagar os seus vícios.
Alguém já viu os administradores das grandes empresas a fumar no passeio? E os deputados, acaso sentados nas escadarias de São Bento, fazendo a pausa? E no entanto, não é totalmente proibido fumar nos locais de trabalho? E na Assembleia da República?
Como há fumadores, põe-se a questão: onde é que eles fumam? Além do Casino, claro está. (Por acaso já li onde é que os deputados fumam, mas não é na rua.)
A quem esta lei afecta são os pequenos restaurantes e cafés onde só vai quem quer. Sobre restaurantes e cafés, acrescente-se, nos últimos quinze anos, mais coisa menos coisa, deixaram de ser o espaço de lazer e confraternização dos tempos do Bocage, passando pelos de Pessoa, e que deliciosamente ainda tive a sorte de saborear. Cafés onde se ia passar a tarde, onde não corriam connosco à hora do almoço, onde se podia ler, escrever e estudar, e até namorar. É curioso que foi mesmo a propósito desta lei que apanhei o peixe pela boca quando ouvi o dono de uma tasca comentar: "Se calhar até é bom. As pessoas já não fumam, vão-se embora mais depressa". Foi este clima pestilento de ganância que transformou os cafés e restaurantes em fábricas de chouriços que há muito tempo não frequento excepto por razões de força maior.
Mesmo assim, quando se pensava que esta lei vinha dar hipótese de finalmente separar as águas, fumadores para um lado, não fumadores para outro, como devia ser, com cafés e restaurantes diferenciados, vem apenas penalizar os pequenos espaços.
E se nos casinos se pode fumar, o que dizer de clubes privados? Em baixo, nos comentários, levantei a questão dos clubes de charutos e cachimbo. Um clube é um espaço privado só para sócios, não um espaço público. Em Portugal não existe (ou perdeu-se) esse tipo de associativismo, mas sinto cada vez mais falta dele por razões que nem têm a ver com esta lei. Entrada só para sócios. Fim de muitos problemas.
Continuo a não saber a resposta. Afinal, se eu decidir fazer da minha casa um clube de fumo é ilegal porque se junta muita gente a fumar?... O que é um espaço "público"? Um lugar onde entra toda a gente? E desde quando é que nos bares (uns mais do que outros) entra toda a gente? Se me proibirem de entrar na Kapital por não gostarem dos meus sapatos posso chamar a polícia e forçar o meu direito de entrada? Não, devido ao velho "direito de admissão". Logo, se eu decidir fazer um bar só para fumadores e proibir a entrada de não fumadores, ou vice versa, não estou a exercer o "direito de admissão"? A nova lei sobrepõe-se ao direito de admissão e ao direito dos clubes privados? Aceitam-se respostas.
Por último, os trabalhadores a quem esta lei afecta. Como sempre, os do costume. Os que têm pouco tempo para fazer pausas, os que não têm gabinetes, os que trabalham em grandes estruturas (prédios, centros comerciais, escolas, hospitais) de onde se demora muito tempo a sair para vir à rua. Isso é fundamentalismo, sim. Trabalhei num sítio que considero equilibrado. Havia uma cantina e espaço de convívio com uma sala à parte, totalmente isolada por vidro, onde se entrava, se fechava a porta e se fumava. Curiosamente, era também a única sala onde as janelas estavam abertas e se respirava o ar não viciado pelos ares condicionados. Nunca ninguém se queixou nem tinha de quê. Havia espaço para todos sem prejudicar ninguém nem o expulsar para a rua, de pé, de castigo, o que é altamente vexatório e toma contornos de perseguição porque é desnecessário.
Excepto, é claro, nos restaurantes finos e casinos, onde a saúde dos empregados já não parece ser tão importante porque servem a realeza. O fumoir foi sempre coisa de rico. As orgias de álcool e droga dos loucos anos 20 também. A criadagem fuma no estábulo e droga-se na sargeta. Agora percebe-se melhor quem é rico e quem não é. Uma lei, uma luz, um abismo.
