domingo, 27 de agosto de 2023

Jane Eyre (2011)

Por alguma razão julguei que este filme ia ser uma seca, e enganei-me redondamente. É claro que conheço a história; a preceptora que se apaixona pelo patrão que por sua vez é casado com uma mulher louca que este esconde de toda a gente em quartos recônditos da casa. É quase uma história de terror, e já foram feitas tantas adaptações ao cinema que seria impossível nunca ter visto um dos filmes.
Mas confesso que já não me lembrava dos pormenores. Durante aquelas cenas da infância, em que Jane é maltratada por um primo mais velho e detestada por uma tia que se quer ver livre dela, enviando-a para uma “escola” onde os castigos corporais são frequentes e a disciplina aterradora, nem sabia ao certo se estava a ver a infância de Jane ou a da pobre mulher louca. Uma infância de abusos daquela ordem podia muito bem enlouquecer uma pessoa.
“Jane Eyre” é um dramalhão, um bom dramalhão de Charlotte Brontë, e não sei se não será mais conhecido do que o outro dramalhão da sua irmã Emily Brontë, “Wuthering Heights” (“O Monte dos Vendavais”). Mas se “Wuthering Heights” é todo ele paixão desenfreada, gritos, lágrimas, loucura, morte e vingança, “Jane Eyre” é muito contido, espartilhado, mantendo a tensão naquilo que não se vê e não se sabe mas cuja presença se adivinha na estranheza dos acontecimentos. Esta adaptação conseguiu captar muito bem a atmosfera opressiva e misteriosa que inquieta Jane na grande mansão onde, como assalariada, não lhe cabe fazer demasiadas perguntas.
Muitas vezes não gosto de uma história por não me identificar nada com a heroína. Não foi o caso de Jane Eyre, com quem me identifiquei bastante. Diria mesmo que a admiro e que gostava de ser assim: contida, séria, profissional, impassível. Mas depois há a outra, a louca do sótão, talvez uma simbologia (acidental?) do próprio turbilhão de sentimentos, mágoas e rancores que Jane tem de esconder no sótão da consciência para que nada transpareça para o exterior. O que eu não faria jamais era casar com o homem que tentou casar comigo em bigamia. Mas a autora resolve o caso depressa, até um pouco convenientemente demais no meu entender.
Gostei muito do filme, recomendo, e estou a planear ler o livro.

15 em 20

 

domingo, 20 de agosto de 2023

I'll Always Know What You Did Last Summer / Vou Sempre Saber o Que Fizeste no Verão Passado (2006)

[contém spoilers]

Este terceiro “episódio” de “Sei o Que Fizeste no Verão Passado” não é mau de todo tendo em conta o género. Mas a verdade é que eu já não sei o que eles fizeram no verão passado original, muito menos na sequela. Filmes completamente esquecíveis.
Nesta continuação, um grupo de adolescentes no último verão lá da terrinha, antes de irem às vidas deles para a universidade e novos empregos, decide pregar uma partida. Lêem no jornal o que aconteceu antes, e um deles veste-se de assassino, com o gancho e tudo. (Este gancho é mesmo o original, encomendado no Ebay como é moderno, o que vai ser importante mais tarde.) O objectivo é pregar um susto aos visitantes de uma feira de verão. Um dos jovens é o filho do xerife, que é bastante bom com o skate. O assassino mascarado persegue o skater até ao telhado de um prédio, de onde este salta com uma manobra monumental. A amparar-lhe a queda estariam alguns colchões colocados na rua. E, ora bem, a partida era só isto. Mas acontece que alguém retirou os colchões e o desgraçado estatelou-se e morreu.
A princípio o grupo de jovens nem quer acreditar. Era só uma partida. Nenhum deles desviou os colchões nem sabem quem foi. Mas de repente a nova realidade fala mais alto. Todos os adolescentes têm grandes perspectivas fora da cidadezinha e não lhes convém nada verem-se envolvidos num processo judicial em que teriam de provar a sua inocência, ou pelo menos a sua falta de intenção de matar alguém, ainda por cima sendo a vítima o filho do xerife. Afinal, foi um acidente azarado, ou eles assim pensam.
Dentro em breve, começam a aparecer os fatídicos avisos: SEI O QUE FIZESTE NO VERÃO PASSADO. A princípio os jovens pensam que é o xerife que está a vingar a morte do filho, mas depressa descobrem algo mais sinistro. O assassino voltou, embora tenha morrido no segundo filme. Isto significa que agora o assassino é sobrenatural! Tentam matá-lo com facas, tentam matá-lo com tiros… E ele não morre. É uma espécie de Michael Myers (“Halloween”) vingativo. Quando finalmente lhe vêem o rosto, então não é a cara chapada do Freddy Krueger (“Nightmare on Elm Street”)? Ouviram bem: Michael Myers com cara de Freddy Krueger. Pior é impossível.
Tendo tudo isto em consideração, e que agora o assassino é sobrenatural, estou abismada em como não fizeram mais filmes da série. É verdade que já não existe nada de original para explorar, mas isso nunca impediu sequelas atrás de sequelas.
Já era tempo de alguém fazer a versão portuguesa desta saga. “Eu sei que tu sabes que eu sei que tu sabes que eu sei o que fizeste no verão passado”. Cenário: Assembleia da República. O enredo seria uma mistura com “Final Destination”, em que os deputados receberiam avisos sinistros para não se aproximarem do parlamento, mas, ainda assim, seriam lá atraídos um a um, para serem chacinados de diversas formas e feitios nos corredores escuros da assembleia deserta à noite. Não vou dizer quem eu escolheria para ser a Final Girl para não parecer tendenciosa.(Sim, tem de haver uma Final Girl. É uma das regras. Mas em alguns casos a Final Girl também morre no final, fazendo jus ao título. Fica à vontade do realizador.) E pronto, foi a minha fantasia cinematográfica para alguém aproveitar.
Em suma, é um filme que se vê bem, sem grandes expectativas, e que agradará a quem conhece os dois primeiros.

