“Mythos” é um novo programa da RTP2 em que José Pedro Serra nos conta a história e as origens dos mitos mais basilares da tradição clássica.
A linguagem é erudita e académica e não vai ser fácil de acompanhar por todos. O programa é apenas isto: José Pedro Serra a falar, com alguns exemplos da representação pictórica do mito em questão ao longo dos séculos, e pode ser considerado aborrecido por quem não esteja muito interessado. Lembra-me um pouco os programas de História do saudoso Professor José Hermano Saraiva, mas ainda mais parado.
Mesmo assim, recomendo a todos os amantes dos grandes mitos (muitos deles reflectidos na tradição cristã, até mais do que eu pensava) e da filosofia em geral.
Encontra-se a passar na RTP2 presentemente.
domingo, 29 de janeiro de 2023
Mythos
domingo, 22 de janeiro de 2023
Kursk / The Command (2018)
Este foi um filme que adiei ver porque “vivi” a situação com o horror que uma coisa destas acarreta. Em 2000, o submarino russo Kursk afundou-se durante um exercício naval no mar de Barents devido a um acidente com um torpedo. Assim que se percebeu que havia sobreviventes, e que a marinha russa estava com dificuldade em resgatá-los, foi oferecida ajuda de todo o mundo. A ajuda foi rejeitada até ser tarde demais. Alegou-se segredos militares para negar a intervenção, mas o facto é que esta acabou mesmo por ser aceite. Não há garantia de que a ajuda internacional tivesse chegado a tempo, mas também não foi dada permissão para que chegasse mais cedo. A verdade é esta: a Rússia preferiu deixar os seus homens morrer em vão a admitir parte fraca.
O acidente com o Kursk deu-se já no tempo de Vladimir Putin. Tendo em conta acontecimentos mais recentes, nada disto nos surpreende. Mas o que aconteceu com o Kursk (e que expôs uma marinha com falta de meios de resgate, com equipamentos obsoletos e falhas de manutenção, entre outros problemas de manifesta decadência) foi uma humilhação internacional que ajuda a explicar os dias de hoje.
Eu queria ver este filme para saber os pormenores, e nada como ver para perceber. O filme baseia-se nas investigações posteriores. As personagens, antes anónimas, ganham vida e familiares. Infelizmente, já sabemos o fim. Não é um filme para se ver sem alguma preparação mental para o inevitável. É difícil assistir. Comove-nos, entristece-nos, mas acima de tudo enraivece-nos. Podia ter sido evitado. Vidas podiam ter sido salvas.
Mesmo sendo um filme com um cariz muito forte de documentário dramatizado, acho justo dar
15 em 20
domingo, 15 de janeiro de 2023
I Am Slave / Eu, Escrava (2010)
O que mais me chocou não foi exactamente a escravatura. Foi o facto de em pleno século XXI ainda haver gente, e gente abastada, bem na vida, que se julga no direito de possuir uma escrava em casa. Isso, sim, é arrepiante. Não é que me deva surpreender, porque os ordenados de miséria pagos pelas grandes empresas exploradoras são em si próprios uma forma de “escravatura moderna” que empobrece as pessoas a ponto de estas ficarem, na prática, desprovidas de quaisquer direitos, sempre em risco de perderem o pouco que têm e de que precisam para subsistir.
“Eu, Escrava” é outro nível de exploração, bem entendido, mais a par com outro crime dos nossos dias que é o rapto e exploração sexual de mulheres (como pelas máfias de Leste) mediante ameaça às suas famílias ainda nos países de origem. Não nos esqueçamos dessas também.
O filme baseia-se na experiência verídica de Mende Nazer, pelo que se assemelha mais a um documentário. Malia, jovem sudanesa, é raptada aos 12 anos na sequência de um ataque à sua tribo e vendida a uma família abastada de Cartum, onde é treinada para ser criada doméstica sem quaisquer direitos (escrava). Malia é vítima de violência física e psicológica para se “resignar”. Por último, a sua “dona” remete-a para uma prima em Londres, já Malia tem 18 anos, onde o processo de lavagem cerebral continua.
