terça-feira, 8 de abril de 2025

La Religieuse / A Religiosa (1966)

Os acontecimentos passam-se em França, entre 1757 e 1760. Um casal de classe alta alega já não ter dinheiro para o dote da terceira filha, Suzanne, depois de ter casado as duas irmãs mais velhas. Como tal, Suzanne é obrigada pela família a tomar os votos religiosos, contra a sua vontade expressa e todos os seus protestos. Os pais deixam de lhe falar e fecham-na no quarto como a uma prisioneira, forçando-a a obedecer.
Suzanne torna-se freira mas, logo após a morte dos pais, decide contactar um advogado que a ajude a renunciar aos votos interpondo um processo em tribunal. A determinação de Suzanne não basta e o tribunal dá razão à Igreja, alegando que Suzanne tomou os votos de livre vontade. Entretanto, as outras freiras tornam-lhe a vida num inferno: prendem-na numa cela sem mobília, tiram-lhe a roupa e até os lençóis, põem-na a pão e água, proíbem-na de ir à missa e rezar, confiscam-lhe os livros religiosos e o rosário, e perante os gritos exasperados de Suzanne acusam-na de estar possuída pelo Diabo, chegando a pedir um exorcismo.
Uma vez que Suzanne perde o processo, e que o seu advogado conhece os abusos que ela sofre, é mesmo este quem lhe paga outro dote para a transferir de convento (para entrar também era preciso pagar um dote à Igreja; a mãe de Suzanne pagou-o vendendo as jóias). O primeiro dote nunca é restituído.
Neste outro convento o ambiente parece mais descontraído e alegre, mas depressa Suzanne começa a ser sexualmente assediada pela madre superiora, uma mulher ainda nova, lésbica e predadora. Suzanne confessa-se a um padre que está a par da situação, mas a madre superiora, que é muito bem conectada na sociedade, arranja maneira de se livrar dele.
O novo confessor, por sua vez, confessa a Suzanne que também ele foi obrigado a entrar no sacerdócio e que teve de se resignar. No entanto, ambos combinam fugir juntos e são bem-sucedidos.
Logo na primeira noite de liberdade, porém, numa estalagem, o padre tenta violar Suzanne. Esta consegue escapar e vai parar a uma povoação de camponeses, ficando a trabalhar junto deles. Todavia, ouve as mulheres do campo condenarem a fuga da monja (procurada pelas autoridades) que só tinha de “comer, dormir e rezar”, em vez de trabalhar no duro.
Suzanne tem de fugir de novo e acaba a mendigar na rua. Aí, por ser jovem e bonita (nesta altura Suzanne não tem mais de 20 anos), é descoberta pela Madame de um bordel que a “acolhe” no seu estabelecimento. Na iminência de se prostituir, na virtude da sua virgindade, Suzanne prefere suicidar-se, pede perdão a Deus e atira-se de uma janela.
Nunca tinha visto “La Religieuse”, ou se vi devia ser muito nova e esqueci completamente. Surpreendeu-me, para um filme francês da altura, a dinâmica rápida do enredo, sem perder tempo e eliminando pormenores desnecessários. “La Religieuse” é a adaptação do romance homónimo de Denis Diderot, publicado postumamente em 1796, e é inspirado em pessoas reais. Neste longínquo ano de 1966, o filme “La Religieuse” foi censurado por apresentar uma imagem negra das instituições religiosas, o que é por si só eloquente.
A história de Suzanne é triste e trágica, ainda mais trágica porque a personagem era verdadeiramente devota e virtuosa e o seu único “pecado” era desejar ser livre. Na altura não havia lugar no mundo para uma mulher livre e independente, principalmente uma mulher bem-nascida mas destituída de meios como no caso de Suzanne. Talvez arranjasse um pretendente na sua classe social mas a família deste não concordaria com o casamento sem um dote (e, fosse como fosse, “pertenceria” ao marido e não seria livre). Abaixo da sua classe social, depois do “escândalo” de querer renunciar aos votos, era igualmente ostracizada por uma população religiosa que não admitia tais humores terrenos aos representantes da Igreja. O convento, a mendicidade ou a prostituição eram as únicas opções que a sociedade lhe permitia. Dá que pensar.
Apesar de ser um filme antigo, recomendo a quem ainda não viu.

15 em 20

[Confissão: confesso que gravei este filme mais ou menos por engano num dos canais de cinema. Acontece que o título em inglês é “The Nun” e a sinopse que aparecia no filme era a do filme de terror “A Freira Maldita”. Fiquei intrigada por um filme francês de 1966 ter o mesmo enredo de “The Nun” e decidi gravar para desvendar o mistério. Mistério desvendado e ainda bem que gravei.]


 

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