quinta-feira, 31 de agosto de 2006

O desperdício! O desperdício!

Hoje lembrei-me de tudo o que vou perder e chorei.

quarta-feira, 30 de agosto de 2006

Memória II

Diz-se que quando se morre toda a vida passa como um filme em frente dos olhos.



Verão. 1980.

Havia uma inocência não só em mim como em todas as pessoas crescidas. O mundo era simples. Comprava-se pão na padaria, detergente na drogaria, bolos na leitaria. Toda a Lisboa vivia nesta calma provinciana que não tinha nada a ver com os modelos e continentes de agora e os metros e as pessoas a correrem 2, 3 ou 4 horas por dia só de casa para o trabalho. Havia tempo. Havia tempo!
No verão notava-se mais? Talvez. Mas de inverno também havia pais que levavam os meninos todos da rua à escola, parando de casa em casa, e ainda tinham tempo de ir para os respectivos empregos. As mães podiam ficar em casa e fazer lanches e mandar fazer sestas e os trabalhos de casa. As crianças mais velhas podiam brincar na rua, aos bandos, de putos. Tudo isto era Lisboa e agora é deserto de velhos, mendigos e casas arruinadas, toda uma cidade antiga debaixo de pó como Pompeia.
Como é que o dinheiro chegava com apenas os pais a trabalhar? Se calhar não chegava. Se calhar a inocência era tanta que se pensava que chegava.
Lembro-me dos domingos de Agosto daquele ano de 1980, e como foram quentes, ou se calhar era apenas que eu não tinha memória de tanto calor e fui apanhada de surpresa, e essas coisas não se esquecem. Não que o verão fosse um tempo feliz, mas nessa altura ainda não era tão infeliz. Nessa altura ainda os amigos do bairro não me desapareciam meses a fio, nessa coisa das férias que os levava para longe, para muito mais longe do que eu pensava e do que ainda provavelmente penso. Coisa estranha, essa de viajar, de ir para a "terra" ver a "família", de ter lá "casa" ou "parque de campismo", o que raio seria isso.
Havia alguns dias em que o capricho levava o meu pai a passear-nos à praia. Porquê apenas alguns dias por ano ou só de manhã, nunca percebi porque nunca me entrou na cabeça. Para mim as coisas fazem-se fundo, não se toca só na superfície, mas tenho para mim que era a minha mãe que não gostava do mar.
Os domingos eram então dias chatos em que o momento alto era ir ao único restaurante que estava aberto quando as leitarias tinham fechado para férias e comer uma mousse de chocolate. Depois havia que sentar a vegetar em frente à televisão até ser noite e ser hora de dormir, mas eu não dormia. Nessa altura não podia perceber como a frustração e o ódio se acumulava mais nesses dias quentes, como vapor a apitar, em que se ficava no fresco do escuro de casa. Não admira que aqui se morra de verão. É tradicional. Verão, pó, cemitério, calor, suor a escorrer pela cara abaixo dos coveiros. Para mim verão sempre foi morte, mesmo antes de o saber que o era.
Mas não em 1980, talvez o último ano da inocência. Lembro-me que foi nesse ano que tive um pressentimento, um terrível presságio, de que as coisas iam correr mal. Não, não tinha indícios, mas uma pessoa sabe estas coisas tal como sabe se é menino ou menina. Sabe-se. Ponto final. Mas não foi no verão. No verão ainda se ia todos os dias depois do almoço tomar café à leitaria, as mães e os filhos, e ainda havia esperança.
Eu devia odiar o verão tal como se odeia a morte. Mas não o fiz. Abracei-o muito antes de saber apreciar a solidão. Iam-se todos, ficava só eu. Era uma questão de tempo que um dia fosse eu que me ausentasse quando me convidassem para ir também. Quem olha a solidão muito tempo acaba por descobrir nela encantos inesperados. Viciantes. Plenos de satisfação.
Lembro-me que tinha uma espécie de trabalho de casa por dia, naquelas grandes férias de verão, mas acabava tudo na primeira semana de férias para ter mais tempo livre. *Risos* Hoje percebo o disparate dessa ideia. Como se eu precisasse do tempo livre para alguma coisa. Os meus amigos e colegas nunca os completavam, e agora percebo porquê, porque iam de férias e faziam coisas. Hoje eu resolveria não perder nem uma semana do meu tempo livre com esses deveres maçudos e gravitaria imediatamente para a frente da televisão. Why bother? Nada nunca mudou.