A primeira coisa que fazem a estas pessoas é tirar-lhes o passaporte, além de as proibirem de sair ou de contactar seja com quem for. Qualquer “transgressão” implica castigos, como ser fechada no escuro durante uma semana. Ameaçam matar-lhe a família ainda no Sudão se ela desobedecer, o que é um grande motivador de submissão. Na Europa, a incredulidade das pessoas perante esta situação é o maior aliado dos criminosos (não se lhes pode chamar outra coisa). Das poucas vezes que Malia consegue fugir, dirige-se a todas as pessoas que julga africanas e, ao pedir ajuda, chama-lhes “irmãos” (o que é comovente), originando nestes, nascidos e criados no Reino Unido, a perfeita estupefacção e indiferença.
Os “donos” de Malia são pessoas abastadas, que pagam a uma ama e a um chauffeur de serviço permanente. Este homem de meia-idade é o primeiro a aperceber-se da situação real de Malia, mas também ele precisa do emprego e teme ajudá-la. Pergunto, podemos mesmo culpá-lo? Não deve ser muito fácil arranjar um emprego tão bom naquela idade, e ele também tem família em que pensar. É dos outros tais “escravos”, aqueles que não o sendo acabam por sê-lo. Sim, é claro que podia ter feito uma chamada anónima para a polícia, mas não seria demasiado comprometedor? Mesmo assim, o chauffeur é o único aliado de Malia e ajuda no que pode, principalmente ao explicar-lhe que ela tem direitos. Permite-lhe, por exemplo, ficar ao portão e pedir auxílio a quem passa. Finalmente, Malia encontra outro sudânes que consegue libertá-la do cativeiro. Não considero isto um spoiler porque este filme funciona mais como documentário em que o importante é assistir a toda esta experiência e dá-la a conhecer, e ter em atenção que pode estar a acontecer mesmo debaixo dos nossos narizes.
Achei especialmente comovente a dramatização que ocorre durante anos, em que Malia, isolada de tudo e todos, ao crescer, tem como único “confidente” um pequeno gato de peluche, com quem fala e que a “aconselha”, ou melhor, com quem ela faz terapia em voz alta de forma a encontrar força e esperança para continuar. O pai de Malia, no Sudão, nunca deixa de a procurar, por muito que lhe digam que a filha está morta ou foi vendida e que nunca mais a verá.
O filme termina com o alerta de que se estima que existam 5000 trabalhadores escravos na situação de Malia, só no Reino Unido. No século XXI, volto a salientar.
“Eu, Escrava” não é fácil de ver, mas deve ser visto. A ignorância da realidade, a incredulidade de vizinhos e visitantes da casa, é o pior inimigo das pessoas apanhadas nesta situação.
O que mais nos enfurece é que esta família podia muito bem pagar a Malia pelo seu trabalho e tratá-la como ser humano. Não é uma questão financeira, é mesmo uma questão de sadismo.
Não vou dar nota ao filme porque este tem mais de documentário dramatizado do que de obra ficcional.
domingo, 8 de janeiro de 2023
The Walking Dead (2010–2022)
Ao fim de 12 anos nos nossos écrans, “The Walking Dead” acabou. Alguém deu por isso? Lembro-me de momentos em que o fim de uma temporada significava o terror de que alguém nos contasse um spoiler, por acidente ou de propósito. Desta vez não ouvi uma única palavra sobre o fim da série de zombies mais icónica da última década. E isto é triste.
“The Walking Dead”, no seu auge, foi a melhor série de zombies jamais feita, e ainda não vi nada que a superasse ou que não se alimentasse (directa ou indirectamente) das ideias do universo Walking Dead.
Muitos fãs começaram logo a chamar-lhe telenovela a partir da segunda temporada, mas eu não sou dessas. Acho mesmo que a série atingiu o seu melhor algures entre a fuga de Terminus (os canibais) e a chegada a Alexandria. Depois apareceu Negan e tudo descambou. As personagens tornaram-se caricaturas, bonecos de acção, os diálogos degradaram-se, cada vez mais rebuscados e irrealistas. Chegou a ser doloroso assistir a alguns episódios, tal como actualmente é doloroso assistir a “Fear The Walking Dead”, o que uma pessoa continua a fazer por ter investido tanto nesta série, e um pouco por masoquismo, e porque os zombies de Greg Nicotero são mesmo muito bons!