Entretanto, neste mesmo Portugal de jantares de lagosta no Gambrinus e altas fumaradas no Casino do Estoril, Governo paga aumento das pensões (miseráveis) em 14 prestações, não vão os reformados perder a cabeça e gastar os cêntimos todos de uma vez, sei lá, num maço de cigarros.
domingo, 6 de janeiro de 2008
Direito de escolha
A minha raiva com esta Lei Anti-Tabaco não é a lei propriamente dita mas o espírito que a orienta. O meu post anterior sobre o assunto foi cómico mas este será sério. A coisa levantou questões tão graves que nem sei por onde começar.
Talvez por isto. O povo é ignorante, muito ignorante. A dona de um cafézinho aqui do bairro decidiu que o café dela (aí uns 20m2, se tanto) vai ser para fumadores. Foi daí, comprou o dístico azul e disse "aqui fuma-se". Totalmente ignorante da lei, não sabe que não lhe foi dado direito de escolha. Nem sabe que a qualquer momento lhe pode entrar um gajo pela loja adentro e multar à vontade. É assim a ignorância. É por isto também que o povo não se revolta quando é preciso. E a mim o que revolta é a ignorância.
Voltemos à lei do tabaco, sem esquecer o pormenor da ignorância. Esta lei lembra-me a proibição de dar milho aos pombos. Caso não saibam, caros leitores, é proibido e punido com coima, em Lisboa, o hábito inofensivo e milenar de alimentar os pombos no jardim. Desculpa: os excrementos estragam as estátuas. De modo que qualquer estátua é mais importante do que as criaturas vivas. É a mesma mentalidade que quase nos proíbe de deslocarmos os nossos animais nos transportes públicos. É a mentalidade paranóica do medo da morte e da higiene e da supremacia do ser humano que é veiculada a toda a hora como se pode ver pela histeria da gripe das aves. Nunca ninguém parou de dar comida aos pombos, mas às escondidas, porque aqui na rua há um bufo. Um bufo que ameaça vingar-se dos vizinhos chamando a polícia. Esta história caricata não é do tempo da PIDE e de Salazar, mas dos nossos dias, do nosso recém chegado 2008. A raça humana é o homem lobo do homem.
Esta lei, como as anteriores, é mais uma lei proibicionista e nazi (porque vexatória) que não dá hipótese de escolha aos donos dos estabelecimentos (ao contrário do que a minha ignorante vizinha pensa). Daqui até à proibição de fumar em nossa própria casa, o nosso espaço privado, vai um passinho. É isso mesmo que eu estou a dizer, meus amigos. Adivinha-se o caminho: a ilegalização do tabaco.
Se os meus amigos pensavam que me importa fumar na rua, mesmo em relação aos bares, tirem o cavalinho da chuva. Pelo contrário, não vejo a obrigatoriedade de ir fumar para a rua como um problema mas como uma oportunidade. Vou fazer amigos novos e inesperados.
A mim preocupa-me algo de mais perigoso. Cada vez que uma substância é ilegalizada nascem fortunas! Foi assim com o ópio, com a cocaína, com o haxixe, com o próprio álcool nos Estados Unidos durante a Lei Seca, e será assim com o tabaco. Países produtores e canais distribuidores têm todo o interesse em ver o tabaco ilegalizado. O tráfico compensa. A única razão porque hesitam é porque o tabaco não é, no fim de contas, tão viciante como as outras drogas. Estou a comparar a dependência da nicotina à dependência da heroína e mesmo do álcool. Qualquer fumador, com força de vontade, larga o tabaco de um dia para o outro. E mesmo que tenha recaídas, e compre um cigarro no mercado negro, esse cigarro não lhe incapacita os sentidos como as drogas alucinatórias e não aparece no emprego incapaz de trabalhar. Se existir dependência, depois do desmame, esta é psicológica, como a do jogo, a da internet, a do sexo, e outras mais graves como a auto-mutilação.
Se o mercado não percebesse isso, há muito que o tabaco estava proibido. Se a tendência for proibicionista, nada nos garante que o álcool não seja de venda proibida, como já é a pessoas "nitidamente embriagadas" ou que aparentem distúrbios "psicológicos". Leiam o cartaz quando estiverem no supermercado. Já nos dizem qual é o nível de embriaguez socialmente consentida. O que tem a ver o nível de embriaguez com a harmonia social e a saúde dos restantes cidadãos ainda estou para perceber. Estamos a falar de pessoas notoriamente embriagadas que já não se aguentam de pé e que não têm equilíbrio suficiente para entrar num carro sem ajuda quanto mais de o conduzir e que não oferecem perigo nenhum para a sociedade a não ser a ofensa inestética de um vómito. Mas que é proibido, é.
