sábado, 27 de outubro de 2018

Sanctum (2011)

 

Um grupo de espeleólogos aventureiros monta uma operação num complexo de cavernas inexploradas. A princípio está tudo tão bem organizado que até parece turismo de aventura. Até que um ciclone inesperado inunda as cavernas. A partir daqui os mergulhadores presos na gruta ficam com a saída bloqueada e começa uma desesperada luta pela sobrevivência. Este filme é inspirado em acontecimentos reais.
Por alguma razão, pensei que Sanctum ia ter ameaças sobrenaturais. Devia estar a confundir com outro parecido, The Descent. Sendo assim, é apenas um filme-desastre com elementos de terror, um terror muito velhinho: o de ser enterrado vivo. Enterrados vivos já estão todos, dentro de um sistema de grutas sem conhecerem a saída. Ou morrem por falta de oxigénio ou morrem afogados. A grande experiência destes espeleólogos não é suficiente na luta contra as cavernas. As mortes não são gratuitas.
O filme é muito competente a mostrar-nos a urgência, o perigo, a claustrofobia dos espaços apertados dentro e fora de água. É daqueles filmes que nos deixam sem fôlego porque temos a tendência de conter a respiração quando os personagens estão a mergulhar sem oxigénio.
As personagens não são fascinantes mas é impossível não torcerá por Josh, filho adolescente do espeleólogo principal, o único que não está ali de sua vontade mas porque o seu pai acha interessante levá-lo com ele nas expedições como “actividade de férias”. Pobre miúdo. Do que percebemos do filme, a mãe do miúdo já não é viva, ou o pai do miúdo estaria em mais apuros fora da gruta quando ela soubesse a que perigos aquele pai anda a expor o filho.
Tirando esta relação pai-filho, não há muito mais para comentar a nível de personagens. Os sobreviventes tentam desesperadamente encontrar outra saída, a caverna continua a inundar-se, os espaços são cada vez mais apertados, o material e os alimentos começam a ser perdidos no percurso ou a ficar inutilizados. O desastre é inevitável. Resta saber quem sobrevive.
E afinal não é necessária a ameaça sobrenatural. Basta o instinto de sobrevivência que acaba por virar uns contra os outros, tornando uma má situação numa situação ainda pior.

É um filme que vai agradar aos amantes de aventura que também gostam de terror (algumas mortes são bastante chocantes). Um daqueles que nos deixa agarrados ao écran do princípio ao fim.



15 em 20


Nota: Este filme teve ainda mais impacto em mim depois do recente incidente na Tailândia. Agora percebo que tipo de estreitos eles tiveram de vencer, debaixo de água, em que tinham de retirar o equipamento para passar. Não é para amadores. Aqueles miúdos tiveram mesmo muita sorte.

sábado, 20 de outubro de 2018

Ugetsu / Contos da Lua Vaga (1953)

 