Bastantes fãs abandonaram “The Walking Dead” nessa altura e não posso censurá-los. As temporadas de Negan, principalmente, foram muito mazinhas, em todos os sentidos e até em termos de world building. Às vezes era difícil perceber o que estava a acontecer, o que implica não apenas má escrita mas má realização em geral.
Em retrospectiva, a morte de Karl, a saída de Rick e de Michone foram de facto golpes demasiado profundos de que a série nunca se conseguiu recuperar, por muito que Daryl e Carol a tenham tentado levar às costas até ao fim.
O fim (?)
Chegamos então à última temporada em que a show runner Angela Kang tentou pegar no que tinha e salvar o que podia. Nesta altura a qualidade melhorou bastante, mas era tarde demais. Esta devia ser a história da família Grimes e seus amigos. Não é de estranhar que nos últimos 8 episódios os escritores se tenham voltado para a única sobrevivente original do clã Grimes: Judith, a única Grimes que vem da primeira temporada. Sim, na barriga da mãe, mas Judith foi importante desde o momento em que Lori se apercebeu da gravidez. (Não posso incluir o filho de Rick e Michonne porque só no último episódio é que lhe deram qualquer coisa para dizer. O que me lembra novamente que Michonne jamais se iria embora atrás do fantasma de um homem e deixaria um filho tão pequeno no meio do apocalipse zombie, outra das perplexidades que ninguém percebeu.)
Nos últimos 8 episódios, a série regressa a Judith, resumindo, através de monólogo interior e montagens do passado, o que foi o caminho até aqui e recordando as personagens que ficaram para trás. Muito disto bateu directamente na nostalgia e acertou o alvo. Mas não resolve a questão premente: a série não acabou. “The Walking Dead” continua nas muitas sequelas já feitas (como a mais recente, “Tales of the Walking Dead”) e por fazer. O facto de a AMC ter anunciado sequelas com Rick, Michonne, Maggie, Negan, Daryl e Carol também despejou a série de tensão. Sabíamos que aqueles personagens não iam morrer e que a história deles não acabava aqui. (A minha maior surpresa foi saber que afinal a actriz Melissa McBride –Carol– recusou continuar e não vai participar no spin off com Daryl Dixon. Acho que ela só faz é bem.)
Resta quem? Os personagens secundários, e Judith. Ainda nos pregaram um susto do caraças com Judith, mas acho que Angela Kang percebeu a tempo que os espectadores se revoltavam se acontecesse alguma coisa à miúda que estava onde não devia estar. (Resumindo, os adultos deixam-na ir com eles para um conflito armado, apesar de a miúda não ter mais que 10 anos, porque ela lhes pede, quando lhe deviam ter dito: Vê lá se não queres levar uma lambada! Vai mas é acabar os trabalhos de casa! Até nos dois últimos episódios, “The Walking Dead” persiste em fazer coisas estúpidas, tipo “imagem de marca”.)
Mesmo assim, gostei da conversa sincera e emocional entre Maggie e Negan, em que este finalmente pediu uma desculpa sentida pelo que fez a Glenn e Maggie lhe respondeu também do coração. Mas não consigo esquecer que este novo Negan, como personagem, é um embuste. O Negan original era uma caricatura de desenhos-animados; este Negan é John Winchester. E está tudo dito acerca de Negan.
Ezekiel também confronta Negan, tal como Aaron já tinha feito. (Mesmo assim, é impressionante como estes personagens tardios se tornaram importantes, muito graças aos seus actores.) Ezekiel não esquece o que ele fez. A certa altura pensei que Ezekiel ia falar de Shiva, mas a tigresa não foi mencionada, embora igualmente vítima indirecta dos Salvadores. Sempre gostei de Ezekiel, mesmo quando ele andava a brincar ao Senhor dos Anéis nos tempos do Reino. Compreendo a ideia dele. Num mundo sem esperança, as pessoas precisam de fantasia para se distraírem. Escapismo. Não é por isso que vemos o nosso tipo preferido de Fantasia, seja com dragões seja com zombies, ou ambos? Não foi por isso que assistimos a “The Walking Dead”, e que nos irritámos quando a série não era tão boa a ponto de nos fazer esquecer a realidade?