Isto era para ser uma memória agradável mas não o foi. Ainda estou para desencantar uma memória agradável do fundo do baú. Quanto mais olho para trás mais compreendo como fui infeliz, e quando comparo o antes como o agora mais me é aparente que se tivesse de resumir a minha vida numa palavra essa seria "desperdício". Mas penso que houve um propósito, um plano superior para a minha existência. Que não seja perceber isto:

As pessoas são como as plantas. Deite-se uma semente em bom solo, com muito ar livre, e sol, e nutrientes generosos, e água suficiente, e essa planta crescerá e será uma grande árvore e impressionará com a sua imponência. Deite-se a mesma semente num quarto escuro, num vaso ínfimo, e prive-se a terra de água, e esqueie-se-lhe o tronco e corte-se-lhe qualquer ramo que se atreva a despontar, medroso, em busca de luz, e ter-se-à uma planta esbranquiçada, raquítica, moribunda. Se muitos anos depois essa planta sem sorte ainda estiver viva é já uma vitória do seu instinto de sobrevivência. Nada de novo. Eça de Queirós já o disse n'"Os Maias".

Não tenho tempo para escrever mais. Tenho de ir ver televisão.

terça-feira, 29 de agosto de 2006

Memória

Diz-se que quando se morre toda a vida passa como um filme em frente dos olhos.


E depois houve aquela vez em que eu me senti feliz pela primeira vez desde há muito tempo. E falei com ele ao telefone. "Sabes, já me sinto muito melhor. Agora tenho uma cama, um quarto, e está a dar um filme de terror. Sinto-me quase feliz".
"Não me digas", desdenhou ele, "que isso é que te faz feliz?"
Como é que ele poderia saber se sempre teve um quarto, uma cama e, diga-se de passagem, uma mobília inteira (!!!). Queria que eu lhe dissesse "não, amor, só tu me fazes falta, e o teu corpo, e o teu cheiro, e a tua voz, e o teu amor". Mas foda-se, não, o que me faltava mesmo era uma cama.

Um destes dias vi um filme sobre a guerra americana da secessão, em que dizia um dos soldados: "Durante todo aquele tempo senti-me morto, mas afinal tinha apenas fome".


E lembro-me de outra vez, semelhante a esta. Mostrei à minha amante, a minha querida, o orgulho da menina dos meus olhos, a minha nova torneira (porque durante anos não houve torneira, houve uma bacia de plástico onde se lavava a cara em cima de um móvel de cozinha com tampo de mármore), e ela gozou-me. "Ai Jasus, uma torneira, binde ber a minha torneira". Só o amor me fez perdoar. E ainda dizem que sou fria. A água também era fria, especialmente no inverno. Lembro-me de ser tanto frio e as rachas das paredes da casa permitirem ver as pessoas que passavam na rua, que em vez de me despir, não o fazia, e acabava por vestir o pijama por cima da camisa interior e das collants. Tive sempre tanto frio, tanto frio!

quarta-feira, 16 de agosto de 2006

De como eu acabei a viver em Portugal

Eis a história de como eu acabei a viver em Portugal. Foi assim.