Em muitos países, também o suicídio foi proibido (e punido com pena de morte!) durante séculos e séculos de influência da igreja.
A tendência proibicionista também já começou com as benzodiazepinas ao volante. As benzodiazepinas, altamente viciantes, são outra substância que dava um grande jeito ilegalizar (e por sua vez substituir por pior). Actualmente estão ao preço da chuva e o número de viciados é aliciante.
No tempo da guerra, até o café e os chocolates forneceram uma excelente oportunidade de negócio para o mercado negro.
É tudo isto que a Lei do Tabaco traz ao de cimo, lembrando-nos de que nos Estados Unidos se chegou ao extremo de proibir o tabaco a uns tantos metros de qualquer casa habitada, e que temos de pensar se queremos uma sociedade em que o Estado se sobrepõe ao livre arbítrio ou se queremos uma sociedade equilibrada em que o direito de escolha é sagrado. Eu voto pela segunda.
Talvez por isto. O povo é ignorante, muito ignorante. A dona de um cafézinho aqui do bairro decidiu que o café dela (aí uns 20m2, se tanto) vai ser para fumadores. Foi daí, comprou o dístico azul e disse "aqui fuma-se". Totalmente ignorante da lei, não sabe que não lhe foi dado direito de escolha. Nem sabe que a qualquer momento lhe pode entrar um gajo pela loja adentro e multar à vontade. É assim a ignorância. É por isto também que o povo não se revolta quando é preciso. E a mim o que revolta é a ignorância.
Voltemos à lei do tabaco, sem esquecer o pormenor da ignorância. Esta lei lembra-me a proibição de dar milho aos pombos. Caso não saibam, caros leitores, é proibido e punido com coima, em Lisboa, o hábito inofensivo e milenar de alimentar os pombos no jardim. Desculpa: os excrementos estragam as estátuas. De modo que qualquer estátua é mais importante do que as criaturas vivas. É a mesma mentalidade que quase nos proíbe de deslocarmos os nossos animais nos transportes públicos. É a mentalidade paranóica do medo da morte e da higiene e da supremacia do ser humano que é veiculada a toda a hora como se pode ver pela histeria da gripe das aves. Nunca ninguém parou de dar comida aos pombos, mas às escondidas, porque aqui na rua há um bufo. Um bufo que ameaça vingar-se dos vizinhos chamando a polícia. Esta história caricata não é do tempo da PIDE e de Salazar, mas dos nossos dias, do nosso recém chegado 2008. A raça humana é o homem lobo do homem.
Esta lei, como as anteriores, é mais uma lei proibicionista e nazi (porque vexatória) que não dá hipótese de escolha aos donos dos estabelecimentos (ao contrário do que a minha ignorante vizinha pensa). Daqui até à proibição de fumar em nossa própria casa, o nosso espaço privado, vai um passinho. É isso mesmo que eu estou a dizer, meus amigos. Adivinha-se o caminho: a ilegalização do tabaco.
Se os meus amigos pensavam que me importa fumar na rua, mesmo em relação aos bares, tirem o cavalinho da chuva. Pelo contrário, não vejo a obrigatoriedade de ir fumar para a rua como um problema mas como uma oportunidade. Vou fazer amigos novos e inesperados.
A mim preocupa-me algo de mais perigoso. Cada vez que uma substância é ilegalizada nascem fortunas! Foi assim com o ópio, com a cocaína, com o haxixe, com o próprio álcool nos Estados Unidos durante a Lei Seca, e será assim com o tabaco. Países produtores e canais distribuidores têm todo o interesse em ver o tabaco ilegalizado. O tráfico compensa. A única razão porque hesitam é porque o tabaco não é, no fim de contas, tão viciante como as outras drogas. Estou a comparar a dependência da nicotina à dependência da heroína e mesmo do álcool. Qualquer fumador, com força de vontade, larga o tabaco de um dia para o outro. E mesmo que tenha recaídas, e compre um cigarro no mercado negro, esse cigarro não lhe incapacita os sentidos como as drogas alucinatórias e não aparece no emprego incapaz de trabalhar. Se existir dependência, depois do desmame, esta é psicológica, como a do jogo, a da internet, a do sexo, e outras mais graves como a auto-mutilação.