Por falar em realidade, sou das poucas que gostou dos episódios na Commonwealth, apesar dos muitos, muitos erros. A Commonwealth mostra-nos o que seria o mundo actual, como o conhecemos, mas com zombies. De certa forma, os zombies vieram impor a lei do mais forte em todo o lado, mas na Commonwealth continuava tudo igual: os pobres, os ricos, os importantes, a carne para canhão. Foi interessante.
Tenho escrito bastante sobre esta série e não há muito mais a dizer que não tenha dito já. Podemos mesmo considerar que “The Walking Dead” acabou quando já há spin offs a filmar com os seus personagens principais? A avaliar pela qualidade dos spin offs já existentes, se calhar eu preferia mesmo que a série acabasse de facto aqui.
ESTA SÉRIE MERECE SER VISTA: 2 vezes até Negan aparecer; a partir daí é com cada qual
domingo, 1 de janeiro de 2023
Oblivion / Esquecido (2013)
O filme é promissor. Depois de uma introdução relativamente longa em voz off, ficamos a saber que uma espécie alienígena tentou apossar-se dos recursos da Terra. No conflito que se seguiu, os humanos responderam com armas nucleares, ganhando a guerra mas destruindo o planeta. Os sobreviventes teriam ido para Titã, uma lua de Júpiter. Na Terra ficou uma equipa, Jack e Victoria, encarregada de recolher os últimos recursos do planeta antes de partir de vez.
É muita informação para o primeiro minuto do filme, mas não fica por aqui. Jack tem reminiscências, ou sonhos, ou flashbacks, com uma mulher e com o planeta antes de ser destruído, mas não consegue lembrar-se de muita coisa uma vez que as memórias de ambos (de Jack e de Victoria) foram apagadas no interesse da missão. (Quem leu “1984” de George Orwell começa logo a desconfiar. Memórias apagadas? Cheira a esturro.) Mas numa inspecção de rotina Jack encontra um livro (e lembramo-nos de “Fahrenheit 451”), que guarda carinhosamente.
Mais tarde percebemos que Jack e Victoria não são apenas uma equipa mas também um casal em crise. Ela quer partir para Titã, ele preferia ficar na Terra, apesar do estado do planeta, com a radiação e tudo. Na verdade, ele já encontrou um refúgio num lugar seguro, onde tem uma cabana à beira de um lago e onde guarda mais livros e discos e memórias de uma civilização que já não existe. (Entre os discos, para meu deleite, o álbum “Rio” dos Duran Duran). Jack quer partilhar tudo isto com Victoria, mas ela recusa sair da base de operações e descer ao terreno.
Há outra coisa que não bate certo neste “paraíso” tão rotineiro. Os humanos ganharam a guerra e estão a retirar toda a água do planeta para levar para Titã, mas os Saqueadores (nome que dão aos alienígenas) continuam na Terra e continuam a atacar Jack. Porquê? Jack também se questiona sobre isto. Não faz sentido.
Toda aquela introdução em voz off serviu para nos enganar pela perspectiva de Jack, mas, por esta altura, com tantas pistas já lançadas, o espectador começa a perceber que algo está muito errado, e começa igualmente a desconfiar da verdadeira identidade destes “Saqueadores” que se escondem nos destroços. Eu adivinhei o fim nos primeiros 10 minutos do filme, coisa que não costuma acontecer porque não gosto de me pôr a especular. Não foi preciso especular, era demasiado óbvio.
O que não torna o filme exactamente previsível, devido a muitas reviravoltas pelo meio. De facto, tantas reviravoltas que a história se tornou um pouco confusa e difícil de seguir. Também não acredito muito no fim romântico porque não tem grande fundamentação.
“Oblivion” é daqueles filmes promissores que podiam ter cumprido a promessa se não se tivessem tornado numa manta de retalhos. Foi a sensação que tive ao ver o filme: uma coisinha daqui, uma coisinha dali, uns cheirinhos a distopia, e na tentativa de ser original tornou-se em vez disso rebuscado (e nem por isso original). Podia ter sido um filme muito bom, mas penso que a longo prazo vai ser mesmo esquecido. Fica o trocadilho.
13 em 20