12 em 20


domingo, 13 de agosto de 2023

The Winchesters (2022-2023)


Já disse várias vezes e vou voltar a dizer: “Sobrenatural” deve ter sido das séries mais subestimadas que já existiram. Durante 15 temporadas e 15 anos (2005-2020), “Sobrenatural” prendeu a atenção dos fãs e fez mesmo fãs envergonhados que não admitem conhecer os Winchesters (mas conhecem!). A química entre Sam e Dean era intensa e genuína. É preciso não esquecer que a princípio eram dois irmãos em conflito, muito diferentes um do outro, unidos unicamente pela busca de vingança em sequência da morte da namorada de Sam nas mesmas circunstâncias que vitimaram Mary Winchester. “Sobrenatural” fazia-nos querer saber de Sam e Dean. As mortes atingiam-nos. Houve mesmo cliff-hangers entre temporadas que me deixaram muito preocupada com o destino dos “rapazes”. Até os personagens secundários se tornaram mitológicos de tão inesquecíveis.
“The Winchesters” segue a mesma fórmula, mas num patamar muito inferior a este. Com produção e narração de Jensen Ackles (aqui também no papel de Dean), esta é a história de Mary Campbell e John Winchester, ou seja, supostamente uma prequela dos acontecimentos de ”Sobrenatural”. Dean é o narrador, e desde o início nos deixa de pulga atrás da orelha de que isto não vai ser exactamente o que pensamos, mas não posso tentar explicar sem incorrer em spoilers. O último episódio desvenda tudo. Prestem atenção porque no final faz sentido.
Algumas passagens de “The Winchesters” parecem de facto contrariar o que vimos e sabemos de Mary e John. Por exemplo, na série original John não conhecia o passado de Mary como caçadora e só descobriu quando Azazel (o demónio dos olhos amarelos) a matou. É então que John se torna no caçador obcecado que conhecemos.
Em “The Winchesters”, John recebe de certo “homem misterioso” uma carta do pai, Henry Winchester, que o leva direitinho a um bunker dos Homens de Letras. Mais motivo ainda para desconfiar, uma vez que John Winchester nunca falou dos Homens de Letras aos filhos e que Sam e Dean só encontram esta organização já tarde na série. (O episódio em que eles descobrem o bunker é inesquecível.)
John e Mary conhecem-se por acaso quando John chega do Vietname. Também ela anda à procura do pai, Sam Campbell, que foi caçar para parte incerta atrás de uma pista sobre uns monstros de outra dimensão chamados Akrida. Os Akrida querem aniquilar a vida em todos os planetas e já não seria a primeira vez que tentavam atacar a Terra, mas foram repelidos pelos Homens de Letras. Como é que nunca tínhamos ouvido falar de uma ameaça tão grande como os Akrida? A certa altura os Akrida até dizem a John que foram eles quem mataram Henry, o que nos deixa ainda mais perplexos. Sabemos que os Homens de Letras foram dizimados por demónios. Então, que segredo se passa aqui?
“The Winchesters” tenta fazer o mesmo que “Sobrenatural” fazia no princípio: um monstro da semana ao mesmo tempo que os caçadores perseguem a ameaça maior, os Akrida. É neste pano de fundo que John e Mary se apaixonam.
Ora, sinceramente, sabendo nós que este foi um amor épico, eu esperava ver faíscas a voar entre os dois. Pelo contrário, e lamento muito dizê-lo, não existe quase química, nem boa nem má, entre os dois actores. Mary e John são ambos casmurros e mandões, o que bate certo, e passam a série a discutir. Nunca aquela relação resultaria na vida real e muito menos acabaria em casamento. Simplesmente não está lá. Mary e John parecem mais irmã e irmão, o que neste caso não funciona por razões óbvias.
Aliás, todos os personagens mais jovens são muito superficiais. Temos algumas cenas boas com a mãe de John, Millie Winchester, a bruxa boa Ada Monroe, Sam Campbell e os actores veteranos em geral (alguns deles caras familiares do passado, mas não vou revelar). Não culpo os actores mais novos. Simplesmente não lhes foi dado o peso dramático que acontece naturalmente nas conversas entre os mais velhos.
John, Mary, Latika e Carlos não tiveram grande enredo emocional com que trabalhar. Sem surpresas, a série não foi renovada. Não sei se tenho pena ou não. Depois do último episódio ficou tudo muito bem resolvido. Não estou a imaginar mais temporadas de monstros da semana (e até esses foram muito fraquinhos) depois das proporções épicas atingidas por “Sobrenatural”. Os irmãos Winchester impediram dois ou três apocalipses, foram ao Inferno, foram ao Purgatório, foram ao Céu, travaram a irmã de Deus, mataram Lúcifer, mataram Deus, até mataram a Morte, tinham um anjo como melhor amigo e foram os pais adoptivos de um novo Deus. É difícil ultrapassar isto.
“The Winchesters” estaria sempre condenado a ser um sub-produto Young Adult a não ser que ganhasse asas como “Sobrenatural” ganhou. Sim, é preciso não esquecer que as primeiras temporadas de “Sobrenatural” não deixavam adivinhar o que veio depois. Faltou aqui a magia entre Sam e Dean, e faltaram as asas, algumas bastante literais como as de Castiel. Talvez com o tempo “The Winchesters” levantasse voo também, mas a temporada inicial não bastou para agarrar os fãs.
Eu achei interessante como entretenimento, mas confesso que os melhores momentos foram protagonizados pelas personagens da série original (obviamente). Detestei a música dos anos 70. Adorei a moda! Aquele poliéster todo, as calças de boca de sino, a roupa hippie, as flores no cabelo. A certa altura Mary usa um vestido branco que parece uma mistura entre camisa de dormir e vestido de noiva (alguma moda da altura era tenebrosa, admito). E adorei que os caçadores tivessem de usar livros a sério para investigar os monstros e que só pudessem comunicar-se através de telefones fixos ou rádios. Muito retro. Não desprezemos o poder da nostalgia. Talvez um dos problemas da série tenha sido não ter apostado mais na nostalgia. Afinal, resultou com “Stranger Things”. Mas talvez os fãs de “Sobrenatural” não tenham idade para nostalgias dos anos 70. Seja o que for, não resultou.
RIP “The Winchesters”. Ou talvez não, porque em “Sobrenatural” as coisas só ficam mortas até voltarem à vida. Talvez Jensen Ackles acerte para a próxima.