Se o mercado não percebesse isso, há muito que o tabaco estava proibido. Se a tendência for proibicionista, nada nos garante que o álcool não seja de venda proibida, como já é a pessoas "nitidamente embriagadas" ou que aparentem distúrbios "psicológicos". Leiam o cartaz quando estiverem no supermercado. Já nos dizem qual é o nível de embriaguez socialmente consentida. O que tem a ver o nível de embriaguez com a harmonia social e a saúde dos restantes cidadãos ainda estou para perceber. Estamos a falar de pessoas notoriamente embriagadas que já não se aguentam de pé e que não têm equilíbrio suficiente para entrar num carro sem ajuda quanto mais de o conduzir e que não oferecem perigo nenhum para a sociedade a não ser a ofensa inestética de um vómito. Mas que é proibido, é.
Em muitos países, também o suicídio foi proibido (e punido com pena de morte!) durante séculos e séculos de influência da igreja.
A tendência proibicionista também já começou com as benzodiazepinas ao volante. As benzodiazepinas, altamente viciantes, são outra substância que dava um grande jeito ilegalizar (e por sua vez substituir por pior). Actualmente estão ao preço da chuva e o número de viciados é aliciante.
No tempo da guerra, até o café e os chocolates forneceram uma excelente oportunidade de negócio para o mercado negro.
É tudo isto que a Lei do Tabaco traz ao de cimo, lembrando-nos de que nos Estados Unidos se chegou ao extremo de proibir o tabaco a uns tantos metros de qualquer casa habitada, e que temos de pensar se queremos uma sociedade em que o Estado se sobrepõe ao livre arbítrio ou se queremos uma sociedade equilibrada em que o direito de escolha é sagrado. Eu voto pela segunda.
Cortem!
Hoje tinha preparado ficar por casa e talvez trabalhar em mais um capítulo das minhas memórias sobre o movimento gótico mas a mente anda demasiado por outras bandas.
Vou antes salientar este excelente post do Henrique no Hora Absurda, sobre a nossa muito portuguesa miséria envergonhada:
Pois eu acho que ainda não cortaram o suficiente a água, a luz, o pão. Deviam cortar mais, para ver se as bestas acordam. Ainda há muita besta adormecida. Apenas um quinto das bestas abriu os olhos. O resto queixa-se que os gajos que cortam a água, a luz, o telefone, é que são maus, e esquecem-se que durante 30 anos andaram a votar no sítio errado, se votaram de todo, abstraindo-se de toda a responsabilidade sobre o futuro do país. E entretanto lá se vão entretendo com futebóis, "morangos" e créditos até vir o homem do corte. Aí, ai que d'el rey, que são maus! Chamam nomes aos operadores de call center, querem bater aos gajos que lhes vêm buscar o carro, vandalizam as casas que são forçados a abandonar quando não pagam as prestações. Parecem crianças a quem tiram um brinquedo.
Eu digo aos homens e mulheres deste país: deviam cortar-lhes os tomates, sem anestesia.
Corte-se!
De onde vem a minha implacável intolerância à cobardia? Já aqui o disse mais de uma vez, eu não devia estar na internet. Não venho da classe média. Venho de mais baixo, muito mais baixo. Em 2005, ano em que estive desempregada, passei muito frio porque não havia dinheiro para ter o aquecedor ligado. Cheguei a escrever este blog, à noite, de luvas e gorro. Agora já o posso dizer, porque já passou. Não sei se não se repetirá. A única razão porque mantive a internet foi a necessidade de procurar emprego. E muitas vezes pensava como seria se não houvesse dinheiro para a electricidade que sustenta o computador e o telefone que recebia as chamadas. Quando se é pobre, uma coisa arrasta a outra e a certa altura já nem há dinheiro para procurar emprego. Mas nunca, NUNCA!, pensaria em queixar-me dos homens maus que não dão o que não pago. Esta ideia que tudo é de graça porque o Estado tudo dá foi o maior erro em que caiu a geração que desgraçou a minha, a geração que fez o 25 de Abril. A geração que hoje vive dos altos ordenados ou da reforma que eu não terei. A mesma geração que só acorda quando não tem água, nem luz, nem comida, e lhes levam o carro, a casa, e acorda na rua. E ainda há quem passe pelos sem abrigo e ache que a culpa é deles.