O cinema japonês clássico é uma das minhas paixões “secretas”. Não sei explicar porquê. Talvez porque são sempre relatos de crueldade e servidão em que a sensibilidade sobressai de forma mais pungente do que nos filmes ocidentais. Uma sensibilidade muito japonesa que ainda se nota nos filmes modernos, até nos de terror.
Tenho a certeza de que já tinha visto “Contos da Lua Vaga”, filme de Kenji Mizoguchi de 1953. (Recordo-me de um ciclo de cinema japonês que passou na RTP2 há muitos anos, em que vi bastante filmografia da época.) Deve ter sido há demasiado tempo para lembrar e voltei a ver. Não me arrependi.
Não são filmes para toda a gente. Quem não conseguir abstrair-se do preto e branco e da actuação exagerada dos actores (como se estivessem no teatro), ou quem não conseguir “entrar” na cultura que serve de pano de fundo, dificilmente gostará do género. Nada aqui é Hollywood, e ainda bem.
“Contos da Lua Vaga” é um filme moral sobre a ambição e a ganância. Genjuro é um camponês pobre e humilde, casado e pai de um filho pequeno, que vive num casebre contíguo ao da sua irmã, Ohama, também casada com Tobei, igualmente camponês. A acção passa-se no século XVI, durante uma guerra civil. Genjuro domina a arte da olaria e aproveita a passagem dos exércitos para vender os seus trabalhos no mercado. Faz tanto dinheiro que nunca mais pensa nutra coisa. Por seu lado, o cunhado Tobei mete na cabeça que quer ser um samurai porque não quer ser pobre toda a vida. Ambas as esposas advertem contra a ambição em demasia mas, apesar dos riscos que correm em tempo de guerra, aceitam acompanhar Genjuro ao mercado para venderem mais olaria.
Fazem o caminho de barco, para evitarem os exércitos que andam a pilhar as aldeias, mas o rio também não é livre de perigos. Depois de avisados de que existem por ali piratas, Genjuro deixa a mulher e o filho em segurança, na margem do rio, e continua a viagem. Tobei e Ohama seguem com ele.
No mercado, fazem grande sucesso. A olaria de Genjuro é magnífica. Genjuro sonha em comprar sedas para presentear a sua esposa mas Tobei pega na sua parte e vai comprar uma armadura e uma lança que lhe permitam entrar ao serviço de um senhor da guerra. Ohama vai atrás dele, mas não o encontra. Perdida em terreno desconhecido, é emboscada por soldados que a violam. A cena da violação, que não se vê, é um dos exemplos desta sensibilidade nipónica de que falava a início. Ficamos na dúvida do que acontece, mas as dúvidas são esclarecidas quando um dos soldados lhe atira dinheiro como despedida. Acrescentado, ao abuso, injúria.
Entretanto, no mercado, Genjuro é abordado pela nobre dama Wakasa e sua aia que lhe fazem uma grande encomenda a ser entregue na casa senhorial. Quando Genjuro lá chega as coisas ficam estranhas. A dama Wakasa começa a seduzi-lo com cortesias e cantigas de requinte nobre e Genjuro não tem força para resistir. A aia ajuda-o a perceber o que tem de fazer: casar com Wakasa, imediatamente. Enfeitiçado, Genjuro esquece a mulher e o filho e fica sob o domínio de Wakasa. Nem repara, ao entrar na casa, que a entrada parece completamente abandonada. Sim, é uma casa assombrada. Wakasa, a aia, até as criadas, são todas fantasmas.
Entretanto, Tobei consegue tornar-se um homem importante ao serviço de um samurai. A sua única intenção é voltar a casa, para mostrar à mulher Ohama como está rico e prestigiado. Pelo caminho, os vassalos pedem-lhe que pare e descanse num bordel do caminho. Onde encontra Ohama, forçada à prostituição agora que ficou destituída de tudo pelos exércitos inimigos.
Ainda sob o efeito de Wakasa, Genjuro vai fazer mais compras para o seu novo lar quando encontra um sábio que o alerta. Incrédulo, descobre que todo o clã de Wakasa foi morto por inimigos e que a sombra da morte paira sobre ele também a não ser que fuja daquela assombração. Genjuro não consegue afastar-se do seu amor fantasma, mas permite que o sábio o exorcize. Quando ele regressa à casa senhorial, Wakasa está mais determinada do que nunca em levá-lo dali, agora que o considera seu marido, para a sua “terra natal”. Mas desta vez Genjuro está protegido do encantamento graças ao exorcismo que recebeu.
Não vou contar o fim. É digno de se ver e reserva ainda muitas surpresas. Os amantes do sobrenatural e do terror vão certamente gostar deste filme.

Para mais informações sobre o filme, em inglês, podem consultar o título original, Ugetsu.

15 em 20

sábado, 13 de outubro de 2018

Frozen / Pânico na Neve (2010)


Três jovens são acidentalmente esquecidos num teleférico de uma estância de esqui. É noite, a temperatura é negativa, há uma tempestade de neve. Mas o frio não é o maior problema deles. Este é um daqueles casos em que o título português se aplica melhor do que o original. Sim, o frio é um problema também, mas o filme nunca se centrou na eventualidade de morrerem de hipotermia. Pelo contrário, se as temperaturas fossem assim tão baixas a história teria acabado muito mais cedo. Esquecidos no teleférico, a descoberto, pendurados a demasiada altura do chão, eles sabem que a estância de esqui vai ficar fechada a semana toda. Ninguém virá procurá-los. Não têm telemóveis com eles. Têm de sair dali ou morrerão de sede, de fome ou de frio, consoante as condições climatéricas a que ficarão expostos.
É um pouco incerto se a distância do chão é suficiente para saltar. Um deles tenta e parte ambas as pernas. Como se não fosse já uma situação terrível, de repente aparece uma alcateia de lobos atraída pelo sangue…
A premissa do filme é muito simples, mas as consequências são dramáticas. Este é um daqueles “podia acontecer a toda a gente” nas circunstâncias erradas. Não precisamos de investir muito nas personagens. O que conhecemos delas antes do acidente é suficiente para percebermos que não são excepcionais. São apenas pessoas normais apanhadas numa situação extrema em que têm de encontrar maneira de sobreviver.
E sim, existem alguns problemas de credibilidade neste filme. Por exemplo, que jovens desta faixa etária não levassem os telemóveis, mesmo arriscando-se a parti-los. Se fosse gente mais velha ainda acreditaria. Gente desta idade, não. Desde quando é que o risco de partir o telemóvel os impede? (Papá compra outro.) Mas de certeza que o filme arranjaria maneira de tornar os telemóveis inoperacionais (falta de rede) e ia dar ao mesmo. Por isso não considero uma falha significativa. Menos credível é que uma estância de esqui estivesse fechada desde domingo à noite até sexta-feira, isto é, a semana inteira, em plena época alta. Há sempre gente de férias, especialmente as pessoas que gostam de esquiar e que marcam as férias de propósito neste período. Isto já faz menos sentido. Mas a presença dos lobos, que também é estranha num local tão frequentado, até pode ser explicada por este lapso regular de actividade da estância. Uma estância, aliás, que devia ser encerrada por motivos de segurança. Bastou balançar um bocadinho o teleférico para saltar o parafuso principal que o mantinha preso à estrutura!
Mas nada disto é impossível e pode resultar de uma simples confluência de azares. Os nossos jovens estavam no sítio errado à hora errada. A partir do momento em que compreendemos a situação ficamos irremediavelmente agarrados ao filme. À medida que o perigo aumenta, temos de ver o final. É impossível não torcer por eles.
“Frozen” é um bom filme de “terror situacional”. Curto, tenso, sem desvios desnecessários, de um suspense de cortar à faca. Gostei e recomendo. O título é que podia ter sido mais bem escolhido.

