terça-feira, 27 de fevereiro de 2007
Paz
Não sei como escrever sobre isto.
A minha vida tem conhecido uma tal calma que não me atrevo a mexer uma palha que transtorne esta total tranquilidade.
Não lhe chamaria felicidade mas estou muito confortável neste ninho que criei para mim. Nada mais interessa.
A minha vida tem conhecido uma tal calma que não me atrevo a mexer uma palha que transtorne esta total tranquilidade.
Não lhe chamaria felicidade mas estou muito confortável neste ninho que criei para mim. Nada mais interessa.
quinta-feira, 15 de fevereiro de 2007
Porque votei "sim"
A princípio, decidi não votar de todo. Acho que este referendo foi uma palhaçada para entreter o povo e o distrair dos problemas mais graves que são de facto urgentes e terríveis, como, por exemplo, e ironicamente, a falta de segurança e recursos que levam as mulheres a abortar.
Foi o ebola que, noutro sítio onde conversamos, me convenceu a ir votar. Disse-me qualquer coisa como: "já que não nos deixam resolver tudo, vamos resolver o que podemos resolver". Não respondi, é verdade, mas fiquei a pensar no assunto. E achei que devia ir votar e fazer a minha parte para de facto resolver o assunto.
Cheguei à conclusão, com este voto, de que, para o pior e o melhor, considero a hipocrisia um mal pior do que a indiferença pela vida. Não é todos os dias que se chega a uma conclusão destas e não gosto mais de mim por admiti-lo mas às vezes é preciso reconhecer a chaga no próprio corpo antes de o apontar no corpo dos outros.
Em 1998, votei "não". E se me perguntarem se concordo com a liberdade da mulher em abortar até às dez semanas, não concordo, não concordo mesmo nada! Votei contra a minha consciência. E votei assim por uma razão:
Não quero que as mulheres não façam um aborto porque o aborto é ilegal. Quero que as mulheres não façam um aborto porque a sua consciência não o permite. Em plena liberdade, em pleno uso do seu livre arbítrio. E isso é uma tomada de consciência civilizacional, como acabar com as touradas ou a pena de morte. É uma longa caminhada da humanidade para se tornar mais sensível, mais empática, mais humana. É nisso que acredito.
Em 1998, porque estava convencida de que o "sim" ia ganhar, pensei que o meu voto era uma tomada de posição, uma expressão de consciência. A abstenção maciça chocou-me. Sim, chocou-me que todas aqueles mulheres que já foram abortar tivessem tido uma oportunidade de deixarem de ser criminosas aos olhos da lei e não a tivessem aproveitado. Chocou-me que as pessoas, homens também, porque os filhos não são feitos só pelas mulheres, se estejam perfeitamente nas tintas para o facto de serem criminosos ou não.
Mas estávamos em 1998. Ainda tinha muito que aprender sobre este país antes de conseguir acreditar que é um país de pernas para o ar. E como elas (e eles) não votaram, fui votar eu, desta vez, porque já vi miséria material -- e moral -- suficiente para perceber que às vezes o aborto é a melhor solução. Todos os argumentos pró e contra já foram amplamente debatidos e não vou repeti-los aqui.
O que me fazia confusão era a hipocrisia. Isso acabou. Assim o ar parece mais limpo.
Agora também vou poder dizer a todos os casais que foram irresponsáveis que os acho irresponsáveis e que se deviam considerar irresponsáveis. Agora posso dizer-lhes que os acho levianos e insensíveis. A liberdade implica responsabilidade. É por isso que as crianças não andam sozinhas na rua.
Perturba-me, imenso, que pensem em obrigar-me a pagar os abortos dos outros com o dinheiro dos meus impostos. O Estado não tem nada que meter o bedelho na vida íntima das pessoas. Estar grávida não é uma doença. Fazer um filho não é ter cancro. Evita-se. Ou aborta-se. Mas não quero ser eu a pagar. Suspeito, pelo andar da carruagem, que não terei outra alternativa senão pagar abortos de filhos que não fiz.
E pergunto-me: homessa! E ninguém pega num cacete e se revolta num país em que não há dinheiro para manter abertas maternidades mas há meios e recursos para meter o aborto no Orçamento de Estado?!
Não espero resposta a esta pergunta de retórica. Claro que não há revolta. Está tudo demasiado cheio de fome para se levantar.