Enquanto houver quem pense assim, corte-se! Aliás, vou corrigir: enquanto a maioria pensar assim, cortar-se-à. E cortar-se-à! E cortar-se-à! E é bem feita. Ainda devia doer mais.
Vou antes salientar este excelente post do Henrique no Hora Absurda, sobre a nossa muito portuguesa miséria envergonhada:
O nosso Presidente da República mandou uma boca no sentido de se remendar a moralidade tiocrática que pulula por aí. Deu a dica ao governo para se reduzir o salário dos gestores de empresas. Mas trata-se, efectivamente, de uma forma de tapar ainda mais os olhos das bestas que já não veem um boi à frente do nariz. Não veem, não senhor. Vamos supor que o governo fazia baixar aqueles salários. Mesmo que a redução fosse de 50%, esses tios gestores não davam por isso. Arranjariam forma de compensar essa redução com mais benesses das empresas que gerem. Em certas empresas são os tios gestores que determinam os seus salários e benesses. E como aquelas empresas prestam serviços em regime de monopólio ou em cartel com outras, elas podem sempre apresentar lucros fabulosos porque impõem o preço dos seus serviços. Nem o consumidor pode sequer boicotar-lhes a estratégia. Tomemos como exemplo a electricidade. De que adianta pouparmos na electricidade se o preço sobe e continuamos a pagar o mesmo porque os lucros não podem baixar, têm que subir sempre. Quanto mais pouparmos, mais lucros terão a EDP, a REN, a Iberdrola, etc.. Depois são os mais pobres que sofrem porque eles não poderão pagar a conta e a EDP manda cortar a luz sem dó nem piedade. Quantos lares já têm a luz cortada neste momento em Portugal? Pergunte-se aos Me®dia, talvez saibam (isso é que era bom!).
(...)
Muitas empresas que prestam serviços são apenas fachadas “financeiras”, nem prestam já serviços. Mandam outras empresas menores fazer o serviço que eles supostamente deviam prestar - é aquilo a que eles pomposamente chamam de outsourcing para que as bestas pensem que se trata de algo moderno e bom para as bestas. Mas é, tão somente, uma forma de explorar melhor as bestas. As pequenas empresas que prestam serviços às grandes financeiras (EDP, Telecom, Netcabo, SMAS), procuram sacar o máximo delas. Do género de fazerem mal uma instalação para, depois do cliente reclamar, enviarem de novo os seus técnicos ao cliente e facturarem pela resolução do problema “fabricado” - a história da carraça, conhecem? Mas quem paga tudo é o cliente, isto é, nós, as bestas.
(...)
Por isso, caros cidadãos (entenda-se bestas!), preparem-se para apertar ainda mais o cinto. Não dou conselhos a ninguém, mas vejo que a única forma de escaparmos à miséria total é deixarmos de necessitar dos serviços deles; procuremos alternativas, se houver. Ou habituemo-nos a viver sem luz, sem água, sem nada. Isto é que um verdadeiro PR devia dizer. Tudo o resto vem por acréscimo, porque saúde, educação, etc., tudo segue a mesma lógica tiocrática que consegue enganar as bestas com medidas que favorecem cada vez mais os tios, e mais ninguém.
Pois eu acho que ainda não cortaram o suficiente a água, a luz, o pão. Deviam cortar mais, para ver se as bestas acordam. Ainda há muita besta adormecida. Apenas um quinto das bestas abriu os olhos. O resto queixa-se que os gajos que cortam a água, a luz, o telefone, é que são maus, e esquecem-se que durante 30 anos andaram a votar no sítio errado, se votaram de todo, abstraindo-se de toda a responsabilidade sobre o futuro do país. E entretanto lá se vão entretendo com futebóis, "morangos" e créditos até vir o homem do corte. Aí, ai que d'el rey, que são maus! Chamam nomes aos operadores de call center, querem bater aos gajos que lhes vêm buscar o carro, vandalizam as casas que são forçados a abandonar quando não pagam as prestações. Parecem crianças a quem tiram um brinquedo.
Eu digo aos homens e mulheres deste país: deviam cortar-lhes os tomates, sem anestesia.
Corte-se!