Nota: os amantes de gore vão preferir ver a versão em DVD, que mostra cenas (não vou revelar de que tipo) que no filme original apenas se ouvem. Pessoalmente, bastou-me ouvir. Aplaudo a decisão de não cair na tentação de mostrar. Neste caso, Adam Green, o realizador, fez uma boa escolha em deixar certos pormenores à imaginação.


15 em 20

sábado, 6 de outubro de 2018

Black Death / Morte Negra (2010)

O ano é 1348. O pano de fundo é o surto de peste bubónica na Inglaterra medieval. Eu esperava um drama histórico à volta da epidemia mas o filme anda mais no género Aventura a piscar o olho à Grimdark Fantasy.
O enredo é muito curto. A mando da igreja, um grupo de cavaleiros dirige-se para uma vila isolada em terreno pantanoso onde, segundo rumores, não só as pessoas são imunes à peste como existe um necromante que ressuscita os mortos. O que só pode significar que têm um pacto com o Diabo, obviamente. O objectivo do líder dos cavaleiros, Ulrich (Sean Bean, Boromir em “O Senhor dos Anéis” e Ned Stark em “Guerra dos Tronos”) é capturar e executar barbaramente esse herege. No caminho, alicia um jovem noviço como guia até à vila recôndita (Eddie Redmayne, que também conhecemos como protagonista da adaptação de ”The Pillars of the Earth”).



Chegando à vila em questão, é óbvio que algo de estranho se passa. Aqui não há pilhas de mortos a queimar ou enterrar. A igreja está abandonada ao pó e às teias de aranha e os residentes converteram-se ao paganismo. A pessoa mais importante da vila parece ser a bela Langiva (Carice van Houten, a Melisandre de “Guerra dos Tronos”). Obviamente, tem de ser uma bruxa.


O filme é brutal e cru do princípio ao fim. Morte não falta (natural ou provocada), violência muito menos, e outras nojices de revirar o estômago como os corpos cobertos de bubões purulentos. O filme salva-se à minha classificação de porno-tortura porque tem o bom gosto de não mostrar todos os pormenores tão explicitamente como podia ter feito. Nos instantes piores, a câmara afasta-se.
O que não quer dizer que este não seja um filme de violência gratuita, ou quase. Chegamos ao fim sem perceber qual era o objectivo. Afinal, por quem é que devíamos torcer? Os cristãos são fanáticos, maus e desleais. Os pagãos são desleais, maus e fanáticos. O jovem monge, o único que prometia ser uma pessoa decente, acaba tão mau como eles. A bruxa, afinal, é apenas uma curandeira que percebe de ervas e drogas. O piscar de olho à Fantasia, que o filme prometia desde o princípio, desfaz-se em explicações sherlockianas: não são ressurreições, são embustes (Teria sido muito mais interessante ter enveredado pelo sobrenatural.) O que sobra então deste filme? Todos são maus, a religião é má, a vida não é boa, a peste é pior. Tudo é negro como a peste.
Mesmo assim, o filme não é muito difícil de se ver graças ao bom gosto de evitar a porno-tortura. Promete mais do que oferece, mas oferece o bastante. No mínimo dos mínimos podemos regalar-nos com os cenários, o guarda-roupa, a fotografia. Tudo muito convincente do período histórico que representa, se não entrarmos em grande minúcia.
E os fãs da “Guerra dos Tronos” vão adorar o confronto entre este quase-Ned Stark e esta quase-Melisandre, disto tenho a certezinha absoluta. Eu, confesso, diverti-me.

13 em 20