Mas não quero fugir muito ao intuito deste post. Porque votei "sim". Fui votar sim para acabar com a hipocrisia. Ponto final. Neste acto, também contribuí para liberdade de escolha. Por isso, tenho o direito de exigir o mesmo para mim. Onde está a minha liberdade de escolha de ter um filho? Não sou suficientemente irresponsável para trazer ao mundo uma criança para viver na miséria. Gostaria muito de ter a liberdade de escolha de trazer ao mundo uma criança em condições dignas sem ter de a dar a gente rica. Onde está a minha liberdade de escolha?
Ah, pois, já me esquecia. Tenho tanta liberdade de escolha como a mulher que, desesperada, vai fazer um aborto. É essa a liberdade que nós temos.
Todos os dias acorda um. Que hoje acordem mais uns quantos.
Foi o ebola que, noutro sítio onde conversamos, me convenceu a ir votar. Disse-me qualquer coisa como: "já que não nos deixam resolver tudo, vamos resolver o que podemos resolver". Não respondi, é verdade, mas fiquei a pensar no assunto. E achei que devia ir votar e fazer a minha parte para de facto resolver o assunto.
Cheguei à conclusão, com este voto, de que, para o pior e o melhor, considero a hipocrisia um mal pior do que a indiferença pela vida. Não é todos os dias que se chega a uma conclusão destas e não gosto mais de mim por admiti-lo mas às vezes é preciso reconhecer a chaga no próprio corpo antes de o apontar no corpo dos outros.
Em 1998, votei "não". E se me perguntarem se concordo com a liberdade da mulher em abortar até às dez semanas, não concordo, não concordo mesmo nada! Votei contra a minha consciência. E votei assim por uma razão:
Não quero que as mulheres não façam um aborto porque o aborto é ilegal. Quero que as mulheres não façam um aborto porque a sua consciência não o permite. Em plena liberdade, em pleno uso do seu livre arbítrio. E isso é uma tomada de consciência civilizacional, como acabar com as touradas ou a pena de morte. É uma longa caminhada da humanidade para se tornar mais sensível, mais empática, mais humana. É nisso que acredito.
Em 1998, porque estava convencida de que o "sim" ia ganhar, pensei que o meu voto era uma tomada de posição, uma expressão de consciência. A abstenção maciça chocou-me. Sim, chocou-me que todas aqueles mulheres que já foram abortar tivessem tido uma oportunidade de deixarem de ser criminosas aos olhos da lei e não a tivessem aproveitado. Chocou-me que as pessoas, homens também, porque os filhos não são feitos só pelas mulheres, se estejam perfeitamente nas tintas para o facto de serem criminosos ou não.
Mas estávamos em 1998. Ainda tinha muito que aprender sobre este país antes de conseguir acreditar que é um país de pernas para o ar. E como elas (e eles) não votaram, fui votar eu, desta vez, porque já vi miséria material -- e moral -- suficiente para perceber que às vezes o aborto é a melhor solução. Todos os argumentos pró e contra já foram amplamente debatidos e não vou repeti-los aqui.
O que me fazia confusão era a hipocrisia. Isso acabou. Assim o ar parece mais limpo.
Agora também vou poder dizer a todos os casais que foram irresponsáveis que os acho irresponsáveis e que se deviam considerar irresponsáveis. Agora posso dizer-lhes que os acho levianos e insensíveis. A liberdade implica responsabilidade. É por isso que as crianças não andam sozinhas na rua.
Perturba-me, imenso, que pensem em obrigar-me a pagar os abortos dos outros com o dinheiro dos meus impostos. O Estado não tem nada que meter o bedelho na vida íntima das pessoas. Estar grávida não é uma doença. Fazer um filho não é ter cancro. Evita-se. Ou aborta-se. Mas não quero ser eu a pagar. Suspeito, pelo andar da carruagem, que não terei outra alternativa senão pagar abortos de filhos que não fiz.
E pergunto-me: homessa! E ninguém pega num cacete e se revolta num país em que não há dinheiro para manter abertas maternidades mas há meios e recursos para meter o aborto no Orçamento de Estado?!
Não espero resposta a esta pergunta de retórica. Claro que não há revolta. Está tudo demasiado cheio de fome para se levantar.
Mas não quero fugir muito ao intuito deste post. Porque votei "sim". Fui votar sim para acabar com a hipocrisia. Ponto final. Neste acto, também contribuí para liberdade de escolha. Por isso, tenho o direito de exigir o mesmo para mim. Onde está a minha liberdade de escolha de ter um filho? Não sou suficientemente irresponsável para trazer ao mundo uma criança para viver na miséria. Gostaria muito de ter a liberdade de escolha de trazer ao mundo uma criança em condições dignas sem ter de a dar a gente rica. Onde está a minha liberdade de escolha?