De onde vem a minha implacável intolerância à cobardia? Já aqui o disse mais de uma vez, eu não devia estar na internet. Não venho da classe média. Venho de mais baixo, muito mais baixo. Em 2005, ano em que estive desempregada, passei muito frio porque não havia dinheiro para ter o aquecedor ligado. Cheguei a escrever este blog, à noite, de luvas e gorro. Agora já o posso dizer, porque já passou. Não sei se não se repetirá. A única razão porque mantive a internet foi a necessidade de procurar emprego. E muitas vezes pensava como seria se não houvesse dinheiro para a electricidade que sustenta o computador e o telefone que recebia as chamadas. Quando se é pobre, uma coisa arrasta a outra e a certa altura já nem há dinheiro para procurar emprego. Mas nunca, NUNCA!, pensaria em queixar-me dos homens maus que não dão o que não pago. Esta ideia que tudo é de graça porque o Estado tudo dá foi o maior erro em que caiu a geração que desgraçou a minha, a geração que fez o 25 de Abril. A geração que hoje vive dos altos ordenados ou da reforma que eu não terei. A mesma geração que só acorda quando não tem água, nem luz, nem comida, e lhes levam o carro, a casa, e acorda na rua. E ainda há quem passe pelos sem abrigo e ache que a culpa é deles.
Enquanto houver quem pense assim, corte-se! Aliás, vou corrigir: enquanto a maioria pensar assim, cortar-se-à. E cortar-se-à! E cortar-se-à! E é bem feita. Ainda devia doer mais.
quinta-feira, 3 de janeiro de 2008
Quem tem medo da morte não merece estar vivo
Os não-fumadores estão a começar a meter-me raiva.
Estão dois drogados a dar um chuto num casebre abandonado. Entra outro e acende um cigarro.
- Ò dá de frosques, não podes fumar aqui que é um espaço público! Queres-te matar mata-te lá fora, ò malcheiroso!
Já há muito tempo que os não-fumadores se estão a esticar. Não falo de espaços fechados. Falo das caras de enjoo nas filas para o autocarro, as velhas a tossir a fingir que têm bronquite, e outras que tais que um dia se me apanham do avesso ainda ficam sem dentes que a paciência tem limites e eu sou do signo Touro que vai enchendo até rebentar.
Já há muito tempo que é proibido fumar nos espaços onde trabalho. Restaurantes e cafés, cinemas e teatros, com a crise que está, todas as razões para não pôr lá os pés são boas razões. E sejamos francos. Malta dos cafés e dos restaurantes já não querem lá os clientes a fazer sala à volta da bica. Querem é servir sopas, sandes, pregos no prato ao balcão, fechar às 6 da tarde que ala que se faz tarde, e pôr a gente toda a andar depois de consumir.
Para ir conversar com amigos restam os bares. Esta é que é a razão da minha raiva. Ninguém deixa de sair à noite por causa do fumo. Quem quer saúde vai ao ginásio. Ò meus amigos, os bares são para a má vida! Não se ponham a pau e ainda nos proibem de beber álcool! O quê, riem? Foi assim que Al Capone fez fortuna. Lei Seca.
Quem vai a um bar e não fuma, e possivelmente não bebe, vai ao bar para quê? *bate na testa* Que burra que eu sou! Vai ao engate! E não se esquece de levar preservativo, por causa das doenças. Conheci um homem assim, daqueles que não andam nos transportes públicos por causa dos germes. Há de facto uma doença, uma doença mental que não tem cura. Como se não bastasse já a percentagem de tarados na noite lisboeta, só cá nos faltam os health freaks!
Até já estava a ficar muito zangada com as perspectivas desta invasão de gajos tarados, quando o presidente da ASAE, uma das entidades que irá fiscalizar a aplicação da lei que proibe o fumo em espaços fechados de utilização pública, foi fotografado pelo Diário de Notícias (DN) a fumar uma cigarrilha no Casino do Estoril às 02.30 da manhã do dia 01 de Janeiro.
A mim lembra-me aquela "mais depressa se apanha um mentiroso do que um coxo" ou ainda aquela "faz o que eu digo, não faças o que eu faço". Isto da leis é o para o Zé Povinho, até porque diz o figurão: "Em explicações ao DN, António Nunes considerou que a nova lei «não proíbe expressamente o tabaco nos casinos e nas salas de jogos», justificando com a existência de um conflito de interesses com a lei do jogo, que contudo, não faz qualquer referência ao consumo de tabaco."