Estava eu no mundo das almas, mais precisamente no SDRP (Secção dos Desencarnados para Reencarnação Próxima) quando me apercebi de que não tinha a certeza onde me instalar nos próximos 70 anos (com sorte). Depois de milénios e milénios a visitar todos os locais do planeta Terra, as opções começam a ser repetitivas. Desde a Índia, onde, como qualquer crente na reencarnação que se preze, passei uns bons tempos, à fria Europa onde vivi a maior parte das minhas últimas vidas, tudo era bastante déjà vu. O Oriente não me fascinava (e ainda não me fascina - devo ter-me farto dos Mongóis no tempo deles), a Austrália e a África têm grandes bichos rastejantes e bestas ferozes, e o que eu queria mesmo era um lugar quente e tranquilo onde pudesse assistir pacatamente ao espectáculo do Fim dos Tempos - leram bem, Fim dos Tempos, que é como quem diz o Fim do Mundo, que foi só por isso que me convenceram a voltar para o aqui e o agora. Disseram-me, e fica entre nós, que ia ser melhor do que o Fim de Ano na Praça do Comércio...
Pedi ajuda a um orientador. Os OCs (Orientadores Celestiais) são como os orientadores profissionais cá de baixo, excepto que conhecem de facto o futuro e sabem o que dizem.
Depois de o ouvir, e apesar da minha ânsia por climas tropicais, África e América Latina foram cartas postas fora do baralho. Fome, guerra, corrupção assassina, miséria atroz... "Não, nem pensar!", respondi. "O meu karma não é assim tão pesado. Pensemos em algo melhorzinho. Não mereço tal sorte".
O meu OC, que era preto, ou tinha sido preto e mantinha a cor, porque como se sabe os anjos no céu não se casam nem são dados em casamento e também não têm cor nem sexo, mas até que lhe ficava bem com a túnica de cetim e as plumas das asas brancas (dava ares de Pai de Santo sem turbante), começava a ficar preocupado com a minha esquisitice e quase disposto a dar-me também umas asinhas e a promover-me a um cargo vitalício no funcionalismo público espiritual sem direito a férias pagas no estrangeiro.
Começámos então a analisar as hipóteses restantes. Algures na Indonésia havia uma vaga para uma vida de classe média (que por lá significa vida de nababo) mas terramotos e tsunamis dia sim dia não tiravam a pica toda. Paciência. O dinheiro não é tudo.
O Brasil, rejeitei logo. Homens feios. Homens muito feios. Disse-lhe que preferia voltar para a Índia, fazer voto de castidade e juntar-me às irmãzinhas da Madre Teresa.
Falou-me então dessa nação poderosa, os Estados Unidos da América, onde se pode de facto ser filho de ninguém, começar por servir hamburgueres e acabar como presidente de uma grande companhia, "um dos últimos sítios do mundo onde uma Educação ainda vai valer alguma coisa até lá para o ano 2000". Atraiu-me, e a cena gótica até não era má de todo. Estávamos ainda em 1960 e qualquer coisa e eu só tinha ainda visto os Doors ao vivo mas podia adivinhar que o caminho era por ali. Mas logo depois de consultar o futurómetro (espécie de televisão que permite ver o futuro para que o espírito à procura de encarnação não venha ao engano), e fui logo sintonizar aquilo no canal dos anos 90 com uma certa curiosidade sobre o pós-Guerra Fria!, percebi que as mordaças tinham emigrado para lá e desisti a tempo.
Estávamos a ficar limitados, mais uma vez, à velha Europa. "Bem, lá volto para a Holanda, onde os homens são bons e eu me divirto. Ou melhor ainda, para a Inglaterra. Mostra-me lá isso da cena gótica outra vez". Ele mostrou. Era cada vez mais por/para ali.
Já estava convencida de que ia ser Londres o meu destino, ou talvez mesmo Leeds para compor o ramalhete, quando, de novo, desabafei: "Raios, lá vou eu voltar para o frio, mas não há alternativa, lá terá que ser".
Foi então que os olhos do meu OC se arregalaram. "Talvez não. Se é só isto que desejas da grande civilização europeia, há alternativa. Bem, uma alternativa-zinha. Há um país-inho medíocre, entre o Atlântico e o Mediterrâneo, que agora vive em ditadura mas isso vai acabar assim que tu chegares, e é, enfim, um país-inho, bonitinho, simpático, sem o sangue na guelra dos espanhóis, sem a máfia organizada dos italianos, sem a língua lixada dos gregos..."
"E que país é esse que nunca ouvi falar dele?"
"Chama-se Portugal... Portugal-zinho." Eu só deitei a língua de fora, como se vomitasse. "Mas repara, é quente durante o Verão (se bem que os nativos não saibam dar valor ao clima porque acham que o frio é chique), é visitado por isso mesmo, e pelas belas praias!, por todos os europeus que o desejam para colónia de férias (o que vai ser fatal mas não te aflijas que a tua estadia é apenas temporária e não é nada contigo), e é um local sem guerras porque o povo é cobarde".
Ligámos o futurómetro e rimos a bom rir da revolução de Abril e do seu glorioso futuro, especialmente na ilha da Madeira.
Havia uma cena gótica(-zinha), havia holandeses nas praias, havia estrangeiros na internet e, Alá seja louvado, não havia guerra porque o povo era manso.
"Só há um senão", avisou o meu OC. "Aqui não há mérito que te valha. Podes até ser um einstein que só te safas no estrangeiro. Conhecimentos noutras áreas que interessem ao mundo também as não há. Conhecimentos sobre a cultura autóctone não interessa aos próprios. Professores, sábios, filósofos, por lá não se safam. Só pedreiros. Pedreiros safam-se. Pensa assim naquilo como... uma África com monumentos!"
"E sem bicheza."
Nessa altura eu estava numa de make love not war, até porque era o tempo dos hippies, e só queria flores no cabelo. Decidi a encarnar-me aqui. (Mas continuo a pensar que foi pela ausência de bicheza...)
Mas enganei-me. Devia ter mesmo ido para a Holanda. No Verão, porque tinha dinheiro para férias, viria à mesma para cá curtir as praias e o calor que os locais preferem destruir com os seus ares condicionados terceiro mundistas. De Inverno, teria neve a sério, frio a sério, não esta coisa-zinha a que os portugueses se habituaram a chamar "briol", e viveria em casas a sério, calafetadas e quentinhas. E teria cena gótica! Mais do que cena gótica, poderia fumar - haxixe! - à vontade, nos cafés! Possivelmente, até dar milho aos pombos sem levar multa que aquela gente é assim livre e doida?... E, acima de tudo, teria homens bons, homens bons e mulheres boas, boas, boas!
Agora é tarde. Eu vim para cá assistir ao Fim dos Tempos. Qualquer balcão ou lugar de plateia serve o propósito quando isto começar a ferver.