Ah, pois, já me esquecia. Tenho tanta liberdade de escolha como a mulher que, desesperada, vai fazer um aborto. É essa a liberdade que nós temos.
Todos os dias acorda um. Que hoje acordem mais uns quantos.
quarta-feira, 14 de fevereiro de 2007
Corpse Bride (2005)
Quando Tim Burton faz filmes de bonecos deixa-me sem palavras, mas não necessariamente no bom sentido. Por um lado, fico fascinada pela técnica e pela beleza da imagem; por outro, profundamente desiludida pela superficialidade da história que, apesar de fantástica, não deixa de ser inconsistente e de uma simplicidade infantil. Por falar em infantil, não é por acaso que li algures que Tim Burton faz nestes filmes um Walt Disney do cinema de terror, mas na minha opinião o realizador não demonstra pela morte o respeito que ela merece. E aqueles trocadilhos constantes, eram suposto ter piada? Assim como a dança dos esqueletos?... Fico na dúvida. É um filme para crianças ou adultos?
No caso de "Nightmare Before Christmas", apenas gente crescida pode compreender a complexidade de Jack, mas em "Corpse Bride" as personagens são apenas bonecos, marionetas de papel, sem pés nem cabeça (algumas, literalmente, e aqui vai mais um trocadilho dispensável e sem graça nenhuma). Tim Burton habituou-nos a melhor, muito melhor.
Isto lembra-me aquela velha história: a beleza é fundamental, e enche o olho, mas sem conteúdo é uma beleza vazia que perde o interesse.
Pela técnica envolvida, 14 em 20.
The Glow (2002)
"The Glow" passou recentemente na tv portuguesa e é daqueles filmes discretos e despretenciosos que entretém e merece alguns comentários.
A história é simples e recorda outros filmes de terror. Um jovem casal é convidado por um grupo de idosos a viver num luxuoso apartamento num condomínio fechado a preço muito vantajoso. Uma oportunidade difícil de encontrar e ainda mais de recusar. Este grupo de idosos depressa começa a parecer uma seita, cultuando uma obsessão com o bem estar estar físico, a ginástica, a alimentação saudável. E muitos batidos cor de rosa...
A jovem esposa, que fuma às escondidas, começa a sentir-se desconfortável nesse ambiente que de tão "saudável" se torna opressivo, e que a está a separar cada vez mais do marido, um grande adepto do fitness que partilha das manias dos anfitriões. Mas depois do desaparecimento súbito do casal de inquilinos que os antecederam, ela começa a investigar e a descobrir factos assustadores sobre o grupo de idosos que a princípio pareciam tão bem intencionados. Periodicamente, estes alugavam apartamentos a outros casais, jovens e sem família, que acabavam por desaparecer sem deixar rasto. Mais. Todos os idosos do condomínio estavam de facto muito bem conservados. Todos tinham mais de 100 anos.
Ninguém acredita na sua tentativa de expor os senhorios como assassinos, o que lhe vale quase o internamento por loucura. (Esta parte, curiosamente, assemelha-se às cenas mais carismáticas de "Rosemary's Baby", de Roman Polanski, e o espectador dá por si à espera de descobrir que o marido também está feito com os velhos, mas não é o caso.)
Afinal, o batido cor de rosa não é de morango... mas de sangue. Um dos idosos, médico reformado, descobriu no sangue dos jovens a substância necessária à prolongação da vida, e o destino dos inquilinos era a sangria. Os bondosos velhinhos eram, na verdade, modernos vampiros.
É um filme de que não se deve esperar muito, excepto pela presença de Portia de Rossi, actriz bastante conhecida da série "Ally McBeal", num papel muito diferente.
Duas morais se podem tirar desta história tão velha como o "Capuchinho Vermelho". Primeira: quando a esmola é grande, o pobre desconfia. Segunda: a obsessão pela saúde é tão doentia como um regime fascista (os americanos que o digam).
12 em 20 pelo entertenimento.
A história é simples e recorda outros filmes de terror. Um jovem casal é convidado por um grupo de idosos a viver num luxuoso apartamento num condomínio fechado a preço muito vantajoso. Uma oportunidade difícil de encontrar e ainda mais de recusar. Este grupo de idosos depressa começa a parecer uma seita, cultuando uma obsessão com o bem estar estar físico, a ginástica, a alimentação saudável. E muitos batidos cor de rosa...