E o charuto, pode meter-se na boca? Chupar no cachimbo, pode-se? Se calhar a lei é omissa. Agora já sei que posso fumar no Casino. É bem. Probir aqueles jogadores viciados de fumar ainda lhes curava o vício... de jogar. E isso não pode ser. Olha o dinheirinho que se perde. Isto há espaços públicos, para o Zé Enrabado, e espaços finos, para a elite!
Entretanto, estava um casal a foder a um canto de uma discoteca, no escurinho. Quando se vêm, ambos acendem um cigarro. O segurança, que estava a topar tudo, chega-se ao pé deles e diz:
- Amigos, aqui não se pode fo... fumar.
Estão dois drogados a dar um chuto num casebre abandonado. Entra outro e acende um cigarro.
- Ò dá de frosques, não podes fumar aqui que é um espaço público! Queres-te matar mata-te lá fora, ò malcheiroso!
Já há muito tempo que os não-fumadores se estão a esticar. Não falo de espaços fechados. Falo das caras de enjoo nas filas para o autocarro, as velhas a tossir a fingir que têm bronquite, e outras que tais que um dia se me apanham do avesso ainda ficam sem dentes que a paciência tem limites e eu sou do signo Touro que vai enchendo até rebentar.
Já há muito tempo que é proibido fumar nos espaços onde trabalho. Restaurantes e cafés, cinemas e teatros, com a crise que está, todas as razões para não pôr lá os pés são boas razões. E sejamos francos. Malta dos cafés e dos restaurantes já não querem lá os clientes a fazer sala à volta da bica. Querem é servir sopas, sandes, pregos no prato ao balcão, fechar às 6 da tarde que ala que se faz tarde, e pôr a gente toda a andar depois de consumir.
Para ir conversar com amigos restam os bares. Esta é que é a razão da minha raiva. Ninguém deixa de sair à noite por causa do fumo. Quem quer saúde vai ao ginásio. Ò meus amigos, os bares são para a má vida! Não se ponham a pau e ainda nos proibem de beber álcool! O quê, riem? Foi assim que Al Capone fez fortuna. Lei Seca.
Quem vai a um bar e não fuma, e possivelmente não bebe, vai ao bar para quê? *bate na testa* Que burra que eu sou! Vai ao engate! E não se esquece de levar preservativo, por causa das doenças. Conheci um homem assim, daqueles que não andam nos transportes públicos por causa dos germes. Há de facto uma doença, uma doença mental que não tem cura. Como se não bastasse já a percentagem de tarados na noite lisboeta, só cá nos faltam os health freaks!
Até já estava a ficar muito zangada com as perspectivas desta invasão de gajos tarados, quando o presidente da ASAE, uma das entidades que irá fiscalizar a aplicação da lei que proibe o fumo em espaços fechados de utilização pública, foi fotografado pelo Diário de Notícias (DN) a fumar uma cigarrilha no Casino do Estoril às 02.30 da manhã do dia 01 de Janeiro.
A mim lembra-me aquela "mais depressa se apanha um mentiroso do que um coxo" ou ainda aquela "faz o que eu digo, não faças o que eu faço". Isto da leis é o para o Zé Povinho, até porque diz o figurão: "Em explicações ao DN, António Nunes considerou que a nova lei «não proíbe expressamente o tabaco nos casinos e nas salas de jogos», justificando com a existência de um conflito de interesses com a lei do jogo, que contudo, não faz qualquer referência ao consumo de tabaco."
E o charuto, pode meter-se na boca? Chupar no cachimbo, pode-se? Se calhar a lei é omissa. Agora já sei que posso fumar no Casino. É bem. Probir aqueles jogadores viciados de fumar ainda lhes curava o vício... de jogar. E isso não pode ser. Olha o dinheirinho que se perde. Isto há espaços públicos, para o Zé Enrabado, e espaços finos, para a elite!
Entretanto, estava um casal a foder a um canto de uma discoteca, no escurinho. Quando se vêm, ambos acendem um cigarro. O segurança, que estava a topar tudo, chega-se ao pé deles e diz:
- Amigos, aqui não se pode fo... fumar.
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