Doces pesadelos.

terça-feira, 15 de agosto de 2006

Vida pós-morte

Há pessoas que têm experiências de quase morte em que vêem uma luz branca e entes queridos já falecidos, e há pessoas que passam pelo mesmo e não se lembram de nada antes do momento em que tudo ficou negro.
E se, apenas como hipótese, a vida depois da morte não é para todos mas só para alguns? E se é um dom, ou uma recompensa, apenas para os dignos?
E se se nem sequer é um dom ou uma recompensa, mas algo de puramente aleatório?
Claro, não seria justo, mas há alguma coisa que o seja?


Pleasant nightmares, everyone.

sexta-feira, 11 de agosto de 2006

Dois filmes

Ok, porque a preguiça é um pecado aqui vai um "dois em um" de penitência.




"Gothica", 2003

Foi com bastante curiosidade que vi o filme de título quase igual ao deste blog.
Uma psiquiatra dá por si a experimentar as alucinações de uma paciente e a história desenvolve-se até à concretização de que as visões são causadas pelo fantasma de uma vítima de um crime verdadeiramente real.
As críticas não são famosas e com razão. O filme promete mais do que dá e não passa de um cruzamento entre um "Silêncio dos Inocentes" e um "Sexto Sentido". O título foi escolhido (apenas?) devido ao lado fantasmagórico da história. Podia também chamar-se "Silêncio Sentido" ou "Sexto Inocente" e era menos enganador. E não era preciso invocar os romances góticos do século XIX... em vão.
Só porque entretem,

13 em 20.


Agora o próximo...






"The Fog II", 2005

Dizer aqui que fiquei decepcionada não será inteiramente verdade porque como as sequelas já nos habituaram tão bem o surpreendente é quando são boas....
Ora bem, o que há de errado com este filme? Tudo. Um filme de terror tem como objectivo meter medo ao espectador através de uma ameaça desconhecida. Também ajuda um bocadinho que os intérpretes sejam credíveis e que a história não seja susceptível de ser adivinhada desde o primeiro minuto. Mas aqui não há nada a fazer. Já se sabe que há fantasmas, que vêm com o nevoeiro, que estão ali para se vingar. Depois é só contar os mortos.