A jovem esposa, que fuma às escondidas, começa a sentir-se desconfortável nesse ambiente que de tão "saudável" se torna opressivo, e que a está a separar cada vez mais do marido, um grande adepto do fitness que partilha das manias dos anfitriões. Mas depois do desaparecimento súbito do casal de inquilinos que os antecederam, ela começa a investigar e a descobrir factos assustadores sobre o grupo de idosos que a princípio pareciam tão bem intencionados. Periodicamente, estes alugavam apartamentos a outros casais, jovens e sem família, que acabavam por desaparecer sem deixar rasto. Mais. Todos os idosos do condomínio estavam de facto muito bem conservados. Todos tinham mais de 100 anos.
Ninguém acredita na sua tentativa de expor os senhorios como assassinos, o que lhe vale quase o internamento por loucura. (Esta parte, curiosamente, assemelha-se às cenas mais carismáticas de "Rosemary's Baby", de Roman Polanski, e o espectador dá por si à espera de descobrir que o marido também está feito com os velhos, mas não é o caso.)
Afinal, o batido cor de rosa não é de morango... mas de sangue. Um dos idosos, médico reformado, descobriu no sangue dos jovens a substância necessária à prolongação da vida, e o destino dos inquilinos era a sangria. Os bondosos velhinhos eram, na verdade, modernos vampiros.
É um filme de que não se deve esperar muito, excepto pela presença de Portia de Rossi, actriz bastante conhecida da série "Ally McBeal", num papel muito diferente.
Duas morais se podem tirar desta história tão velha como o "Capuchinho Vermelho". Primeira: quando a esmola é grande, o pobre desconfia. Segunda: a obsessão pela saúde é tão doentia como um regime fascista (os americanos que o digam).
12 em 20 pelo entertenimento.
A expansão da alma
Diz Neale Donald Walsch, em "Conversations With God", que quando o ser descobre a alma fica tão deslumbrado que durante muito tempo se esquece de que ainda vive no mundo material e tem um corpo que precisa de cuidados.
Isto aconteceu-me. Durante dois ou três anos, não sei bem, porque nesse deslumbramento o tempo deixa de ser medido porque também perde a importância, negligenciei quase completamente os aspectos materiais da existência porque os espirituais se tornaram indizivelmente mais importantes.
Depois desta passagem, regressei "à terra". Foi então que comecei a reparar como o espaço que me rodeava era muito mais pequeno do que eu me lembrava, não só na minha própria casa como em todos os outros locais que frequento e sempre frequentei. Das duas uma, ou eu cresci ou as paredes começaram a encolher, tal como encolhem as casas à medida que as crianças crescem. Só que eu estou do mesmo tamanho. Então, como explicar isto?
Isto aconteceu-me. Durante dois ou três anos, não sei bem, porque nesse deslumbramento o tempo deixa de ser medido porque também perde a importância, negligenciei quase completamente os aspectos materiais da existência porque os espirituais se tornaram indizivelmente mais importantes.
Depois desta passagem, regressei "à terra". Foi então que comecei a reparar como o espaço que me rodeava era muito mais pequeno do que eu me lembrava, não só na minha própria casa como em todos os outros locais que frequento e sempre frequentei. Das duas uma, ou eu cresci ou as paredes começaram a encolher, tal como encolhem as casas à medida que as crianças crescem. Só que eu estou do mesmo tamanho. Então, como explicar isto?
domingo, 4 de fevereiro de 2007
"Shadow of the Vampire" (2000)
Um filme sobre um filme. Um filme de vampiros sobre um filme de vampiros. Um vampiro a fazer de actor a fazer de vampiro. - Curioso como a mitologia se vai vampirizando a si própria. Já o Théâtre des Vampires foi descrito por Anne rice como "vampiros a fazer de humanos a fazer de vampiros!. -
John Malkovich interpreta um Murnau febril e sem escrúpulos que faz um pacto com o diabo por paixão à sua arte, à ciência da sua câmara recém nascida. Obsessivo, promete a actriz principal ao vampiro mais repugnante da história do cinema, tão repugnante que nem os actuais meios de caracterização reduziram Willem Dafoe a algo semelhante à personagem de Max Schreck, o original Nosferatu.
O verdadeiro golpe de asa do filme só chega no fim, quando o espectador se questiona quem é mais repugnante, o vampiro ou o implacável realizador. Em suspenso até ao último minuto.
Só por isso, 14 em 20.
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