Nunca pensei que esta série tivesse uma segunda temporada. A primeira pareceu-me uma história finalizada. Vic McQueen venceu, não sem o sacrifício do pai do seu filho, o Wraith (carro-vampiro) ficou sem motor, e Manx acabou comatoso no hospital.
Por outro lado Bing Partridge andava a monte. Bing Partridge é o equivalente para Manx do que Renfield era para Drácula. Ainda na esperança de ser levado para a Christmasland (onde não ia divertir-se tanto como pensava), Partridge consegue localizar o Wraith e pô-lo a funcionar. Após oito anos de coma, Charles Manx morre no hospital, mas assim que o Wraith volta a ter motor, Manx ressuscita.
Durante todo este tempo, Vic McQueen nunca se convenceu de que Manx já não era um perigo. Agora ela mora com o filho e com o namorado e tem uma oficina de motas onde dá largas aos seus talentos criativos pintando capacetes por encomenda. Longe ficaram os sonhos de entrar numa escola de Belas Artes e ser alguém. Mas não se pode dizer que viva mal, ou que seja uma má mãe. Simplesmente desenvolveu o hábito de beber whisky (herdado direitinho do pai) a toda a hora e às escondidas. Em sua defesa, durante estes anos todos Vic continuou a receber telefonemas ameaçadores directamente da Christmasland (é Millie, filha de Manx, quem lhe telefona), que muitas vezes guarda em segredo para si. Estes telefonemas tanto chegam em telefones normais como em telefones de brinquedo, o que é por si só arrepiante.
A notícia da morte de Manx não a convence, e o seu sexto sentido tem razão. Manx é ressuscitado assim que o carro volta à vida. E agora Manx só tem um objectivo; vingar-se e roubar o filho de Vic, levando-o também para a Christmasland.
Enganei-me, na crítica anterior, ao julgar que Manx era velho, mesmo muito velho. Aqui eu estava a pensar em séculos. Afinal não era assim tão velho, e um flashback explica-nos o seu encontro com o maldito Wraith e a criação da Christmasland imaginária. Manx era jovem durante os anos 30, época da Grande Depressão. O Wraith foi comprado barato como tentativa de criar o seu próprio negócio assim que as coisas melhorassem. A mulher de Manx zanga-se com ele por gastar dinheiro inutilmente, dinheiro que ele arranjou empenhando as jóias dela (“Já ninguém tem dinheiro para um chaffeur, Charles”), e ameaça sair de casa e levar com ela a filha de ambos, Millicent. É então que algo aqui acontece e que o Wraith se torna um carro-vampiro e que a Christmasland, imaginada em conjunto por Charles e Millie, se torna uma realidade (embora imaginária). Millie é a sua primeira habitante e a mãe dela, esposa de Manx, a sua primeira vítima.
Deste modo, nos nossos dias Manx tem uns 110/120 anos, e uma aparência jovem alimentada pelas almas dos miúdos raptados. Falhando o Wraith, a força mágica que lhe confere imortalidade, Manx transforma-se num velho da sua idade real. Mas, praticamente imortal, a única maneira de o matar é destruindo o Wraith, o que não é tarefa fácil porque o carro tem vontade própria.
Recuperado da morte e de uma autópsia (matar Manx não é mesmo fácil), este começa de imediato a cercar Wayne McQueen, filho de Vic. O apelo da Christmasland é praticamente irresistível para uma criança, e depois de alguma resistência Manx consegue dar-lhe a volta. Não é um rapto. Mais doloroso ainda para Vic, a certa altura é Wayne quem segue Manx voluntariamente (ou o mais voluntariamente possível nestas circunstâncias, em que o Wraith já lhe comeu a alma). Agora Vic tem de tentar resgatar o seu filho e matar Manx de uma vez por todas.
Tal como a primeira temporada, também a segunda vale mais pelo complexo drama familiar do que pela história de terror em si. Vic sempre quis escapar ao mesmo destino dos pais, mas acaba exactamente como eles. Entretanto, Chris McQueen, pai de Vic, já deixou a bebida, mas Vic ainda agora começou. Vic atinge o ponto mais baixo quando pega fogo à sua própria casa, embriagada, tentando livrar-se de todos os telefones de onde recebe chamadas fantasmagóricas. Por causa disto recebe um ultimato do namorado: ou pára de beber ou está tudo terminado entre eles. Vic decide deixar Wayne com o pai adoptivo e sair de casa. Tirando a parte das chamadas fantasmagóricas, este podia ser um drama em que os filhos acabam a repetir os erros dos pais, por falta de condições ou de apoio para os superarem, ou por auto-sabotagem. A família McQueen precisava de muita terapia, com ou sem Manx.
Efectivamente, o drama continua a ser o ponto forte da série à medida que a história de terror se torna cada vez mais rebuscada e a premissa é esticada até um limite em que a corda da credibilidade ameaça partir-se. Para mim, partiu-se mesmo. Por exemplo, qual é o plano deles para destruir a Christmasland? Detoná-la com explosivos. Como é que se faz explodir um espaço imaginário? Com explosivos imaginários? Não, os explosivos até eram bem reais. Isto para mim foi a certeza de que mais valia se terem ficado pela primeira temporada.
Todos os episódios são esticados “demais”, espremendo todas as pinguinhas do drama. Não digo que tenha sido uma temporada chata com episódios de encher chouriços, mas notou-se que as ideias já faltavam quando, em vez de usar explosivos reais (duas vezes, ainda por cima, e em vão), Vic poderia, por exemplo, ter tentado recrutar a ajuda de outros “criativos” como ela, expandindo o universo sobrenatural da série.
Recomendo NOS4A2 a quem gosta de um bom drama familiar com um carro-vampiro à mistura (ou a toda a gente que deteste o Natal tanto quanto eu), mas a segunda temporada não vale tanto como a primeira. O último episódio tentou lançar as bases para uma continuação, mas a série foi cancelada. Já não havia por onde esticar mais.
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