Há uma parte deliciosa, contudo, em que do nevoeiro aparece o "Carl McCoy" e, talvez, os restantes membros dos Fields of the Nephilim.
Se é um facto que Carl McCoy adoptou o estilo do filme original de 1980, pode bem ser que o filme de 2005 quisesse adoptar o Carl McCoy. ;)

Quanto aos outros personagens, aqueles que de facto fazem parte do filme e não da minha imaginação delirante, temos o rapazinho/borracho/símbolo sexual do Superhomem de "Smallville" (Tom Welling) a fazer um papel mais convincente do que a rapariguinha/borracho/símbolo sexual de "Lost" (Maggie Grace). No caso da última, há uma tão total ausência de diferenças entre as personagens do filme e da série ("Shannon") que a qualquer momento se espera que apareça o namorado iraquiano "Sahid" a trazer algum verdadeiro mistério ao dito nevoeiro de que trata o filme.
Sim, comparado com o original, o filme é muito mau, muito mau, mesmo muito mau!

Há contudo um pormenor delicioso que vale mais um pontinho porque é destas subtilezas que se faz o cinema. Na cena em que uma das vítimas morre esfaqueada por pedaços de vidro, em vez da sangria do costume os vidros penetram o corpo do homem e saem dele tão imaculados quanto entraram, e são essas anormalidades que fazem que um filme sobre o sobrenatural pareça "bom". Isso e o homenzinho da praia, o caçador de tesouros, que não tem nada a ver com a história mas que faz a figura do "coro" das tragédias gregas, um pormenor a lembrar os melhores momentos de Carpenter.
O resto foi para facturar que já não há imaginação para mais (e venha mais um "Halloween" em 2007, como se ainda houvesse pachorra para o gajo da máscara branca!) e é por isso que não passa o nível de entretenimento imbecil para menos de duas horas.

14 em 20 (14 por causa dos Fields, se bem que só na minha imaginação delirante, senão levava 13 também)

Uma canção

Definitivamente sem paciência para ligar o cérebro à impressora que emite os meus posts, aqui fica uma canção.



Always said you were a Youthquaker, Edie
A stormy little world shaker
Warhol's darling queen, Edie
An angel with a broken wing

The dogs lay at your feet, Edie
We carressed your cheek
Stars wrapped in your hair, Edie
Life without a care
But you're not there

Caught up in an endless scene, Edie
Paradise a shattered dream
Wired on the pills you took, Edie
Your innocence dripped blood, sweet child

The dogs lay at your feet, Edie
We carressed your cheek
Stars wrapped in your hair
Life without a care
Ciao, baby!

Sweet little sugar talker
Paradise dream stealer
Warhol's little queen, Edie
An angel with a broken wing

The dogs lay at your feet, Edie
We carressed your cheek, well
Stars wrapped in your hair
Life without a care

Why did you kiss the world goodbye
Ciao, Baby!
Don't you know paradise takes time
Ciao, Edie!

Why did you kiss the world goodbye
Ciao, Baby!
Don't you know paradise takes time
Ciao, Edie!

Ciao, Baby!
Ciao, Baby!
Ciao, Baby!
Ciao, Baby!



The Cult, "Edie (Ciao Baby)"

quarta-feira, 2 de agosto de 2006

De cócoras

Um homem, senhor Cadete, fecha-se por dentro destas noções, ausente na sua presença de mulher, acreditando que alguém ainda lhe continua pondo as mãos nos ombros, se eles choram de saudade e se isso lhes inspira a certeza necessária. Quando, de súbito, um estranho como você aponta o queixo na direcção do rapaz e pergunta se ele não medra, eu sinto que errei em tudo na vida, porque um dia quis morrer e desisti por causa deles.
Nunca mais fui capaz de me endireitar por dentro da vida. Continuo vivo, é um facto, mas de cócoras, de cócoras perante o mundo e, se me puser de pé, a minha vista já não vê o longe, nem sequer mesmo o outro lado da rua.
A este menino pode ter acontecido algo de semelhante, porque os rapazes da sua criação cresceram e estão de pé na vida, ao passo que ele tem a tristeza encostada à carne, e a tristeza já lhe entrou nos ossos. Pois será que ela mina os seres assim por dentro, chupa-os até devorar a seiva dos ossos e dos nervos; será que a tristeza envelheceu um corpo antes mesmo de ele crescer e se tornar jovem para então poder multiplicar-se?




João de Melo, in "O meu mundo não é deste reino"