ESTA SÉRIE MERECE SER VISTA: 1 vez

PARA QUEM GOSTA DE: Sobrenatural

 

domingo, 6 de agosto de 2023

I Am Legend / Eu Sou a Lenda (2007)

Confesso que começo a ficar farta de ver o mesmo enredo repetidamente, se bem que este filme de 2007 deva ter sido dos primeiros, nos últimos tempos, a usar o único sobrevivente num mundo apocalíptico.
E o filme é basicamente isto: um vírus modificado, inicialmente usado para curar o cancro, transforma as pessoas em monstros raivosos que não suportam o sol, vivem no escuro e comem os não-infectados. (Questiono-me: porque é que não se comem uns aos outros também? Porque é que nestes filmes os infectados querem sempre comer os não-infectados? Mas divago.)
Robert Neville, militar e cientista, é imune e aparentemente o único sobrevivente da cidade. Todos os dias faz emissões de rádio a tentar contactar mais sobreviventes, sem sucesso. Ao mesmo tempo, trabalha incansavelmente a procurar a cura para o vírus a partir das suas células imunes, também sem sucesso.
Entretanto, a cidade é agora uma selva urbana. Veados correm em bandos por entre os carros parados no meio da rua desde há três anos quando as pessoas estavam a tentar fugir da quarentena (só 15 dias, a princípio, prometeram-lhes; onde é que eu já ouvi isto?). De repente, aparece uma leoa que mata um dos veados. O leão e os leõezinhos aparecem logo a seguir. Isto foi muito interessante. De certeza devem ter sido animais fugidos do Jardim Zoológico na falta dos tratadores, ou assim suponho a presença de leões em Manhattan.
Robert Neville tem uma única companheira, a cadela Max. Os cães podem ficar infectados apenas por contacto, mas não por via aérea como as pessoas. É claro que o filme usou o pobre animal para nos partir o coração.
Neste momento aparecem mais sobreviventes, quando Neville já não julgava que existissem.
E depois as coisas tornam-se estranhas. Afinal os seres humanos infectados não ficaram tão imbecis e raivosos como os pintaram, o que arrasa todo o world building feito até então.
Cheguei ao fim do filme sem perceber o que este queria transmitir. As imagens do mundo apocalíptico, desértico e selvagem, são sempre tão arrepiantes quanto fascinantes. Mas depois de vermos uma catrefada de filmes e séries do género já não tem o impacto que deve ter tido em 2007. O enredo não conseguiu aguentar-se nas pernas. Sinceramente não gostei e já vi muito melhor a partir do mesmo material. A melhor cena é mesmo a dos leões. Não estava nada à espera.

13 em 20 (mais um ponto pelos leões)